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SEÇÃO
DOSSIÊ
GEOGRAFIA DA POPULAÇÃO E A PRÁTICA DE ENSINO:
a proposta de uma cartilha sob o viés da diversidade sexual
POPULATION GEOGRAPHY AND TEACHING PRACTICE:
The proposal of a guidebook from the sexual diversity perspective
GEOGRAFÍA DE LAS POBLACIONES Y LA PRÁCTICA DE LA
EDUCACIÓN: Propuesta de una cartilla bajo el enfoque de la
diversidad sexual
Dayana Debossan Coelho
1
Universidade Federal Fluminense (UFF),
Rio de Janeiro, Brasil
e-mail: dayanadebossan78@gmail.com
Lilian Aparecida de Souza
2
Universidade Federal Fluminense (UFF),
Rio de Janeiro, Brasil
e-mail: liliansouzageo@gmail.com
Resumo
Esta pesquisa resulta das reflexões operadas na disciplina Prática de Ensino, do curso de Licenciatura em Geografia da
Universidade Federal de Viçosa, na qual elaboramos uma cartilha portadora de conteúdo geográfico direcionada para o Ensino
Fundamental II. O produto educacional foi pensado a partir da observação das pesquisadoras no campo de estágio sobre as
experiências espaciais vivenciadas por grupos submetidos a regimes de opressão no espaço escolar. Para sua confecção, nos
baseamos nos documentos normativos da Educação Básica e na bibliografia existente sobre essa temática. Em nossas análises
utilizamos os interseccionados marcadores sociais: gênero e sexualidade. O objetivo do recurso didático, com potencial para
ser desenvolvido na área de Geografia da População, foi apresentar uma proposta de prática de ensino diferenciada nesta área,
1
Doutoranda em Geografia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Mestre em Geografia pela Universidade Federal de
Juiz de Fora (UFJF), Bacharela e Licenciada em Geografia pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Vice-coordenadora
do Laboratório “Geografia Histórica das Cidades e Territórios” (GEHOCITE) localizado nas dependências do Departamento
de Geografia da UFV. Atua no Núcleo de Estudos e Pesquisas Agroambientais (NEPAM) na linha de pesquisa Sociedade,
Agricultura e Meio-Ambiente da UFF.
2
Doutoranda em Geografia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Mestre em Geografia pela Universidade Federal de
Juiz de Fora (UFJF) e Licenciada em Geografia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Pesquisadora associada
ao Núcleo de Pesquisa Geografia, espaço e ação (NUGEA/UFJF).
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de modo a problematizar atitudes consideradas opressoras no espaço escolar e fora dele. Sua produção representa uma prática
pedagógica e um instrumento de reflexão para a práxis docente, possuindo relevância educativa, acadêmica e social.
Palavras-chave
Ensino Fundamental; Geografia da População; prática de ensino; recurso didático; diversidade sexual.
Abstract
This research results from the reflections prompted in the discipline Teaching Practice, offered by the Undergraduate Licentiate
Program of Geography at the Federal University of Viçosa. In this subject, we prepared a guidebook containing geography
content aimed at the final years of Middle School. The educational product was developed from the participant observation of
the researchers in the internship field on the spatial experiences lived by groups subjected to oppression regimes in the school
space. For the elaboration of this guidebook, we based ourselves on the normative documents of the Brazilian Basic Education,
as well as on existing bibliography on this theme. In our analyses, we used the intersecting social markers: gender and sexuality.
The main objective of the didactic resource, with the potential to be developed in the knowledge area called Population
Geography, was to present a differentiated teaching practice proposal in this area, in order to problematize attitudes considered
oppressive in the school space and outside of it. The production of the guidebook represents a pedagogical practice and a
reflection instrument for teaching and also social relevance.
Keywords
Middle School; Population Geography; teaching practice; didactic resource; diversity perspective.
Resumen
Esta investigación resulta de las reflexiones utilizadas en la asignatura Práctica de la Educación, ofrecida en la Licenciatura en
Geografía de la Universidad Federal de Viçosa. En esta materia elaboramos una cartilla con información geográfica dirigida a
los últimos años de la Educación Básica II. El producto educativo fue pensado a partir de la observación activa de los
investigadores en campo durante la práctica sobre las experiencias vividas por grupos sometidos a un régimen de opresión en
el espacio escolar. Para la elaboración de la cartilla nos basamos en los documentos normativos de la Educación Básica y
también en la bibliografía existente sobre el tema. En nuestros análisis utilizamos marcadores sociales interseccionales: género
y sexualidad. El objetivo principal del recurso didáctico, con potencial para ser desarrollado en el área del Geografia de las
Poblaciones, constituyó en presentar una propuesta de práctica de educación diferenciada en esta área, que permita
problematizar actitudes consideradas como opresoras en el ámbito estudiantil y, consecuentemente fuera de él. La elaboración
de la cartilla representa un método pedagógico y un instrumento de reflexión para la práctica docente y posee relevancia no
solo pedagógica y académica, sino también social.
Palabras-clave
Educación básica; geografía de poblaciones; prácticas de educación; recurso didáctico; diversidad sexual
Introdução
Os debates étnico-raciais, de gênero, orientação sexual, dentre tantos outros, muitas
vezes permanecem invisibilizados na escola, promovendo um silêncio desconcertante. Neto
(2004) afirma que os espaços da moral estabelecem padrões e transgressões, que cada vez mais
afunilam e reproduzem discussões sobre a condição social que a modernidade emprega nas suas
instituições, tal como a frequente reprodução do aparelho da escola como caixa de ressonância
das ideologias dominantes e conservadoras da sociedade. Com isso, a função social que a escola
exerce, enquanto espaço democrático, é constantemente orientada por tais padrões que ocultam
as situações de alteridade na elaboração de seus materiais teóricos e nas orientações ideológicas
do ensino, existindo, desse modo, uma resistência muito grande em incorporar questões de
gênero e sexualidade.
Envolto no discurso da democratização da escola, a dimensão homogeneizante traduz
uma forma demarcada de conceber a educação, o ser humano e seus processos de formação,
isto é, expressa um projeto político-pedagógico. Este, por sua vez, irá indicar o complexo das
ações educativas que ocorrem no interior da instituição. o se pode perder de vista que os
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alunos e alunas chegam à escola caracterizados pela diversidade oriunda do desenrolar
cognitivo, afetivo e social, notoriamente contraditórios e reflexo da “[...] qualidade e quantidade
de suas experiências e relações sociais, prévias e paralelas à escola” (DAYRELL, 1999, p. 140).
Ou seja, são sujeitos corpóreo e socioculturais plurais. Nesse sentido, muitas vezes, as
abordagens uniformes concedidas por alguns estabelecimentos escolares vêm ratificar a
desigualdade e as injustiças das origens sociais dos alunos e consagrar a lógica da sociedade
patriarcal, heteronormativa, misógina e racista.
O pertencimento a um grupo no espaço escolar se torna um pré-requisito à interação
entre os alunos e os professores, e os ideais hegemônicos são explícitos tanto no grupo quanto
nos debates existentes na escola. O complexo cenário da formação identitária dos alunos (quem
é negro, quem é branco, orientação sexual etc.) revela resistências, movimentos, hierarquias e
desigualdades no espaço.
Focalizar as aproximações, alteridades, escolhas, os distanciamentos e conflitos, enfim,
a vida em grupo, significa enxergar a escola como uma estrutura constituída por sujeitos
socioculturais em interação com os demais. Apreender estes homens e mulheres através da ótica
identitária significa alcançar os discentes em sua diferença, na medida em que o indivíduo é
considerado portador de “[...] uma historicidade, com visões de mundo, escala de valores,
sentimentos, emoções, desejos, projetos, com lógica de comportamentos e hábitos que lhes são
próprios [...]” (DAYRELL, 1999, p. 140).
Entendendo que o ser jovem é condicionado pelas experiências, pode-se inferir que os
estudantes da comunidade LGBTQIAPN+
3
, vivenciam sua juventude através da distinção
corpóreo-territorial. Tal distinção faz com que, muitas vezes, os integrantes da comunidade não
ocupem os mesmos espaços escolares que a comunidade heteronormativa (os trajetos não são
os mesmos para os vários tipos de sujeitos.) O itinerário de discentes com corpos negros é
diferente, por exemplo, do de corpos brancos, assim como é distinto o de sujeitos heterossexuais
perante o dos sujeitos LGBTQIAPN+. A discriminação em relação à raça, a orientação sexual,
ao gênero, aos corpos (estereotipados em esbeltos e magros ou “fora de forma” /gordinhos, ao
tipo de cabelo etc.)
4
conduzem à prática do bullying. Este, de acordo com Pereira (2009), é uma
situação que se caracteriza por agressões (física, verbal e psicológica), praticada de forma
repetitiva, gerando transtornos aos envolvidos. Suas implicações na escola afetam os alunos e
as alunas, produzindo consequências no seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e psicológico.
Os temas que na teorização e no discurso são constantemente escamoteados ou
trabalhados unilateralmente (raça, gênero, sexualidade, feminismo etc.) têm sua explosão com
a “virada crítica” ocorrida no Brasil entre os anos de 1970 e 1980. Associados à vertentes pós-
críticas, à reação (de contrapoder) aos governos autoritários e à possibilidade de abertura à
3
A comunidade de pessoas fora do padrão cis-heteronormativo, em suas diversidades, abrange um número cada vez
maior de definições, sendo a sigla LGBTQIAPN+ (Lésbicas, Gays, Bi, Trans, Queer/Questionando, Intersexo,
Assexuais/Arromânticas/Agênero, Pan/Poli, Não-binárias e mais) a mais atual para se referir a esta população. A
primeira parte da sigla LGB se refere à orientação sexual enquanto o restante diz respeito à maneira como o
indivíduo se reconhece, ou seja, sua identidade de gênero. Esta será a nomenclatura adotada no trabalho, todavia, por
ser uma produção anterior, a cartilha ainda utiliza a sigla LGBTQI+.
4
Os caminhos dos corpos no ambiente escolar podem ser caracterizados como diferentes ou “marginais” podendo,
com isso, ter interdição nas suas espacialidades, outros corpos marcados por juízos de valores considerados
“normais” tendem a desenvolver qualquer espacialidade (cf. SILVA, 2009b).
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redemocratização do país, alguns teóricos da Geografia
5
começaram a esboçar transformações
na geografia escolar e, consequentemente, nas suas teorizações e práticas. Ratts (2016), a este
respeito, chama a atenção dizendo que as questões de gênero e sexualidade passaram a oxigenar
os debates geográficos nesse contexto.
Enquadrando-se epistemologicamente nas vertentes pós-críticas, o temário gênero e
sexualidade foi assentido por alguns teóricos e teóricas da Geografia. Contudo, não foi
incorporado direta e de forma cabal nas áreas de ensino e didática. Apenas eventualmente,
foram feitas menções na Geografia Escolar às problemáticas de gênero e sexualidade, e ainda
uma resistência do corpo docente em apropriá-las e incorporá-las à sua práxis pedagógica.
Isso acontece, segundo Silva (2009a), porque os educadores não estão preparados e se orientam
por valores hegemônicos da sociedade heteronormativa, muitas vezes incrustados no seu
processo formativo.
Segundo Silva (2009a), o gênero e a sexualidade dos sujeitos podem ser entendidos
como marcadores da diferença” na comunidade escolar, abarcando ausências, presenças,
discriminações, barreiras, recusas, etc. De uma forma geral, as escolas têm funcionado como
aparelhos de reprodução das ideologias dominantes da sociedade, conforme apontava
Althusser (1980) e Foucault (2014).
A escola ainda, por vezes, reproduz e ratifica os padrões de exclusão que estão em voga
na sociedade e naturaliza-os. Nesse ínterim, a instituição enrijece as distinções de renda, cor e
gênero e promove uma educação para a consagração de “verdades” alinhadas à ordem
heterossexual dominante. No espaço escolar, experiências espaciais são interditadas aos grupos
que transgridem a norma hegemônica em relação à sexualidade, ao gênero e ao desejo (SILVA,
2009b). Como exemplo, podemos citar o constrangimento das alunas travestis, as quais têm sua
espacialidade restrita, ou ao menos constrangida, nos banheiros, nas aulas de educação física e
no pátio na hora do recreio. À luz das contribuições de Silva (2009b) isso ocorre uma vez que
a marca da transgressão dos travestis é explícita, visual, menos perceptível das que ocorrem
com os gays e/ou lésbicas.
Ao confrontar e tensionar o poder heteronormativo, as travestis e toda a comunidade
LGBTQIAPN+ são alvo de constantes agressões. A escola, em muitos casos, torna-se local de
sofrimento, violência e ataques recorrentes à sua autoestima, que malogra as esperanças de
conquistas materiais e sociais no futuro. Afinal, as experiências vivenciadas são,
predominantemente, marcadas pela exclusão e interdição do acesso à educação, o que resulta
na evasão escolar.
Apesar da escola, em muitos casos, contribuir para a produção de representações sociais
negativas, ela também pode ser o espaço da inclusão, do acesso democrático ao conhecimento,
da convivência das diferenças, da justiça social. Nesse sentido, o docente é convidado a intervir
na realidade socioespacial, promovendo Geografias subversivas, a fim de: legitimar o direito
universal à escola; questionar a organização binária da sociedade heteronormativa; produzir um
contrapoder visando a reorganização espacial - a organização do espaço é concebida como
sexista e vigora como componente de ordenamento das relações de gênero (MASSEY, 1984);
5
Tais como: Milton Santos com a discussão do racismo e da corporeidade do cientista negro; José Willam Visentinni
que ao retratar a realidade social dos estudantes indicou questões de feminismo, de segregação étnica (enfocando o
apartheid sul-americano em seus livros didáticos e paradidáticos) e de racismo; Tomoko Iyada Paganelli que nos seus
estudos sobre as crianças destacou as problemáticas raciais e de gênero, dentre tantos outros.
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trazer à tona o debate sobre pluriversalidade de gênero e sexualidades. Ao tensionar a pretensa
hegemonia branca, masculina e heterossexual, podemos caminhar em direção a um projeto de
escola mais includente, solidário, empático e que seja capaz de respeitar a alteridade.
A partir das considerações esboçadas, o trabalho em tela é um relato de experiência da
elaboração de uma cartilha com o seguinte título: “Pergunte a si mesmo: eu sou contra o
bullying? A escola em qualquer lugar é uma escola antibullying”, portadora de conteúdo
geográfico e direcionada para os anos finais do Ensino Fundamental
6
. O produto educacional
foi pensado a partir da observação participante das pesquisadoras nos campos de estágio sobre
as experiências espaciais vivenciadas por grupos submetidos a regimes de opressão no espaço
escolar. Em nossas análises, utilizamos os distintos e interseccionados marcadores sociais:
gênero e sexualidade. O objetivo principal do recurso didático, com potencial para ser
desenvolvido na área de conhecimento denominada Geografia da População, consistiu em
apresentar uma proposta de prática de ensino diferenciada nesta área, de modo a problematizar
pensamentos, representações e atitudes consideradas opressoras no espaço escolar (como o
bullying) e, consequentemente, fora dele.
Nesse sentido, a proposta da criação da cartilha busca conferir visibilidade ao corpo e à
corporeidade, compreendidos segundo Ratts (2016, p. 125) como “[...] categorias de
pensamento - sociais, espaciais e culturais, antropológicas, geográficas e históricas”. Ou seja,
clarificar a dimensão espacial da corporeidade
7
elucidando as diferenças dos/nos corpos e na
ocupação destes nos espaços sociais em termos de pertencimentos raciais, de gênero e
sexualidade.
Formação docente, ensino de Geografia e diversidade sexual: a origem da proposta
Este trabalho resulta das reflexões teórico-analíticas e metodológicas operadas na
disciplina Prática de Ensino, ofertada pelo curso de Licenciatura em Geografia da Universidade
Federal de Viçosa (UFV) no primeiro semestre de 2021. Tal disciplina, de extrema importância
para a formação docente, objetiva: refletir sobre a natureza da docência em Geografia em
situações contextualizadas; compreender o papel da Geografia escolar na atualidade;
instrumentalizar discentes licenciandos para atuação em sala de aula; analisar e produzir
materiais didáticos para a educação básica; planejar e executar planos de aula, planos de curso,
unidades didáticas e sequências didáticas para os níveis de Ensino Fundamental e Médio,
utilizando diferentes linguagens geográficas. Deste modo, busca estimular os estudantes a
desenvolver a práxis reflexiva, fundamental para a docência.
6
A cartilha foi produzida, mas as autoras não tiveram a oportunidade de apresentá-la e discuti-la com as turmas em
que realizaram o estágio supervisionado devido às adaptações ao ensino remoto impostas pelas necessárias medidas
de isolamento social para a contenção da pandemia de coronavírus.
7
Santos denomina esta dimensão de lugaridade: “[...] a corporeidade nos leva a pensar na localização (talvez
pudéssemos chamar de lugaridade), a destreza de cada um de nós [...] E aí aparece em resumo o meu corpo, o corpo
do lugar, o corpo do mundo. Quem sabe o preconceito não virá do exame da minha individualidade, nem da
consideração da minha cidadania, mas da percepção da minha corporeidade” (SANTOS, 1997, p. 134-135, grifos
nossos).
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Em uma das atividades prático-reflexivas da disciplina, a proposta foi a elaboração de
um produto educacional cuja temática fosse relevante e pouco trabalhada nas aulas de Geografia
na Educação Básica. Para selecionar o tema, partimos da leitura e análise de documentos
normativos da educação básica, tais como a Base Nacional Comum Curricular BNCC
(BRASIL, 2018) e os Parâmetros Curriculares Nacionais PCNs (BRASIL, 1998), em seus
volumes de Geografia e Orientação Sexual, e das vivências e experiências obtidas nos campos
de estágio formativos da Licenciatura. Isso porque consideramos, assim como Lima e Pimenta
(2006), que o estágio, além de se constituir como campo de conhecimento e dispositivo
pedagógico que auxilia na reflexão e enfrentamento da dicotomia teoria e prática, é um
instrumento de pesquisa. Nessa perspectiva, advogamos que a universidade é espaço formativo,
lócus da docência, e que a pesquisa na escola integra o caminho metodológico para esta
formação. Portanto, o estágio consiste na investigação das práticas pedagógicas nos
estabelecimentos educacionais.
Compreendendo o desenvolvimento do estágio como uma atividade investigativa,
detectamos junto às escolas em que o realizamos, através de observação participante
8
, lacunas
e (in)visibilidades no que tange às questões de gênero e sexualidade, tanto no Ensino
Fundamental quanto no Ensino Médio, sobretudo nas aulas de Geografia. Realidade semelhante
de muitas instituições escolares (estaduais, municipais, públicas e privadas), foram apontadas
nas pesquisas de Ratts (2016), Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis
e Transexuais ABGLT (2016) Faria (2018), Souza (2021), entre outros. Nesse ínterim, a
temática selecionada para a elaboração do produto educacional da disciplina Prática de Ensino
foi a diversidade sexual e o recurso didático a fim de trabalhá-la foi a cartilha.
A justificativa que embasa tal escolha está relacionada ao silenciamento de alguns
professores em geral e de Geografia em tocar no assunto, já que o mesmo é visto como “tabu”
social (o que está associado ao próprio receio/despreparo dos sujeitos escolares - professores,
funcionários, corpo administrativo etc.). Como é um tema pouco discutido, os alunos, alunas e
demais integrantes da comunidade escolar reproduzem estigmas e preconceitos a respeito dos
colegas integrantes da comunidade LGBTQIAPN+, que nos padrões heteronormativos não são
identificados e tratados como pessoas “normais”, levando ao cometimento de bullying no
espaço da escola.
As instituições de ensino não estão apartadas das dinâmicas sociais e reúnem boa parte
das contradições da sociedade, acabando por hierarquizar gêneros e sexualidades através da
preservação de um padrão de representação masculino, branco e heterossexual. Deste modo,
muitas vezes dentro do espaço escolar preconceitos são difundidos e a diversidade dos sujeitos
é constrangida, silenciada ou excluída. Quando muito, sexualidades outras são toleradas, mas
ainda longe de serem respeitadas (FARIA, 2018).
Faria (2018) em diálogo com Ornat (2012) e Silva (2011), indica que a escola vai se
configurar como um espaço interdito das expressões da diversidade, pautando-se por relações
heteronormativas de poder que se expressam tanto em suas estruturas arquitetônicas, quanto em
suas normativas, currículos e sujeitos. O autor problematiza diversos aspectos que contribuem
8
De acordo com Gil (1999), a observação pode ser utilizada como uma técnica de coleta de dados. Segundo ele, a
observação usa os sentidos para captar a realidade, podendo o cotidiano ser apreendido sem intermediação. A
observação participante consiste numa participação real/ativa do conhecimento seja na vida de uma comunidade,
grupo, instituição ou uma dada situação, ou seja, realiza-se a detecção do conhecimento de vida de um grupo por
meio do interior dele mesmo. Esta técnica se divide em duas modalidades: a natural, na qual o observador pertence à
comunidade que estuda; e a artificial, em que o observador se insere ao grupo com o intuito de efetuar uma
investigação. Nesta pesquisa utilizamos esta última, sendo que ela possibilitou captar as palavras e o comportamento
dos discentes.
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e aprofundam essa realidade excludente, dentre eles, as lacunas e os esvaziamentos da formação
docente em Geografia, no que tange à questões de gênero, sexualidade e diversidade sexual,
embora identifique que haja uma crescente abertura para tais discussões dentro do campo
acadêmico (FARIA; RATTS, 2017).
Com relação aos documentos orientadores da educação brasileira, estes pouco tratam da
sexualidade em sua diversidade. A Base Nacional Comum Curricular - dispositivo normativo
que estabelece os conjuntos de aprendizagens essenciais que devem ser desenvolvidas ao longo
da Educação Básica - em sua apresentação afirma ser “[...] um documento completo e
contemporâneo, que corresponde às demandas do estudante desta época, preparando-o para o
futuro” (BRASIL, 2018, p. 5). Todavia, as demandas da discussão sobre gênero, diversidade e
sexualidade, questões urgentes na contemporaneidade, tiveram pouca atenção na disputa de
narrativas que constituíram o documento, gerando espaços desiguais de poder na estrutura
curricular.
A esse respeito, Silva, Brancaleoni e Oliveira (2019) colocam que as referências à
temática se congregam na seção vinculada às Ciências da Natureza, sobretudo ao componente
curricular Ciências, sendo ausentes nas demais áreas do conhecimento. Segundo os autores, o
tema sexualidade é restrito à etapa da escolaridade que envolve o oitavo ano do Ensino
Fundamental e é tratado sob o prisma dos mecanismos reprodutivos, da gravidez, das infecções
sexualmente transmissíveis e da fase que contempla a puberdade. Ou seja, a sexualidade é
trabalhada a partir dos conceitos de saúde e qualidade de vida. Na parte do documento dedicada
à Geografia, destacamos, de forma geral, pouca abertura para inclusão do debate acerca dos
termos “diversidade sexual”, “direitos humanos”, “preconceitos”, “direitos sexuais”, “gênero”
e “orientação sexual”.
Mesmo com a BNCC (BRASIL, 2018), a maioria dos currículos escolares ainda tem
como referência os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs (BRASIL, 1998). Nestes que
subsidiam a elaboração dos currículos, a discussão da sexualidade aparece como um tema
transversal sob o título de “orientação sexual”. Segundo os documentos oficiais, os temas
transversais contribuem na formação integrada dos alunos com temas de relevância em seu
cotidiano, e a sugestão é que sejam trabalhados em todas as áreas do conhecimento e também
de maneira interdisciplinar. Entretanto, a pesquisa realizada por Lira e Joffili (2010) demonstra
que a temática é geralmente associada ao sistema reprodutor e abordada em aulas de Ciências
e Biologia, sendo timidamente trabalhada em outras áreas, tal como a Geografia.
Mesmo com as pequenas abordagens geográficas e de outras ciências que ainda
ocorriam de forma esporádica no espaço escolar, com a ascensão do conservadorismo
representado por Jair Messias Bolsonaro (ainda como deputado estadual em 2011 e depois
como candidato à presidência da República em 2018) e seus aliados, houve a distorção de
projetos que garantiam a dignidade à comunidade LGBTQIAPN+. Um deles foi o “Escola sem
Homofobia”, baseado em um conjunto de diretrizes criadas pelo Ministério da Educação do
Brasil (MEC), o qual era constituído de material didático (filmes, cartilhas e sugestões de
sequência didática para os professores) visando debater a violência de gênero e o preconceito
nas escolas.
Tal projeto foi apropriado e distorcido pela ala (ultra) conservadora e fundamentalista
da sociedade brasileira, deslegitimando os direitos da população LGBTQIAPN+, se referindo
pejorativamente ao “Escola sem Homofobia” como “Kit Gay”. Além disso, projetos são criados
por estes políticos de modo a silenciar ainda mais a abordagem dos temas gênero e sexualidade
nas escolas, tal como o chamado Movimento Escola Sem Partido (GAYLATINO E DA
ALIANÇA NACIONAL LGBTI+, 2018).
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Segundo Faria (2018), estes exemplos mostram que nos últimos anos o debate de gênero
e sexualidade na escola tem gerado muitas discussões no bojo da sociedade brasileira, tanto que
ele teve certa centralidade nas pautas das eleições presidenciais de 2018, que culminaram na
vitória do candidato ultraconservador Jair Bolsonaro. Segundo o autor, esta situação de conflito
tem contribuído para o crescimento do número de casos de bullying cometidos contra pessoas
que o estão nos “padrões heteronormativos”, tanto dentro da escola quanto fora dela. Estes
casos, ao não serem abordados e resolvidos de maneira adequada, acabam por reforçar
comportamentos sexistas, machistas e LGTBfóbicos, aumentando o sofrimento de quem sente
em seus corpos as marcas da violência.
Analisando este triste cenário, Roberto Diniz Junqueira afirma que:
A homofobia nas escolas afeta o bem-estar subjetivo; incide no padrão das relações
sociais entre os estudantes e destes/as com os/as profissionais da educação; afeta as
expectativas quanto ao “sucesso” e ao rendimento escolar; produz intimidação,
insegurança, estigmatização, segregação e isolamento; gera desinteresse pela escola;
produz distorção idade-série e evasão; prejudica o processo de inserção no mercado
de trabalho; enseja uma invisibilidade e uma visibilidade distorcida; conduz à maior
vulnerabilidade (em relação a chantagens, assédios, DSTs, aids, etc.). (JUNQUEIRA,
2013, p. 51-56)
São incontáveis os impactos do bullying na experiência escolar e na vida dos sujeitos
que o sofrem. Contudo, muitos destes homens e mulheres fora dos padrões heterossexuais, ao
passar por situações de violências e constrangimento dos seus corpos e identidades, se afirmam,
questionam e tensionam a hegemonia social de gênero e de sexualidade. Deste modo, mesmo
com retrocessos oriundos do fortalecimento do conservadorismo e aumento da violência, é
possível identificar que há avanços.
Ratts (2016) e Faria (2018) acreditam que o espaço escolar se configura como um lócus
privilegiado para a reflexão sobre gênero e sexualidade. Isso porque, além da função social da
escola ser a de formação cidadã, ela é lugar de encontro de culturas, saberes científicos e saberes
cotidianos, reunindo distintos sujeitos (muitos deles fora da normativa heterossexual) que se
colocam em conflito e diálogo. Nesse sentido, Madrid argumenta que:
[...] se a escola espelha as estruturas, as dominações e as exclusões socioespaciais, ela
também ocupa uma posição de promover debates que contribuam na reflexão destas
estruturas (racista, patriarcal, machista, misógina, heteronormativa, transfóbica,
homofóbica, bifóbica, por exemplo) para que se tenha uma quebra/desconstrução. A
produção do espaço geográfico, nesta perspectiva, promove transformações refletidas
nas práticas do cotidiano, e contribui para uma sociedade democrática e pluralista
(MADRID, 2019, p. 184).
Sob esse viés, a Geografia Escolar é chamada a oferecer subsídios no sentido de derrubar
estereótipos atribuídos aos sujeitos integrantes da comunidade LGBTQIAPN+, buscando
dialogar a respeito do espaço, gênero e das sexualidades. Para tanto, dentre os objetivos da
educação geográfica deve estar a conformação de um raciocínio espacial que instigue pensar e
problematizar a relação sociedade-espaço, trazendo para o debate as espacialidades cerceadas
e/ou negadas dos distintos sujeitos e grupos sociais (CAVALCANTI, 2012).
Assim sendo, os professores e professoras em suas aulas e demais atividades
pedagógicas devem buscar refletir sobre as vivências de pessoas de diferentes classes sociais,
gêneros, cores, etnias, sexualidades, compreendendo suas espacialidades e historicidades. Esse
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entendimento a partir das interseccionalidades
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agrega ao ensino de Geografia um caráter
problematizador e um conhecimento socialmente referenciado e comprometido, com potência
de estimular a compreensão da produção do espaço e das desigualdades, contribuindo, desta
forma, para o pensamento crítico dos estudantes acerca de temas que tratam das dinâmicas
socioespaciais sob os quais a sociedade brasileira se organiza (FARIA, 2018; MADRID, 2019).
Ao incorporar as interseccionalidades e outros olhares e modos de representação da
sexualidade, as aulas de Geografia contribuem para desvelar opressões e desigualdades, abrindo
possibilidade para as reflexões acerca da diversidade e da ordem binária dos sexos, promovendo
a inclusão da diferença. A este respeito, Faria (2018) tangencia que:
a geografia na escola pode se projetar como reveladora das contradições dialéticas,
das tensões sociais, das representações, de modo a expressar um saber sobre a
espacialidade que opere como um mecanismo de emancipação, de alteridade, em
oposição a práticas escolares que reforçam estereótipos negativos, historicamente
construídos em torno da sexualidade (FARIA, 2018, p. 54).
Entretanto, isso exige que os professores e professoras de Geografia extrapolem os
limites de conhecimentos, por vezes engessados em práticas tradicionais, tensionando valores
morais e ações que negam a diversidade. O desafio de romper com os muitos silêncios e os
silenciamentos é algo cotidiano, e para isso é necessário incluir discussões e ações pedagógicas
que promovam uma educação para a sexualidade e para a diversidade, e que combata qualquer
opressão e marginalização da diferença. Ressaltamos que não é fácil. A tarefa colocada aos
profissionais da educação é o desenvolvimento de métodos e práticas de ensino
problematizadoras e que incorporem recursos didáticos diversos de modo a sensibilizar e
despertar o interesse dos estudantes. Foi com base nesse entendimento que buscamos elaborar
a cartilha antibullying sobre diversidade sexual.
A cartilha de diversidade sexual como recurso didático antibullying nas aulas de
Geografia
Tendo como base a BNCC (BRASIL, 2018), a temática da diversidade sexual foi
pensada para ser desenvolvida e trabalhada junto aos alunos e alunas dos anos finais do Ensino
Fundamental II (sobretudo, do 9º ano) e dentro da área de conhecimento da ciência geográfica
denominada Geografia da População (sobretudo nos tópicos estrutura e distribuição geográfica
da população)
10
. Ao abordar temas populacionais no ensino de Geografia, Rua (1993, p. 145)
salienta que “é necessário que se fale de ‘gente’ e não de números”. Dados quantitativos são
importantes e permitem compreender a totalidade, mas devem ser relacionados com dados
qualitativos que considerem os homens e mulheres em suas corporeidades, culturas, modos de
vida, entre outros aspectos sociais, econômicos e políticos, que contribuem para o entendimento
da população em sua diversidade e totalidade, em múltiplas escalas.
9
Interseccionalidade é um termo formulado em 1989, pela norte-americana Kimberlé Crenshaw, pesquisadora e
militante do feminismo negro. Trata das sobreposições das multiplicidades identitárias, tais como: gênero, raça,
etnia, orientação sexual, idade, deficiência, entre outros marcadores sociais da diferença, e das opressões que a
elas se entrelaçam (RIBEIRO, 2018).
10
Isto é: população absoluta; população relativa; crescimento natural ou vegetativo; superpovoamento; taxa de
natalidade, taxa de fecundidade; taxa de mortalidade (e mortalidade infantil); expectativa de vida, crescimento
migratório (migração pendular, migração sazonal, migração definitiva); pirâmide etária (PANIS, 2018; DANTAS et al,
2011). A partir desses tópicos podemos incorporar às aulas dados e reflexões sobre a comunidade LGBTQIAPN+, bem
como discussões a respeito de gênero e sexualidade.
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Nesse sentido, o desafio colocado aos professores e professoras de Geografia é criar
situações de ensino-aprendizagem que deem conta de corporificar os estudos da população, sem
negar os dados estatísticos, levando em conta a diversidade dos sujeitos em suas
interseccionalidades e também as vivências dos estudantes. Para tanto, o trabalho com
diferentes recursos pode ser um caminho interessante. Livros didáticos, tabelas e mapas
continuam relevantes no desenvolvimento de habilidades geográficas basilares, porém existem
muitas outras linguagens, métodos e olhares que contribuem, inclusive, no maior interesse e
criticidade dos discentes. Contudo, é importante lembrar que os recursos didáticos em si pouco
fazem sentido, pois eles são mediações dos processos de aprendizagem e devem estar
adequados aos temas em estudo, às estratégias didáticas e às realidades e corporeidades dos
sujeitos da produção do conhecimento escolar.
Lana de Souza Cavalcanti (2012) reflete que para alcançar os objetivos traçados no
ensino de Geografia é necessário fazer escolhas adequadas de métodos, práticas e também de
recursos didáticos. Como forma de melhorar a aprendizagem, podem ser utilizadas tecnologias,
jogos, poesias, oficinas, atividades lúdicas, aulas de campo e cartilhas são possibilidades de
recursos que podem ser acionados para a construção do conhecimento geográfico. Para a
atividade em questão, optou-se pelo desenvolvimento de uma cartilha, por sua potencialidade
educativa. De acordo com Boto (2004), o termo cartilha é usado desde o princípio da Idade
Moderna e deriva da palavra cartinha, diminutivo de carta, sendo desde aquela época
identificada como um conjunto de textos de fácil compreensão cujo objetivo era informar e
ensinar.
As cartilhas podem ser utilizadas em diversas áreas das ciências e campos do ensino,
desde que devidamente contextualizadas e inseridas na proposta pedagógica. Identificada por
Silva (2018) como material didático não convencional, a cartilha possibilita discutir temas que
não aparecem nos livros didáticos. Além disso, ela é um recurso documental simples de fazer,
embora não seja fácil, pois deve ser escrito em linguagem acessível e de boa compreensão, e
possuir um apelo altamente visual, contando com ilustrações que ampliam as potencialidades
de entendimento do tema tratado.
Segundo Oliveira (2014), trabalhar com recursos diversos, tal como as cartilhas, em
torno das temáticas da população e a partir das problemáticas vivenciadas por estudantes,
permite debater e aprofundar questões pungentes ao cotidiano escolar e à sociedade, tal como
a sexualidade e a diversidade. Deste modo, dirá a autora que quando bem pensado e estruturado
“[...] o estudo da população também vai repercutir na formação social do aluno, família e
comunidade” (OLIVEIRA, 2014, p. 1), pois por ele perpassam “[...] informações, processos,
valores e atitudes que orientam práticas cidadãs cotidianas” (CAVALCANTI, 2012, p. 46).
Buscando colocar em pauta a (in)visibilidade das questões de gênero e sexualidade nas
aulas de Geografia, a proposta foi criar uma cartilha que agrupasse imagens, tabelas, dados de
pirâmides populacionais, mapas e quadrinhos a um texto informativo e que pudesse ser
compartilhada com docentes e discentes de forma online ou impressa. Tendo como referência
os estudos de Silva (2018), para a produção da cartilha seguimos os seguintes passos, conforme
esquematizado na Figura 1: a) escolha do tema; b) pesquisa de levantamento bibliográfico; c)
produção dos textos; d) seleção e organização das ilustrações; e) elaboração e diagramação da
cartilha.
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Figura 1: Etapas de produção da cartilha Antibullying para discentes do Ensino Fundamental
II
Fonte: SILVA, M. M (2018), adaptado.
Como explicado, a escolha do tema se deu devido às lacunas encontradas por nós e
outros autores a respeito do debate do gênero e da sexualidade no espaço escolar, sob o prisma
de análise geográfico
11
. Diante deste cenário, foram elencados alguns objetivos a serem
contemplados na produção e divulgação da cartilha e na sequência didática a qual ela está
inserida, são eles: promover o debate da diversidade sexual nas aulas de Geografia; contribuir
para romper com preconceitos em relação à orientação sexual a partir da desconstrução de
leituras heteronormativas e misóginas; apresentar dentro das temáticas de Geografia da
População a composição populacional da comunidade LGBTQIAPN+, discutir suas
corporeidades, espacialidades, e as estatísticas que envolvem as vítimas de homofobia; chamar
atenção dos alunos a respeito do bullying. Por fim, a apresentação dos dados em conjunto com
as vivências dos estudantes e reflexões suscitadas buscará sensibilizar e mobilizar os discentes
no combate ao preconceito e a desenvolver empatia pelos colegas e respeito à diferença.
Para tanto, foi necessário realizar uma pesquisa sistemática sobre o tema e sua relação
com os conteúdos de Geografia da População, sendo esta a segunda etapa da elaboração da
cartilha. Durante este processo, utilizamos pesquisas acadêmicas que nos permitiram
compreender como se opera a construção das invisibilidades de gênero e sexualidades nas
escolas, e mais especificamente no ensino de Geografia. Destas, destacamos as contribuições
de Silva (2009a, 2009b, 2011); Faria (2018) e Ratts (2016).
Também buscamos dados estatísticos e chegamos ao documento Transrespeito versus
Transfobia Mundial (TvT), produzido pela Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil
REDETRANS Brasil (2019), o qual nos forneceu gráficos e mapas sobre assassinatos de
pessoas trans e de gênero diverso em todo o mundo. Na Fundação Instituto de Pesquisas
Econômicas (2009) e no Instituto Unibanco (2016) nos suprimos com dados a respeito do
bullying e discriminação no ambiente escolar; na Fundação Perseu Abramo (2015) encontramos
referências que discutiam sobre a homofobia nas escolas brasileiras e o Manual de
Comunicações LGBTQI+ (2019) nos auxiliou a diferenciar e caracterizar os componentes que
integram a sigla (orientação sexual e identidade de gênero).
11
São importantes referências os estudos de Ratts (2016), Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais,
Travestis e Transexuais ABGLT (2016), Faria (2018), Souza (2021), dentre outros.
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Além disso, o Dossiê “Assassinatos contra travestis brasileiras e violência e transexuais”
em 2019 e 2020, produzido pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais do
Brasil/ANTRA e pelo Instituto Brasileiro Trans de Educação/IBTE (2021) nos possibilitou
visualizar a escala geográfica de abrangência da diversidade sexual, uma vez que analisaram o
assassinato contra pessoas transexuais no mundo, no Brasil e em seus estados e regiões. O
Dossiê também fornece tais dados a partir do prisma de análise racial e espacial ao revelar quais
locais as vítimas sofriam atentados.
A seleção dos dados e imagens que seriam apresentados e mais a escrita do texto foram
as etapas seguintes na produção da cartilha. Entendendo as características deste recurso
didático, o público alvo a que ele se destinava e com base nos objetivos do documento, fizemos
a análise e adaptação dos conteúdos. Buscamos escrever parágrafos curtos e/ou tópicos em
linguagem acessível, de fácil compreensão e que dialogassem diretamente com as figuras,
mapas e gráficos apresentados. Por fim, o último passo foi a diagramação da cartilha, no qual
procuramos deixá-la visualmente bonita e atrativa aos alunos do segundo ciclo da Educação
Básica. O resultado deste trabalho é apresentado na figura abaixo (Figura 2).
27
Figura 2a - Cartilha Pergunte a si mesmo: Eu sou contra o bullying? A escola em qualquer cidade é uma escola antibullying
Elaborada pelas autoras, 2021.
28
Figura 2b - Cartilha Pergunte a si mesmo: Eu sou contra o bullying? A escola em qualquer cidade é uma escola antibullying
Elaborada pelas autoras, 2021.
Figura 2c - Cartilha Pergunte a si mesmo: Eu sou contra o bullying? A escola em qualquer cidade é uma escola antibullying
29
Elaborada pelas autoras, 2021.
Figura 2d - Cartilha Pergunte a si mesmo: Eu sou contra o bullying? A escola em qualquer cidade é uma escola antibullying
30
Fonte: Elaborada pelas autoras, 2021.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
COELHO, Dayana Debossan. SOUZA, Lílian Aparecida de. GEOGRAFIA DA POPULAÇÃO E A PRÁTICA DE ENSINO:
a proposta de uma cartilha sob o viés da diversidade sexual. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 15-44, jul. 2020
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Em sua página inicial, a cartilha apresenta o que é bullying. A escolha de abordar
este tema logo no começo do documento se justifica porque as reflexões relacionadas aos
constrangimentos e violências sofridos pelos sujeitos fora dos padrões heteronormativos
na escola baseou todas as discussões que se propõe nas páginas seguintes e que culminam
na lista de instrumentos jurídicos, órgãos para apoio e no incentivo à alunos e alunas que
sofrem bullying por seu gênero e sexualidade denunciarem tanto na escola quanto nos
canais legais cabíveis. Os demais tópicos perpassaram pela apresentação da sigla
LGBTQIAPN+, da simbologia do movimento da diversidade e das diferenças entre
identidade de gênero, expressão de gênero, sexo biológico e orientação sexual.
Dados sobre a discriminação e a homofobia nas instituições de ensino e fora delas
também foram relacionados a mapas e gráficos que espacializavam a violência e
assassinatos de pessoas LGBTQIAPN+, mostrando que o Brasil está no topo do ranking
de violação de direitos humanos e homicídio contra esta população, sendo as transexuais
e travestis as que mais sofreram agressões, bullying e a discriminação (SILVA, 2009a).
No que tange às escolas, as pesquisas realizadas nas referências bibliográficas e
documentais mostraram que infelizmente a sensação de afastamento desse espaço é um
fato corriqueiro na vida de estudantes fora dos padrões heteronormativos, piorando
quando se trata daqueles não-brancas.
De acordo com a Pesquisa Nacional Sobre o Ambiente Educacional no Brasil,
realizada em 2015 pela ABGLT (2016, p. 27), 60,2% dos alunos LGBTQIAPN+
afirmaram sentir insegurança na escola no último ano por causa de sua orientação sexual
e 42,8% se sentiam inseguros por causa da maneira como expressavam o nero. Essa
insegurança e sentimento de medo, que podem levar ao abandono e à evasão escolar por
parte destes sujeitos, tem uma origem real, que o mesmo estudo mostra que 27% das
pessoas entrevistadas relataram ter sofrido agressão e 73% ouviram algum tipo de
xingamento em razão de sua sexualidade.
Diante deste contexto perverso e partindo das provocações de Cavalcanti (2012),
elaboramos a cartilha pensando-a como um recurso inserido dentro de uma sequência
didática cujo objetivo é trabalhar as temáticas da sexualidade, gênero e diversidade com
alunos e alunas do ano do Ensino Fundamental. Embora não tenha sido possível
executar este planejamento durante o estágio, suas etapas serão aqui brevemente
relatadas.
Propomos que a aula temática sobre diversidade sexual ocorra no momento em
que o professor tenha trabalhado os principais conceitos da Geografia da População em
aulas anteriores (compreendendo o crescimento populacional a partir da relação entre
demografia e condições socioeconômicas) e que os estudantes se apropriaram da
alfabetização e leitura cartográficas, visto que foram utilizadas diferentes formas de
representação no produto educacional. Sugerimos que o professor inicie a discussão com
uma roda de conversa com perguntas introdutórias, tais como: qual a composição da sua
família? Conhece alguém que foi discriminado por seu corpo ou sua sexualidade?
viu algum colega sendo humilhado ou sofrendo agressão física por conta da sua
sexualidade na escola? E fora dela? No momento das questões geradoras, buscar-se-á
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
COELHO, Dayana Debossan. SOUZA, Lílian Aparecida de. GEOGRAFIA DA POPULAÇÃO E A PRÁTICA DE ENSINO:
a proposta de uma cartilha sob o viés da diversidade sexual. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 15-44, jul. 2020
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trazer o que os alunos sabem a respeito do assunto e suas vivências e experiências
espaciais.
Depois de estabelecer esse diálogo, distribua a cartilha de forma impressa ou
digital, a critério do docente e a trabalhe de modo a aliar as falas e experiências dos
estudantes aos dados e conhecimentos científicos, sobretudo os relacionados às
características da população brasileira, buscando estimular os alunos a interpretá-los,
confrontando-os com a realidade, de modo a trazer para o debate as espacialidades dos
sujeitos em suas interseccionalidades. Por fim, a ideia é que o professor sugira aos
discentes conversar sobre a temática com pessoas de fora da escola, e trazer suas
impressões para o debate e problematização na aula posterior. Desta maneira, acreditamos
estar em consonância com Cavalcanti, para quem
O ensino de Geografia, assim, não deve se pautar pela descrição e enumeração
de dados, priorizando apenas aqueles visíveis e observáveis na sua aparência
(na maioria das vezes impostos à “memória” dos alunos, sem interesse por
parte destes). Ao contrário, o ensino deve propiciar ao aluno a compreensão do
espaço geográfico na sua concretude, nas suas contradições (CAVALCANTI,
2010, p. 20).
Tendo como referência a fala da autora, ressaltamos com o processo de elaboração
da cartilha que as análises espaciais dos temas da Geografia da População, quando
consideram e colocam em debate questões de gênero e sexualidade, podem servir de
instrumento reflexivo acerca das desigualdades socioespaciais, preconceitos e
discriminações, que também ocorrem no espaço escolar.
Tal como Milton Santos (2014, p. 144), pensamos que “[...] é impossível imaginar
uma cidadania concreta que prescinda do componente territorial”. Nesse entendimento,
esperamos que a cartilha e o conteúdo nela trabalhado façam sentido na vida dos
discentes, instigando-os a refletirem sobre o seu cotidiano, podendo contribuir para que
problematizem permanentemente a relação sociedade-espaço e que ajam no sentido da
construção de uma sociedade que, no mínimo, respeite a diversidade.
Para não concluir
A cartilha de diversidade sexual apresentada foi produzida a partir das reflexões
suscitadas na disciplina Prática de Ensino e nas experiências vivenciadas no estágio
supervisionado, espaços importantes do percurso formativo da licenciatura que fomentam
o desenvolvimento de competências indispensáveis à atuação docente. Todavia, as
discussões em torno das questões de gênero e diversidade sexual ainda são escassas dentro
dos cursos de graduação em Geografia, nas instituições de ensino e na sociedade
brasileira, sendo esta a justificativa da escolha da temática para ser trabalhada no recurso
didático.
Entendida como uma mediação dos processos de ensino-aprendizagem, a cartilha
foi produzida para futuros trabalhos nas aulas de Geografia da População no segundo
ciclo do Ensino fundamental e problematiza as muitas violências e silenciamentos das
pessoas LGBTQIAPN+ nos diversos âmbitos, inclusive na escola. Nesse sentido,
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corrobora-se com Ratts (2016, p. 124) quando o autor afirma que uma instituição “[...]
que se pretenda inclusiva deve ampliar ao máximo o conjunto de segmentos a serem
atendidos”, e fomentar o reconhecimento da diversidade. Isso exige a consideração dos
sujeitos em sua totalidade, com seus corpos, sua cultura, seus sentimentos, e medidas
eficazes para a redução da prática de bullying, o que tende a diminuir a sensação de
insegurança, fracasso e, até mesmo, a evasão escolar. Essas medias contribuiriam para
tornar os estabelecimentos de ensino locais de mais acolhimento, democracia e cidadania,
ao contrário do que frequentemente vem ocorrendo - locais de LGBTfobia (sobretudo,
transfobia - discriminação para com travestis e transexuais).
Identificamos que o ensino de Geografia pode ajudar nesse processo, pois essa
ciência vem se mostrando importante na produção de discursos subversivos à ordem
patriarcal, heteronormativa e misógina ao inserir nos diálogos com os discentes a
recognição à diferença e aos direitos humanos. A este respeito, destacamos o trabalho de
pesquisadores como Silva (2009a, 2009b, 2011) Ornat (2012), Ratts (2016), entre outras
e outros, que tencionam a ciência geográfica e corajosamente conformam um campo de
estudos que se dedica ao entendimento das interseccionalidades em sua dimensão
espacial.
Também ressaltamos a importância de que durante a Licenciatura os discentes
vivenciem experiências formativas que pautem a diversidade dentro e fora dos muros da
universidade. Estar na escola coloca o futuro professor, tal como ocorreu com as autoras,
de encontro a temas pungentes ao cotidiano escolar e, nesse sentido, as disciplinas que
suscitam reflexões teórico-práticas, tal como as operadas nas disciplinas Prática de Ensino
e Estágios, contribuem na preparação dos docentes para que trabalhem criticamente
questões que tratam da complexidade socioespacial. No que tange à diversidade sexual,
cotidianamente os geógrafos e geógrafas são convidados a desconstruir as narrativas cis-
heteronormativas e lançar luz sobre os integrantes da comunidade LGBTQIAPN+,
contribuindo para que os sujeitos, muitas vezes, silenciados, possam se colocar e se
afirmar, tensionando e buscando subverter a ordem instituída.
Na cartilha proposta utilizamos, sobretudo, os marcadores sociais de gênero e
sexualidade como uma estratégia pedagógica contra a intolerância e o bullying. Todavia,
nada impede que outros sejam interseccionados pelos docentes ao utilizarem o material
por nós elaborado nos seus processos de ensino-aprendizagem. Cada professor pode
adaptá-lo de acordo com seus objetivos e planejamento, pois consideramos que são as
ações dotadas de intencionalidade que transformam a realidade socioespacial cabendo, de
modo especial, aos professores e professoras enveredar na luta coletiva contra os poderes
hegemônicos que norteiam o saber e o poder.
Nesse sentido, a ciência geográfica possui um papel ímpar de desvendar este
binômio saber/poder nas instituições, como a escola, de maneira a descortinar o “véu” da
dominação e do controle da ordem social cis-heteronormativa. Portanto, uma das
contribuições da Geografia no debate da diversidade sexual consiste em suscitar
discussões sobre a sexualidade no ensino, promovendo no espaço educacional críticas às
pedagogias conservadoras e discriminatórias e potencializando pedagogias de
reconhecimento da diferença, da diversidade e dos distintos sujeitos escolares.
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Não tivemos a pretensão de esgotar a totalidade do assunto, mas abrir espaço para
o diálogo, inferindo que mais estudos sejam desenvolvidos em relação à temática tratada.
Nesse ínterim, a produção da cartilha representou uma prática pedagógica e um
instrumento de reflexão para a práxis docente, tendo em vista que chama atenção para
discussões historicamente negligenciadas/silenciadas, tanto socialmente quanto
cientificamente. Desse modo, possui relevância não apenas pedagógica ou acadêmica,
mas também social, auxiliando no combate ao preconceito e discriminações relacionados
a questões de gênero e sexualidade.
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AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
COELHO, Dayana Debossan. SOUZA, Lílian Aparecida de. GEOGRAFIA DA POPULAÇÃO E A PRÁTICA DE ENSINO:
a proposta de uma cartilha sob o viés da diversidade sexual. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 15-44, jul. 2020
Submissão em: 17/01/2022. Aceito em: 28/06/2022.
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AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
COELHO, Dayana Debossan. SOUZA, Lílian Aparecida de. GEOGRAFIA DA POPULAÇÃO E A PRÁTICA DE ENSINO:
a proposta de uma cartilha sob o viés da diversidade sexual. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 15-44, jul. 2020
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a proposta de uma cartilha sob o viés da diversidade sexual. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 15-44, jul. 2020
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