Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
JÚNIOR, Arnóbio Rodrigues de Sousa. Uma análise crítico-reflexiva da educação ambiental em um livro didático do ensino
fundamental da escola pública. Revista Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 7, nº 14, pp. 11-36, maio-agosto de 2021.
Submissão em: 28/03/2021. Aceito em: 11/07/2021.
ISSN: 2316-8544
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SEÇÃO ARTIGOS
UMA ANÁLISE CRÍTICO-REFLEXIVA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM
UM LIVRO DIDÁTICO DO ENSINO FUNDAMENTAL DA ESCOLA PÚBLICA
A CRITICAL-REFLEXIVE ANALYSIS OF ENVIRONMENTAL EDUCATION
IN A TEXTBOOK OF ELEMENTARY EDUCATION IN PUBLIC SCHOOLS
Arnóbio Rodrigues de Sousa Júnior
1
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará Campus Crateús
arnobiojr07@gmail.com
Resumo
Este artigo tem como objetivo analisar o ensino de educação ambiental do livro didático do ensino
fundamental de uma escola pública do estado do Ceará. Entendemos que a educação ambiental é um dos
instrumentos essenciais para a construção de dispositivos de combate aos conflitos socioambientais que
penalizam as populações tradicionais por preservar a natureza. Para tanto, a pesquisa de natureza qualitativa
e o estudo exploratório foram utilizados como procedimentos metodológicos. Nota-se a necessidade de
construir um ensino que sensibilize os estudantes para o desenvolvimento de atitudes que estejam
comprometidas com a preservação da natureza e, ao mesmo tempo, compreendam o seu papel ecológico.
Palavras-chave
Geografia escolar; Livro didático; Docência; Educação ambiental.
Abstract
This article aims to analyze the teaching of environmental education from the elementary school textbook
of a public school in the state of Ceará. We understand that environmental education is one of the essential
instruments for the construction of devices to fight socioenvironmental conflicts that penalize traditional
populations for preserving nature. Therefore, qualitative research and exploratory study were used as
methodological procedures. There is a need to build education that sensitizes students to the development
of attitudes that are committed to preserving nature while understanding its ecological role.
Keywords
School geography; Textbook; Teaching; Environmental education.
1
Graduando em licenciatura em Geografia pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do
Ceará Campus Crateús, pós-graduando em Gestão Escolar e Coordenação Pedagógica e bolsista da
CAPES pelo Programa Residência Pedagógica (PRP). ORCid: https://orcid.org/0000-0003-1766-7672
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JÚNIOR, Arnóbio Rodrigues de Sousa. Uma análise crítico-reflexiva da educação ambiental em um livro didático do ensino
fundamental da escola pública. Revista Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 7, nº 14, pp. 11-36, maio-agosto de 2021.
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Introdução
Considerando-se a dialética do tempo e das mudanças sociais, a educação ainda
apresenta muitos desafios que precisam ser superados, da mesma maneira que é de
extrema importância que se construa na escola e em sala de aula novas práticas
pedagógicas que redimensionem e revigorem nossas atitudes enquanto profissionais da
educação e sujeitos sociais, políticos e individuais. Como processo formativo e ato
político, faz-se necessário que a educação esteja objetiva e subjetivamente interligada ao
nosso cotidiano, às nossas vivências e à nossa espacialidade, de modo que seja possível
expressar-se em sala de aula e na escola as múltiplas geografias de nosso território, o que
possibilita dialogar com os pares.
É urgente que a escola, o currículo e as práticas pedagógicas no contexto escolar
possam construir um processo rizomático de educação que atenda às nossas necessidades
de formação, nos colocando como interventores sociais diante dos inúmeros problemas
que vivenciamos. Com o advento da técnica e, por conseguinte, de seu crescimento e sua
disseminação houve o aumento substancial de transformações técnico-científicas que
possibilitaram o desenvolvimento de estudos que refletem sobre os fenômenos causadores
do desequilíbrio ecológico paralelamente a outros problemas de ordens sociais e
econômicas.
Nesse sentido, este artigo surge da implicação e reflexão sobre a dimensão da
educação ambiental a partir de um olhar sensível, pedagógico e político sobre o livro
didático. É nessa perspectiva que a presente produção acadêmica tem como objetivo
analisar o ensino de educação ambiental pautado em um livro didático do ensino
fundamental de uma escola pública do interior do estado do Ceará. Compreendemos que
a educação ambiental é imprescindível para a construção de sujeitos minimamente
comprometidos com a preservação dos recursos naturais e da natureza.
É sabido que em tempos de consolidação de uma política ultraliberal no país,
sobretudo a partir de 2018, às sombras de um governo neoliberal que se utiliza do
sucateamento da educação como política pública e das práticas fascistas como políticas
de governo tem-se vivido momentos de incertezas e de retrocessos sociais que
culminam na redução de políticas públicas de combate ao desmatamento, às queimadas,
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tanto no alijamento de políticas educacionais que possam garantir um ensino de qualidade
quanto no acirramento da competição e da luta de classes.
Entendemos a necessidade de construir não uma educação ambiental que
coloque em questão os problemas ecológicos de nossa sociedade e, em uma outra escala,
os problemas ecológicos da humanidade, como também quais caminhos devemos
percorrer para solucioná-los e, nesse viés, construir a sensibilização dos estudantes na
escola e para além de seus muros de forma que se edifique a conscientização. A fim de
que seja possível alcançar esse nível, é preciso trabalhar a educação ambiental numa
perspectiva crítica e numa abordagem teórico-metodológica alinhada às vivências, às
experiências e à territorialidade dos estudantes.
Neste artigo, reconhecemos a educação ambiental como um processo formativo
com a finalidade de nos despertar para um novo estilo de vida. Ao passo que há o diálogo
com a concepção de pedagogia da emancipação à luz de Dermeval Saviani e de Paulo
Freire é que se entende o ponto de partida para pensar em soluções para os problemas
ambientais. Do ponto de vista da legislação, é válido pontuar que:
Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo
e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e
competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do
povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (BRASIL, 1999, n.p.).
Por essa razão, é necessário que estejamos atentos à concepção de educação
ambiental com a qual o livro didático trabalha e a quais realidades e problemáticas são
elencadas no processo de construção do ensino e da aprendizagem. A educação ambiental
sob a ótica da pedagogia histórico-crítica e libertadora faz com que notemos um novo
estilo de vida baseado na sustentabilidade, no desenvolvimento sustentável e na defesa
constante de práticas agroecológicas que incidem no fortalecimento de políticas de
convivência com o semiárido, de apreço pela natureza e pelos recursos naturais, além de
reconhecer e respeitar as potencialidades da natureza.
Assim sendo, este artigo é de extrema relevância, pois torna oportuno que criemos
diálogos de formação sobre a educação ambiental e sobre o contexto histórico-social que
estamos vivenciando, visto o atual cenário de retrocessos das políticas públicas que
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afrouxam as leis ambientais e permitem a intensificação do desmatamento, das queimadas
e da exploração da natureza por empresas privadas.
Embora não seja seu objetivo central, este trabalho, também, oportuniza a
inquietação sobre a educação ambiental no contexto da docência e da formação de
professores, uma vez que constrói a discussão no sentido de sensibilizar a comunidade
acadêmica em relação às problemáticas ambientais a partir da análise do ensino de
educação ambiental no âmbito da ciência geográfica.
A educação ambiental deve ultrapassar o contexto da escola enquanto teoria,
consolidando-se enquanto prática de maneira a adotarmos uma nova postura em relação
à natureza e ao meio ambiente. Dito isso, é fundamental pensar numa educação ambiental
crítica ancorada na práxis da ecologia ecossocialista e na preocupação metódica,
científica e crítica de Freire ao propor para a formação docente a discussão com os alunos
a partir da realidade de suas vivências em áreas, em grandes circunstâncias, descuidadas
e desassistidas pelo poder público. É imprescindível partir da premissa de que a educação
ambiental faz parte da luta de classes e que está situada na dimensão da sociedade e das
relações dos indivíduos enquanto sujeitos ontológicos.
Metodologia
A importância das metodologias para o desenvolvimento de qualquer produção
científica é inquestionável, visto que os procedimentos metodológicos são, em tese, os
caminhos que devemos percorrer para o desenvolvimento do trabalho. Este artigo recorre
à pesquisa de natureza qualitativa de cunho bibliográfico e ao estudo exploratório, posto
que esse tipo de pesquisa e de estudo nos oportuniza dialogar com outros sujeitos, além
de nos levar à reflexão e a múltiplas inquietações sobre a temática.
Afora construirmos os novos diálogos de formação, a pesquisa bibliográfica é
essencialmente necessária para qualquer produção acadêmica, haja vista que todo
trabalho de cunho científico necessita de uma revisão bibliográfica (FONSECA, 2002).
Essa metodologia permite que construamos novas proposições teóricas acerca da temática
pesquisada. Partimos de Melo (2007), Gadotti (2001), Loureiro (2004), Arrais (2020),
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Barbosa (2020), dentre outros autores, ao passo que nos apropriamos de livros, artigos e
outras fontes bibliográficas.
Sendo assim, a análise da educação ambiental no livro didático parte da visão
subjetiva do pesquisador à luz da ciência geográfica. Portanto, a análise do conteúdo sobre
a educação ambiental se constitui na interpretação e descrição dos dados percebidos, bem
como a partir da ênfase subjetiva do pesquisador. Sob a ótica de Apolinário (2012),
entendemos que essa pesquisa é também de finalidade básica, visto que é uma pesquisa
sem quaisquer interesses comerciais, além de ser também uma pesquisa descritiva, pois
busca especificar um fenômeno de ordem socialmente construído. Desse modo, foi
utilizado um livro de Geografia do nono ano da coleção Vontade de Saber, da editora
Quinteto, como objeto de análise.
O livro é de autoria da professora Neiva Camargo Torrezani e é composto por oito
capítulos. Buscando analisar o ensino de educação ambiental, este artigo recorre à análise
do capítulo oito intitulado de Os desafios para um meio ambiente melhor. Esse material
faz parte das obras didáticas, pedagógicas e literárias oferecidas pelo Programa Nacional
do Livro Didático (PNLD) e foi escolhido pelos professores da escola referente ao
quadriênio 2020-2023. No âmbito da escola, não uma análise sistemática e crítica feita
pelos professores em relação à escolha do material didático, o que evidentemente não
desqualifica a produção do material.
Por conta disso, é interessante que o professor consiga se atentar ao uso da
linguagem no decorrer do texto em diálogo com o nível de ensino, de imagens e suas
relações com o texto, da proposta pedagógica, das atividades direcionadas em cada
capítulo e do referencial do livro, dentre outras questões que fazem parte de sua análise.
Esses elementos são essenciais para que professor e aluno possam explorar o conteúdo
programático.
Ainda, para desenvolver a análise de maneira sistemática, foi necessário dialogar
com alguns critérios de avaliação a partir da leitura de Pontuschka, Paganelli e Cacete
(2009) que nos ajudam a refletir sobre o livro didático de geografia sob a perspectiva
de uma leitura crítica e no espectro da realidade dos estudantes a fim de que se possa
fomentar a crítica e abordar outras leituras tangentes ao ensino de educação ambiental.
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Esse é o único capítulo que aborda em essência a temática da educação ambiental,
por isso restringimos sua análise. Cabe destacar que esta discussão é possível porque
a educação ambiental é uma temática que está sendo contemplada e/ou priorizada no
sumário do livro didático, o que permite que ressaltemos o quanto a educação ambiental
deve ser pautada no currículo escolar.
Primeiras considerações
O livro didático a ser analisado está sendo usado atualmente por uma escola do
município de Tamboril, localizada no interior do estado do Ceará e, conforme a
classificação do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), ao
delimitar os perfis de regiões de planejamento do Estado do Ceará, nos Sertões de
Crateús. Dito isso, é importante pontuar que os estudantes que têm acesso a esse material
didático da escola pública, na escala de análise, localizam-se no semiárido nordestino,
marcado pela variação de precipitação pluviométrica e por um alto nível de desigualdade
social e econômica, como afirma o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Em linhas gerais, nota-se que o livro didático apresenta uma diversidade de
conteúdos que certamente irão contribuir para uma leitura de mundo que, embora não
esteja próxima da realidade dos estudantes da escola pública do interior do estado do
Ceará, torna possível que façamos alguns tensionamentos e reflexões a partir de uma
visão mais sistêmica de conjuntura e de mundo. O livro didático de Geografia pouco
dialoga com a territorialidade local dos estudantes, visto que os conteúdos programáticos
refletem sobre os aspectos gerais da Europa Ocidental e Oriental, tal como os aspectos
gerais da Ásia e Oceania.
É a partir dos capítulos seis e sete que há um diálogo mais efetivo com o contexto
nacional e local dos estudantes, dado que é discutida a globalização em diferentes
perspectivas. Posteriormente, o capítulo oito, com uma abordagem na temática do meio
ambiente, nos permite pensar o ensino de educação ambiental.
Desse modo, é de extrema importância que a escola tenha professores que
valorizem a docência como uma atividade intelectual de caráter crítico e reflexivo, em
prol de construir outras abordagens que possam dialogar com os reais instrumentos de
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aprendizagem dos estudantes. Isso porque o livro didático não contempla todas as
pedagogias e é um instrumento escrito para um público genérico de realidades diferentes;
desde o contexto nacional, regional e local às diferentes realidades urbanas e rurais.
Partindo dessa reflexão, o professor assume uma tarefa fundamental. Sempre
buscar construir o ensino de geografia em diálogo com os espaços de vida dos estudantes
e com seus contextos de vida, pois o livro não representa uma realidade específica. Fica
sob incumbência do docente fazer as adaptações ao cotidiano dos estudantes da escola
pública.
O livro escolhido para análise faz parte do edital do PNLD 2020. A proposta
pedagógica apresentada neste edital e material didático contempla a temática educação
ambiental, em consequência de ser o objetivo do PNLD que ênfase às temáticas sociais
que envolvem a sociedade. O livro didático, por meio do PNLD, tem como um dos
intuitos principais dar apoio aos estudantes no processo de ensino e aprendizagem. É sob
essa perspectiva que o PNLD se constitui como uma política que possibilita subsidiar e
orientar a construção dos materiais didáticos.
É interessante que a escolha do livro didático esteja alinhada ao projeto político
da escola e a uma dimensão crítica do ensino, haja vista a necessidade da emancipação
social, da autonomia intelectual e da criticidade. No caso da Geografia, é importante que
a escolha do livro represente a construção do saber geográfico a partir dos pressupostos
da geografia crítica que tem como temas principais as relações sociais e espaciais. No
entanto, são projetos, ideologias e propostas que estão em disputa na escola.
Evidentemente, a escolha de um material crítico está condicionada aos professores de
geografia que entendem o espaço geográfico como objeto de estudo e instrumento de
reflexão sobre os fenômenos e relações sociais que se constituem no espaço.
O PNLD ao ser financiado pelo Fundo Nacional de Educação (FNDE) oportuniza
a democratização dos processos educacionais na escola. Contudo, é válido destacar que
embora o PNLD apresente subsídio para a construção da aprendizagem, propostas
político-pedagógicas que podem ou não empobrecer as discussões sobre inúmeras
temáticas e, por conseguinte, reduzir a aprendizagem dos estudantes.
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Assim, as orientações e observações do PNLD para a construção do material
didático devem ser analisadas com cuidado. Não podemos correr o risco de retroceder e
de permanecer no mesmo cenário, pois diante da complexidade do mundo contemporâneo
a necessidade de avançarmos nos processos educacionais que sensibilizem e
conscientizem os sujeitos.
Ao ter acesso ao guia de livros didáticos, é fundamental que os professores
coletivamente tenham disponibilidade para problematizar o material, os conteúdos e a
organização, considerando-se que o livro didático influencia o trabalho pedagógico dos
professores. Portanto, esse material precisa ser compreendido como um recurso e
instrumento pedagógico que deve atender os estudantes e os professores. É objetivo do
PNLD auxiliar o trabalho pedagógico do professor; contudo, os materiais didáticos não
podem se consolidar como currículo escolar.
Além disso, os materiais didáticos buscam cumprir uma demanda de mercado,
embora consigam disseminar conhecimentos pertinentes à formação dos aprendizes. Não
é em vão que o livro didático se instrumentaliza como um recurso didático. Esse material
repercute na construção de uma proposta pedagógica e de um currículo. À vista disso, nos
cabe pensar o livro didático de forma crítica e reflexiva e, sobretudo, a partir do interesse
e necessidade de formação dos estudantes da classe trabalhadora em meio ao contexto da
luta de classes.
Precisamos, portanto, disputar a escola, a pedagogia e o currículo. assim será
possível intensificar uma educação que alinhe teoria e prática e que entenda a urgência
de debater a educação ambiental para além dos muros da escola. É interessante que essa
discussão esteja pautada e construída nos outros espaços de formação e de vida para tentar
sensibilizar os sujeitos e construir uma outra sociedade que se avizinha, ancorada na
filosofia da práxis e da pedagogia da emancipação social e no constante enfrentamento às
práticas de dominação e de exploração do modo de produção capitalista.
O ensino é sempre dinâmico, logo, é imprescindível que o livro didático apresente
outras gramáticas e linguagens que possam representar melhor o espaço geográfico na
sua totalidade e complexidade (PONTUSCHKA; PAGANELLI; CACETE, 2009). Nesta
perspectiva, é lido refletir sobre quem é o autor do livro didático de geografia, pois
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precisamos compreender o perfil desse profissional para que se perceba de que forma se
constroem os conceitos geográficos, que análise do espaço geográfico está sendo
evidenciada e que projeto político-pedagógico está por trás das páginas do livro didático,
tendo em vista que o livro didático pode ser considerado hoje, no Brasil, um dos
principais instrumentos de difusão, não de métodos e conteúdos educativos, mas
também de informação e cultura » (ABONDANZA, 2020, p, 462).
A autora do livro didático analisado, a professora Neiva Camargo Torrezani, é
licenciada e bacharel em Geografia pela Universidade Estadual de Londrina (UEL-PR),
especialista em Análise e Educação Ambiental em Ciências da Terra pela UEL-PR,
mestra em Geografia pela UEL-PR e atuou como professora da rede particular de ensino.
É evidente que a professora apresenta um nível de formação qualificada. No
entanto, os conteúdos programáticos pouco se relacionam com a perspectiva de vida dos
estudantes do semiárido nordestino, considerando-se, também, que sua formação se deu
em boa parte na região sul.
um distanciamento da autora com a escola pública. Essa dimensão é
importante, pois são dois projetos distintos de pedagogia que refletem na forma de
selecionar e abordar os conteúdos e as dimensões sociais. A proposta pedagógica
apresentada no livro se distancia da realidade dos estudantes do semiárido nordestino.
Isso evidencia que a maioria dos autores que escrevem o livro didático não são da região
Nordeste e/ou não estudaram em instituições de ensino superior nordestinas.
Essa reflexão é construída mediante a análise dos livros didáticos, em virtude de
a formação dos autores e a construção dos conteúdos geográficos evidenciarem uma
proposta curricular. Nesse caso, destaca-se que a predominância de um saber
geográfico construído na região Sul, que, assim como a região Sudeste, concentrou e
ainda concentra a construção da geografia acadêmica. Sobre os autores dos livros
didáticos de geografia, ressalta-se que:
82% estão na região Sudeste; 16%, na Sul; 2%, na Nordeste e nenhum nas
regiões Norte e Centro Oeste do país. também um predomínio de autores
masculinos. Em relação ao gênero, 63% é composto por homens e 37%, por
mulheres (ABONDANZA, 2020, p. 470).
Esses dados são referentes ao período de 2005 a 2020, estudo realizado com todas
as coleções de geografia dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio
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aprovadas no PNLD. Esse quantitativo é reflexo da pesquisa realizada com 88 coleções
que conta com o nome de 100 autores.
A maioria dos autores dos livros didáticos de Geografia é da região Sudeste, dado
que evidencia que as discussões do/no livro didático partem de uma outra perspectiva de
formação geográfica, não sendo suficiente, portanto, em relação à geografia do ponto de
vista do território nordestino. Partindo dessa premissa, o professor terá a missão de
espacializar os conceitos para a realidade dos estudantes.
É fundamental analisar como a educação ambiental está sendo construída no livro
didático. A priori, cabe destacar que devemos entender a educação ambiental além da
dimensão do ecológico e do natural. Ela deve ser compreendida além do aspecto
estritamente biológico, o que facilita a construção de um ensino voltado para a
sensibilização, para as mudanças de hábitos e, sobretudo, para o entendimento da
educação ambiental enquanto processo formativo que contribui para a sustentabilidade.
Uma educação geográfica com foco no meio ambiente, de modo a implicar em
nossos cotidianos, ressignificando nossas atitudes e práticas para que seja possível pensar
em novos horizontes. A educação ambiental ainda é um desafio para muitas escolas que
não compreendem sua importância e sua necessidade.
Nesse sentido, é de suma importância que a educação ambiental seja pauta e
interesse dos documentos normativos da escola como o Projeto Político Pedagógico
(PPP) e que seja uma temática recorrente nos planos de aula. Embora haja dificuldades
em construir a educação ambiental na escola, sabe-se que esse processo formativo é
regulamentado e respaldado em documentos e leis que fortalecem o compromisso da
escola e das demais instituições educacionais.
É sabido, também, que a educação ambiental em diálogo com a pedagogia crítica
é ponto de partida para a transformação dos pressupostos defendidos pela política
ambiental do modo de produção capitalista. É, portanto, um processo de transformações
radicais no interior das políticas capitalistas que se utilizam de ferramentas e quaisquer
instrumentos necessários para a exploração da natureza.
Ressalta-se que a perspectiva de educação ambiental integradora quando a
escola se alinha e se articula com a pedagogia crítica e com a defesa de políticas públicas
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que são essenciais para iniciativas que combatam as injustiças ambientais, além de
construir os enfrentamentos contra a política de exploração do capital. será possível
desenvolver a educação ambiental numa perspectiva crítica nos espaços escolares se a
escola assumir o compromisso com a mudança social e dos valores sociais pré-
estabelecidos.
Por conseguinte, é importante que a educação ambiental seja pensada e articulada
como prática social e ação política e em diálogo com a pedagogia crítica de modo a nos
sensibilizar sobre a temática e pautar a educação ambiental em nossas vidas e nos planos
de governo sob uma outra perspectiva, o que contribui para uma outra visão de educação:
integradora e complexa.
Vivemos em um momento histórico que nos desperta para situações que afetam
diretamente a sociedade e as nossas relações de vida. A questão ambiental é um dos
elementos centrais para o entendimento de nossa sociedade. É essencial que
reconheçamos nosso pertencimento à natureza e à concretude dos agentes sociais diante
dessa questão de ordem ambiental, mas também política.
A pedagogia libertadora de Freire e a histórico-crítica de Saviani nos convidam a
refletir sobre o modelo de escola, permitindo-nos questionar o currículo, incluir a
educação ambiental incisivamente no PPP, tensionar o debate na escola e na sala de aula
a partir da realidade dos estudantes e discutir as propostas do livro didático. As estratégias
para a preservação do meio ambiente perpassam o entendimento de uma outra pedagogia
que enfoque as políticas públicas ambientais no campo da educação; para a
implementação dessas estratégias é importante que se tenha uma mudança de
mentalidade, de atitudes e de comportamentos.
Em função disso, faz-se necessário que a educação ambiental esteja relacionada
com o nosso contexto de vida e de relações sociais e precisa ser pautada nos planos de
governo como política pública e discutida no currículo escolar. De imediato, coloca-se
em questão que o livro didático não menciona diretamente o que é a educação ambiental
e sua relevância para a formação dos estudantes. Além do livro didático, na Base Nacional
Comum Curricular (BNCC):
uma exclusão do conceito de Educação Ambiental, como importante área
de conhecimento para os estudos realizados na Educação Básica sobre as
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problemáticas ambientais do período atual. Esta exclusão desconsidera o
processo histórico de lutas dos movimentos ambientalistas, dos povos
tradicionais e de outros grupos sociais que se dedicam às causas ambientais
pela construção de políticas públicas que venham fortalecer a Educação
Ambiental no Brasil (BARBOSA; OLIVEIRA, 2020, p. 327).
É notória a contribuição do livro didático na sistematização do conteúdo
programático, assim como recurso didático e de apoio aos estudantes, e da BNCC como
documento orientador para a construção da prática pedagógica dos professores. Todavia,
não podemos usar a BNCC como currículo escolar, ainda que busque explorar
competências, princípios, valores e direitos de aprendizagem.
Mesmo a base apresentando competências específicas e habilidades no ensino
fundamental no âmbito da geografia, a ausência de uma discussão efetiva sobre
educação ambiental, estando sempre nas entrelinhas os pormenores acerca da temática.
Em vista disso, entende-se que a base não trata a educação ambiental como temática que
possa efetivamente desenvolver habilidades procedimentais, competências e mudanças
de atitudes nos estudantes.
Essa leitura acerca da educação ambiental na base é inteiramente fundamental,
pois esse documento incide na prática pedagógica de professores e, infelizmente, muitos
docentes o conseguem visualizar como determinadas temáticas são representadas na
base. Nesse sentido, entendemos que seja de extrema importância que o livro didático
consiga desenvolver que a educação ambiental deve ser entendida para os estudantes
como uma temática candente em suas vidas.
O século XXI passa por uma crise de múltiplas dimensões que repercute no debate
do papel da sociedade para com a natureza. Com o caos pandêmico, que desmascarou a
estrutura da crise do capital, passamos a perceber que a educação ambiental, ainda de
forma secundária, passou a ser focalizada na dimensão do ecológico e do social, em razão
de a natureza ser uma grande frente de exploração em vista da necessidade de recursos
naturais para suprir a demanda da competitividade e da obsolescência programada.
Nota-se que há uma relevância da temática para a sociedade. Logo, a educação
ambiental deve ser trabalhada pertinentemente na escola para que se possa construir
relações colaborativas visando fomentar a perspectiva ecológica do bem viver, romper
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AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
JÚNIOR, Arnóbio Rodrigues de Sousa. Uma análise crítico-reflexiva da educação ambiental em um livro didático do ensino
fundamental da escola pública. Revista Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 7, nº 14, pp. 11-36, maio-agosto de 2021.
Submissão em: 28/03/2021. Aceito em: 11/07/2021.
ISSN: 2316-8544
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com a lógica colonizadora da sociedade urbano-industrial e fortalecer a luta dos e com os
povos tradicionais que lutam incisivamente por uma política de preservação ambiental.
Essa crise demonstra que devemos ressignificar a forma como interagimos com a
natureza e para isso, a educação ambiental é um dos primeiros pontos a ser colocado em
questão. Estão postos os desafios, mas precisamos de enfrentamentos que compreendam
as particularidades locais, de maneira a socializar os saberes e fortalecer as soberanias
dos povos em seus territórios que primam pelo desenvolvimento sustentável e
sustentabilidade, pois entendem que a natureza não pode ser usada como recurso para a
acumulação de riqueza, como mencionado:
Dialeticamente falando, para construirmos um novo patamar societário e de
existência integrada às demais espécies vivas e em comunhão com o mundo,
precisamos superar as formas de alienação que propiciam a dicotomia
sociedade/natureza (LOUREIRO, 2004, p. 16).
Somente a educação ambiental crítica poderá fomentar as possibilidades para a
transformação social. No livro, nota-se de imediato que as questões abertas (discursivas)
finais do capítulo oito não provocam o desenvolvimento argumentativo. O capítulo oito
não traz trechos que provocam indagações aos estudantes, ou seja, não apresenta
perguntas reflexivas no decorrer dos textos que possam levar os estudantes a pesquisar e
não títulos que possam interrogar os estudantes sobre as temáticas relacionadas à
educação ambiental. a presença de conteúdos conceituais, os quais precisam ser
contextualizados conforme a espacialidade e escala de vida dos estudantes.
O livro didático apresenta um perfil transitório de pedagogia liberal tradicional e
libertadora. Logo, é importante refletir que a educação ambiental convencional não
compreende à educação ambiental pelo tratamento consistente de nossa especificidade
como seres biológicos, sociais e históricos, de nossa complexidade como espécie e da
dialética natureza/sociedade como unidade dinâmica.” (LOUREIRO, 2004, p. 64).
O livro trabalha os pressupostos históricos que culminaram no surgimento de
pautas, de reivindicações e de movimentos sociais sobre os problemas ambientais em
escala mundial. A conferência de Estocolmo, realizada na Suécia em 1972, é considerada
um marco histórico para o avanço nas políticas públicas de preservação ambiental, nas
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JÚNIOR, Arnóbio Rodrigues de Sousa. Uma análise crítico-reflexiva da educação ambiental em um livro didático do ensino
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políticas de educação ambiental e na evolução do pensamento ambientalista. Ressalta-se
que é nesta conferência que é reconhecida a importância da educação ambiental.
O livro apresenta de forma sistemática um organograma que evidencia a evolução
da discussão da temática ambiental por meio da realização das conferências.
Consideramos como aspecto positivo porque são pontos de partida para discutir a questão
ambiental e revelam resultados positivos em vista dos objetivos almejados nas
conferências, nos protocolos e nas convenções em prol da questão ambiental e são
questões que repercutem na sociedade atual. Além disso, as conferências foram essenciais
para estruturar uma nova ótica da educação ambiental do ponto de vista da legislação.
Brasil (1981) afirma que todos temos o direito a um ambiente ecologicamente
equilibrado. Foi a partir das conferências que podemos avançar na discussão, dos projetos
e ações. Os projetos de intervenção em educação ambiental certamente nos conduzem a
um outro modo de agir dentro de nosso espaço de vida e de convívio social. Desse modo,
devemos considerar a educação ambiental como elemento indispensável para a busca pela
consciência ecológica.
Na seção que recebe o nome de As questões ambientais não são atuais do
capítulo oito, uma fragilidade do debate sobre a concepção de consciência ecológica.
Nessa seção, chama-se a atenção para o contexto de intensificação dos problemas
ambientais no século XX, sobretudo a degradação e poluição ambiental que infligem na
qualidade de vida da população, ressaltando que foi a partir desse processo latente que se
deu início a conscientização ecológica, que fortaleceu a construção dos movimentos de
luta, chamados de ambientalistas e ecológicos.
A discussão dessa seção é muito frágil do ponto de vista geográfico e pedagógico.
A consciência só é adquirida mediante uma constante sensibilização dos estudantes sobre
as problemáticas que se estruturam em torno do seu território e diante da tamanha
gravidade de problemas de ordem nacional e mundial. Para isso, é mister uma educação
ambiental inteiramente crítica.
Cabe destacar que a consciência é, sobretudo, um processo de construção
intelectual, pedagógica, política e ética. É imprescindível que o professor assuma a
condição de sujeito mediador, crítico e reflexivo, questionando o ensino como uma
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JÚNIOR, Arnóbio Rodrigues de Sousa. Uma análise crítico-reflexiva da educação ambiental em um livro didático do ensino
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construção social (FARIAS, 2006). Brasil (1981) nos diz que é preciso instigar e
promover a educação ambiental em todos os níveis e modalidades de ensino. É preciso
que se compreenda que a:
Educação Ambiental se constitui, neste cenário, como um importante agente
de análise crítica e transformação social, no qual a Educação Básica é campo
de atuação e possibilidades para a construção de uma consciência sobre os
problemas ambientais (BARBOSA; OLIVEIRA, 2020, p. 328).
Sem dúvidas, a educação ambiental é uma exigência do nosso tempo. Diante dessa
afirmativa, cabe a nós pensarmos em um ensino crítico de educação ambiental e da ciência
geográfica que tenha significado para a vida. É buscar construir habilidades que garantam
ao estudante participar como interventor social na solução para os problemas que
envolvem a dinâmica da sociedade, a sua comunidade e entendendo que a educação
ambiental não se faz somente na escola.
Descortinando a análise do capítulo
Alguns elementos da análise do capítulo oito foram antecipados na seção
anterior. Nesta segmentação buscamos evidenciar outras questões importantes. Fazer uma
leitura do livro didático requer a compreensão de que o livro enquanto material didático
demonstrará escolhas epistemológicas e político-pedagógicas que incidem na construção
de um tipo de ensino e de currículo. Então, cabe analisar o livro na perspectiva do ensino
de Geografia a partir da realidade dos estudantes, de modo que se possa perceber que
conteúdos programáticos estão sendo evidenciados e que construção de sujeitos está por
trás das páginas do livro didático.
O capítulo oito, composto por quarenta páginas, busca discutir o meio ambiente;
logo, a educação ambiental em seu campo de análise, evidencia de início, leituras que
repercutem no contexto da sociedade europeia, chamando a atenção dos estudantes para
o quanto o uso dos veículos e combustíveis fósseis são prejudiciais ao meio ambiente,
ressaltando que em alguns países da Europa, o uso dos meios de transportes não poluentes
é incentivado pelo governo. Ainda na primeira página do capítulo, a autora elucida, por
meio de uma fotografia, que a China é um dos países que mais emitem gases poluentes.
Não há, de início no capítulo, uma abordagem dessas questões mencionadas para
o contexto do Brasil, que os alunos devem minimamente refletir sobre sua escala de
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localização. Da mesma maneira, não é colocado que o Brasil, embora não seja o mais
poluente do mundo, está entre os dez primeiros mais poluentes, emitindo dióxido de
carbono em massa que intensifica a alteração das mudanças climáticas. Nessa
perspectiva, é preciso enfatizar também no contexto brasileiro, que o desmatamento
(muito presente e legitimado em tempo de pandemia) é um dos fatores que muito
contribuem para a emissão de gases poluentes e para a degradação do solo.
A partir de uma abordagem que dialoga com o espaço de localização dos
estudantes, é possível fazer outras ligações que permitem construir um ensino reflexivo,
crítico e que dialoga com o espaço geográfico dos estudantes. É valoroso tecer a crítica a
essa primeira abordagem do livro didático, que pouco repercute no contexto de vida dos
estudantes, a menos que o professor consiga, criticamente, fazer pontes dialógicas para
trazer a discussão para a realidade dos sujeitos na sala de aula, pois conforme Cavalcanti
(2010, p. 24): o ensino de geografia deve visar ao desenvolvimento da capacidade de
apreensão da realidade do ponto de vista da sua espacialidade.
Ainda na página introdutória do livro, é plausível a colocação da autora ao
enfatizar que o capítulo evidenciará o quanto o atual modelo de desenvolvimento, baseado
no lucro a qualquer custo, é prejudicial ao meio ambiente. Contudo, entendemos que é
primordial deixar claro que o atual modelo de desenvolvimento é o modo de produção
capitalista que desrespeita as potencialidades da natureza. Essa reflexão é determinante
para que o estudante do ensino fundamental procure entender a lógica imperativa da
sociedade capitalista.
Não nos serve, enquanto classe, que o modo de produção capitalista não esteja
explícito no livro didático como um modelo predatório. Dessa forma, a educação
ambiental crítica assume um posicionamento crítico que promove um processo educativo
em prol da justiça ambiental, da preservação dos recursos naturais e do apreço pela
natureza.
Na perspectiva da educação ambiental, o capítulo aborda temáticas que são
urgentes, bem como o consumismo, meio ambiente e a agricultura com um olhar para a
produção de alimentos transgênicos, a questão do lixo que é uma problemática a ser
enfrentada no Brasil e as reflexões sobre um meio ambiente sustentável em diálogo com
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a abordagem dos marcos históricos (conferências, protocolos) que permitiram colocar em
questão o meio ambiente.
Há uma articulação dialógica entre os conteúdos, mas são reflexões rápidas, sem
muito aprofundamento teórico, considerando a quantidade de páginas e o nível de ensino
e aprendizagem dos estudantes. Essas temáticas às quais o livro faz referência devem ser
exploradas ao máximo no campo de vida dos estudantes em conjunto com seus saberes
acumulados cotidiana e historicamente, porque a geografia na escola deve estar, então,
voltada para o estudo de conhecimentos cotidianos trazidos pelos alunos e para seu
confronto com o saber sistematizado que estrutura o raciocínio geográfico
(CAVALCANTI, 2010, p. 129).
O debate sobre a sociedade do consumo evidencia para os estudantes que o
capitalismo estimula incisivamente a sociedade a ter essa necessidade. O que precisa ser
colocado em questão e que o livro não aborda, é que mediante o avanço da técnica e do
aumento significativo de produtos para consumo, a natureza é a grande frente de captação
de recursos das empresas para a produção de serviços e produtos diversos em meio ao
progresso tecnológico.
A exploração da natureza, ou seja, o uso dos recursos naturais de forma indevida
que incide em inúmeras problemáticas (desmatamento, queimadas, degradação do solo
etc.), é um agravante da destruição constante do meio ambiente, podendo intensificar
também problemas de ordem social. É visto que há, diante da articulação da política
capitalista, a programação para os produtos e serviços se tornarem obsoletos e impactarem
diretamente em nossas vidas. O marketing do consumismo busca a todo momento
contribuir com o consumo desenfreado que repercute em novas lógicas de exploração da
natureza. Essa reflexão deve ser evidenciada no livro didático para tentar sensibilizar os
discentes sobre como opera o ciclo vicioso do consumismo.
Não bastam apenas campanhas publicitárias que protestam contra o consumismo.
A escola deve ser um dos meios de formação que ensine a sociedade a aprender a
consumir de forma ecológica, em parceria com outras instituições, de modo que
dissemine atitudes, conhecimentos e práticas que fortaleçam o consumo consciente e a
sustentabilidade.
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Os textos complementares chamam a atenção para a ideia da reutilização e
reciclagem e isso precisa ser colocado em prática. Por esse motivo, é de suma importância
que a educação construa teoria e prática de forma simultânea, o que exige que a escola
consiga desenvolver o ensino em diálogo com a pesquisa, uma vez que um não existe sem
o outro (FREIRE, 2003).
O meio ambiente sofre com o ritmo de crescimento de atividades econômicas e
com o consumo excessivo. Tudo isso é produto da grandiosa exploração dos recursos
naturais. O livro didático, de forma singular, apresenta os principais problemas
ambientais que estão relacionados com o modelo de consumo e de produção capitalista.
O desmatamento é um dos grandes problemas relacionados ao modelo de
produção e consumo que propicia o aumento substancial de áreas urbanas. Essa
problemática deve ser também evidenciada em sala no contexto do semiárido brasileiro a
fim de que os estudantes percebam que não é uma problemática distante de suas vidas e
que impacta diretamente na forma como se organizam em seus territórios.
O livro destaca também o uso constante de agrotóxicos que poluem a água,
contaminam os solos e afetam diretamente o modo de vida de povos tradicionais. Em sala
de aula, é possível que o professor contraponha a agricultura familiar no semiárido como
uma prática agroecológica com a política dos agrotóxicos e da produção de transgênicos
que crescem substancialmente devido ao discurso empreendedor e aos avanços
tecnológicos e, ainda, evidencie que a agricultura familiar é responsável tanto pela
geração de renda de muitos brasileiros como pela alimentação de muitas famílias.
O consumo de água é uma outra temática abordada no capítulo, ressaltando
sobretudo o consumo desigual e os dados evidenciando a disponibilidade de água no
mundo. É preciso pontuar que a distribuição da água no Brasil e no mundo se de forma
irregular e carece de um debate profundo, de modo a sensibilizar as pessoas para com o
consumo de água, a forma de uso e, sobretudo, convidando a população a refletir sobre a
importância desse recurso para além do uso cotidiano.
A gestão das águas no Ceará tem procurado construir um modelo que esteja
relacionado com a participação efetiva da sociedade, de órgãos públicos e de outros
dispositivos que constituem a chamada gestão participativa que é essencial para a
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articulação entre os setores e sociedade e no que tange ao debate sobre o consumo e
preservação dos recursos hídricos. A gestão das águas no Ceará compreende as bacias
hidrográficas como unidades básicas para a construção de planejamentos ligados ao
potencial hídrico.
Busca-se desenvolver um gerenciamento em termos quantitativos e qualitativos
dos recursos hídricos. Os números da quantidade de açudes criados, poços etc.,
demonstram a infraestrutura ofertada por uma gestão participativa com foco em suprir as
carências das comunidades e na criação de projetos que possam efetivar políticas públicas
que garantam o abastecimento hídrico. É importante que essas reflexões sejam elucidadas
em sala diante da construção do ensino e aprendizagem.
É nesta perspectiva que se entende que o livro didático deveria configurar-se de
modo que o professor pudesse tê-lo como instrumento auxiliar de sua reflexão geográfica
com seus alunos, mas existem fatores limitantes para tal. (PONTSCHKA; PAGANEL;
CACETE, 2009, p. 343). Diante desse diálogo, é notório que o livro permite construir
alguns pressupostos teóricos que nos levam a uma educação ambiental comprometida
com o desenvolvimento sustentável, independentemente de o professor dever avançar nas
discussões para além do livro didático.
É fundamental potencializar o ensino de geografia ancorado na reflexão e na
prática dos estudantes. A seção nomeada O consumo e o lixo induz positivamente o
indivíduo a pensar sobre o descarte de lixo que deve ser reciclado ou destinado a aterros
sanitários. No entanto, nem todas as cidades têm aterro sanitário que dispõe de técnicas
que evitam a poluição. Buscando dialogar com a realidade de muitos estudantes, é
indispensável problematizar o descarte de lixo nos lixões a céu aberto que podem
contaminar os lençóis freáticos e o solo, dentre outras problemáticas que podem surgir no
contexto da saúde coletiva da população.
Como coloca Gadotti (2001, p. 89), o desenvolvimento sustentável tem um
componente educativo formidável.” Assim, só conseguiremos nos aproximar ou construir
o desenvolvimento sustentável mediante um processo educativo formidável, que
compreenda a educação ambiental como uma pauta urgente para a escola e para a agenda
pública.
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O livro usa textos complementares, fotografias, gráficos e outros elementos que
ajudam a sistematizar o ensino, como demonstra a Tabela 01. Esses elementos se
constituem como marcadores metodológicos que podem ajudar na construção de um
ensino de geografia mais qualificado e interdisciplinar.
Tabela 1: Elementos que complementam os textos do capítulo oito.
Linguagem
cinematográfica
Mapas
Fotografias
Charges
Gráficos
01
03
34
0
04
Fonte: Elaboração do autor, 2020.
Nota-se que o livro didático é insuficiente quanto ao uso da linguagem do cinema,
que é um elemento indispensável para a disseminação da produção cultural e da
interdisciplinaridade. É elementar que o professor consiga utilizar essa linguagem como
recurso didático para expandir as possibilidades de interação entre os pares e enriquecer
o repertório sociocultural dos estudantes.
Há, nessa perspectiva, a utilização da linguagem cartográfica de forma reduzida
quando comparada com a quantidade de páginas do capítulo e com a quantidade de
temáticas que ele aborda. É imprescindível que os estudantes possam ter a capacidade de
fazer uma leitura cartográfica, o que permite orientá-los sobre várias referências
geográficas. Não há, por conseguinte, quase nada de leitura gráfica.
É visto que muitas fotografias no decorrer do capítulo oito com a intenção de
ilustrar situações narradas no texto. Porém, as fotografias evidenciam, em síntese, a
Europa, a Ásia ou o Sul e Sudeste brasileiro. São fotografias distantes da realidade do
semiárido. As fotografias presentes no capítulo são usadas como complementação de
textos e, de fato, se articulam com os conteúdos presentes. Entretanto, é preciso refletir
até que ponto essas imagens servem como representações para a formação dos estudantes,
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pois as imagens devem ser exploradas em sala de aula e devem contribuir na formação
do jovem.
Quanto aos textos complementares, estes são mais reflexivos, buscam construir
atividades que possam inquietar o estudante e se apresentam numa perspectiva crítica,
apesar de serem descartados, na maioria das vezes, em sala de aula pelo professor que
não tem muita disposição à leitura e ao trabalho de forma coletiva. Somente a educação
ambiental crítica poderá vincular o processo de aprendizagem do estudante na escola com
as perspectivas sociais do mundo. Desse modo, Loureiro (2007, p. 66) nos diz que:
Com a perspectiva crítica, entendemos que não há leis atemporais, verdades
absolutas, conceitos sem história, educação fora da sociedade, mas relações em
movimento no tempo-espaço e características peculiares a cada formação
social, que devem ser permanentemente questionadas e superadas para que se
construa uma nova sociedade vista como sustentável.
É na perspectiva da educação crítica que a educação ambiental poderá romper
com os paradigmas liberais tradicionais impregnados na formação dos estudantes na/da
escola e dos conteúdos programáticos do livro didático, criando uma sistemática de leitura
a partir da realidade de cada indivíduo (CASTROGIOVANNI; GOULART, 1998).
Pode-se afirmar que o capítulo apresentou uma linguagem clara e destinada ao
público do ensino fundamental com uma proposta teórico-metodológica que respeita a
trajetória da geografia como ciência, sem perder o caráter científico, percebendo que as
leituras dos textos tratam do espaço geográfico, mesmo que oscile entre tendências
pedagógicas. Há a presença vigorosa de conteúdos conceituais e, de forma esporádica, a
presença de conteúdos atitudinais e procedimentais.
Finalmente, a estrutura do capítulo auxilia na leitura dos estudantes da mesma
forma que os conteúdos se apresentam de forma sistematizada e de acordo com a
linguagem geográfica necessária ao público leitor. Sabe-se, todavia, que há a necessidade
de problematizar alguns elementos numa outra perspectiva social e pedagógica.
A docência em geografia com um olhar na educação ambiental
Corroborando com Farias (2006), o professor não pode ser concebido sozinho
como o agente da mudança, como o sujeito da práxis, como o autêntico indivíduo que
conduz o ensino e a aprendizagem a uma verdadeira transformação social. O professor
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precisa dialogar incisivamente com a escola e, para além dela, articular um processo
rizomático de educação integradora e emancipadora, que permita ao estudante construir
sua autonomia intelectual.
No campo da docência, o professor deve questionar o currículo, não usar o
sumário do livro didático como guia de formação e reconhecer que a temática ambiental
está posta como um tema transversal. Brasil (1997) instiga o docente a pensar o meio
ambiente como uma crise ambiental ou civilizatória. Essa reflexão, dentre outras
pertinentes, permite que pensemos cotidianamente o ensino de educação ambiental,
reconsiderando as práticas pedagógicas e as ações cotidianas. Assim sendo, o docente
deve perceber a educação ambiental para além do aspecto natural, mas compreendendo,
também, faces históricas, culturais, sociais e políticas (ARRAIS; BIZERRIL, 2020).
Isso posto, cabe ao professor pensar o currículo e a pedagogia, pois o currículo
incide em um modelo de sociedade e de vida. É a partir do princípio da educação
ambiental crítica que iremos construir um outro modelo de sociedade que, inclusive, já se
avizinha.
Posta nesses termos, a educação ambiental crítica é bastante complexa em seu
entendimento de natureza, sociedade, ser humano e educação, exigindo amplo
trânsito entre ciências (sociais ou naturais) e filosofia, dialogando e
construindo pontes e saberes transdisciplinares. Implica igualmente o
estabelecimento de movimento para agirmos-pensarmos sobre elementos
micro (currículo, conteúdos, atividades extracurriculares, relação escola-
comunidade, projeto político pedagógico etc.) e sobre aspectos macro (política
educacional, política de formação de professores, relação educação-trabalho-
mercado, diretrizes curriculares etc.), vinculando-os. (LOUREIRO, 2007, p.
68).
Em vista disso, a educação ambiental crítica busca problematizar a realidade e
questionar o status quo. Essa vertente de educação exige do professor competência
técnica, política e humana. Isso porque o docente deve contribuir no processo de
conscientização dos estudantes, na construção de conhecimentos para uma compreensão
básica dos problemas ambientais e no desenvolvimento de habilidades que possam
permitir ao estudante ter uma participação ativa na sociedade.
É construir competências e habilidades voltadas para a emancipação social e não
para o mercado de trabalho em prol da exploração da natureza e acumulação de riqueza.
Cabe, então, à escola e ao professor articular a educação ambiental com uma compreensão
de totalidade e ligada à vida dos estudantes.
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No campo da formação docente, deve-se buscar renovar a formação geográfica
com um olhar atento para as questões ambientais, para o currículo de formação e refletir
sobre como essa formação está sendo construída e até que ponto ela é comprometida com
o meio ambiente, de modo a renovar as estratégias de ensino e fortalecer a proposta de
educação ambiental de cunho crítico que possa fomentar a formação política.
Sendo assim, é importante frisar que os trabalhos desenvolvidos nos cursos de
licenciatura em Geografia são fundamentais para que a questão do livro didático deixe de
ser uma questão e passe a ter soluções.” (CASTROGGIOVANI; GOULART, 1998, p.
20). muitos desafios no contexto da docência, visto as escolhas epistemológicas de
formação, mas a educação ambiental é uma temática tangente à vida de todos e deve ser
construída no aspecto da superação das relações sociais vigentes (LOUREIRO; CUNHA,
2008).
Em suma, cabe pontuar e refletir sob a ótica de Guattari que:
Não haverá verdadeira resposta à crise ecológica a não ser em escala planetária
e com a condição de que se opere uma autêntica revolução política, social e
cultural reorientando os objetivos da prodão de bens materiais e imateriais.
(GUATTARI, 1990, p. 09)
A docência deve estar articulada com a teoria e a prática de forma simultânea e as
universidades devem se aproximar das escolas para que possam contribuir no processo
educativo que rompa com a lógica de dominação. Dessarte, uma das funções
fundamentais dos professores é a de contextualizar o conteúdo geográfico com a
espacialidade de vida dos estudantes e repensar algumas questões a partir de seu espaço
de vida.
Considerações finais
Esta produção acadêmica, ancorada na pesquisa qualitativa e no estudo
exploratório, buscou analisar o ensino de educação ambiental no/do livro didático do
ensino fundamental de uma escola pública do Estado do Ceará, construindo inquietações,
reflexões e críticas no âmbito do ensino de Geografia. Embora a educação ambiental
esteja contemplada e/ou priorizada no sumário do livro didático, o professor não deve
usá-lo como currículo escolar.
Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
JÚNIOR, Arnóbio Rodrigues de Sousa. Uma análise crítico-reflexiva da educação ambiental em um livro didático do ensino
fundamental da escola pública. Revista Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 7, nº 14, pp. 11-36, maio-agosto de 2021.
Submissão em: 28/03/2021. Aceito em: 11/07/2021.
ISSN: 2316-8544
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Tornou-se evidente que a temática da educação ambiental ainda precisa ser
explorada com mais afinco e em diálogo com as vivências dos estudantes da escola
pública. Apesar de o livro didático não contemplar uma análise geográfica a partir do
espaço de vida de todos os estudantes, cabe ao professor desenvolver um processo
educativo que comova a todos a desenvolver atitudes inovadoras e ecológicas, além de se
colocar como atores sociais que devem contribuir para a construção de uma outra
sociedade, livre da injustiça ambiental, ecologicamente saudável, dentre outras
possibilidades.
O livro didático demonstrou ter coerência entre os conteúdos, mas ainda
precisamos aprofundar as discussões, a fim de redimensionar as temáticas para um outro
campo de análise que possa fazer com que todos entendam a gravidade dos problemas
ambientais. Por fim, este artigo propicia fortalecer a discussão e pensar em novas formas
pedagógicas para construir o ensino de educação ambiental.
Nos convida, também, a pensar as práticas docentes na/da escola, de maneira a
entendermos que essa temática é essencial para a formação curricular, colocando a
educação ambiental na dimensão do político e do social.
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JÚNIOR, Arnóbio Rodrigues de Sousa. Uma análise crítico-reflexiva da educação ambiental em um livro didático do ensino
fundamental da escola pública. Revista Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 7, nº 14, pp. 11-36, maio-agosto de 2021.
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