AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
59
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
SEÇÃO
DOSSIÊ
A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA
METRÓPOLE: uma análise espaço-temporal dos territórios da
cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009
UNDERGROUND TERRITORIALIZATION IN THE
METROPOLIS: a spatiotemporal analysis of the territories of
Hip-Hop culture in Belo Horizonte between the years 1990-2009
TERRITORIALIZACIÓN UNDERGROUND EN LA
METRÓPOLIS: un análisis espacio-temporal de los territorios de
la cultura Hip-Hop en Belo Horizonte entre los años 1990-2009
Glaycon de Souza Andrade e Silva
1
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas),
Minas Gerais, Brasil.
e-mail: glaycongeografia@gmail.com
1
Doutorando, como bolsista CAPES, em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia Tratamento da
Informação Espacial (PPGG-TIE) da PUC Minas. Mestre em Geografia Tratamento da Informação Espacial pelo
PPGG-TIE da PUC Minas. Bacharel e Licenciado em Geografia pela PUC Minas.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
60
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
Resumo
Investigar a cultura Hip-Hop pelo viés da ciência geográfica é uma temática emergente e compõe um campo da ciência
denominado de Geografia Marginal, e almeja, principalmente, alcançar uma visibilidade dessa cultura suburbana no
debate acadêmico e científico. Nesse sentido, o presente estudo tem por objetivo compreender a evolução espaço-
temporal da cultura Hip-Hop ao longo de duas décadas, desde 1990 até 2009, na cidade de Belo Horizonte. Para tanto,
a metodologia se baseou no levantamento de dados secundários e na confecção de cartografias dos territórios
undergrounds na capital mineira. De acordo com os resultados obtidos na pesquisa, pode se inferir que ao longo do
espaço-tempo houve processos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização dos territórios do Hip-Hop,
verificando-se a tendência de estabelecimento de territórios em espaços públicos tanto centrais quanto periféricos da
cidade, e, além disso, nota-se que há espaços privados que possuem capacidade de reconhecer e agregar essa cultura
junto ao cenário cultural underground belo-horizontino.
Palavras-chave
Hip-Hop; Belo Horizonte; Territórios; Geografia.
Abstract
Investigating Hip-Hop culture from the perspective of geographic science is an emerging theme and makes up a field
of science called Marginal Geography, and, mainly, aims to achieve a visibility of this suburban culture in the academic
and scientific debate. In this sense, this study’s main purpose is to understand the spatiotemporal evolution of Hip-Hop
culture over two decades, from 1990 to 2009, in the city of Belo Horizonte. To achieve this, the methodology was based
on the survey of secondary data and the creation of cartographies of underground territories in the capital of Minas
Gerais. According to the results obtained in the research, it can be inferred that over space-time there were processes
of territorialization, deterritorialization and reterritorialization of Hip-Hop territories, where there is a tendency for
them to be established in both central and peripheral public spaces of the city, and, in addition, it is noted that there are
private spaces that have the capacity to recognize and aggregate this culture with the underground cultural scene in
Belo Horizonte.
Keywords
Hip-Hop; Belo Horizonte; Territories; Geography.
Resumen
Investigar la cultura Hip-Hop a través del sesgo de la ciencia geográfica es un tema emergente y conforma un campo
de la ciencia denominado Geografía Marginal, y pretende, principalmente, lograr la visibilidad de esta cultura
suburbana en el debate académico y científico. En ese sentido, el presente estudio tiene como objetivo comprender la
evolución espacio-temporal de la cultura Hip-Hop a lo largo de dos décadas, de 1990 a 2009, en la ciudad de Belo
Horizonte. Para eso, la metodología se basó en la recolección de datos secundarios y en la creación de cartografías de
los territorios subterráneos en la capital de Minas Gerais. De acuerdo a los resultados obtenidos en la investigación, se
puede inferir que a lo largo del espacio-tiempo se han dado procesos de territorialización, desterritorialización y
reterritorialización de los territorios del Hip-Hop, verificándose la tendencia a establecer territorios en los espacios
públicos tanto centrales como periféricos de las ciudad y, además, se advierte que existen espacios privados que tienen
la capacidad de reconocer y sumar esta cultura a la escena cultural subterránea de Belo Horizonte.
Palabras-clave
Hip-Hop; Belo Horizonte; Territorios; Geografía.
Introdução
O espaço urbano contemporâneo é concebido, para além de sua materialidade, por
inúmeros atores e grupos sociais heterogêneos que estabelecem relações de trocas, usos
e interdependências com a finalidade de constituir relacionamentos e convenções sociais
basilares para a convivência em sociedade. No seio desses convívios, nota-se que
verdadeiras relações de poder em que se têm atores hegemônicos que agem no controle
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
61
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
tanto das estruturas sociais quanto da coletividade. Logo, uma porção de indivíduos
que são dominados por encontrar-se à margem desse processo e, em muitos casos, até
excluídos dele.
Contudo, diante dessa organização societária hierárquica e desigual, nota-se o
levante de atores e coletivos que objetivam questionar, subverter e transformar essa
condição social, como é o caso da cultura Hip-Hop que busca fomentar a formação
educacional, política e artística de seus membros a fim de garantir justiça, igualdade, paz,
amor, diversão e conhecimento, como preconiza a Universal Zulu Nation. Para alcançar
uma sociedade democrática e uma cidade mais inclusiva para todos, o Hip-Hop possui
quatro elementos artísticos que fomentam alcançar esse propósito, são eles: o Disc Jockey
(DJ), o Mestre de Cerimônia (MC), o graffiti e o break dance. Logo, percebe-se que o
Hip-Hop, um notável representante da contracultura.
O Hip-Hop surge nos Estados Unidos da América (EUA) no início da década de
1970 enquanto um movimento cultural, tendo suas primeiras manifestações por meio da
realização de bailes, dos quais alguns exemplos são as Block Parties, Party e a Flava Jam
2002, que ocorriam em quadras, becos, ruas, parques, galpões e outros espaços públicos
dos burgos nova iorquinos do Bronx, Brooklyn e Harlem. Nesse sentido, nota-se que os
territórios fundantes da cultura se tratavam de espaços comuns da cidade devido à falta
de receptividade dos estabelecimentos privados que, em muitos casos, eram aversos as
manifestações artísticas do Hip-Hop, resultado de um estigma social perante a juventude
negra.
Ainda sobre os bailes, a principal intenção eram cumprir a finalidade de válvulas
de escape para a juventude afro-americana que se encontrava assolada por problemáticas
sociais e urbanas, como a violência, o tráfico de drogas, o desemprego, a ausência de
políticas, e, em uma escala mais ampla, a profunda recessão econômica do pós Segunda
Guerra, a falência da cidade de Nova York e o reordenamento urbano que colocou abaixo
inúmeros conjuntos habitacionais que abrigavam as classes socais menos abastadas
(TURRA NETO, 2013).
Com o passar do tempo, superando a finalidade inicial de entretenimento, o Hip-
Hop atinge status e se consolida como cultura negra suburbana por meio da articulação
de Kevin Donavan, conhecido como Afrika Bambaataa, que fundou a Universal Zulu
Nation se baseando nas influências políticas advindas dos líderes negros e movimentos
dos direitos civis da época. A entidade se trata de uma organização não governamental
com o objetivo de promover a união dos quatro elementos da cultura, compartilhar
conhecimentos com as Infinity Lessons em palestras e aulas, atividades artísticas e,
principalmente, disseminar o Hip-Hop por todo o mundo (LEAL, 2007).
Desta maneira, a cultura Hip-Hop alcança todos os continentes e é assimilada
culturalmente em inúmeros países do globo, de modo que no caso brasileiro não foi
diferente. No contexto nacional, o Hip-Hop chega ao Brasil no início da década de 1980,
em um período marcado pela repressão do regime ditatorial. As primeiras manifestações
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
62
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
da cultura ocorreram nas capitais de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte (BH)
com a chegada dos primeiros conteúdos do Hip-Hop estadunidense, com filmes, clipes,
revistas, discos e vestimentas divulgados pela indústria midiática ou pelos adeptos que
viajavam para os EUA e voltavam com as bagagens repletas de artigos da cultura. Além
disso, os Bailes Black’s, promovidos pelo pessoal da black music, reproduziam músicas
de disco, soul, funk e rap que embalavam a juventude negra e periférica da época
(BORRI, 2015). Contudo, é importante destacar que a principal cena acontecia na capital
paulista devido ao fato desta ser a metrópole nacional, sendo assim o núcleo catalisador
que propaga o Hip-Hop para as demais cidades, interiorizando-o pelo Brasil.
No caso brasileiro, assim como ocorreu nos EUA, verifica-se territorializações
iniciais acontecendo em espaços públicos e, em certos casos, espaços alternativos da urbe.
Tal fato foi constatado em São Paulo, onde jovens provenientes de diversos bairros da
cidade, em sua maioria periféricos, se deslocavam para a Estação São Bento e a Galeria
24 de Maio, territórios fundantes do Hip-Hop nacional, para praticarem o break dance, o
graffiti e apresentações de rap com DJs e MCs, promovendo trocas e disseminando a
cultura.
Além disso, no período de eclosão da cultura, os espaços privados que recebiam
as vertentes artísticas do Hip-Hop se tratavam de locais que possuíam uma pegada mais
underground dentro do universo cultural, sendo alguns desses locais: casas de show,
boates, discotecas, bares, clubes e centros culturais. Com a intenção de fortalecer o
movimento, nota-se que diversos desses espaços alternativos, seja em âmbito local,
nacional ou internacional, abriram suas portas para o Hip-Hop e demais culturas
suburbanas entendendo a relevância de suas manifestações e visando romper com a lógica
da cultura de massa imposta pelo capitalismo, subverter valores tradicionais e contrariar
padrões da sociedade conservadora.
Logo, diante desse panorama cultural, nota-se que a cultura Hip-Hop sofre com
uma tendência histórico-social de segregação promovida por certos segmentos
conservadores e tradicionais da sociedade contemporânea a fim de minar as práticas
artísticas dos elementos desta cultura, tais como o graffiti, a dança e a música. Esse dilema
da segregação socioespacial não se restringe somente à capital mineira, havendo
reverberações semelhantes em outras metrópoles nacionais, como por exemplo: São
Paulo, como evidenciado nas pesquisas de Gomes (2008) e Gomes (2012) que analisaram
os usos do território paulistano pelo Hip-Hop, e no Rio de Janeiro, destacados nos
trabalhos de Oliveira (2004; 2006) que analisou o espaço urbano carioca à partir dos
traços territoriais e a compreensão espacial dos membros do Hip-Hop, negros e pobres, e
cidades internacionais, como é o caso de Nova York e Los Angeles (LEAL, 2007;
TEPERMAN, 2015), resultante de uma interpretação discriminatória do Hip-Hop por se
tratar de uma cultura suburbana vinculada a um segmento majoritariamente negro e
periférico da sociedade urbana contemporânea.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
63
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
Sobre essa breve descrição da limitação espacial, observa-se que os territórios
possuem a tendência de serem constituídos em espaços marginais da cidade,
demonstrando que os coletivos e membros do Hip-Hop necessitam negociar ou, em
alguns momentos, até disputar a utilização e territorialização com outras culturas
suburbanas, grupos e transeuntes que perpassam esses territórios. Em algumas
oportunidades, verifica-se a sobreposição destes territórios por grupos pertencentes às
culturas suburbanas que dividem o mesmo lugar, como é o caso dos grafiteiros e skatistas.
Diante dos desafios enfrentados pelos membros da cultura Hip-Hop para ocupar
e coexistir na cidade, o presente estudo dedica-se a identificar e caracterizar os territórios
do Hip-Hop e o processo de territorialização que se desenrola no meio urbano. Nesse
sentido, o objetivo principal é compreender a evolução espaço-temporal da cultura Hip-
Hop ao longo de duas décadas, desde 1990 até 2009, na cidade de Belo Horizonte. Para
tal, são traçados os seguintes objetivos específicos: identificar e caracterizar os territórios
formados pelos membros do Hip-Hop na capital belo-horizontina ao longo de cada
década; compreender as relações socioculturais dos sujeitos pertencentes a cultura que
condicionam as apropriações mantidas nesses espaços e, por fim, analisar espacialmente
a distribuição territorial do Hip-Hop local a partir dos territórios fundamentais
identificados.
A hipótese levantada neste estudo é de que, dada a natureza estigmatizada do
movimento Hip-Hop e o rechaço dos setores hegemonizadores da cidade, a sua existência
se deu a partir da territorialização de espaços periféricos e negligenciados da cidade a fim
de superar as limitações espaciais impostas pela discriminação cultural e socioespacial,
e, além disso, as sobreposições territoriais com outros grupos culturais. Desta forma, os
membros e coletivos do Hip-Hop priorizam a ocupação de espaços públicos e privados
que se localizam em porções marginais de BH, salienta-se que tais espaços podem estar
posicionados em regiões centrais, pericentrais e periféricas da cidade.
Neste sentido, pode-se pressupor que encontros e demais eventos da cultura são
realizados tanto nas periferias, onde historicamente emergiu o Hip-Hop e residem seus
membros, quanto em locais alternativos situados na área central da cidade. Logo, os
territórios tendem a apresentar-se espacialmente dispersos por todo o espaço urbano da
capital mineira, a fim de manter um vínculo de pertencimento geográfico com seus locais
de origem e, também, estabelecer novas territorialidades.
Em vista do reconhecimento cultural do Hip-Hop local, justifica-se esse estudo
devido à escassez de investigações dentro do campo da Geografia que trabalhem com a
cultura Hip-Hop belo-horizontina e, além disso, nota-se o ineditismo científico ao dar
destaque à distribuição espacial e temporal dos territórios enquanto elementos
fundamentais desta cultura suburbana que emerge no seio da metrópole com a intenção
de reafirmar sua notoriedade reivindicatória e subversiva diante dos setores hegemônicos
e conservadores da sociedade.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
64
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
O artigo encontra-se dividido em cinco seções: primeiramente, nesta introdução
aborda-se brevemente a história da cultura Hip-Hop em diferentes escalas apresentando
suas características culturais, sociais e políticas que são caras ao estudo; a segunda seção
trata dos aportes teóricos conceituais que elucidam as discussões sobre os conceitos de
‘cultura’, ‘contracultura’ e ‘cultura suburbana’, assim como as categorias geográficas de
‘espaço público’, ‘território’, ‘territorialização’ e ‘territorialidade’; a terceira seção
explicita o percorrer metodológico do levantamento de dados secundários e a produção
dos mapeamentos que subsidiaram as análises; na sequência apresenta-se os resultados e
discussões analíticas espaciais sobre o fenômeno cultural do Hip-Hop local; por fim,
discutem-se as considerações finais deste estudo, promovendo a aproximação entre a
Geografia, Música e cultura, sendo o Hip-Hop o elemento catalisador para uma leitura
alternativa do espaço urbano.
Aportes teóricos conceituais
No presente estudo, busca-se tratar das apropriações territoriais do Hip-Hop que
se materializam nos encontros e eventos em espaços da cidade, prioritariamente públicos,
possibilitando a congregação de artistas e membros da cultura por meio das manifestações
artísticas. Nesse sentido, o Hip-Hop representa um fenômeno de contracultura que
promove a disseminação de saberes através de seus quatro elementos e resistência urbana
pelo ato de ocupação territorial dos locais subutilizados ou esquecidos da cidade. Desta
maneira, são caros os conceitos supracitados, dado que a investigação se encontra
associada à corrente humanista da Geografia Cultural, que objetiva realizar análises
geográficas espaciais de uma cultura suburbana.
Inicialmente, deve-se esclarecer acerca da definição do conceito de ‘cultura’,
termo exaustivamente trabalhado em diversas Ciências Humanas, possuindo inúmeros
significados e entendimentos que variam de acordo com o campo de conhecimento ou a
finalidade investigativa para qual o termo é empregado. De acordo com Laraia (2006, p.
28), a definição mais popular pertence à Antropologia e foi cunhada por E. B Tylor, que
interpreta a cultura “como sendo todo o comportamento aprendido, sem associação com
traços genéticos”. Tal definição é tida como muito sintética, e veio a ser reformulada por
outros teóricos, como é o caso de Geertz (2008, p. 4), que esclarece que “não se trata de
uma ciência experimental em busca de leis, mas como uma ciência interpretativa, à
procura do significado”. Se aproximando de uma análise mais humanística que enfoca
nas relações humanas a partir das experiências, trocas, hábitos e significados dos sujeitos.
No campo da Geografia, o conceito de ‘cultura’ também passou por diversas
redefinições ao longo do tempo. Segundo Corrêa (2009), é possível identificar duas
perspectivas desse entendimento: primeiro, tem-se na Geografia Cultural saueriana da
Escola de Berkeley que considera a cultura como uma entidade supraorgânica; e segundo,
na perspectiva da denominada Geografia Cultural renovada, em que prevalece a visão de
cultura como restrita de acordo com o progresso e o papel que a mesma desempenha na
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
65
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
sociedade. Em suma, dentre a pluralidade conceitual do termo, a definição que mais se
aproxima e dialoga com o fenômeno aqui estudado é a holística interpretação de Paul
Claval (2007), que traz aspectos das relações entre cultura, vida social, poder, espaço e
paisagem. Nesse sentido, o autor desenvolve um apanhado geral que dialoga desde a
Geografia Cultural clássica, passando pela escola possibilista até chegar na Geografia
renovada com a modernização que teceu novos modos de relação entre o sujeito e o meio
(CLAVAL, 2007).
É fundamental trazer esse parecer sobre o conceito de ‘cultura’, desde uma forma
mais ampla com definições interdisciplinares e mais especificamente na Geografia, pois
o escopo analítico trabalha com uma cultura suburbana que é o Hip-Hop. Contudo, sabe-
se que o Hip-Hop sempre ocupou historicamente uma posição contra-hegemônica que
surgiu nos subúrbios estadunidenses diante de um cenário marcado pelo racismo,
violência, desemprego, problemas estruturais urbanos, segregação socioespacial e
ausência de políticas blicas que afetavam diretamente a população negra e latina
(TURRA NETO, 2013; TEPERMAN, 2015).
Diante disso, o Hip-Hop ganha a adesão dos jovens afro-americanos, que
descobriram nesse movimento cultural uma válvula de escape das mazelas cotidianas por
meio das Block Parties que agitavam os burgos nova-iorquinos sob o comando dos DJs e
MCs. Além do divertimento, o Hip-Hop desde o início esteve comprometido com as
questões políticas e sociais a favor das minorias, tecendo duras críticas ao poder vigente
e as ações arbitrárias do Estado. De acordo com Hobsbawn (1995), foi nas décadas de
1950 e 60 que essa tomada de consciência foi despertada na juventude, por meio do
conhecimento e ousadia, no pós Segunda Guerra Mundial com uma visão crítica ao modo
de governança então vigente. Assim, esse levante de jovens ficou conhecido como
‘contracultura’, que se trata de uma postura ideológica tendo por intuito o protesto, a
rebeldia e a revolução para superação de ideologismos repressivos, da alienação,
consumismo e a cultura de massa.
Sob esse aspecto, Maciel (1973), afirma que a contracultura pode ser também uma
postura de crítica radical e libertária em face do descontentamento com a cultura
convencional. Segundo Martínez (2012) apoiado nas contribuições do teórico Theodore
Roszak (1972):
Por “contracultura” devem ser pensados todos os fenômenos daqueles anos (e
alguns imediatamente anteriores): oposição à guerra de Vietnam, movimentos
pelos direitos civis, o chamado “amor livre” e o uso de drogas psicodélicas na
procura de uma “expansão da consciência”, entre outros, não como fatos
isolados, mas como gestos de uma dissensão radical e de grande inovação
cultural. [...] a “contracultura” não teria nascido apenas do desconforto
econômico de algumas pessoas ou classes. Ela reflete uma rejeição radical dos
valores herdados de seus antepassados mais próximos. (MARTÍNEZ, 2012, p.
152)
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
66
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
Desta maneira, o Hip-Hop se enquadra nessa ideologia de contracultura estando
vinculado aos Movimentos dos Direitos Civis dos Negros e deres políticos
afroamericanos da época, a fim de contrapor os atores hegemônicos em busca de
igualdade (CONTADOR; FERREIRA, 1997). É notório o comprometimento ideológico
e revolucionário em todas as manifestações artísticas dos quatro elementos da cultura,
com destaque para o gênero musical e o graffiti, permeados de conteúdo contestatório e
politizado. Pereira (1983) elucida que o surgimento da contracultura esteve vinculado às
Artes, como por exemplo a música.
Em linhas certamente muito gerais, este é o pano de fundo contra o qual vemos
florescer toda a cultura jovem dos anos 60, batizada com o rótulo de
contracultura. Esta, por sua vez, se concretizou através de inúmeras
manifestações surgidas em diferentes campos, como o das Artes, com especial
destaque para a música, ou melhor, para o rock; o da organização social,
aparecendo em primeiro plano a ênfase dada pelo movimento hippie à vida
comunitária, na cidade ou no campo; e, ainda, o da atuação política.
(PEREIRA, 1983, p. 40)
Ainda sobre o aspecto musical relacionado a contracultura, Maciel (1973),
complementa.
Do ponto de vista estritamente musical, a obra de Hendrix encerra a grande
lição cultural do rock. Foi essa música que praticamente estabeleceu o método
fundamental de criação da contracultura. Consiste basicamente em recolher o
lixo da cultura estabelecida, o que é, pelo menos, considerado lixo pelos
padrões intelectuais vigentes, e curtir esse lixo, levá-lo a sério como matéria-
prima da criação de uma nova cultura. (MACIEL, 1973, p.141)
Como pode ser visto, a cultura Hip-Hop possui traços revolucionários que se
expressam por meio de seus quatro elementos, definindo-a como uma contracultura
potente de um caráter predominantemente urbano. Historicamente, o Hip-Hop atua no
cenário underground cultural com a intenção de ser um contraponto à cultura de consumo,
rompendo com os padrões comerciais e estando distante dos holofotes da indústria
midiática de massa. Nesse sentido, o Hip-Hop seguiu por uma via marginal da arte, tendo
como principal palco ‘a rua’, ocupando, prioritariamente, espaços públicos da cidade para
divulgar suas vertentes artísticas, como é o caso dos shows de rap, eventos de break dance
e festivais de graffiti. Logo, o espaço urbano público é fundamental pois é dotado de
elementos valiosos para essa cultura marginal. Gomes (2018) destaca três elementos:
São expressões claras desses acordos e compromissos que regulam
comportamentos, fluxos, funções, condições de acessos em diferentes
circunstâncias e são derivados de direitos e deveres socialmente e
republicanamente estabelecidos. Esse tipo de normatização constitui, pois, a
qualidade primeira desse espaço e um dos seus componentes essenciais. 2) O
segundo elemento central de um espaço público é a heterogeneidade
elementar que está subsumida na reunião de indivíduos. Espaços públicos
colocam ao abrigo à manifestação da individualidade e, portanto, oferecem
condições para o reconhecimento das diferenças e encorajam ações
afirmativas. Do ponto de vista político, espaços públicos respondem à questão
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
67
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
de saber como estabelecer um terreno de vida comum sem que para essa
convivência precisemos renunciar às nossas diversidades em termos de
opinião, vontades, valores, atitudes e formas de apresentação. [...] 3) o terceiro
componente essencial dos espaços públicos diz respeito ao seu poder
comunicacional. Uma vez que nos é garantida a legitimidade das diferenças
individuais, estar junto sobre um mesmo espaço significa a possibilidade de
exibir características próprias e independentes Trata-se de um exercício
veiculado a partir de uma infinidade de repertórios, verbais, gestuais,
comportamentais, do vestuário, das formas de apresentação enfim, de tudo
aquilo que produz significação social. A comunicação é ativada por
compartimos um mesmo espaço. Por isso, espaços públicos convidam à
observação e a vivência da alteridade. (GOMES, 2018, p. 117 e 118, grifo
nosso)
Os espaços públicos da cidade possuem características essenciais para a promoção
da vida pública urbana, apresentando-se como terrenos férteis para a realização de
encontros e intercâmbios culturais. Logo, esses espaços são territorializados pelos MCs,
DJs, grafiteiros, dançarinos e demais membros do Hip-Hop para se constituírem
territórios integrantes da cena local. Nesse sentido, para Menezes e Cardoso (2017) a
territorialização é um processo social constituidor de identidade política e ideológica para
a formação cultural dos indivíduos. Em extensão, a territorialidade é a categoria que paira
no campo da idealização almejada por aquele coletivo e firma-se no campo real pelo
mantimento do território concreto.
Os territórios são articulados em rede, algo imprescindível para compreensão
e análise dos fenômenos sócio-espaço-territoriais. [...] Para além, os territórios
são campos de forças, são antes teias ou redes de relações sociais projetadas
no espaço, no qual não se necessita de forte enraizamento material para que se
tenha um território. (SOUZA, 2014, p. 86)
Sendo assim, o procedimento de formação territorial é resultante de um
desenvolvimento gradual de uso e ocupação constituído por processos geográficos
determinados de Territorialização-Desterritorialização-Reterritorialização (T-D-R). De
acordo com Haesbaert (2014), a territorialização trata do desenvolvimento de territórios,
a desterritorialização caracteriza-se pela perda de território de modo espontâneo ou
forçado, causando o rompimento do controle das territorialidades pessoais ou coletivas,
e, por fim, a reterritorialização é a prática de retomada ou conquista de novos territórios.
A prática de realizar encontros em espaços públicos acontece de maneira orgânica
com a apropriação e fixação num determinado local através das manifestações artísticas,
criando, assim, um exercício territorial que possui referência material e simbólica para a
afirmação daquele grupo. Tal fato, na visão de Haesbaert (2004) é a gênese do território,
pois criam-se vínculos identitários para com o território, sendo esse dotado de valor.
Souza (2014) acrescenta que o território se qualifica como “o espaço social, delimitado e
apropriado politicamente enquanto território de um grupo, é suporte material da
existência e, mais ou menos fortemente, catalisador cultural-simbólico e, nessa qualidade,
indispensável fator de autonomia” (SOUZA, 2014, p. 108).
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
68
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
Este estudo será orientado pela ideia de território cultural ou simbólico-cultural
fundamentada por Haesbaert (2004), na qual o espaço é permeado de identidade
territorial, sendo carregado de significados simbólicos e subjetivos concebido através dos
encontros, eventos e vivências possibilitadas pela cultura Hip-Hop e seus quatro
elementos.
Procedimentos metodológicos
Metodologicamente, a presente pesquisa encontra-se fundamentada na corrente
da Geografia Humanista Cultural, seguindo um método investigativo dedutivo por meio
de uma abordagem qualitativa focalizando nos membros da cultura Hip-Hop a fim de
compreender suas apropriações, usos, relacionamentos, conflitos e significados para a
constituição dos territórios da cena na cidade de BH, sendo o espaço urbano considerado
como verdadeiro palco de experiências e representações sociais. Para tal, o estudo apoia-
se em dados secundários provenientes de pesquisas bibliográficas, estudos e literaturas,
com destaque para as contribuições de Dayrell (2005) e Silva (2021). Além disso, foram
realizados levantamentos documentais em buscadores online de distintas fontes, como
sites de notícias, blogs, redes sociais, registros fotográficos, audiovisuais, banners,
panfletos, flyers de eventos, músicas, documentos, notícias e reportagens, que abordam a
história da cultura Hip-Hop na capital mineira ao longo das referidas décadas e, mais
especificamente, elencados os espaços frequentados pelos seus adeptos e fatos relevantes
desse processo de territorialização. Logo, as referências espaciais se tornaram as bases
adotadas para o mapeamento dos territórios ocupados pelo Hip-Hop ao longo do tempo
na capital mineira.
Para tanto, as informações qualitativas sobre os locais frequentados foram
espacializadas, por meio do georreferenciamento, posicionando assim os territórios em
distintos espaços da cidade lançando mão da plataforma Google My Maps.
Posteriormente, esses pontos foram tratados no software ArcGis 10.4 com o
geoprocessamento e confecção dos layouts para os cartogramas temáticos de localização
dos territórios compartimentados em duas décadas, são elas a década de 1990 (1990-
1999) e a década de 2000 (2000-2009). Sobre a seleção das duas décadas supracitadas,
ocorreu devido ao fato de que na década de 1990 constata-se a ascensão da cultura Hip-
Hop local, com a afirmação dos territórios, e ao final desta referida década há o declínio
da cena artística devido à pouca visibilidade no mercado cultural. Contudo, após esse
período difícil, foi nos idos dos anos 2000 que a cultura Hip-Hop retoma sua notoriedade
graças a parceria de antigos e novos representantes da cena.
Finalmente, para a realização das análises da evolução espaço-temporal dos
territórios apoiou-se nas referências espaciais e não-espaciais contidas nas bibliografias e
referências documentais que versam sobre o Hip-Hop local que elucidam a construção
histórica, os traços da territorialização, os atores sociais e suas dinâmicas que
caracterizam os territórios frequentados. Em suma, o presente artigo é tido como uma
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
69
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
prioridade investigativa pois apresenta a evolução das ocupações artísticas e sociais da
cultura Hip-Hop belo-horizontina sendo base para responder questões futuras.
Os territórios da cultura hip-hop na década de 1990 (1900-1999s)
Para dar início às análises da evolução espaço-temporal da cultura Hip-Hop, é
necessário contextualizar historicamente a formação desta cultura suburbana no contexto
da cidade de Belo Horizonte. Como foi tratado brevemente na introdução, o Hip-Hop
surge na década de 1980 com os bailes que ocorriam pela cidade. Nessa época, a cultura
Hip-Hop esteve vinculada com a cultura Funk desenvolvendo conjuntamente suas
trajetórias, por intermédio de seus respectivos gêneros musicais (Rap e Funk), no cenário
artístico local representando a black music. Foi na década de 1990 que o Hip-Hop inicia
sua trajetória independente, após a ruptura com a cultura Funk, por causa do propósito
musical que os artistas almejavam. Em relação à ruptura, os adeptos do funk se
identificavam com um ritmo mais dançante e despojado com a intenção de animar os
bailes. Diferentemente, os rappers almejavam um conteúdo melódico mais comprometido
com as questões sociais trazendo à tona as desigualdades e mazelas da periferia em
canções com um teor de manifesto orientado pelo objetivo desta cultura (DAYRELL,
2005). Dito isso, foi a partir da década de 1990 que os membros do Hip-Hop passam a
territorializar a cidade de maneira independente, justificando o recorte temporal proposto.
Figura 1: Mapa dos territórios da cena Hip-Hop belo-horizontina na década de 1990
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
70
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
Elaborado pelo autor (2021)
Como pode ser observado no mapa acima (Figura 1) nota-se que os territórios
utilizados para shows, práticas artísticas e encontros dos membros da cena Hip-Hop local
no período da década de 1990 possuíam um quantitativo limitado, totalizando 13
territórios identificados, e se apresentavam afastados espacialmente uns dos outros.
Ambos fatores se justificam devido às condições de comunicação naquela época, pois os
membros da cultura Hip-Hop residiam em locais periféricos e espacialmente dispersos na
cidade e, além disso, os meios de comunicação ainda eram limitados restringindo o
contato. Em relação à comunicabilidade, em muitos casos, essa era efetiva somente entre
os sujeitos residentes na mesma ‘quebrada’
2
ou pertencentes ao mesmo elemento e/ou
coletivo. Resultando em uma cena bastante fragmentada no início da referida década.
Nesse sentido, os principais locais de encontros dos adeptos da cultura nesse
período foram: o extinto Colégio Palomar, situado na Avenida Afonso Pena em frente ao
Parque Municipal; a Praça da Savassi, denominada Praça Diogo de Vasconcelos; o Coreto
da Praça da Liberdade; o Terminal Turístico Juscelino Kubitschek (Terminal JK); e a
Praça da Estação, todos situados na região do hipercentro da capital. Tais territórios são
2
Gíria que se refere ao local de origem do membro da cultura Hip-Hop.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
71
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
considerados locais ótimos por causa da posição geográfica e a facilidade de acesso dos
membros utilizando o transporte público como principal meio de locomoção. Contudo,
houve desafios na territorialização desses locais. Segundo Dayrell (2005), para utilizar
dos espaços supracitados, os integrantes do Hip-Hop passavam por sérias dificuldades
por serem taxados de marginais, sendo reprimidos e até expulsos pelos proprietários e
pela polícia, como foi o caso do Terminal JK, que foi proibido de ser ocupado.
Do ponto de vista artístico, em 1990 na capital mineira eram poucas as casas de
shows, boates, danceterias e bares que recebiam eventos da cultura Hip-Hop, algo muito
semelhante ao que acontecia em São Paulo e Nova York acerca da restrição de espaços
para divulgação da arte de rua. Desta maneira, a alternativa para se manifestar eram os
eventos públicos locais, como por exemplo as festas de rua, quermesses, eventos
culturais, bailes e shows beneficentes. Sobre os bailes, esses aconteciam nas famosas
Quadras da Vilarinho na região de Venda Nova e a Quadra Chiodi no bairro Madre
Gertrudes, organizados pelos integrantes da black music, e nos eventos públicos anuais,
com destaque para o “Arena da Cultura” e o “BH Canta e Dança”, esse último realizado
em 1993 e reuniu cerca de 8 mil jovens na Praça da Estação.
De acordo Dayrell (2005) foi após os shows de Thaíde e DJ Hum em 1991 e o
show do Racionais MC’s em 1995 que os artistas e membros da cultura Hip-Hop
passaram a se conectar, havendo trocas efetivas que consolidaram a cena hip-hop belo-
horizontina. Para além disso, os shows de artistas nacionais resultaram em uma maior
visibilidade da cena com a criação de programas de rádio dedicado ao gênero rap, estúdios
de gravação, surgimento de Fanzines, eventos dedicados à cultura de rua, a abertura de
espaços culturais dedicados às culturas suburbanas e, consequentemente, o exponencial
aumento dos adeptos à cultura Hip-Hop.
Acerca dos estabelecimentos que passaram a recepcionar shows do gênero rap, de
acordo com Dayrell (2005) e levantamentos documentais online, foram mapeados os
seguintes territórios: Broaday, um bar temático que se dedicava aos estilos undergrounds
e localizado no bairro Santa Tereza; Boate Trash, atual Cine Santa Tereza; Butecário Bar
Brasil, funcionava na sede do Sindicato dos Bancários (Sindiban) na região central;
Discoteca Phoenix, localizada no bairro Padre Eustáquio, que recebia apresentações de
break dance; Danceteria Studio 94, situada na região do Barreiro que realizava matinês
sob o comando de DJs que tocavam clássicos da black music; e o Calabouço (figura 2),
um dos principais espaços culturais das décadas de 1980 e 1990 para os artistas
independentes locais e sua localização era no bairro Primeiro de Maio.
Figura 2: Matéria “Rap sacode o Calabouço” no Jornal Estado de Minas (1998)
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
72
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
Fonte: Coletivo Bambata (2014)
Em relação aos estabelecimentos identificados, por meio do levantamento documental e
pesquisas online, é importante destacar que em sua maioria estes se caracterizavam como
ambientes ecléticos do ponto de vista musical. Tais locais recebiam apresentações artísticas de
gêneros distintos e, consequentemente, o público se modificava a cada evento. Desta forma, é
possível inferir a ocorrência de territorialidades fluídas com grupos identitários que
territorializavam aqueles espaços durante um determinado período, prioritariamente quando
ocorrem shows ou apresentações.
Além disso verifica-se a existência de espaços dedicados às culturas suburbanas, como
era o caso do Butecário, Broaday e o Calabouço, demonstrando circunstâncias de apropriações
diversas em tempos e ocasiões distintas, e, também, sobreposições territoriais com diferentes
grupos pertencentes à cena underground frequentando o mesmo evento.
Os territórios da cultura hip-hop na década de 2000 (2000-2009s)
No final da década de 1990, os artistas da cultura passavam por duras penas com
dificuldades de patrocínios, impossibilidade de gravação musical, aparelhagem precária,
baixo retorno financeiro e invisibilidade no cenário artístico local (DAYRELL, 2005).
Desta maneira, a segunda metade da década de 1990 se caracterizou como um período de
declínio e perdurou até a virada da década. Diante desse cenário e a fim de reavivar a cena
local, constata-se uma articulação no início dos anos 2000 entre os antigos e novos
integrantes da cultura Hip-Hop belo-horizontina, mais precisamente MCs e DJs da cena,
que se uniram para promover encontros quinzenais dos quatro elementos na Praça Sete
de Setembro, uma das mais conhecidas praças da cidade. E, em consequência dessa
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
73
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
mobilização, percebe-se a retomada das apropriações dos espaços públicos pela cultura
Hip-Hop com destaque para a profusão rap freestyle (O SOM QUE VEM DAS RUAS,
2011).
Figura 3: Mapa dos territórios da cena Hip-Hop belo-horizontina na década de 2000
Elaborado pelo autor (2021)
É possível destacar duas circunstâncias espaciais resultantes desse processo de
retomada das ocupações dos espaços públicos urbanos: primeiro, o incremento no número
de territórios da cultura Hip-Hop na cidade; e segundo, diz respeito a tendência de
centralização territorial com cerca de 85% dos espaços identificados se localizando na
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
74
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
região do hipercentro, como pode ser observado na figura 3. Desta maneira, os territórios
centrais mais que duplicaram em comparação com a década de 1990, totalizando 17
lugares reconhecidos e frequentados pelos integrantes da cultura. Pode-se reforçar que a
tendência de territorialização dos espaços centrais, sejam eles alternativos, marginais ou
negligenciados, é priorizada pela cultura Hip-Hop devido a adesão da cultura e a posição
geográfica no espaço urbano.
Prosseguindo com as análises acerca dos territórios na região central, verifica-se
processos de desterritorialização e a reterritorialização de espaços públicos da cidade,
como procedeu com a desocupação do Terminal JK, do Coreto da Praça da Liberdade, o
saguão do Colégio Palomar e a Praça da Savassi, e o estabelecimento dos adeptos do Hip-
Hop nas praças Sete de Setembro e Afonso Arinos, e no Viaduto Santa Tereza,
demonstrando que o processo territorial é contínuo e repleto de alternâncias. Certos fatos
justificam essas mudanças territoriais, como a proibição dos usos e fechamento de
determinado local (como foi o caso do Colégio Palomar) e até a facilidade de
deslocamento com a ressignificação de novos espaços, provocando novas conformações
espaciais.
Como foi dito anteriormente, a disseminação do rap freestyle foi muito
significativo para a consolidação desses novos territórios, pois os jovens se encontravam
para a realização de batalhas de rima tornando uma ocasião de congregação entre os
quatro elementos da cultura com a presença de MCs, DJs, b-boys e b-girls, e os grafiteiros
resultando na unicidade da cena local (SILVA, 2021). Além disso, as batalhas tendem a
cumprir a função de visibilidade para os novos MCs da cena, sendo um palco aberto e
democrático para os jovens apresentarem sua arte da improvisação e divulgar seus
trabalhos autorais. Em decorrência dessa visibilidade, os MCs adquiriram
reconhecimento e participaram do evento ‘Liga dos MCs’ promovido pela empresa Red
Bull, que movimentou a cena Hip-Hop local, resultando como reverberação o surgimento
do ‘Duelo de MCs’ através da idealização e articulação do coletivo Família de Rua (O
SOM QUE VEM DAS RUAS, 2011; SILVA, 2021).
Em princípio, os encontros aconteceram na Praça da Estação com periodicidade
semanal e, após alguns meses, os integrantes da cultura passaram a se encontrar debaixo
do Viaduto Santa Tereza, estabelecendo ali o Duelo de MCs. Desde o ano de 2007 e até
os dias de hoje, o Viaduto Santa Tereza recebe os Duelos, encontros, shows, eventos e
outras manifestações culturais e políticas do Hip-Hop, totalizando mais de uma década
de cultura de rua. Desta forma, é unânime entre os membros desta contracultura a
indicação do Viaduto Santa Tereza como o principal território do Hip-Hop belo-
horizontino. Principalmente por ser um marco fundamental para a cena local, no que tange
a apropriação dos espaços públicos da cidade.
Apoiando-se no mapa anterior (figura 3), é possível identificar o aumento no
número de estabelecimentos culturais privados que passam a reconhecer e,
consequentemente, proporcionar apresentações da cultura Hip-Hop, totalizando 12 locais.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
75
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
É fundamental destacar que, além dos espaços alternativos da cultura underground como
Matriz Casa Cultural, Estrela, A Autêntica e A Obra, ocorre a expansão da cena Hip-Hop,
se apresentando e territorializando em casas de show tradicionais da cidade, como foi o
caso do Arcadium, Mix House e Lapa Multshow (figura 4). Sob outra perspectiva,
distinguem-se dois territórios característicos da cena Hip-Hop local, ambos assinalados
na região central, que configuram dois tipos de territorializações próprias desta cultura.
são elas a Galeria Praça Sete, que representa um território comercial ocupado por lojas
voltadas à artigos da cultura de rua, e a Sede do Partido dos Trabalhadores (PT-BH) que
recepcionava eventos da cultura, simbolizando assim um território político.
Figura 4: Cartaz de divulgação do show do Julgamento no Lapa Multshow (2008)
Fonte: Duelo de MCs (2008)
Sobre os territórios mapeados na porção periférica da cidade, pontos 9 e 11,
verifica-se dois centros culturais: o Centro Cultural N.U.C. e o Centro Cultural Alto Vera
Cruz, ambos localizados na regional Leste. A posição geográfica desses espaços é
estratégica, pois objetivam compor uma política de descentralização dos equipamentos
públicos dentre as nove regionais da capital mineira a fim de atender um maior número
de cidadãos, cumprindo a finalidade do direito à cultura, promoção da cidadania e
valorização das identidades locais. Desta maneira, os centros culturais se tornaram
territórios fundamentais para o Hip-Hop local, dando suporte aos quatro elementos,
fomentando o surgimento de novos artistas e conservando essa cultura periférica.
Considerações finais
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
76
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
O presente estudo sobre a evolução espaço-temporal da cultura Hip-Hop na cidade
de Belo Horizonte, apoiado em dados secundários e geoprocessamento, demonstrou
efetivamente que houve demarcações territoriais significativas dessa cultura ao longo de
duas décadas. Nesse sentido a hipótese é constatada pois, apesar dessa cultura suburbana
enfrentar constantemente o preconceito e a invisibilidade decorrentes de uma visão
discriminatória de determinados segmentos da sociedade, os integrantes do Hip-Hop
buscam desde seu surgimento até os dias de hoje se desvencilhar desses estereótipos a
fim de reafirmar cotidianamente a relevância de sua cultura e manifestações artísticas.
Para tanto, verificou-se que ao longo da década de 1990 os territórios se
apresentavam dispersos por toda a mancha urbana da capital mineira, havendo a
territorialização de espaços públicos e privados para realização de shows e demais
eventos da cultura. nos anos 2000, houve o restabelecimento da cena Hip-Hop após
um período de declínio na segunda metade de 1990, com a desterritorialização de antigos
espaços e reterritorialização de novos locais demonstrando que o mantimento de
territórios por essa contracultura trata-se de um processo contínuo e repleto de
transformações. Devido esse processo, denominado por Haesbaert (2014) de T-D-R, foi
constatado a ampliação no número de territórios e, consequentemente, sua aglutinação na
porção central e pericentral da cidade.
Finalmente, é possível destacar que a cultura Hip-Hop ao longo do tempo tem
conquistado cada vez mais espaço no cenário cultural e socioespacial das grandes
metrópoles, como é o caso de BH, por meio de sua adesão junto às demais culturas
undergrounds que objetivam reafirmar suas perspectivas críticas e contra hegemônicas
ao mercado artístico. Logo, observa-se no espaço urbano a consolidação de locais
alternativos que recepcionam os artistas e eventos do Hip-Hop. Por fim, ressalta-se que
esse estudo visa fomentar o campo de estudos geográficos voltados a cultura Hip-Hop,
desempenhando um certo diferencial acadêmico ao investigar a cena cultural da cidade
de Belo Horizonte que servirá de base para estudos posteriores a fim de promover os
debates acerca das culturas suburbanas e reafirmar as identidades artísticas negras e
periféricas.
Referências bibliográficas
BORRI, Giovanna Teixeira. Hip-Hop: Movimento Político-Cultural de resistência da
juventude da periferia e sua inserção nos saraus. 2015. 128f. Dissertação (Mestrado
em Serviço Social) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2015.
CLAVAL, Paul. A geografia cultural. Florianópolis: Ed.UFSC, 3. ed., 2007. 456 p.
COLETIVO BAMBATA. Matéria do Estado de Minas sobre o festival “Calabouço Rap
Festival” (1998). Página do Coletivo Bambata (Facebook), 17 de agosto de 2014.
Disponível em: <https://tinyurl.com/nrt55p9e>. Acesso em: 29 out. 2021.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
77
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
CONTADOR, António Concorda; FERREIRA, Emanuel Lemos. Ritmo e Poesia: Os
Caminhos do Rap. Lisboa: Assírio & Alvim, 1997. 288p.
CORRÊA, Roberto Lobato; Sobre a Geografia Cultural. Instituto Histórico Geográfico
do Rio Grande do Sul (IHGRGS), s.l., 2009. Disponível em: <
https://ihgrgs.org.br/artigos/contibuicoes/Roberto%20Lobato%20Corr%C3%AAa%20-
%20Sobre%20a%20Geografia%20Cultural.pdf>. Acesso em: 29 out. 2021.
DAYRELL, Juarez Tarcisio. A música entra em cena: o rap e o funk na socialização
da juventude. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2005. 303p.
DUELO DE MCS. No intervalo das batalhas: Show do Julgamento no lançamento do
disco ‘No foco do caos’. Blog Duelo de MCs, 29 de maio de 2008. Disponível em:
<https://duelodemcs.blogspot.com/2008/05/no-intervalo-das-batalhas.html>. Acesso
em: 28 out. 2021.
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008. 323p.
GOMES, Carin Carrer. O uso do território paulistano pelo Hip-Hop. 2008. 158f.
Dissertação (Mestrado em Geografia Humana) Universidade de São Paulo, São Paulo,
2008.
GOMES, Renan Lélis. Território usado e movimento Hip-Hop: cada canto um rap,
cada rap um canto. 2012. 159f. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Universidade
Estadual de Campinas, Campinas, 2012.
GOMES, Paulo César da Costa. Espaço público, espaços públicos. Niterói:
GEOgraphia, v. 20, n. 44, setembro-dezembro 2018. Disponível em:
<https://doi.org/10.22409/GEOgraphia2018.v1i44.a27557>. Acesso em: 22 out. 2021.
HAESBAERT, Rogério. Des-caminhos e perspectivas do território. In: RIBAS, A. D.;
SPOSITO, E. S.; SAQUET, M. A. (Orgs.) Território e desenvolvimento: diferentes
abordagens. Francisco Beltrão: Editora da UNIOESTE, 2004. 174p.
HAESBAERT, Rogério. Desterritorialização: entre as redes e os aglomerados de
exclusão. In: CASTRO, I Elias; GOMES, Paulo César da Costa.; CORRÊA, Roberto
Lobato (Orgs.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2014, pp.
165-206.
HOBSBAWN, Eric. A Era dos Extremos: o breve século XX 1941-1991. São Paulo:
Companhia das Letras, 1995. 1087p.
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro:
Zahar, 2006. 120p.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
78
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
Leal, Sérgio José de Machado. Acorda Hip-Hop: despertando um movimento em
transformação. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2007. 456p.
MACIEL, Luis Carlos. Nova Consciência/Jornalismo Contracultural: 1970 1972.
Rio de Janeiro: Eldorado, 1973. 240p.
MARTÍNEZ, Horacio Luján. Theodore Roszak (1933-2011) - Um contra-obituário.
Revista Espaço Acadêmico, v. 11, n. 132, p. 151-156, 20 janeiro 2012. Disponível em:
<http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/14349>. Acesso
em: 23 out. 2021.
MENEZES, Hilário José; CARDOSO, Eduardo Shiavone. TERRITÓRIO E
TERRITORIALIZAÇÃO: questões conceituais para uma abordagem e leitura dos
movimentos sociais. PEGADA - A Revista da Geografia do Trabalho, [S. l.], v. 18, n.
3, 2018. DOI: 10.33026/peg.v18i3.5140. Disponível em:
<https://revista.fct.unesp.br/index.php/pegada/article/view/5140>. Acesso em: 23 out.
2022..
O SOM que vem das ruas. Direção: Daniel Veloso e Eduardo Zunza. Produção: G5
Filmes. Belo Horizonte: Família de Rua, 2011. 1 vídeo (34 min e 53 segs.). Disponível
em: https://vimeo.com/99645819. Acesso em: 15 out. 2021.
OLIVEIRA, Denilson Araujo de. Por uma significação geográfica do Movimento Hip
Hop. 2004. 79f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel em Geografia)
Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2004.
OLIVEIRA, Denilson Araujo de. Territorialidades no mundo globalizado: outras
leituras de cidade a partir da cultura Hip Hop na metrópole carioca. 2006. 172f.
Dissertação (Mestrado em Geografia) Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2006.
PEREIRA, Carlos Alberto M. O que é contracultura. São Paulo: Brasiliense, 1983.
104p.
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. SONS DA RUA: os territórios e territorialidades
dos rappers da cena Hip-Hop belo horizontina na última década (2010-2019s). 2021.
188f. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais, Belo Horizonte, 2021.
SOUZA, Marcelo José Lopes de. O território: sobre espaço e poder, autonomia e
desenvolvimento. In: CASTRO, I Elias; GOMES, Paulo César da Costa.; CORRÊA,
Roberto Lobato (Orgs.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2014, p. 77-116.
TEPERMAN, Ricardo. Se liga no som: As transformações do rap no Brasil. São Paulo:
Ed. Claro Enigma, 2015. 177p.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Glaycon de Souza Andrade e. A TERRITORIALIZAÇÃO UNDERGROUND NA METRÓPOLE: uma análise espaço-
temporal dos territórios da cultura Hip-Hop em Belo Horizonte entre os anos de 1990-2009. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8,
17, pp. 69-93, jul. 2022
Submissão em: 18/09/2021. Aceito em: 29/03/2022.
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
79
ENSAIOS DE GEOGRAFIA
W W W. P E R I O D I C O S. U F F. B R / E N S A I O S _ P O S G E O
I S S N : 2 3 1 6 8 5 4 4
TURRA NETO, Nécio. Movimento Hip-Hop do mundo ao lugar: difusão e
territorialização. Juiz de Fora: Revista de Geografia, v. 3, n. Especial, p. 1-11, 2013.
Disponível em: <https://periodicos.ufjf.br/index.php/geografia/article/view/17962>.
Acesso em: 20 out. 2021.