CENÁRIOS E EFEITOS DA PANDEMIA NA AMAZÔNIA: ANÁLISE E MAPEAMENTO DA COVID-19 NOS ESTADOS DO PARÁ E AMAZONAS
Rodrigo Luciano Macedo Machado[1]
Universidade Federal do Pará
RESUMO:
Esta pesquisa tem por objetivo evidenciar de forma panorâmica como a pandemia de COVID-19 repercute em cenário de inúmeras especificidades nos estados do Pará e Amazonas, a partir de análises bibliográficas, discussões e produções cartográficas, com o uso do software QGIS 3.18.26. Passamos a revelar as principais tendências frente às condições socioespaciais e a respeito dos novos desafios impostos em face aos antigos e novos dilemas na região amazônica.
Palavras-chave: COVID-19; Mapeamento; Pará; Amazonas.
INTRODUÇÃO
Diante do atual panorama a respeito dos cenários da pandemia de COVID-19, esta pesquisa busca analisar os efeitos desta conjuntura nos estados do Pará e Amazonas, sobretudo nos principais eixos, aglomerados urbanos e metrópoles. Esta análise se justifica do ponto de vista teórico e prático, por contextualizar e apresentar as diferentes especificidades e interações diante desta crise à sociedade, como a atuação do poder público municipal, estadual e federal. Além disso, a escolha destes estados da Amazônia legal se dá pelo expressivo número de casos e óbitos, monitorados ao longo desta pesquisa, como destaques não somente na região em discussão, mas também sobre o ponto de vista nacional, merecendo uma maior aproximação quanto às particularidades que podem ter contribuído para este protagonismo em tempos de pandemia.
METODOLOGIA
Foram realizados levantamentos bibliográficos a respeito do processo de urbanização na Amazônia e sobre a propagação de COVID-19 em escalas local, nacional e mundial. Para as produções cartográficas, utilizamos o software QGis 2.18.26,com base em dados de boletins disponibilizados pela Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará (SESPA, 2020), Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS, 2020), Ministério da Saúde (BRASIL, 2020), somado a informações sobre isolamento social da empresa INLOCO (2020). Foram distribuídos e espacializados os dados absolutos de casos e óbitos levando em consideração os municípios dos respectivos estados, com ênfase para os números das capitais.
CONDIÇÕES INTRA-URBANAS FRENTE À PANDEMIA NA AMAZÔNIA
Ao traçarmos observações a respeito dos efeitos da pandemia na Amazônia, é necessário ressaltar as questões históricas e estruturais, pois o contexto amazônico por muito tempo foi pensado “de fora para dentro”, sem obedecer as especificidades fisiográficas e socioculturais da região, o que segundo Gonçalves (2001) rendeu a Amazônia um extenso histórico de conflitos e injustiças sociais. Este breve histórico pode ser visto como elemento de contribuição sobre as desigualdades cada vez mais presentes nos centros e centralidades urbanas na Amazônia.
As cidades da Amazônia costumam responder ao que acontece em seus arredores, e neste cenário pandêmico isto não poderia ser diferente. No entanto, esta resposta não se dá apenas pelos números de casos confirmados e óbitos, mas responde também sobre a efetividade das ações do Estado em suas distintas esferas. O que se torna cada vez mais entrelaçado, neste novo momento, são as condições que a pandemia tende apresentar como sintomas no panorama urbano cada vez mais graves numa região onde as populações são altamente expostas a diferentes tipos de vulnerabilidades, algo ainda mais propício à disseminação do vírus, como Harvey (2020) afirma:
Mas o impacto econômico e demográfico da disseminação do vírus depende de fissuras e vulnerabilidades preexistentes no modelo econômico hegemônico. [...] Vivemos em um mundo altamente conectado, onde quase todos viajam. As redes humanas de difusão potencial são vastas e abertas. (HARVEY, 2020, p. 16).
Logo, esta atenuação das vulnerabilidades aqui presentes, se conecta às redes urbanas, e se difundem em patamares estimulados pelos fluxos globais, cada vez mais estreitados com o avanço dos meios de produção capitalistas e necessidades de manutenção do capital.
CAMPO DE BATALHA
A Amazônia está em um de seus momentos mais críticos sobre o ponto de vista social e econômico, produzido a partir de uma guerra invisível, a qual provoca reações e tomadas de decisões no eixo político, por uma verdadeira disputa sobre o que se deve privilegiar. Este campo de batalha possui individualidades que levam à tona toda uma desestrutura social já presentes e tornam-se cada vez mais evidentes, a partir de problemas constantes nas grandes metrópoles amazônicas, bem como nas periferias, revelando o apelo social e condições de sobrevivência precárias, o que leva a uma rediscussão sobre o papel do Estado e como as populações mais vulneráveis estão expostas à condições cada vez mais brutais de acesso ao básico, ao direito a sobrevivência, o acesso ao mínimo em uma região onde as desigualdades são resultados de uma lógica de prioridades que reforçam vulnerabilidades e segregações ainda mais estampadas neste atual momento.
Em análise do dia 19 de abril de 2020, pode-se averiguar distintas formas de concentração de COVID-19, em comparativo entre os estados do Pará e Amazonas, com destaque para a dispersão e espacialização do número de casos e também pelos níveis de isolamento social nas capitais analisadas (figura 1).
De acordo com a figura 1, as dispersões são bastante distintas com diferentes períodos da adoção de medidas de políticas relacionadas ao combate à pandemia. No Amazonas estão localizados os primeiros sinais de rápida elevação do número de casos pela COVID-19, com maior espraiamento na metrópole e cidades interioranas. No Pará, os primeiros casos estão relacionados aos fluxos nacionais, constantes a partir da maior conexão por eixos rodoviários e aéreos.
Figura 1 - Mapa da situação de COVID-19
e isolamento social nos estados do Pará e Amazonas
(19/04/2020)
Fonte: INLOCO (2020); SESPA(2020); FVS (2020); BRASIL (2020).
Além dos dados sobre a expansão da COVID-19, observamos, a partir dos dados da empresa INLOCO (2020), os níveis de isolamento social próximos nos respectivos estados, entretanto, com destaque para uma maior adesão no estado do Pará. Uma das razões atribuídas a estes índices razoáveis de isolamento social pode estar relacionada ao elevado número da informalidade, entre os maiores do Brasil segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2019). O Pará lidera o ranking com 62,4% de informalidade e o Amazonas apresenta 57,6%, o que chama a atenção para um predomínio dessas populações e, consequentemente, apresentam maior vulnerabilidade socioeconômica e menores alternativas de corresponder ao isolamento social, forçados a lutar pela sobrevivência em duplo combate.
As aglomerações urbanas acompanham distintos fluxos em eixos amazônicos, seja pelos rios, via terrestre ou aérea. Nesse sentido, trouxemos uma análise a partir de dois mapas que enfatizam esta conjuntura, e propomos aqui uma análise comparativa entre os estados do Pará e Amazonas (figura 2).
Figuras 2 - Situação da COVID-19 nos estados do Pará e Amazonas
(07/04 e 01/05)
Fonte: SESPA (2020); FVS (2020)
Nas figuras 1 e 2 pode-se destacar a concentração de casos no Pará, principalmente na Região Metropolitana de Belém (RMB) e região nordeste do estado, com atenção também a região do Marajó. Em contraposição, no estado do Amazonas observamos uma maior dispersão de casos e óbitos pela COVID-19, entretanto, com a particularidade de possuir casos em zonas de fronteira internacional, e com predomínio na Região Metropolitana de Manaus.
Neste comparativo é possível identificar a extensão de boa parte do número de casos com conexões a partir do rio Amazonas e outras ligações fluviais, o que torna singular uma das formas de propagação do vírus em áreas de acesso pelos rios. Entretanto, esta interiorização da COVID-19 torna ainda mais preocupante o acesso a populações extremamente vulneráveis, e nestas novas circunstâncias, lhe restam alternativas mínimas para resistir e sobreviver em efeito a tamanhas mudanças no panorama local e global.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com efeito, as análises e produções cartográficas desta pesquisa elucidam dilemas estruturais quando se refere às questões de saúde pública, bem como, diversas outras adversidades no âmbito político, social e econômico. Esta “coronacrise” (MARICATO, 2020) pode apresentar ao Brasil e a Amazônia um novo olhar sobre o básico, sobre ações verdadeiramente prioritárias, após este descortinar dos problemas que sempre estiveram presentes, exigindo um cuidado redobrado e olhar de maior sensibilidade as especificidades de uma Amazônia de aceleradas transformações e desafios históricos, com novas possibilidades na pós-pandemia.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMAZONAS. Fundação em Vigilância em Saúde. Boletins epidemiológicos. Disponível em: <http://www.fvs.am.gov.br>. Acessado em: 01 de maio de 2020.
BRASIL. Coronavírus Brasil. Atualização: 19/04/2020. Disponível em: <https://covid.saude.gov.br/ br/>. Acessado em: 19 de maio de 2020.
PORTO - GONÇALVES. C. W. Amazônia, Amazônias. 1ª Ed. São Paulo: Contexto, 2001.
HARVEY, D. Política anti-capitalista em tempos de COVID-19. In. DAVIS, M. et al: Coronavírus e a luta de classes. Terra sem Amos: Brasil, 2020, p. 13-24.
INLOCO. Mapa brasileiro da COVID-19. Índice de isolamento social. Disponível em: <https://mapabrasileirodacovid.inloco.com.br/pt/>. Acessado em: 19 de abril de 2020.
LOSCHI, M. Desemprego cai em 16 estados em 2019, mas 20 têm informalidade recorde. Agência IBGE notícias. Disponível em: <https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/26913-desemprego-cai-em-16-estados-em-2019-mas-20-tem-informalidade-recorde>. Acessado em: 03 de maio de 2020.
MARICATO, E. A Coronacrise e as emergências nas cidades, por Ermínia Maricato. Jornal GGN, 2020. Disponível em: <https://jornalggn.com.br/a-grande-crise/a-coronacrise-e-as-emergencias-nas-cidades-por-erminia-maricato/?fbclid=IwAR1crEVDyWnO9VA-tzUfZjZWMtfw3fAbkTWnkU_Ad0QkejTprq08_tXFhs8>. Acessado em: 01 de maio de 2020.
PARÁ. Secretaria de Estado de Saúde Pública. Monitoramento Covid-19. Disponível em: <https://www.covid 19.pa.gov.br /#/</#/>. Acessado em: 01 de maio de 2020.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZE A SEGUINTE REFERÊNCIA:
MACHADO, Rodrigo Luciano Macedo. Cenários e Efeitos da Pandemia na Amazônia. Análise de Mapeamento da COVID-19 nos estados do Pará e Amazonas. Revista Ensaios de Geografia, Niterói, vol. 5, nº10, p. 95-101, julho de 2020.
Submissão em05/05/2020. Aceite em: 03/07/2020.
Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ - Brasil
[1] Mestrando em Geografia pela Universidade Federal do Pará.