Na noção de transindividualidade de Chiara Bottici (2020) e na noção de
corpo de Joseli Silva (2013) rezam intersecções para abertura de um feminismo,
ou mesmo sustentações teóricas para as Geografias (trans)Feministas, que se
proponha a desessencialização e desnaturalização das condições dos corpos
referindo aos três traços analíticos de Viviane Vergueiro (2018) da cisgeneridade
como possibilidade para os estudos decoloniais, sendo eles: 1) a pré-
discursividade, 2) a binariedade e 3) a permanência.
Compreende-se em uma análise pluri-sistêmica que o corpo, tido como
vocativo de sexo, raça, gênero e sexualidade, é sinônimo de coisa que deve ser
econômica-político-culturalmente normatizada, regulada, disciplinada nos
interesses de dominação, tendo fins coercitivos aos sujeitos-coletivizados. A
ideia de corporeidade, reforçando a mutabilidade e movimento de apropriação
e dotação de significado dos corpos, é oportuna para pensar que se, para
aqueles — ou aquele, em termos anarquistas, o Estado — que exercem a
dominação jurídico-política (aqui entendo legitimação por/através de meios
institucionais) ou através do terror/do medo, passam a “inspirar identificação
(positiva) e a efetiva apropriação” (HAESBAERT, 2007, p. 20), por outro lado, para
aqueles e aquelas que se concentram no outro pólo desse exercício (do poder),
isto é, o das resistências, criar-ão formas criativas de também se apropriar do
espaço/corpo.
A multidimensionalidade de opressões se apropriam dos corpos em suas
diferenças, e, juridicamente, legislativamente, punitivamente, disciplinarmente
tentam normatizá-los para inserir/excluir de uma economia/epistemologia
política de exploração/espoliação. Ou seja, os compreendemos, neste sentido,
o corpo como espaço apropriado e significado em relações de poder, como
corp(a)s-territórios.
Como afirma Rogério Haesbaert (2007) existe uma complexidade de
territorializações, neste sentido, há múltiplas territorialidades que se interpõem,
seja por justaposição ou por sobreposição. Assim, no movimento, essa
complexa teia de territórios/territorialidades não acontece no estático e inerte,
mas inter-agem em movimento. Até mesmo porque a territorialização é um
processo. Assim, esse movimento e multiplicidade “inclui a vivência
concomitante de diversos territórios - configurando uma multiterritorialidade,
ou mesmo a construção de uma territorialização no e pelo movimento”
(HAESBAERT, 2007, p. 20).