Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
ASSIS, Kamilly Antunes de; RIOS, Gabriela Leal. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 9, nº 19, pp. 87-116, ago-dez de 2022.
Submissão em: 11/05/2022. Aceito em: 13/12/2022
ISSN: 2316-8544
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súbito “esvaziamento” da paisagem, promoveram discursos semelhantes. Enquanto
centralidade, porém não como foco para o poder público e para o direcionamento de
investimentos em infraestrutura pública, aparecem falas de deterioração e incapacidade
estrutural do local em acolher todas aquelas práticas.
Simultaneamente, após os processos de descentralização e esvaziamento do centro, a
mesma questão aparece agora, porém, na forma não apenas do abandono do Estado, mas
também do abandono popular.
À medida que a Capital crescia na direção Sul, esse bairro foi ficando esquecido pelos
poderes públicos. Hoje, até mesmo os que vivem em Vila Velha, Cariacica e Viana
sentem um impacto bastante negativo quando, na entrada de Vitória, voltam o olhar
atentamente para aquele amontoado de casas sujas, mal cuidadas, dando a ideia de
algo abandonado pelos proprietários e pelo poder público” (A GAZETA, 2014, p. 17)
As mudanças da ordem da expansão urbana impuseram aos comerciantes a demanda
por uma adaptabilidade. Dessa forma, os discursos se remodelam e passam a trazer a ideia de
valorização através da tradicionalidade na forma de comercializar, e a Vila se torna, a partir
disso, referência enquanto um patrimônio local de cultura popular. Como coloca Matos (2011),
o comércio da Vila Rubim se mostrou um espaço de resistência, diante dos novos padrões de
consumo, “nele, o que é vendido, a forma como se dá o ato de vender e as formas espaciais
antigas onde se vende se diferenciam do que hoje é difundido e, portanto, comum em outras
porções da cidade.” (p. 72). A paisagem se valoriza, com o tempo, contrariando a valorização
através da aparência ou de sua estética, mas através do simbolismo que se traduz no ato de
habitá-la e participar de sua composição e construção cotidiana.
(...) o Mercado da Vila Rubim, centro da Capital, viveu época de glamour seguidos
de anos de decadência. E hoje? “Ela tem alma”, responde com sabedoria Alice Ramos,
75 anos, frequentadora assídua do mercado e moradora da área há mais de 40 anos.
(...) O visual na Praça chega a receber inclusive críticas dos próprios barraqueiros
“Isto é feio demais. Mas a prefeitura parece não ter interesse em ajudar os pequenos
comerciantes”, lamentou Agnaldo Gonzaga dos Santos, que vende rapadura, melado
de cana, pimenta e colorau moídos na hora, mel dentre outros produtos. As barracas
mantém muitos produtos tradicionais “Aqui temos bucha para banho, aquele que tira
a caraca do corpo, temos pimenta da roça que arde até a alma, queijo curado e a cura
para muitas doenças, que são as ervas medicinais”, orgulha-se o presidente da
Associação dos Barraqueiros da Praça Manuel Rosindo da Silva, Benedito Sales
Rodrigues, dono de uma das barracas que vendem ervas. (A GAZETA, 1997, 1-7, p.
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