Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SOUSA, Everthon Cosme de; BASTOS, Rafael Schneider. ADEMAFIA E O SANTO AMARO: transformação social a partir do skate e da
mobilização popular. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 9, nº 20, pp. 64-94, janeiro-abril de 2023.
Submissão em: 03/06/2022. Aceito em: 31/01/2023
ISSN: 2316-8544
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quase colapso das infraestruturas físicas na região, com o acesso à Zona Sul se tornando um
problema, o que complicava ainda mais a vida dos trabalhadores (ABREU, 2006).
Para contextualizarmos o processo de ocupação da comunidade do Santo Amaro, é
essencial que analisemos as mudanças no cenário político e econômico do município do Rio de
Janeiro de maneira geral. No século XIX, o local onde hoje se localiza o Catete teve um
adensamento populacional com a vinda de imigrantes, serviços e comércios dos mais variados,
o que atraiu a população de alta renda e de status, como políticos e artistas. Em 1897 o Palácio
do Catete se tornou a sede do governo federal, transformando o local em um importante centro
político e socioeconômico do país. Contudo, na década de 1960, com a sede do poder executivo
sendo transferida para Brasília, junto com a transferência da capital, o local entrou em
decadência – com a desvalorização dos imóveis, esfriamento das atividades econômicas e saída
de parte da população de alta renda para outras localidades. Para piorar, as obras vinculadas à
expansão das linhas de metrô na cidade acarretaram em mais prejuízos para o bairro:
Antes caminhos fundamentais para a zona sul, as ruas do Catete, Pedro Américo e
Bento Lisboa tornam-se apenas vias de acesso opcionais, fato que muitos moradores
perceberam como sinal de perda de importância do bairro na cidade.(...) Para culminar
entre 1975 e 1981, as obras de construção do metrô impõem um cotidiano caótico ao
Catete: enormes buracos foram abertos nas calçadas, o trânsito foi desviado em vários
trechos, 55 casas, além de uma escola e a estação de bondes do Largo do Machado,
foram demolidas; outras tantas casas foram desapropriadas; muitas lojas comerciais
fecharam (CARVALHO, 2007, p. 13 apud SILVA; LIMA, 2015, p. 42).
As favelas do Rio de Janeiro, não apenas hoje, mas desde o início, sempre sofreram com
a estigmatização do espaço, tendo a sua imagem projetada como algum tipo de perigo social
para a sociedade, em especial para a burguesia – pensamento muito relacionado à questão de
cor, atingindo principalmente o negro favelado.
Conforme nos lembra Campos (2005), tanto a favela quanto a criminalização dos mais
pobres deve ser contextualizada com a história socioespacial da cidade, já que ao longo desse
processo, fica evidente que os interesses dos grupos socialmente dominantes sempre estiveram
por trás da segregação espacial imposta a esses segmentos sociais, seja por meio do uso das
forças repressoras do Estado, ou por meio das muitas legislações segregacionistas de caráter
econômico e etnorracial. Estas eram respaldadas, na época, pelos discursos jornalísticos,