AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
FREITAS, Edjango Lima; FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
jul. 2020.
Submissão em: 28/11/2021. Aceito em: 17/07/2022.
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SEÇÃO
DOSSIÊ
TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de
Geografia
1
LGBTQIA+ TERRITORIALITIES IN A SCHOOL:
invisibilities and strategies of resistance from the teaching of
Geography
TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EN UNA ESCUELA:
invisibilidades y estrategias de resistencia desde la enseñanza de la
Geografía
Edjango Lima Freitas
2
Secretaria Municipal de Ensino de
Maracanaú, Ceará, Brasil
e-mail: edjangofreitas@yahoo.com.br
Pablo Sebastian Moreira Fernandez
3
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN)
Rio Grande do Norte, Brasil
e-mail: pablosmfernandez@gmail.com
Resumo
Este artigo propõe discutir o espaço escolar a partir das noções geográficas de território e de territorialidade como
expressão de práticas espaciais mobilizadoras da discussão de gênero e de sexualidade, dando ênfase a grupos de
estudantes LGBTQIA+. Estes que por muitos componentes da comunidade escolar são considerados desviantes aos
padrões socioculturais heteronormativos e hegemônicos e vêm enfrentando nas últimas décadas um apagamento por
parte de políticas educacionais que se posicionam claramente sobre a inclusão e diversidade no âmbito dessas
discussões. Para tanto, elegemos o conceito de território (e seus derivativos: territorialidades e territórios vividos) como
1
Este texto deriva de uma dissertação de mestrado intitulada “Territorialidades LGBTQIA+ na educação básica: a
oficina geográfica de gênero e sexualidade como ferramenta de luta e resistência”, defendida no ano de 2021 no
Programa de Pós-graduação em Geografia Mestrado Profissional (GEOPROF), da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (RN).
2
Assessor Escolar (Formador) de Geografia da rede municipal de ensino de Maracanaú - CE, Licenciado em Geografia
e Bacharel em Estudos Regionais pela Universidade Federal do Ceará (UFC), Especialista em Gênero, Diversidade e
Direitos Humanos (UNILAB) e Mestre em Ensino de Geografia GEOPROF (Mestrado Profissional em Geografia -
UFRN).
3
Possui doutorado em Geografia pela Universidade Federal de Goiás (2013), mestrado em Educação pela Universidade
Estadual de Campinas (2008) e graduação em Geografia pela Universidade Estadual de Londrina (2004). Professor
adjunto na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, vinculado ao Departamento de Práticas Educacionais e
Currículo (DPEC) do Centro de Educação e aos Programas de s-graduação em Geografia - Mestrado Profissional
(GEOPROF) e PPGEO. Tem atuado na área de Geografia, com ênfase em Ensino de Geografia, com os seguintes
temas: Metodologias de Pesquisa e Ensino, Fenomenologia, Estágio e Práticas, Formação de Professores, além de
investigar as Linguagens Contemporâneas no (do) Ensino de Geografia, com ênfase na Fotografia. É pesquisador da
Rede Internacional de Pesquisa "Imagens, Geografias e Educação" - Coordenador do Pólo Natal.
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direcionamento para o estudo, visto que as práticas espaciais se tornam experiências “marginais” implicando na quebra
de barreiras, geração de conflitos e na construção de territorialidades a partir de relações de poder.
Palavras-chave
Ensino de Geografia; Territorialidades LGBTQIA+; Gênero; Invisibilidade.
Abstract
This article proposes to discuss the school space as a stage for Geography contents that discuss Gender and Sexuality,
emphasizing the spatial practices of LGBTQIA+ students. These, which by many components of the school community,
are considered deviant from heteronormative and hegemonic sociocultural standards and have been facing, in recent
decades, an erasure by educational policies that clearly position themselves on inclusion and diversity in the context of
these discussions. Therefore, we chose the concept of Territory (and its derivatives: territorialities and territories lived)
as a direction for the study, as spatial practices become "marginal" experiences, implying the breaking of barriers,
generation of conflicts and the construction of territorialities from power relations.
Keywords
Teaching of Geography; Territorialities LGBTQIA+; Gender; Invisibility.
Resumen
Este artículo propone discutir el espacio escolar a partir de las nociones geográficas de territorio y territorialidad como
expresión de prácticas espaciales que movilizan la discusión de género y sexualidad, haciendo énfasis en los grupos de
estudiantes LGBTQIA+. Estos alumnos son considerados por muchos componentes de la comunidad escolar como
desviados de los estándares socioculturales heteronormativos y hegemónicos y se han enfrentado en las últimas décadas
a un borrado por parte de las políticas educativas que se posicionan claramente en la inclusión y la diversidad dentro
de estos debates. Para ello, elegimos el concepto de territorio (y sus derivados: territorialidades y territorios vividos)
como orientación para el estudio, ya que las prácticas espaciales se convierten en experiencias "marginales" que
implican la ruptura de barreras, la generación de conflictos y la construcción de territorialidades a partir de relaciones
de poder.
Palabras-clave
Enseñanza de la Geografía; Territorialidades LGBTQIA+; Género; Invisibilidad.
Introdução
Nós seres humanos somos agentes ativos do metamorfismo que ocorre em nosso
planeta, principalmente por agirmos em grupo, pois é de nossa natureza viver em
comunidade. Inicialmente, temos esse contato através da família e aos poucos somos
inseridos no meio socioespacial, formamos nossos ciclos de afinidades, na maioria das
vezes, quando possível, buscamos nossos iguais. Porém, quando somos inseridos em
instituições que nos acolhem e orientam, essas compulsoriamente sugerem determinados
caminhos.
Somos vítimas e algozes das experiências que moldam nossas personalidades,
sendo essas diretrizes determinantes na construção de territorialidades cotidianas. Isto
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posto, a disciplina de Geografia tem seu papel significativo no processo estrutural de uma
visão crítica, tolerante e acolhedora. Pensando nessa necessidade real, desenvolvemos a
OGGSC - Oficina Geográfica de Gênero e Sexualidade na Contemporaneidade, pensada
para trabalhar com turmas de e anos em uma Escola de tempo integral de Ensino
Fundamental II. O trabalho foi desenvolvido durante a pesquisa de mestrado junto ao
Geoprof - UFRN, e teve como resultado o levantamento de dados através da pesquisa
aplicada em formato de questionário junto aos estudantes e a produção de trabalhos e
depoimentos elaborados pelo público pesquisado.
Esta oficina buscou desenvolver o olhar geográfico de modo a construir olhares
críticos e éticos para questões sobre sexualidades que atravessam o espaço escolar,
experiências que se especializam, e permite que cada aluno olhe para si e para o outro
“em sua singularidade e sua multiplicidade, como sujeitos históricos em processo de
transformação” (WALTRIK, 2018, p. 64).
Desta maneira, essas experimentações vão reconfigurando os ambientes coletivos,
que assimilam as influências e são moldados de acordo com os usos e desusos. É partindo
deste pressuposto oriundo do território vivido que chegamos ao viés que encaminha o
produto didático desta pesquisa, caracterizada pelo trabalho colaborativo na prática
educacional em Geografia.
Acreditamos, portanto, que esse trabalho deve ser introduzido na educação de
forma a contribuir positivamente na ressignificação de vivências espaciais, para isso
sendo iniciado no Ensino Fundamental II, faixa etária e momento onde estudantes dão
sentido às suas práticas socioespaciais e à compreensão de suas experiências cotidianas.
Assim, como recurso para entendermos a escola como uma territorialidade de vivências
múltiplas e plurais, é necessário compreendermos um pouco sobre o lócus da pesquisa:
uma escola de Ensino Fundamental com jornada de tempo integral, onde lecionamos as
disciplinas de Geografia e Ensino Religioso, no município de Maracanaú-CE
4
, que
pertence à Região Metropolitana de Fortaleza, localizado a 24,5 km da capital. A seguir
elegemos algumas imagens que apresentam um pequeno recorte do lugar desta proposta.
4
É um município jovem, com 39 anos de idade, talhado entre as serras do maciço de Maranguape e bordejado por
lagoas que abrigam as maracanãs que deram nome ao município. Além de ser um importante polo
industrial do Ceará, apresenta em sua paisagem conjuntos habitacionais que surgiram para atender
as necessidades de moradia dos trabalhadores, e uma rede escolar com 113 escolas de Ensino
Fundamental, distribuídas entre as modalidades de ensino regular, creche e tempo integral. No
campo da Educação, o município tem grande visibilidade no que se refere a busca pela excelência
em seus projetos que lutam pelas minorias como o Afro-Arte, que é referência na luta contra o
racismo e a valorização do povo negro e indígena.
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Figura 01: Quadra anexa à escola (Pertencente à comunidade)
Fonte: Acervo dos autores (2019)
Figura 02: Pátio da Escola com meninos jogando futebol
Fonte: Acervo dos autores (2019)
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Esta produção textual surge a partir de uma grande necessidade apresentada na
Educação brasileira, desde longos anos, de tornar o ambiente escolar mais acolhedor as
diferenças relacionadas às sexualidades diversas. Problema que vem sendo enfrentado
por pessoas LGBTQIA+ desde quando se necessita frequentar este ambiente comum com
a grande maioria da sociedade que é pautada na heteronormatividade. Neste caminho,
objetivou-se compreender e analisar de que maneira os estudantes LGBTQIA+ constroem
suas experiências espaciais (territoriais) diante de um conjunto de práticas e territórios
heteronormativos, expressas no cotidiano de aprendizado. Para tal, delimitamos uma
etnografia escolar com fundamentos da pesquisa qualitativa e participante, no qual
utilizamos a decodificação de narrativas e linguagens de modo a analisar os questionários,
entrevistas e os materiais produzidos na oficina.
Ensino de Geografia e a questão LGBTQIA+: experiências, desvios e
atravessamentos no território escolar
Pessoas no plural, dando sentido aos sujeitos, seus corpos e suas experiências,
indicando um caminho ao encontro de geografias também plurais, indicando uma direção
epistemológica de abertura, elegendo as vivências destas pessoas LGBTQIA+ como um
ponto de partida para suas compreensões de mundo, para diversos tipos de percepção do
espaço. O corpo, a vida, seus trajetos e trajetórias, ambos são uma centralidade nesta
concepção de espaço, pois toda posição absoluta de um objeto (ou de um sujeito) seria a
morte de toda experiência. Desta maneira, compreende-se que os sujeitos e suas
experiências (sociais, políticas, culturais, afetivas), seus corpos e suas corporeidades
produzem espacialidades, sendo considerados como agentes produtores do espaço
geográfico.
Tal perspectiva de espaço geográfico é aquela da existência cotidiana, que abrange
as vivências do corpo, das memórias, da tomada de consciência e da experiência.
Experiência que conduz o sujeito através de sua vida afetiva, de seu corpo, de seus
hábitos, à geograficidade. Ela se faz oculta e poderá se revelar a qualquer instante, pois
esta geografia permanece, habitualmente, discreta, mais vivida que exprimida (DARDEL,
2011, p. 34). Vem desta compreensão, o entendimento da ideia de territorialidade como
um tipo de experiência humana que se dá nos territórios, produzindo-os, significando-os,
os transformando.
O espaço se produz (e é produzido, reproduzido) como habitação subjetiva tendo
o corpo como base da experiência geográfica, pois o corpo também expressa marcas de
um habitar existencial (a corporeidade, os gestos, as práticas espaciais). Tal entendimento
parte de preceitos da Geografia Humanista Cultural, que procura tecer um entendimento
do “mundo humano através do estudo das relações das pessoas com a natureza, do seu
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comportamento geográfico, bem como dos seus sentimentos e ideias a respeito do
espaço” (TUAN, 1985, p. 143). De modo a consolidar esta perspectiva, elegemos os
conceitos de território e de territorialidade como elemento de análise do espaço escolar e
de seus sujeitos, uma vez que amalgamam as relações sociais, a cultura e o cotidiano em
uma relação de poder.
Desta maneira. teremos um quadro que nos permite refletir sobre como a
Geografia pode ser trabalhada para favorecer as discussões dentro do âmbito LGBTQIA+.
Esta “espacialidade do poder” torna-se nestas linhas, o lócus de corporeidades e
subjetividades, categorias comuns às Ciências Humanas que podem ser um importante
subsídio na estruturação dos elementos que compõem essa e outras rotinas escolares
(NUNES e REGO, 2011, p. 86). Destarte, o presente trabalho se deu no interior de um
espaço escolar, partindo das práticas socioespaciais de um público peculiar a este
ambiente: indivíduos que são considerados desviantes aos padrões heteronormativos e
hegemônicos.
Neste sentido, elegemos o conceito de território (e seu derivativo: as
territorialidades) como guia para tal estudo, visto que as práticas espaciais se tornam
experiências “marginais” pois retratam a impossibilidade de livre circulação dos
indivíduos que não se enquadram no padrão da visão dualista masculino/feminino. O
impedimento aos ambientes comuns e espaços públicos e/ou privados, seja através de
olhares repressores ou de palavras ofensivas, seja pela violência para impedir a circulação
em bares, praças públicas, boates, banheiros públicos, etc.
Ficando claro a partir do momento em que implicam a transposição de fronteiras,
e mais, são constituídas a partir de relações de poder conflituosas que delimitam
passagens e “muros” no espaço geográfico. É criada assim uma trama própria de inter-
relações: de um lado, uma organização oficial do sistema escolar (o território) e de outro,
os sujeitos: alunos, professores e funcionários com suas experiências espaciais (aqui, as
territorialidades), que criam e recriam essas relações, refletindo o mundo externo na qual
estão inseridos.
Esta pesquisa teve como um “norte” teórico, conceitual e político, e também como
inspiração, uma consolidada e abrangente produção acadêmica e de estudos na área de
Geografia, Gênero e Sexualidades, chamada Geografias Marginais, em específico com
acesso às obras do Grupo de Estudos Territoriais GETE, a Revista Latino-Americano
de Geografia e Gênero RLAGG e a Rede de Estudos de Geografia, Gênero e
Sexualidade Ibero-Latino-Americana (REGGSILA). Destes coletivos, nos chama a
atenção o desenvolvimento conceitual do que estes denominam como Geografias
Malditas, inspirando-nos a aproximar estes “temas tabu” do Ensino de Geografia,
especialmente no que toca à sexualidade, as corporeidades e territorialidades
LGBTQIA+, onde:
As sexualidades dissidentes foram consideradas malefícios, e muitas pessoas
foram punidas por viverem desejos considerados impuros. Assim, trazer o
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“malefício” como objeto científico tem sido uma árdua tarefa de nosso
cotidiano acadêmico, porque s somos os sujeitos que estão colocando em
jogo a ideia de “pureza” da ciência e maculando, desse modo, a nobreza do
lugar de honra em que todo o campo de saber se colocou, socialmente. As
malditas geografias são as práticas científicas que ameaçam a pureza da ciência
geográfica, abordando temas e sujeitos desconsiderados nesse campo por não
serem dignos de ter a espacialidade de sua existência reconhecida (SILVA et
al, 2013, p. 12).
Aqui, a geografia maléfica tenta traduzir a existência de territórios (mal)ditos, pois
reconhece um conjunto de disputas vividas por uma coletividade LGBTQIA+ que busca
resistir e se apropriar dos espaços diante de práticas estabelecidas pelos indivíduos que se
afirmam heterossexuais e configuram um padrão heteronormativo produtor de normas,
regras e comportamentos, revelando que: “o poder está no centro da análise, o poder é a
chave, em toda relação circula o poder que não é nem possuído nem adquirido, mas
simplesmente exercido” (RAFFESTIN, 1993, p. 1).
Tal poder se manifesta através de convenções sociais pré-existentes, onde os
indivíduos são separados pelo sexo biológico, tendo que seguir padrões históricos de
comportamento, vestimenta, utilização do espaço coletivo, padrões religiosos, dentre
vários meios de coibição do que é considerado diferente. Pois acreditamos que o poder é
cíclico e pode ser modificado de acordo com a consciência dos indivíduos que operam as
relações sociais nesse território.
O espaço escolar visto pelo olhar analítico da Geografia revela um conjunto de
práticas configuradas a partir de “normas de convivência” extraoficiais, perpassando por
todos os territórios existentes na escola, podendo ser salas de aula, pátio, ambientes para
prática esportiva, direção, secretaria escolar, dentre outros, onde existe uma educação
normativa para os corpos: modos de falar, vestir, correr, andar, fazer as necessidades
fisiológicas, solicitar documentação em seu nome de registro e/ou social (quando
possível), impondo sofrimento para a grande maioria do público que nele convive.
Segundo Jesus (2012):
Cada um(a) de nós é uma pessoa única, que porém tem características comuns
a toda a humanidade. Elas nos identificam com alguns e nos tornam diferentes
de outros, como a região em que nascemos e crescemos, nossa raça, classe
social, se temos ou não uma religião, idade, nossas habilidades físicas, entre
outras que marcam a diversidade humana. [...] Relembre da sua formação
pessoal: desde criança você foi ensinado(a) a agir e a ter uma determinada
aparência, de acordo com o seu sexo biológico. Se havia ultrassonografia, esse
sexo foi determinado antes de você nascer. Se não, foi no seu parto (JESUS,
2012, p. 7).
Dentro do espaço escolar, essas formas de normatização e aprisionamento
subjetivo são introjetados a partir de imposições comportamentais estabelecidas por
padrões patriarcais, sendo muitas vezes sustentadas a partir da concepção de pseudo
normalidade, baseada no dualismo biológico do macho e da fêmea, dos profissionais de
educação.
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Crescemos sendo ensinados que “homens são assim e mulheres são assado”,
porque “é da sua natureza”, e costumamos realmente observar isso na
sociedade. Entretanto, o fato é que a grande diferença que percebemos entre
homens e mulheres é construída socialmente, desde o nascimento, quando
meninos e meninas são ensinados a agir de acordo como são identificadas, a
ter um papel de gênero “adequado”. Como as influências sociais não são
totalmente visíveis, parece para nós que as diferenças entre homens e mulheres
são “naturais”, totalmente biológicas, quando, na verdade, boa parte delas é
influenciada pelo convívio social (JESUS, 2012, p. 7-8).
A imposição do gênero “adequado” é facilmente reafirmada na estrutura
organizacional das escolas, onde as invisibilidades, que são fronteiras segregadoras que
estabelecem a separação do masculino e feminino, surgem através das normas de
vestimenta, acesso aos banheiros, os jogos e brincadeiras taxados como masculinos e/ou
femininos, dentre vários outros posicionamentos cobrados de maneira naturalizada dentro
da biologia. O convívio social nos ambientes educacionais é moldado dentro dessa visão
cisgênera que é enraizada nos pequenos atos condicionados e condicionantes de quem faz
parte de uma comunidade escolar generificadora:
De fato, não fica claro que possa haver um "eu" ou um "nós" que não tenha
sido submetido, que não tenha sido sujeitado ao gênero, onde a generificação
é construída, entre outras coisas, pelas relações diferenciadoras pelas quais os
sujeitos falantes se transformam em ser. Submetido ao gênero, mas subjetivado
pelo gênero, o "eu" não precede nem segue o processo dessa generificação,
mas emerge apenas no interior das próprias relações de gênero e como a matriz
dessas relações (BUTLER, 2000, p. 116).
A generificação é imposta como “nós” emudecendo o “eu” de cada um, desde a
geração da criança, ainda no acompanhamento pré-natal, sendo reafirmado através da tão
esperada divulgação à família e amigos. Estigmatizando inconscientemente que o bebê
será do sexo masculino ou feminino, propagando expectativas na família, na escola, nas
redes sociais. Impondo cobranças acerca do que meninas e meninos precisam ou não fazer
e se comportar ao longo de suas vidas.
Estes comportamentos, por sua vez, são aceitáveis ou rejeitados dentro de
parâmetros pré-definidos hegemonicamente pelo sexo biológico, deixando claro que os
espaços geográficos são construídos a partir de uma lógica binária entre homem e mulher.
Reafirmando que os ambientes escolares são construídos dentro desta visão hegemônica,
vê-se que alunos destoantes a essa imposição o privados de espaços onde ocorrem
práticas esportivas de “meninos ou meninas”, de locais para descanso, os banheiros,
dentre outros espaços materiais da escola. Assim, a escola é composta de territorialidades
que são predominantemente “héteros”, onde os indivíduos se identificam a partir deste
índice social patriarcal
5
entre eles, ocasionando uma exclusão, mesmo que inconsciente,
dos díspares.
5
O índice social patriarcal é aqui entendido como um apanhado de indicações que levam a sociedade a ver o homem
branco, heterossexual, machista, cristão, rico, como o ápice da pirâmide social brasileira. Sendo, portanto, a posição
mais almejada, a mesma que padroniza os comportamentos, tornando-se o baluarte moral.
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Enfrentamentos e desafios da questão LGBTQIA+ na escola
Dentro de nossa sociedade, mesmo o indivíduo não se encaixando em
determinados padrões que lhe são impostos desde o nascimento, ele busca durante toda a
sua trajetória de vida uma adequação. Mostrando-se muitas vezes através de atos falhos,
por busca desta aceitação e (in)conscientes, uma forma de burlar o tecido social e se
enquadrar nestes moldes. Podendo ser através da negação de sua etnia, cor da pele,
orientação sexual, assumindo atitudes em público que negam sua sexualidade (praticando
LGBTfobia), ou até mesmo concordando com a sua descaracterização pessoal (não
assumindo a transexualidade), pois desta maneira se invisibiliza diante do opressor,
evitando confrontos que lhe possam ferir fisicamente, emocionalmente ou desestabilizar
seu status de aceitação neste arquétipo patriarcal.
Essa busca por aceitação repercute na construção de territorialidades, dentro e fora
do ambiente escolar, fazendo com que muitos dos estudantes evitem frequentar locais que
tenham uma certa frequência de utilização das pessoas LGBTQIA+, por serem quase que
exclusivos dos “homos”, ou quando em locais comuns, não querem ser vistos
acompanhados dessas pessoas, com medo de "contrair" a homossexualidade.
Dentro da concepção heteronormativa, existem expectativas como o amor
romantizado, a formação de família padronizada, expectativas de concepção da vida, que
acabam por muitas vezes sendo frustradas na realidade LGBTQIA+, pois os estudantes
que se reconhecem com sexualidades divergentes, não recebem uma educação que
trabalhe a partir de suas necessidades e realidades distintas, que fogem da polarização do
masculino e feminino.
Não se discute com frequência em sala de aula a formação de famílias
homoafetivas, os métodos de reprodução humana para pessoas do mesmo sexo, a relação
sexual de PcD (Pessoas com deficiência), dentre outras discussões que são imperativas a
realidade contemporânea. A norma padroniza e dita o comportamento a ser seguido por
homens e mulheres, inclusive determinando padrões de vestimenta, comportamento e de
ocupação do espaço, determinando condutas explícitas e/ou implícitas da boa aceitação
social.
Conforme orientado por Silva et al (2013), os indivíduos que não se rendem a esta
padronização são automaticamente excluídos ou incluídos ao grupo predominante, como
o ser exótico que deve retratar a forma errada de comportamento. O mesmo pode até se
aproximar do convívio social, porém lhe será lembrado a todo momento que este não é o
seu real lugar, pois nem todas as pessoas ali presentes expressam desejo de se aproximar,
de lhe dirigir ou permitir a fala e, ainda, se colocarão em posição de verbalizar o quanto
seu comportamento é errático ou fora de uma norma social.
Um ponto a ser destacado aqui se refere às políticas de afirmação entendidas como
parte de lutas e que têm como objetivo permitir que grupos discriminados tenham um
tratamento diferenciado para reparar as desigualdades provenientes da LGBTfobia e de
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outras formas de discriminação. Sendo de suma importância na contemporaneidade, pois
visam a busca pela equidade social, não podendo assim serem minimizadas ou excluídas,
mas sim, serem tratadas como pautas importantíssimas. Este ponto deve ser resgatado em
sala de aula, visto que historicamente as lutas sociais não buscam cessar as diferenças,
mas sim suprimir ou subjugar as desigualdades, marcas de uma sociedade democrática.
Neste sentido, acreditamos que o Ensino de Geografia tem papel fundamental e
crítico na construção dos rumos de uma sociedade que vise a equidade de relações. Onde
todos os integrantes sejam respeitados e possam exercer sua cidadania de maneira plena,
contribuindo positivamente e tendo os seus direitos preservados. Coadunando com o que
é defendido pela constituição brasileira em seu artigo 5º onde todas as pessoas são iguais
“perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade,
à segurança e à propriedade” (BRASIL, 1998, p. 13).
Como pode-se reconhecer através de brechas e de modo a respaldar a garantia de
uma educação inclusiva significativa e de qualidade, a consideração da LDB Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em seu primeiro artigo:
Art. 1º. A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na
vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino
e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas
manifestações culturais. §1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se
desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em instituições culturais.
§2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática
social. (BRASIL, Lei 9.394/96, p. 1)
Quando nos referimos às práticas sociais dentro da educação brasileira, ainda na
LDB se tem a abertura para a criação de diretrizes que trazem temas além dos abordados
nas disciplinas regulares e que não visam apenas o saber formal, que prepara o indivíduo
para o mercado de trabalho, mas sim, os que preparam para a vida social. Incluindo-se
aqui o respeito ao próximo, podendo aqui se ter a inserção dos temas de gênero e
sexualidade.
De modo geral, vê-se que a Educação é papel de todos os segmentos próximos aos
educandos, salientando-se a participação das famílias em parceria com as instituições de
ensino. Pois os jovens devem ser bem amparados e esclarecidos de seu papel na vida
social, enfatizando durante as exposições junto a eles, deverão estar preparados não
para o mercado de trabalho como para a vida social. Neste caminho, pode-se reconhecer
como positivo as orientações presentes nos PCN’s de Temas Transversais (BRASIL,
1997, p. 19) em especial no tema a seguir:
Orientação Sexual: “Define um conjunto de características anatômicas e
funcionais, a sexualidade é de forma bem mais ampla, expressão cultural. Cada
sociedade cria conjuntos de regras que constituem parâmetros fundamentais
para o comportamento sexual de cada indivíduo. Nesse sentido, a proposta de
Orientação Sexual considera a sexualidade nas suas dimensões biológica,
psíquica e sociocultural.” (BRASIL, 1997, p. 81)
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
FREITAS, Edjango Lima; FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
jul. 2020.
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Tendo como base as sugestões de abordagem do PCN, as interações cotidianas
são associadas aos conteúdos da disciplina, facilitando a apropriação do conhecimento e
fazer educacional, auxiliando na construção do pensamento crítico. Podemos ainda nos
utilizar da discussão que é feita através da Constituição Federal Brasileira de 1988, que
no seu Art. 5º, coloca que todas as pessoas são iguais: “perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”
(BRASIL, 1998, p. 13).
Um marco que deve ser citado aqui é o programa Brasil sem Homofobia (de 2004),
proveniente de discussões entre o Governo Federal e a sociedade civil organizada, tendo
como objetivo a promoção da cidadania e a garantia de Direitos Humanos para pessoas
lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBTT), que buscava uma equiparação
de direitos e o combate à violência e à discriminação por orientação sexual e de gênero e
fomentou discussões no campo educacional, propondo formações que buscavam
aprimorar a discussão e abrir um leque de metodologias didáticas que visavam lutar contra
a intolerância.
Ainda na esfera educacional, podemos destacar o Decreto 8.727/2016, que alinha
a utilização do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas
travestis ou transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e
fundacional, e impactou positivamente na educação, promovendo o respeito ao artigo 2º,
onde órgãos e entidades da administração pública, em seus atos e procedimentos,
“deverão adotar o nome social da pessoa travesti ou transexual, de acordo com seu
requerimento e com o disposto neste Decreto” (BRASIL, 2016), bem como determinado
em seu parágrafo único no qual é vedado o uso de expressões pejorativas e
discriminatórias para referir-se a pessoas travestis ou transexuais” (BRASIL, 2016). O
que cria uma ferramenta de enfrentamento dentro das diretrizes educacionais atuais, para
trabalhar a questão de orientação sexual e identidade de gênero através das leis
educacionais se torna necessário encontrar meios na legislação, dando abertura na busca
pela igualdade de direitos e respeito dos sujeitos de Orientação sexual e Identidade de
gênero que fogem da heteronormatividade.
O “Grupo de Estudos de Gênero, Sexualidade e Geografia”
No espaço escolar não é diferente, pois o mesmo é reflexo da sociedade vigente e
ainda, grande auxiliar no processo de construção dos comportamentos que serão
utilizados por gerações futuras. Assim, entende-se a possibilidade de realizar uma leitura
geográfica através das lentes do espaço vivido, observando como se desenham as
territorialidades dos sujeitos LGBTQIA+ no Ensino Fundamental, enveredando através
da Metodologia da Pesquisa-Ação, onde:
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
FREITAS, Edjango Lima; FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
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a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é
concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução
de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes
representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo
cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 1986, p. 14).
Esta forma de pesquisa que muitas vezes é praticada por professores de maneira
cotidiana, geralmente na busca pelo reconhecimento dos conhecimentos prévios dos
estudantes ou da realidade de cada lugar, escola, turma, ou seja, faz parte de uma
estratégia do pesquisador de aprimorar seu olhar. Este olhar geográfico possibilita ao
professor-pesquisador a compreensão de espacialidades e de dinâmicas socioespaciais,
como os lugares onde ocorrem práticas esportivas masculinas ou femininas,
agrupamentos de determinado gênero para rodas de conversa, brincadeiras, podendo ser
inventadas pelos sujeitos escolares ou impostas através das regras da escola. Para tanto,
pretendemos aqui sugerir uma forma de transgressão em relação a tudo aquilo que
acreditamos ser castrador, precisa-se estabelecer uma discussão necessária sobre as
construções espaciais de pessoas excluídas socialmente, como os estudantes LGBTQIA+,
negros, PcD, mulheres etc.
Visões perpetuadas de estudos eurocentrados produzidos nos “centros” de
produção de conhecimento, e que são reproduzidos no seio da estrutura educacional
brasileira, na grande maioria das redes municipais de ensino. Deste modo, uma quebra de
paradigmas indica uma educação que vislumbra os preceitos decoloniais, assim como
coloca Maldonado-Torres (2016), ao considerar o campo dos estudos étnico-raciais como
lugares na academia que:
a. investigam de forma central as dinâmicas de exclusão das formas
hegemônicas de poder, ser, e conhecer para o qual b. usam conceitos de raça,
gênero, classe, e outros marcadores da diferença humana hierárquica e
naturalizada, e que além disso c. tomam como fonte de articulação de
problemas que se plasmam em variadas expressões de conhecimento e de
expressão criativa, incluindo o trabalho intelectual, o trabalho artístico, a
mobilização social e a vida “ordinária” de comunidades de cor e que d. denota
uma orientação emancipatória ou decolonizadora no sentido de que estão
enraizados não na atitude liberal das artes liberais cuja tendência principal é a
oposição ao dogmatismo e ao cultivo da tolerância frente à diversidade, senão
uma atitude decolonial que busca o desmantelamento das formas de poder, ser
e conhecer desumanizadoras e a criação do que Frantz Fanon nomeou como o
mundo do Tu (MALDONADO-TORRES, 2016, p. 78).
Assim, tipo de atitude, de objetivo ou propósito conduz à apropriação crítica do
uso de múltiplas disciplinas e métodos, sobretudo nas ciências humanas e nas ciências
sociais, e a construir novas categorias metodológicas, formas discursivas, práticas
pedagógicas e políticas e espaços, não devem ser constructos apenas no interior da
academia, devem sim, serem pensados e situados no Ensino Básico, expressos através das
práticas pedagógicas que busquem a emancipação de todos os indivíduos, o que pode
orientar um conjunto de mudanças sociais tão necessárias na contemporaneidade.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
FREITAS, Edjango Lima; FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
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Servindo de alicerce para a geração que se encontra nos bancos escolares atuais e
que podem contribuir para uma ruptura destes índices sociais patriarcais, reconhece-se
que os sujeitos que também frequentam a escola pública são em sua grande maioria
pessoas negras, pobres e provenientes de famílias “desestruturadas”, onde a mulher negra
e por vezes LGBTQIA+ se mostra figura importante no sustento da família, permitindo
inclusive uma ruptura da alienação imposta pelo CIStema
6
colonial através da abordagem
de conteúdos na disciplina de Geografia que comunguem com a libertação dos discursos
preconceituosos e estigmatizantes que são internalizados e somatizados pelos
historicamente oprimidos.
Compreende-se aqui o espaço geográfico como toda e qualquer localidade, mais
ou menos delimitada, onde ocorrem ações e interações dos seres humanos, considerando
um entendimento de que este é “formado por um conjunto indissociável, solidário e
também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados
isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá” (SANTOS, 2006, p, 39).
Tal concepção nos leva a perceber que o mesmo se apresenta na escola com inúmeras
funções e acolhimentos, em ambiências individuais, coletivas e bivalentes. Porém, esse
tipo de leitura proporcionada pela Geografia ainda não nos contempla dentro da
percepção das disputas que possam acontecer por busca da aceitação social na faixa etária
estudada, por exemplo.
a partir da perspectiva do lugar na Geografia, percebemos que uma visão
intimista na pesquisa não contemplaria ainda as tensões que surgem na escola durante as
relações vividas no cotidiano desse ambiente. Pois conforme Yi-Fu Tuan, o lugar: [...] é
um mundo de significado organizado” (TUAN, 1983, p. 14). No caminho de nossas
práticas, o lugar/oficina pode ser entendido como uma habitação onde os indivíduos se
sentiam seguros, se apresentando de forma familiar e acolhedora quando comparado a
maioria dos ambientes da escola. Deste lugar seguro, tais sujeitos identificam uma lógica
de produção e construção territorial a partir de suas identidades homoafetivas e/ou
homoeróticas no território escolar. Experiência espacial aqui elaborada por Rogério
Haesbaert (2004), ao citar Sack (1986):
A territorialidade, além de incorporar uma dimensão estritamente política, diz
respeito também às relações econômicas e culturais, pois está “intimamente
ligada ao modo como as pessoas utilizam a terra, como elas próprias se
organizam no espaço e como elas dão significado ao lugar”. Sack afirma
também: A territorialidade, como um componente do poder, não é apenas um
meio para criar e manter a ordem, mas é uma estratégia para criar e manter
grande parte do contexto geográfico através do qual nós experimentamos o
mundo e o dotamos de significado (HAESBAERT, 2004, p. 3).
6
Aqui compreendido como o sistema social comum a todos em nossa sociedade, porém sendo aquele que habitualmente
favorece as pessoas cisgênero em detrimento de pessoas LGBTQIA+. Segundo Viviane Vergueiro Simakawa (2015):
A corruptela ‘cistema’, entre outras corruptelas do tipo, têm o objetivo de enfatizar o caráter estrutural e institucional
‘cistêmico’ – de perspectivas cis+sexistas, para além do paradigma individualizante do conceito de ‘transfobia’.
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FREITAS, Edjango Lima; FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
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Essa afirmação encontra força através das experiências vividas por alunos e
expressas em suas falas, se estruturando durante a pesquisa com o que nomeamos como
“Grupo de Estudos de Gênero, Sexualidade e Geografia”
7
, que visava estimular a
apropriação e circulação de conhecimentos de sujeitos LGBTQIA+ nos espaços coletivos
da escola, pois os saberes produzidos por estes grupos historicamente discriminados, além
de serem contra-discursos, “são lugares de potência e configuração do mundo por outros
olhares e geografias” (RIBEIRO, 2017, p. 43). Tal grupo abrigava conjuntamente uma
oficina pedagógica e um grupo de estudos, que com o passar do tempo se tornaria um
território de resistência, promissor para o engajamento na luta pela igualdade, criando
“um poder de recusa às opressões".
Figura 03: Momentos da oficina
Fonte: Os autores
(2019)
Figura 04: Cartaz com a temática Geografia, Gênero e Sexualidade
7
O mesmo é composto por um grupo de alunos(as) que se identificam como LBGTQIA+ e/ou aqueles que simpatizam
com sua aceitação. Por trabalharmos com uma faixa etária compreendida entre dez e dezesseis anos, leva-se em conta
as distorções idade e ano escolar, momento que os indivíduos iniciam a vida escolar.
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FREITAS, Edjango Lima; FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
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Fonte: Acervo dos autores (2019).
Entre as questões postas no coletivo, se a invisibilidade e a negação de Direitos,
visando compreender de que maneira as diretrizes educacionais foram pensadas para
atender a necessidade de acolhimento das diferenças de gênero e orientação sexual no
contexto escolar, facilitando, assim, a edificação de uma escola que esteja aberta a todas
as pessoas e garanta não o aprendizado, mas também a visibilidade, o respeito, a
segurança e o direito à espaços por este grupo tão fragilizado socialmente. A
invisibilização se de modo oposto a qualquer aceitação quanto aos diferentes,
sofrimento, de não ser quem é, horror, de amar e não ser compreendido, cólera, de ser
desigual e não compreender porque “Deus me fez assim?”.
Tais questões nos levam a debater e estudar a noção de Direitos Humanos, visto
que refletem conquistas advindas da luta por melhores oportunidades de vida para as
pessoas em geral, que vem de tempos longínquos da vida em coletividade e que
permanecem necessários na contemporaneidade. Tais direitos emergem com o advento
do Estado Moderno e a consequente superação da sociedade estamental, além do
surgimento de um modelo de sociedade individualista, em que os direitos humanos
passaram a ser garantidos formalmente, com esteio em Declarações e outros documentos
produzidos ao longo da construção do Estado-Nação. Para tanto, sabemos que os Direitos
Humanos são universais, provenientes de conquistas históricas, que são interdependentes,
indivisíveis e inalienáveis:
A universalização e abrangência dos Direitos Humanos vão se dar a partir do
fim da 2ª Guerra Mundial devido ao aumento da quantidade de bens
merecedores de tutela; a extensão da titularidade de alguns direitos humanos
típicos a sujeitos diversos do homem individual, os direitos da coletividade.
Daí por diante, surgiram, gradativamente, diversas declarações de direitos
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
FREITAS, Edjango Lima; FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
jul. 2020.
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humanos destinados às minorias e categorias de pessoas, como da criança, do
doente mental, do doente físico, da mulher etc (ROBERTO XAVIER;
XAVIER; VASCONCELOS, 2018, p. 22).
Garantindo a dignidade humana independentemente da cor de pele, sexo, gênero,
sexualidade, credo ou outra alteridade. Sendo esses direitos que preservam a humanidade,
responsáveis por amparar os demais. Tornando-se imprescindível que os Direitos
Humanos sejam trabalhados nos espaços educacionais garantindo ainda os direitos: civis,
políticos, sociais, econômicos e culturais, visando garantir liberdade, igualdade e
convivência harmônica em todo o corpo social. Em sua base, tais direitos deveriam
atender todas as pessoas, dignificando o ser humano em uma forma geral, porém, na
prática sabe-se que não são inseridos na sociedade de forma que atendam a necessidade
daqueles que sempre foram excluídos, como as mulheres e os LGBTQIA+.
Reconhecidamente, desde as primeiras expressões feitas sobre Direitos Humanos,
temos uma supervalorização do que seriam os cidadãos de primeira grandeza, que aqui
entende-se como a imagem do patriarcado, ou seja, o homem branco, rico, heterossexual
e cristão. Sendo sempre colocado como o ápice da pirâmide social (aqui no caso
brasileiro) deixando a mulher e todos aqueles que não se encaixam neste padrão,
subalternizados.
Questionamentos devem ser feitos sob os tão apregoados direitos à liberdade,
igualdade e fraternidade. Estes são questionáveis pois colocam em xeque a tão almejada
universalização, que, em nuances, esconde a exclusão. Estes direitos que se colocam
como humanos, na prática, devem nascer e imbuir todos os indivíduos, precisam tratar as
pessoas de maneira geral, de forma igual, respeitando-os em toda a sua plenitude e mais
ainda, devem universalizar a abrangência de sua atuação, incluindo aqueles que precisam
ser amparados além dos padrões sociais almejados.
Tedeschi e Colling (2014), ao construírem a discussão sobre a universalização dos
direitos do cidadão, consideram que todos os indivíduos da espécie humana devem ter
seus verdadeiros direitos reconhecidos em abrangência, pois quem vota contra o direito
do outro, abjura os seus próprios direitos. Essa afirmação inclui todas as pessoas, de todos
os sexos e orientações sexuais, etnias, deficiências, religiosidade, condição
socioeconômica, dentre outras variações cabíveis aos seres humanos, pois a humanidade
é assim, rica em diversidade.
É preocupante e necessária nossa atenção (após tantas discussões seculares sobre
dignidade humana) para as motivações e agenciamentos que se evidenciam no cenário
político brasileiro (e mundial) e que revelam um retrocesso tão acelerado sobre os direitos
das minorias e a invisibilização da voz da população LGBTQIA+. Tal situação se vale da
naturalização de preconceitos e de discursos replicados por meio das redes sociais para
sua ampliação, tentando neutralizar através de discursos de ódio a diversidade de
conhecimentos e o histórico de lutas pelo reconhecimento da igualdade de direitos.
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invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
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Assim, torna-se imperativo que a luta das minorias continue e não seja silenciada
pela elite dominante, para se fazerem ouvir e respeitar. Neste sentido, acreditamos que a
Educação tem papel fundamental na formação crítica para a construção dos rumos futuros
de uma sociedade que vise a equidade de relações, onde todos seus sujeitos sejam
respeitados e possam exercer sua cidadania de maneira plena. De modo a contribuir
positivamente e tendo os seus direitos preservados, coadunando com discussões que
prezem pela interseccionalidade e o reconhecimento das formas de opressão, o que
implica que:
Precisamos de novas categorias de análise que incluam raça, classe e gênero
como estruturas de opressão distintas, mas imbricadas. Aderir a comparações
e hierarquizações de opressões o proverbial “sou mais oprimido que você” –
nos prende em uma perigosa dança em que competimos por atenção, recursos
e supremacia teórica. Ao invés disso, sugiro que examinemos nossas diferentes
experiências dentro da mais fundamental relação de danação e subordinação
(COLLINS, 2015, p. 14-15).
Os destinos sociopolíticos das pessoas não devem ser traçados baseados no
capacitismo, na xenofobia, racismo, biologia, ou discriminação qualquer, que venha a
naturalizar a exclusão de indivíduos devido ao preconceito. Desta maneira, a sociedade
em geral deve ter cuidado para que as práticas discursivas condizem com as leis que
protegem os Direitos Humanos e mais ainda, devem cobrar uma postura de seus
representantes políticos para um futuro sem qualquer tipo de preconceito.
Tais questões devem orientar a construção de uma escola que aceite o diferente, e
motive a busca pela educação para a igualdade e pelo reconhecimento da alteridade, se
pautando na constituição de relações fundadas no “respeito entre aqueles(as) que estão
nesse espaço, as quais devem primar pelo reconhecimento do outro como agente e sujeito
de uma prática pedagógica transformadora” (VENCATO, 2014, p. 19).
Considerações Finais
Falar sobre as territorialidades e a invisibilidade das temáticas LGBTQIA+ na
Educação e no ensino de Geografia, é a continuidade de lutas e a ampliação de um debate
que deve ser ampliado, considerando que novas gerações de estudantes trazem consigo
além de suas dúvidas, questionamentos e violências vividas, uma bagagem repleta de
informações e de conhecimento assentado no resistir. Isto implica que a escola e a
Educação devam considerar os sujeitos escolares (dentro e fora dos muros das instituições
de ensino) não somente como seres vivos e pensantes, mas como seres de direitos, de
afetos, de cidadania, de sonhos e merecedores de empatia.
Partindo da premissa de que a escola abriga experiências e territorialidades
diversas, em especial dos sujeitos que a vivem cotidianamente, nos parece em uma
primeira mirada que o corpo (e os corpos) ficou fora da escola, que não adentrou seus
portões, reflexo de teorias educacionais, cursos de formação docente insuficientes para
pensar o estudante em sua totalidade, como se a norma fosse aquela da separação entre
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corpo e mente. Nesta perspectiva é que entendemos que a Geografia (e seu ensino) é um
conhecimento por excelência que viabiliza a entrada do corpo na escola, entendendo que
o reconhecimento da corporeidade como agente produtor de espaços geográficos,
implicam também na produção de lugares de luta, de resistência, refúgios onde pode se
dar a compreensão de sua identidade de gênero, bem como de transposição e dissolução
de fronteiras no interior do território escolar.
Novamente, pautamos a importância do reconhecimento do corpo nesta Geografia
escolar almejada, e a necessidade de pensarmos em uma prática escolar que viabilize o
reconhecimento das identidades de Gênero e das sexualidades como parte da escola, como
visto por exemplo, no reconhecimento pelos estudantes de territorialidades hostis na
escola em localidades específicas como banheiros, sala de aula, pátio ou de forma
generalizada, ampliada por uma reflexão sobre a relação entre espaço e poder através de
padrões normativos, reflexo de comportamentos excludentes que predominam na
sociedade patriarcal, que exclui sistematicamente a mulher, o povo negro, os deficientes
e o povo LGBTQIA+.
Assim, reconhecemos as inúmeras armadilhas e enfrentamentos que esta questão
apresenta aos professores, como na ênfase ao pluralismo cultural quando trabalhado a
temática Brasil, que de fato não reconhece grande parcela dos sujeitos presentes em salas
de aula e escolas públicas. A partir destes questionamentos, resta a nós professores a
criação de estratégias e de modos de ensinar/aprender fundados na luta contra essas
exclusões, considerando uma educação que permita a ampliação de entendimento destes
estudantes como sujeitos ativos na sociedade, que compreendam sua vida e o mundo que
os envolve (com suas mazelas e práticas excludentes).
Referências bibliográficas
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
BRASIL. Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016. Dispõe sobre o uso do nome social
e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito
da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil. Brasília, 28 abr. 2016. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/decreto/d8727.htm>.
Acesso em: 20 de março de 2021.
BRASIL. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União, 24 dez.
1996. Disponível em:<portal.mec.gov.br/arquivos/pdf>. Acesso em: 20 mar. 2021.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Pluralidade Cultural e Orientação sexual. Secretaria de Ensino Fundamental: Brasília:
Ministério da Educação, 1997. 164 p.
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
FREITAS, Edjango Lima; FERNANDEZ, Pablo Sebastian Moreira. TERRITORIALIDADES LGBTQIA+ EM UMA ESCOLA:
invisibilidades e estratégias de resistência a partir do ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 8, nº 17, pp. 45-68,
jul. 2020.
Submissão em: 28/11/2021. Aceito em: 17/07/2022.
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ENSAIOS DE GEOGRAFIA
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Submissão em: 28/11/2021. Aceito em: 17/07/2022.
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