Artigo

EPIFANI FILHO, Marco Aurélio A. e SANANDRES, Luiza B.

CONFLUÊNCIAS

Revista Interdisciplinar de Sociologia e Direito

ISSN 1678-7145 || EISSN 2318-4558

NOVAS TECNOLOGIAS PARA PRÁTICAS ANTIGAS NA

ADMINISTRAÇÃO DE JUSTIÇA:

doistrabalhosdecamponosistemajudicial brasileiro 1

MarcoAurélioA.E.FilhoeLuizaB. Sanandres

Universidade Federal Fluminense. E-mail: alvesepifani@yahoo.com.br E-mail: luizabarcante@outlook.com

RESUMO

Oobjetivo deste artigo é analisar o impacto da utilização de novas tecnologias no sistema de justiça brasileiro, através da comparação entre duas pesquisas de cam - po, uma realizada na Justiça do Trabalho e a outra no Ministério Público. Assim, procura-se compreender como os atores do campo adaptam as suas atividades e propósitos institucionais, alterando os programas e orientações estruturais im - postas pelos sistemas digitais. Como conclusão, a sugestão de que as reformas tecnológicas não providenciam mudanças gerais no nível da burocracia, mas ex - plicitam políticas particularizadas em diferentes contextos institucionais. Palavras-chave: PJe. Judiciário. Ministério Público. Práticas institucionais. Burocracia.

ABSTRACT

This paper discusses new technologies impact on Brazilian justice system. We compare different fieldworks institutional contexts, on labour justice and pu - blic attorneys institution. We observed how old practices are shaped by the - se new digital technologies. Actors adapt their institutional activities and pur - poses by changing programs and structural orientations imposed by digital systems. In sum, we suggest these reforms do not provide changes in bureau - cracy level, however it explicits particularized policies in institutional contexts. Key-words: e-Justice. Judiciary. Public ministry. Institutional practices. Bureaucracy.

1Esse trabalho é resultado de duas comunicações orais ocorridas nos seguintes eventos: IV ENADIR- Encontro Nacional de An -

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tropologia do Direito, GT14, Abordagens Antropológicas do Estado; 5º Seminári Interdisciplinar emSociologia e Direito, GT 20

NOVAS TECNOLOGIAS PARA PRÁTICAS ANTIGAS NA ADMINISTRAÇÃO DE JUSTIÇA

INTRODUÇÃO

Este trabalho busca discutir e com - preender o impacto da utilização de novas tecnologias no sistema de justiça brasileiro. Nos últimos anos, a Justiça Brasileira passou por muitas reformas e pequenas mudanças em sua buro - cracia. O processo judicial eletrônico aparece não somente como uma nova ferramenta para o trabalho, mas como uma solução para antigos problemas, que poderia melhorar a qualidade do serviço público através da facilitação e aceleração dos procedimentos judiciais. Este artigo surgiu de uma confron - tação de experiências de pesquisas. Trata-se da explicitação de diferentes contextos institucionais através da rea - lização de duas pesquisas de campo, uma realizada na Justiça do Trabalho e a outra no Ministério Público.

Durante a participação nas reuniões do Núcleo de Pesquisas sobre Práticas e Instituições Jurídicas (NUPIJ), vincula - do ao Programa de Pós-graduação em Sociologia e Direito (PPGSD) da Uni - versidade Federal Fluminense (UFF), nos socializamos academicamente e tivemos contato com professores e alu - nos da pós-graduação e da graduação que têm como objeto de estudo o direi - to a partir das práticas sociais e de sua configuração institucional.

Este ambiente, em que as experiên - cias são compartilhadas a fim de cons - truir o conhecimento conjuntamente, contribuiu para a construção dos dados

que serviram de base para este trabalho, bem como para a análise destes dados. Ainvestigação é baseada em pesquisa bibliográfica e trabalho de campo, fun - damentada em observações do trabalho cotidiano de servidores públicos, procu - radores de justiça e juízes trabalhistas, como um exercício de observação direta e presencial de fatos e fenômenos assim como estes aparecem nesta realidade social. Ademais, utiliza conversas infor - mais e entrevistas. Ressalte-se que pro - curamos compreender a sociedade pelas práticas dos indivíduos e não pelas leis. Durante as reuniões, percebíamos como antigas práticas burocráticas estavam sendo moldadas e adaptadas às novas tecnologias digitais, que es - tavam sendo implantadas em nossos campos de pesquisa.

No caso da Justiça do Trabalho, tra - ta-se de umapesquisa de campo sobre as práticas dos juízes trabalhistas e o pro - cesso de tomada de decisão, as formas de seleção das informações e do que é registrado. A partir da análise das prá - ticas dos atores jurídicos, pode-se ob - servar que os juízes e servidores perma - neciam realizando suas tarefas práticas da mesma maneira que anteriormente (com os autos físicos), apenas contor - nando cotidianamente os impedimen - tos gerados pelo sistema eletrônico.

Em contraste a esta pesquisa, com - para-se com outra realizada entre 2012 e 2014, emque foi feita uma pesquisa de campo sobre a organização do trabalho

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realizado nas Procuradorias de Justiça Criminais do Ministério Público do Es - tado do Rio de Janeiro. Aqui, os procu - radores de justiça utilizam a implanta - ção do processo judicial eletrônico para contratar novos assessores jurídicos para auxiliá-los no trabalho cotidiano. A comparação entre as práticas ob - servadas em campos de pesquisas dis - tintos tem por objetivo compreender os sentidos atribuídos ao trabalho e às relações pelos atores institucionais inse - ridos em cada um deles.

O que enfocaremos é como as nor - mativas são agenciadas e resignificadas no âmbito administrativo do Estado, explicitando como os profissionais des - tas instituições - servidores públicos, procuradores de justiça e juízes traba - lhistas - adaptam as suas atividades e propósitos institucionais, alterando os programas e orientações estruturais im - postas pelos sistemas digitais.

Nesse sentido, é fundamental a ex - plicitação e a descrição dos rituais ju - diciários, uma vez que este exercício de olhar para si mesmo e se questionar, é o que possibilita estranhar o que num primeiro momento parece natural, mas que, visto de outra perspectiva, não é nada tão óbvio ou natural assim (LIMA e LUPETTI 2010; LUPETTI, 2013). Comoconclusão, a sugestão deque as reformas tecnológicas não providenciam mudanças gerais no nível da burocracia, mas explicitam políticas particularizadas em diferentes contextos institucionais.

A INSTITUIÇÃO DA INFORMA - TIZAÇÃOCOMOUMA“MODER - NIZAÇÃO”DO JUDICIÁRIO

Para ojudiciário a conta é simples: tor - nar o processo de papel em meio exclusi - vamente eletrônico é igual a modernizar a instituição. Por isso, a principal campanha do CNJ, encapada pelo CSJT, é afirmar que “modernizar é parte do processo”. Por outro lado, as ciências sociais encaram a palavra modernização com outras acepções que significam princi - palmente o rompimento com um pas - sado de tradições para um momento em que é valorizado a racionalização e padronização das instituições.

Weber analisou as instituições mo - dernas, ainda que sem conceituar a modernidade, através dos tipos ideias com os quais descreveu as característi - cas destas instituições. De acordo com o sociólogo, estas instituições modernas exerciam tipos diferentes de dominação. O Judiciário está inscrito no tipo de do - minação racional técnico-legal (2014, p. 141) que, entre outras identificações, possui a “crença na legitimidade das or - dens estatuídas e do direito de mando daqueles que, em virtude dessas ordens, estão nomeados para exercer a domina - ção (dominação legal)” (2014, p. 141). Deste tipo de dominação decorrem categorias fundamentais tais como 1) exercício contínuo de funções oficiais; 2) sob determinada competência; 3) tendo o princípio da hierarquia oficial como maneira de apelar a um superior

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para exercer o controle e a supervisão; 4) regras que dão certa previsibilidade as ações das instituições; 5) separação absoluta entre o quadro administrativo e os meios de administração e produ - ção, ou seja, não se pode confundir os trabalhadores e a coisa administrada; 6) a não apropriação do cargo pelo deten - tor, que só ocorre um “direito” ao “car - go” (por exemplo, juízes) para garantir o exercício livre da profissão e não para adquirir vantagens; e, 7) tudo é docu - mentado na instituição burocrática, tudo deve se fixar por escrito sendo o “ponto essencial de toda moderna ação da associação” (2014, p. 143)

Weber afirma que a administração burocrática é a forma mais racional do exercício de dominação “porque nela se alcança tecnicamente o máximo de rendimento em virtude da precisão, continuidade, disciplina, rigor e confia - bilidade – isto é, calculabilidade tanto para o senhor quanto para os demais interessados” (2014, p. 145).

E,porfim,aindaafirmaqueodesenvol - vimentodestas formasemtodasas áreas da sociedade“épuraesimplesmenteo mesmo que o desenvolvimento e crescimento contínuos da administração burocrática: o desenvolvimento desta constitui, por exemplo, a célula germinativa do moderno Estado ocidental” (2014, p. 146). Percebemos que a burocracia e seus efeitos, comoapontado – principalmen - te a “calculabilidade” – são os fatores do desenvolvimento do Estado ocidental

moderno. Ou seja, modernizar uma es - trutura significa dar contornos de pre - visibilidade as suas ações para gerar cal - culabilidade tanto para o Estado quanto para quem está afeto a este poder.

Não há dúvidas que o Judiciário faz parte do Estado e funciona dentro de uma lógica de burocracia. Ocorre que ele permanece sem transparência e “calculabilidade”. Ainda prevalece a máxima de que uma mesma situação terá tratamento distinto se apresenta - do a juízes diferentes.

Desde a reforma do judiciário com a emenda constitucional nº 45 de 2004 são implementadas modificações pro - cedimentais para atingir uma seguran - ça jurídica ou uma previsibilidade no comportamento do Poder Judiciário. Exemplo disso são as súmulas vincu - lantes e os recursos repetitivos, e, mais recentemente a promulgação do Novo Código de Processo Civil.

Percebemos que o Judiciário con - sidera que modernizar é igual a infor - matizar, usar recursos tecnológicos. A principal propaganda do processo ele - trônico é diminuir o tempo cartorial do processo e aumentar o acesso ao pro - cesso uma vez que ele não é retido com nenhuma das partes, nem mesmo com o juiz. Assim, o argumento institucional não passa pela previsibilidade das ações realizadas dentro do Poder Judiciário. O que percebemos da análise dos diferentes contextos institucionais de uso dos sistemas eletrônicos de pro -

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cesso judicial é que existe uma função publicitária, de apelo, para o conven - cimento de que a opção por medidas tecnológicas é o caminho natural de uma instituição “moderna” – sincro - nizada com os acontecimentos so - ciais. E, de outro lado, uma função burocrática de captação de informa - ção para o controle da instituição. Como bem observou Fernando Fontainha a informatização como sen - do “uma verdadeira artéria aberta no Poder Judiciário por onde a modernida - de pode pulsar” (2012, p. 2). OPJe-JT (e todos os outros utilizados nos tribunais) passa a produzir dados sobre a atuação dos funcionários e juízes sem que eles possam controlar, diferentemente do que acontecia com o processo físico.

No entanto, nossos campos demons - tram que as práticas cotidianas emcartó - rios, audiências e gabinetes mostram um controle da informação pelas pessoas, a despeito do sistema. Assim, o sistema de informação, portanto tecnológico, apa - rece como um sistema de controle da informação que busca padronizar o que pode ou não ser feito no processo judi - cial, a despeito das necessidades locais daqueles que usam o sistema.

A JUSTIÇA DO TRABALHO: a audiência convergindo prá - ticas e formando híbridos

O campo de pesquisa na Justiça do Trabalho do Rio de Janeiro é o do con - texto das audiências trabalhistas da ci -

dade de Niterói-RJ. Esta pesquisa se deu entre 2013 e 2014 coincidindo com o primeiro ano de implantação do PJe-JT nas varas do trabalho desta cidade.

As audiências, trabalhistas ou em qualquer outro ramo do judiciário, são espaços privilegiados de observação do trabalho dos atores jurídicos. Nelas convergem o trabalho de todos eles em interação, onde está presente o juiz, o servidor (secretário de audiências), ad - vogados/procurador do trabalho além das partes e das testemunhas.

Se para Fontainha (2012) a informa - tização é a porta de entrada no judiciá - rio da modernidade, para Latour (2003) nós “Jamais fomos modernos ”.

De acordo com Latour (2003) a con - ta da modernidade não fecha. O preten - so rompimento com o passado fica só na teoria e o distanciamento entre o homem e o objeto, entre a sociedade e o laborató - rio, só gera mais problemas porque não explica os híbridos formados - aquilo que nem é uma coisa nem outra.

Para nós, diferente de Fontainha (2012), a informatização apenas insere o judiciário na modernidade porque dis - tancia ainda mais o homem do objeto. Como pôde ser observado no campo, antes da informatização, quando uma petição não era recebida pelo servidor no balcão do judiciário, a responsabili - dade era de alguma pessoa, que podia, por exemplo, ter fechado as portas antes do horário forense. Após a informatiza - ção, a petição pode não ser recebida por

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indisponibilidade do sistema eletrôni - co. Assim, a perda de um prazo proces - sual pode ser ocasionada por erro no sistema ou por falha da internet. Percebemos o local da audiência como o local em que, convergindo prá - ticas, prolifera-se híbridos da utilização do sistema pelo homem.

Em dezembro de 2011 iniciou-se a implantação nas varas do trabalho do país um sistema eletrônico para subs - tituição dos autos processuais físicos designado por Processo Judicial Ele - trônico da Justiça do Trabalho (PJe - -JT). No Rio de janeiro a implantação teve início em junho/2012 no mu - nicípio de Três Rios e em Niterói/RJ em julho de 2013. A partir deste mo - mento as ações judiciais só poderiam ser distribuídas por meio eletrônico mediante certificação digital. Con - sequentemente, ao longo do tempo, findando as ações físicas que foram sendo substituídas por ações movi - mentadas eletronicamente.

O PJe-JT está inscrito dentro dos re - cursos tecnológicos elaborado pela área de conhecimento de Tecnologia da In - formação. Portanto, inserido no campo de conhecimento de sistemas de infor - mação. O que observei durante a pes - quisa é que este sistema é utilizado como um sistema de controle da informação. Este sistema, embora possua uma linguagem própria da informáti - ca e seja chamado de processo judi - cial eletrônico, não possui diferenças

procedimentais do processo judicial físico. Ou seja, o que se observa é que existe um processo judicial, que pode ser utilizado tanto no meio físico quan - to no meio eletrônico.

Noentanto, oquese temem contornos diferenciados a partir da informatização dos autos processuais, é o controle da in - formação. Enãoé dequalquer informação. Nas audiências observadas pude ver que existem diversos tipos de informa - ções - que podem ou não serem registra - das - que influenciam nas decisões. Ou seja, é necessário entender estas catego - rias (informação, decisão e registro) para entender as práticas na audiência traba - lhista e também como influenciam na representação particular da burocracia com a autonomia do magistrado.

O controle da informação pelo sis - tema eletrônico surgiu no meu campo com a abordagem pelo magistrado re - quisitando das partes a apresentação do CPF das testemunhas, sem o qual não poderia ser feito a intimação destas para o comparecimento em audiência. Se no processo físico bastava o nome e o endereço da pessoa, agora é necessário um documento sob pena de perda da prova. A mesma exigência aparece para a distribuição da ação sendo necessá - rio CPF da parte e o CNPJ da empresa, além de CEP, sem qual não é possível inserir o endereço das partes.

Com o processo físico a responsa - bilidade destas informações era da ins - tituição e do funcionário que recebia a

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peça inicial e que cadastrava as informa - ções no sistema (muitas vezes relevan - do algumas informações). Atualmente, o sistema torna esta tarefa menos ma - leável e transfere a responsabilidade do registro para quem propõe a ação. Ocorre que, a mudança na presta - ção da informação não retira o poder dos juízes e dos funcionários de con - trolarem as informações a despeito do sistema, porque o sistema só controla aquilo que é inserido na sua platafor - ma de processamento.

Nas audiências observadas, pude notar que muito do que é dito pelas partes (informações) e que subsidia a decisão do magistrado, não é registra - do na ata da audiência, que funciona como um instrumento institucional de memória dos atos da audiência. Mui - tas vezes o que é escrito na ata - e que passa a ser passível de controle - é tão somente a decisão final.

Em audiências, por exemplo, é de - cidido se as testemunhas serão trazi - das independentemente pelas partes, ou seja, sob responsabilidade destas ou mediante intimação do juízo. Este mo - mento, que observei cotidianamente, é uma espécie de negociação entre o ma - gistrado e as partes que informam sobre a necessidade (ou não) da intimação e o magistrado argumenta quando é possí - vel ou não realizar a intimação. No final o que consta na ata é a modalidade de comparecimento da testemunha: por intimação ou independente.

Informação, então, é tudo aquilo que é dito em audiência ainda que não exista nenhuma forma de registro destas infor - mações, sendo que o juiz pode ou não colocar estas informações, além das de - cisões, quando entender necessário. Este é o caso visto em uma audiên -

cia emque o juiz, ao perguntar ao traba - lhador acerca do recebimento do segu - ro desemprego, este informou que não havia recebido. O juiz então perguntou se ele estava trabalhando e quando ini - ciou o novo serviço. Não sabendo o tra - balhador precisar a informação, o juiz decidiu não registrar no ofício a data de início no novo serviço “—para não ge - rar confusão na CEF”.

Como observei, o PJe é um sistema de controle da informação sem mudan - ças substanciais no processo judicial, ou seja, ele continua o mesmo só que por meio eletrônico. Esta é a visão normati - va da implementação do PJe. No entanto, na prática pude observar mudanças na maneira de lidar com o processo. Mes - mo porque cada magistrado conduz a audiência de uma maneira e é assim que institucionalmente ela é vista, o que pode ser observado na leitura das orientações sobre o PJe do TRT do Rio de Janeiro:

Processo Judicial Ele - trônico mudará a maneira como o advogado vai apre - sentar sua contestação. Ele não poderá mais levá-la em papel, já que o processo é

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todo eletrônico. De resto, a audiência continuará trans - correndo da mesma manei - ra. Cada magistrado con - duzirá os procedimentos de acordo com o seu entendi - mento e os servidores esta - rão preparados para resol - ver eventuais problemas que possam ocorrer. (grifo nosso)

Na Justiça do Trabalho prevalece o princípio da concentração dos atos que gerou a audiência una, ou seja, em uma única audiência é feita a proposta de acordo, a impugnação da contestação, o estabelecimento dos pontos controver - sos e incontroversos, bem como a pro - dução de provas para possibilitar uma sentença rápida. No entanto, com o pro - cesso eletrônico dificilmente observei uma audiência ocorrer sem que houves - se o desmembramento destas fases.

Isto ocorre principalmente porque o tempo de audiência passou a ser muito maior do que o reservado para ela na pauta do dia, sendo o atraso das au - diências algo considerado ruim para o magistrado que se irritava com o “fala - tório” dos diversos advogados e de al - gumas partes na sala de audiências. Percebi, com isso, que o magistrado, muitas vezes, busca apenas administrar o processo (e não o conflito), se preo - cupando em acelerar ou atrasar o anda - mento do processo dependendo de sua intenção nesta administração.

Neste caso se aplica o estudo de Mi - randa (2000, p. 71) que diz:

A ideia de que o uso dos computadores acabaria com essa apropriação do saber não é adequada, pois não conside - ra que a lógica do sistema per - mite que as pessoas se tornem as únicas detentoras do conhe - cimento, que a circulação do saber seja dependente da “boa vontade” dos que o detém. De modo que a informação só en - trará no arquivo do computa - dor se o funcionário quiser.

Assim, nem tudo se registra porque os registros geram constrangimentos para os juízes que na audiência são aque - les que têm o poder de dizer o que se re - gistra ou não, a não ser que o advogado peça expressamente que conste na ata. Como já dito, o que se registra são

as decisões. Dificilmente as demais in - formações são registradas, que costu - mam estar apenas nos depoimentos das testemunhas ou das partes. E o registro é feito na ata de audiências.

A ata de audiência é um instrumento muito importante para o processo e para os atores judiciais. Afinal, o que não est á na ata não tem valor jurídico. Assim, tudo o que for feito a despeito da ata pode ter validade para as pessoas eminteração, mas legalmente, normativamente, o que não estiver registrado não pode ser cobrado.

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É o caso do recurso das decisões interlocutórias na justiça do trabalho . Estas só podem ser questionadas após a sentença final junto com o recurso mais amplo, se presente o descontenta - mento de uma das partes.

Uma vez presenciei em audiência em que o magistrado perguntou se a decisão que ele estaria tomando teria alguma “observação” ou não. Naquela situação o advogado disse que não. O magistrado não aceitou a desistência do trabalhador de um acordo feito entre as partes na sua frente. O magistrado afirmou que “—aqui não é brincadeira, aceitou na minha frente não vai voltar atrás”. Todos estes constrangimentos aconteceram em audiência, no entanto, não foram registrados e para o processo é como se não houvesse ocorrido.

O fato dos juízes não registrarem in - formações e decisões ematas de audiência não se restringe a este caso, mas também em outras situações abordadas por Ana Carolina Penha (2014) quanto às decisões interlocutórias a pretexto de colocar em prática o princípio de proteção ao traba - lhador queinformaalegislação trabalhista. Nesse sentido, Miranda (2000, p. 71) explicita o que foi observado no contexto trabalhista:

a circulação da informação não depende, apenas, da téc - nica de armazenamento ou do modo como se organizam os dados, ela depende, principal -

mente, das tradições culturais envolvidas. Assim, não basta apenas informatizar os dados para que essa lógica seja alte - rada, é preciso que essas prá - ticas “privatizadoras” sejam explicitadas e discutidas.

Assim, a burocracia, sob o pretex - to da “calculabilidade”, necessita fazer o controle das informações e produzir es - tatísticas. Ocorre que, na prática, os ato - res ressignificam este controle de acordo com suas necessidades neste lugar onde se produzem os diversos híbridos. A ob - servação no contexto de onde acontece o registro dos atos geram dados para saber que o sistema de controle é antes contro - lado pelas pessoas que o manipulam.

MINISTÉRIO PÚBLICO: o reflexo dainformatizaçãonaspráticas de trabalho dasProcuradoriasdeJustiça Criminais Em contraste a esta pesquisa, com - para-se com outra realizada entre 2012 e 2014, em que foi feita uma pesquisa de campo sobre a organização do tra - balho realizado nas Procuradorias de Justiça Criminais do Ministério Públi - co do Estado do Rio de Janeiro. Trata-se de uma pesquisa empíri -

ca que possui como enfoque teórico o debate sobre profissões jurídicas e a atuação dos operadores do direito. Ex - plicita-se a constituição das rotinas de trabalho e a forma como a instituição se organiza, através da descrição deta -

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lhada do trabalho cotidiano de dife - rentes profissionais - procuradores de justiça, analistas e assessores.

A pesquisa lança mão de uma me - todologia qualitativa para examinar as formas de atuação e a percepção dos atores da Procuradoria: os procura - dores, os analistas processuais e os as - sessores. Para tanto, a propriedade das ações dos indivíduos é analisada atra - vés da observação da sua atividade co - tidiana, o que se deu com a inserção da pesquisadora no contexto da pesquisa de campo, realizando um processo de observação da prática, mais especifica - mente nas arenas privilegiadas em que circulam esses atores.

Osdados utilizados provêm de minha experiência de trabalho como assessora na Procuradoria de Justiça, função que exerço desde 02 de julho de 2012, data em que fui nomeada e tomei posse de Cargo em Comissão de Assessoramento a Pro - curadoria no Ministério Público do Esta - do do Rio de Janeiro (símbolo CCP).

As Procuradorias de Justiça são ór - gãos de execução do Ministério Público que exercem suas atribuições junto aos Tribunais de Justiça (2ª instância judi - cial). Os procuradores de justiça atuam nas sessões de julgamento dos proces - sos da respectiva Procuradoria de Justi - ça, elaboram um “parecer” e podem in - terpor, da decisão do Tribunal, recursos aos Tribunais Superiores (STF/STJ). Nesta atuação, o Ministério Público atua como fiscal da lei ou custus legis

e não faz parte da relação processual, nem como autor, nem como réu. Nes - ses casos, a função do MP é verificar se os pedidos elaborados pelas partes nos recursos contra as decisões proferidas por juízes em ações na 1ª instância me - recem ou não ser atendidos.

Assim, os procuradores de justiça exaram um “parecer” escrito (sua opi - nião fundamentada sobre o caso) antes do respectivo processo ser encaminha - do para julgamento pelos desembarga - dores do Tribunal de Justiça, que julgam o caso no TJ, considerando — ou não, uma vez que o parecer não é vinculativo — a intervenção realizada pelo procu - rador de justiça através de seu “parecer”. Neste trabalho enfatizo os reflexos

da informatização e da inserção do pro - cesso eletrônico nas práticas de traba - lho realizadas nas Procuradorias.

De acordo com o relatório de inspe - ção realizado pela Corregedoria Nacio - nal do Conselho Nacional do MPRJ, o Ministério Público, “seguindo o movi - mento da sociedade”, cada vez mais tem utilizado o computador como “ferra - menta indissociável e indispensável na busca da excelência no cumprimento de seu dever” (2012, p.493).

De acordo com a instituição, neste relatório oficial, a tecnologia da informa - ção deve ser utilizada a fim de “automa - tizar rotinas, registrar, processar e man - ter o controle de seus dados, processos e procedimentos, e apresentar informa - ções, quando necessário” (2012, p. 493).

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Neste contexto, a Corregedoria Na - cional do Conselho Nacional do MPRJ afirma que utilização de recursos tecno - lógicos propicia existir “melhores opor - tunidades de ampliação dos índices de produtividade (principio da eficiência)” (2012, p. 493). Ademais, defende a ne - cessidade de aplicação de tecnologia a fim de informatizar a cadeia produtiva (que envolve a instrução e a decisão processual) com o objetivo de: “reduzir tempos de tramitação; mitigar retra - balho; eliminar atividades repetitivas; controlar período de permanência em cada etapa do processo; e evitar forma - ção de gargalos” (2012, p. 493). Atualmente, quase todos os proces - sos das câmaras criminais são trami - tados eletronicamente pelo sistema do Tribunal de Justiça. Muito raramente chega algum processo físico. Os proces - sos físicos que ainda chegam ao MPRJ “—Possuem vários volumes e por isso não foram digitalizados pelo TJRJ”, como me foi dito por um analista processual.

O Tribunal de Justiça numera os processos e é o distribuidor do Tribu - nal que encaminha os processos para as Câmaras Criminais julgarem. Após a distribuição para as Câmaras, os pro - cessos são enviados eletronicamente para o MPRJ para que os procuradores de justiça façam os pareceres.

Na assessoria de um procurador, pode-se observar como o trabalho de produção dos pareceres é realizado em conjunto por procuradores, analistas e

assessores, com a inserção do processo eletrônico. Todos possuem computado - res, e-mail funcional, login e senha de acesso diferenciada para o acesso à in - tranet do MPRJ ou ao sistema do TJRJ. Emminha pesquisa de campo, pude perceber que os procuradores de justiça utilizaram a implantação do processo judicial eletrônico para contratar novos assessores jurídicos para auxiliá-los no trabalho cotidiano.

Minha nomeação para atuar como assessora na instituição se deu de forma praticamente simultânea a outros 40 as - sessores. Em entrevista com um analista processual, fui informada que “—Foi por causa do processo eletrônico. Com o pro - cesso eletrônico o trabalho nas procurado - rias criminais aumentou”. Assim, essas nomeações não ocorreram para procu - radorias cíveis pois, à época, somente os processos das câmaras criminais já eram tramitados eletronicamente pelo sistema do Tribunal de Justiça.

Em conversa informal com um pro - curador de justiça, ele disse que:

“— Muitos procuradores de justiça não sabem mexer no computador, não sabem mexer com e-mail. Ajustificativa para a criação desses cargos seria colocar gente mais nova que sabe traba - lhar com internet para poder au - xiliar. A função do cargo de con - fiança a princípio seria auxiliar os procuradores nesse trabalho”.

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De fato, a partir da observação realizada no campo, percebi que a maioria dos procuradores de justiça necessita do auxílio dos analistas e as - sessores a fim de exercerem suas fun - ções no processo eletrônico.

Nesse sentido, fui informada por um assessor que o procurador com o qual ele trabalhava pedia para que ele analisasse o processo judicial no siste - ma eletrônico e escrevesse o parecer em documento Word e imprimisse. Após, solicitava que ele fosse até seu gabinete para entregar o documento em mãos. Ele realizava as correções à caneta. O assessor voltava ao seu local de trabalho e alterava o documento em Word. Após, imprimia novamen - te e levava ao gabinete do procurador para que ele desse o “ok final”. Se o procurador estivesse satisfeito, o asses - sor transformava o arquivo em pdf e, com a utilização de um token, assinava eletronicamente o documento para de - pois anexar no sistema do Tribunal de Justiça o parecer referente ao processo. Outros assessores me informaram que os procuradores sentavam-se aos seus lados e ditavam seus entendimen - tos para que os assessores digitassem os arquivos, uma vez que eles tinham di - ficuldade em trabalhar no computador. Apesar dos membros e servidores

do MP, possuírem cada um, login e se - nha diferenciada para acesso ao sistema do TJRJ, muitos procuradores somente acessam o sistema eletrônico junto com

seus auxiliares. Ademais, em conversa informal com umprocurador, fui infor - mada que ele sentia falta do processo fí - sico, pois conseguia“—pegar no processo e trabalhar mais rápido, já que não tem sistema para cair, ficar off-line”. Nesse sentido, a utilização do meio eletrôni - co aparece como um entrave ao “—bom funcionamento do trabalho”.

Em relação à velocidade do trabalho com a utilização do processo eletrônico, pude observar que o sistema do TJRJ muitas vezes ficava indisponível. Durante o campo, presenciei vários dias da sema - na e até mesmo uma semana inteira que os funcionários do MPnão puderam tra - balhar, pois o sistema do TJ “estava fora do ar”, ou o acesso ao portal de serviços do TJRJ estava intermitente, sem previ - são de normalização do serviço.

Nesse sentido, um assessor me dis - se que “—o processo eletrônico é ótimo quando funciona e quando a pessoa sabe manusear, mas horrível quando cai. Meu trabalho só acumula”.

Quanto às alterações no processo judicial e na maneira de tomada de de - cisão por conta do processo eletrônico, fui informada que “— a diferença agora é que as audiências criminais são grava - das e a gente pode assistir em vídeo os depoimentos em segunda instância”. Antes da instauração do processo eletrônico os depoimentos das teste - munhas e o interrogatório dos réus eram transcritos e anexados à ata de audiência. Ressalto que há uma sele -

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ção do que é gravado, pois não é uma gravação de toda a audiência, mas sim dos depoimentos em partes.

Nesse sentido, assistir as mídias aparece como uma inovação do sentido de se ter acesso à expressão facial e cor - poral das pessoas durante a audiência, o que não era descrito na ata. Ocorre que, cada procurador de justiça gere de forma particularizada o procedimento adotado por sua equipe (formada pelo analista processual e pelo assessor) quanto à necessidade de assistir ou não aos depoimentos. Alguns interlocuto - res me informaram que não assistem a mídia, pois durante o processo – seja na sentença, nas alegações finais ou no recurso – são transcritos trechos dos depoimentos e por isso não haveria essa necessidade, e que só ouviam as mídias eletrônicas quando tais depoimentos não estavam devidamente transcritos no curso do processo, outros me dis - seram que perdiam muito tempo ou - vindo a mídia e transcrevendo os de - poimentos, ou que dava mais trabalho, pois só dava para acessar os áudios por um servidor específico de internet. Por outro lado, observei que alguns procu - radores solicitavam que seus assessores ouvissem as mídias e transcrevessem os depoimentos porque já aconteceu do que estar escrito no processo estar diferente do que constava na mídia. Assim, nesse quesito, a alteração para

o processo judicial eletrônico com a gra - vação das mídias poderia gerar altera -

ções na tomada de decisão do processo, não representando apenas um mecanis - mo. Ocorre que, como descrito, a gestão do trabalho nas procuradorias de justiça criminais é particularizada, o que não confere previsibilidade/calculabilidade nas ações realizadas dentro da institui - ção e para quem está afeto a este poder. Ademais, percebe-se que, a partir

da análise do campo de pesquisa, que os dados vão de encontro à ideia de que o processo eletrônico padroniza o trabalho, acelera, faz com que gaste menos papel, reduza o tempo de tra - mitação, elimine atividades repetitivas e evite a formação de gargalos.

CONCLUSÃO

Este trabalho buscou discutir e compreender o impacto da utilização de novas tecnologias no sistema de jus - tiça brasileiro a partir da comparação entre duas pesquisas de campo.

A comparação entre as práticas observadas em campos de pesquisas distintos permite compreender os sen - tidos atribuídos ao trabalho e às rela - ções pelos atores institucionais inseri - dos em cada um deles.

Analisamos como antigas práticas burocráticas são moldadas e adaptadas às novas tecnologias digitais em diferentes contextos institucionais. Nesse sentido fo - ramexplicitados modosparticulares como práticas dialogam e conflitam com normas vigentes, apresentando representações e particularidades da burocracia no País.

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NOVAS TECNOLOGIAS PARA PRÁTICAS ANTIGAS NA ADMINISTRAÇÃO DE JUSTIÇA

No caso da Justiça do Trabalho, per - cebe-se que os atores jurídicos perma - necem realizando suas tarefas práticas da mesma maneira que anteriormente (com os autos físicos), apenas contor - nando cotidianamente os impedimentos gerados pelo sistema eletrônico. Ade - mais, o PJe é utilizado como um sistema de controle da informação que é contro - lado pelas pessoas que o manipulam. No Ministério Público, os procura - dores de justiça utilizam a implantação do processo judicial eletrônico para contratar novos assessores jurídicos para auxiliá-los no trabalho cotidiano. Em enfoque o fato da a gestão do traba - lho nas procuradorias de justiça crimi - nais ser particularizada, o que não con - fere previsibilidade/calculabilidade nas ações realizadas dentro da instituição e para quem está afeto a este poder. Ademais, percebe-se que, a partir

da análise do campo de pesquisa, que os dados vão de encontro à ideia de que o processo eletrônico padroniza o trabalho, acelera, faz com que gaste menos papel, reduza o tempo de tra - mitação, elimine atividades repetitivas e evite a formação de gargalos.

Nossos campos demonstram que as práticas cotidianas em cartórios, au - diências e gabinetes mostram um con - trole da informação pelas pessoas, a despeito do sistema. Assim, o sistema de informação, portanto tecnológico, aparece como um sistema de controle da informação que busca padronizar o

que pode ou não ser feito no processo judicial, a despeito das necessidades lo - cais daqueles que usam o sistema. Assim, vemos que as normativas são agenciadas e resignificadas no âm - bito administrativo do Estado, a partir da explicitação de como os profissionais destas instituições - servidores públi - cos, procuradores de justiça e juízes tra - balhistas - adaptam as suas atividades e propósitos institucionais, alterando os programas e orientações estruturais impostas pelos sistemas digitais.

Comoconclusão, a sugestão deque as reformas tecnológicas não providenciam mudanças gerais no nível da burocracia, mas explicitam políticas particularizadas em diferentes contextos institucionais.

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Marco Aurélio Alves Epifani Filho

Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Di - reito. Pesquisador do Núcleo de So - ciologia do Direito - UFF vinculado ao INCT-INEAC.

Luiza Barçante Sanandres

Doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais do Programa de Pós-Gradu - ação em Sociologia e Direito pela Uni - versidade Federal Fluminense (UFF, 2015). Pesquisadora vinculada ao In - stituto de Estudos Comparados em Ad - ministração Institucional de Conflitos (INCT-InEAC).

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