As narrativas em torno do sobrevivente enquadraram o meteorito
por meio de ações e de feitos humanos principiados com o desco-
brimento da pedra no sertão baiano em 1784, passando por momen-
tos de esquecimento e por recordações1, assim como por tentativa
fracassada de remoção e, finalmente, com o transporte bem suce-
dido para o Rio de Janeiro em 1888. Todavia, pouco se falou sobre
seu significado sociocultural na Bahia. O que ficou em seu local?
Conforme relatos históricos, em um primeiro momento, no local da
queda e da descoberta do meteoro edificou-se um pequeno obe-
lisco denominado “D. Pedro II”, homenageando a família imperial, o
Ministro da Agricultura Rodrigo Silva, o Visconde de Paranaguá e os
membros da Comissão de Transporte do Bendegó. Em um segundo
instante, um marco memorial aos serviços de engenharia da logística
de transporte também foi erguido na Estação Ferroviária de Jacu-
rici. No translado da rocha até a capital, projetavam-se interesses
políticos e internacionais, como, também, a possibilidade de contri-
buir com o conhecimento científico. Sua remoção contou com uma
solenidade cívica, proveniente de ato do Estado que celebrava os
avanços tecnológicos necessários ao transporte do objeto à capital,
onde a pedra foi cortada2 e recebida em grande estilo.
No interior da Bahia, o meteorito tornou-se uma referência para a
população local, um monumento natural que se inseriu na memória
social enquanto elemento responsável pelo equilíbrio entre os ele-
mentos da natureza. Os obeliscos não compensaram sua ausência
energética, enquanto as reproduções destinadas aos distintos es-
paços institucionais representam-na apenas em suas características
formais, sem, contudo, conferir-lhe ou transferir-lhe poderes atribu-
ídos ao original3.
Nas informações veiculadas em diversos locais e distintos momen-
tos históricos da pedra, pouco se falou em outras temporalidades,
modos de concebê-la fora do contexto nacional ou mesmo de uma
perspectiva estritamente antropocêntrica. Raramente se enfatizou
sua formação geológica, sua criação e viagem por bilhões de anos
no sistema solar, assim como sua entrada na atmosfera, vindo a se
chocar chocou com a Terra. Na perspectiva do sistema solar, suas
1 Estudos pontuais
foram realizados por cientis-
tas e naturalistas, a exemplo
de Aristides Franklin Mornay,
William Hyde Wollaston, Carl
Friedrich Philipp Von Martius e
Johann Baptist Von Spix, que
viajaram pelo Brasil.
2 Um pedaço de
60 kg foi cortado, dividido e
doado a instituições nacionais e
estrangeiras.
.
3 Foram confec-
cionadas quatro réplicas da
pedra. Em 1889, uma réplica,
que se encontra hoje no Palais
de la Découverte, foi exposta
na Exposição Universal de
Paris. As outras três cópias se
encontram na Bahia (no Museu
do Sertão em Monte Santo, no
Museu Geológico da Bahia em
Salvador, e no Museu Antares
de Ciência e Tecnologia, em
Feira de Santana).
arte: lugar : cidade | volume 1, número 1, maio/out. 2024 | doi: 10.22409/arte.lugar.cidade.v1i1.62466 62