Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
LEÔNCIO, Érica Milena Carvalho Guimarães; SILVA, Gabriel Rodrigues da; SILVA, Alexsandro Ferreira Cardoso da. A TRIBUTAÇÃO
IMOBILIÁRIA E SUAS OMISSÕES NA POLÍTICA URBANA:
um estudo de caso da Região Metropolitana funcional de Natal. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 22, pp. 60-78, setembro-dezembro
de 2023.
Submissão em: 27/06/2023. Aceito em: 28/08/2023.
ISSN: 2316-8544
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SEÇÃO ARTIGOS
A TRIBUTAÇÃO IMOBILIÁRIA E SUAS OMISSÕES NA POLÍTICA URBANA:
um estudo de caso da Região Metropolitana funcional de Natal
REAL ESTATE TAXATION AND ITS OMISSIONS IN URBAN POLICY:
a case study of the Functional Metropolitan Region of Natal
LA TRIBUTACIÓN INMOBILIARIA Y SUS OMISIONES EN LA POLÍTICA
URBANA:
un estudio de caso de la Región Metropolitana Funcional de Natal
Érica Milena Carvalho
Guimarães Leôncio1
Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN),
Rio Grande do Norte, Brasil
e-mail: ericah.guima@gmail.com
Gabriel Rodrigues da Silva2
Universidade Federal Fluminense
(UFF),
Rio de Janeiro, Brasil
e-mail: garodrigues@id.uff.br
Alexsandro Ferreira Cardoso da
Silva3
Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN),
Rio Grande do Norte, Brasil
e-mail:
alexsandroferreira@hotmail.com
Resumo
Este trabalho faz uma análise da tributação imobiliária sob a perspectiva da recaptura de mais-valias urbanas e a
falta de efetividade dos instrumentos previstos na legislação urbanística. Além disso, propõe-se a investigar a
relação entre a arrecadação de tributos imobiliários (IPTU e ITBI) e o investimento em infraestrutura urbana, que
tem o potencial de valorizar o solo urbano. O recorte espacial adotado foi a Região Metropolitana de Natal
funcional, composta pelos municípios de Natal, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante, Macaíba e Extremoz.
Esses municípios possuem uma dinâmica imobiliária acentuada e estão em processo de expansão urbana, mas
carecem de um planejamento urbano que se conecte com a gestão tributária municipal e que possibilite a
distribuição mais igualitária dos benefícios dessa arrecadação. Nesse sentido, reflete-se sobre a capacidade de
enfrentar os desafios históricos que as cidades possuem para captar recursos voltados aos investimentos públicos
em infraestrutura urbana. Por fim, buscou-se compreender como a tributação imobiliária pode ser utilizada em
prol do financiamento urbano, de modo a contribuir com a perspectiva do Direito à Cidade pelo viés da justiça
urbana, articulada com a capacidade de investimento e de financiamento das cidades por meio de impostos
incidentes sobre a propriedade privada já consolidados, que possuem também funções extrafiscais.
Palavras-chave
Tributação Imobiliária; Política Urbana; Região Metropolitana de Natal
1
Advogada, com Licenciatura em Geografia. Mestra e doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos
Urbanos e Regionais UFRN.
2
Graduado em Geografia. Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos Urbanos e Regionais UFRN e
doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia UFF.
3
Arquiteto e Urbanista, Professor Adjunto do Instituto de Políticas Públicas UFRN e do Programa de Pós-
Graduação em Estudos Urbanos e Regionais UFRN. Doutor e Mestre em Arquitetura e Urbanismo UFRN.
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Abstract
This study analyzes real estate taxation from the perspective of capturing urban land value increments and the lack
of effectiveness of the instruments provided in urban legislation. Additionally, it aims to investigate the
relationship between the collection of property taxes (IPTU and ITBI) and investment in urban infrastructure,
which has the potential to enhance urban land value. The chosen spatial scope is the functional Metropolitan
Region of Natal, comprised of the municipalities of Natal, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante, Macaíba, and
Extremoz. These municipalities experience significant real estate dynamics and are undergoing urban expansion,
yet they lack urban planning that aligns with municipal tax management and enables a more equitable distribution
of the benefits derived from this revenue. In this regard, it reflects on the capacity to address the historical
challenges that cities face in capturing resources for public investments in urban infrastructure. Finally, the study
sought to understand how real estate taxation can be utilized to finance urban development, contributing to the
perspective of the Right to the City through the lens of urban justice, integrated with the capacity for investment
and financing of cities through established taxes on private property, which also serve non-fiscal purposes.
Keywords
Real Estate Taxation; Urban Policy; Metropolitan Region of Natal.
Resumen
Este trabajo realiza un análisis de la tributación inmobiliaria desde la perspectiva de la captura de plusvalías
urbanas y la falta de efectividad de los instrumentos previstos en la legislación urbanística. Además, se propone
investigar la relación entre la recaudación de impuestos inmobiliarios (IPTU e ITBI) y la inversión en
infraestructura urbana, que tiene el potencial de valorizar el suelo urbano. El recorte espacial adoptado fue la
Región Metropolitana de Natal funcional, compuesta por los municipios de Natal, Parnamirim, São Gonçalo do
Amarante, Macaíba y Extremoz. Estos municipios experimentan una dinámica inmobiliaria marcada y están en
proceso de expansión urbana, pero carecen de una planificación urbana que se conecte con la gestión tributaria
municipal y permita una distribución más equitativa de los beneficios de esta recaudación. En este sentido, se
reflexiona sobre la capacidad para enfrentar los desafíos históricos que las ciudades tienen para captar recursos
destinados a inversiones públicas en infraestructura urbana. Por último, se buscó comprender cómo la tributación
inmobiliaria puede utilizarse en beneficio del financiamiento urbano, contribuyendo a la perspectiva del Derecho
a la Ciudad desde el enfoque de la justicia urbana, articulada con la capacidad de inversión y financiamiento de
las ciudades a través de impuestos incidentes sobre la propiedad privada ya consolidados, que también tienen
funciones extratributarias.
Palabras-clave
Impuestos Inmobiliarios; Política Urbana; Región Metropolitana de Natal.
Introdução
Este trabalho tem como escopo a preocupação em relação ao financiamento próprio das
cidades, reconhecendo que é impossível implementar políticas públicas urbanas sem fontes
sustentáveis de investimento. A partir dessa premissa, realizamos uma análise da inclusão
imobiliária urbana, com o objetivo de explorar o potencial de capturar mais-valias urbanas. Em
outras palavras, examinamos os controles legais que permitem que parte dos lucros excedentes
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provenientes da atividade imobiliária seja reinvestida em prol da coletividade (Smolka;
Amborski, 2000).
As cidades, especialmente as latino-americanas, enfrentam desafios históricos na
adoção de mudança que possibilitam a recuperação de investimentos públicos e privados
envolvidos na valorização do ambiente construído. No entanto, a literatura sobre o assunto
ressalta a importância de implementar políticas públicas que priorizem instrumentos de
arrecadação tributária, fiscal e financeira, direcionando os recursos para projetos de
desenvolvimento urbano prioritários (Smolka, 2013).
Diante disso, este artigo oferece uma contribuição reflexiva diante da ineficácia dos
instrumentos alcançados no Estatuto das Cidades e nos Planos Diretores. O objetivo geral do
trabalho é identificar a relação entre a arrecadação dos tributos imobiliários, a valorização do
solo e a distribuição coletiva de equipamentos e serviços voltados para o desenvolvimento
urbano na Região Metropolitana de Natal funcional (RMNatal). Essa região é caracterizada por
um alto grau de conurbação e de integração das funções urbanas, com isso, o artigo se dedicará
a esses municípios como recorte espacial de estudo, são eles: Natal; Parnamirim; São Gonçalo
do Amarante; Macaíba; e Extremoz. Embora a Região Metropolitana de Natal (RMNatal)
apresente uma notável atividade imobiliária, seus municípios ainda enfrentam a carência de um
planejamento urbano que esteja integrado à gestão tributária municipal e que permita uma
distribuição mais equitativa dos benefícios provenientes da arrecadação de impostos.
Nesse contexto, promovemos uma reflexão sobre a capacidade de enfrentar os desafios
históricos que as cidades, especialmente em áreas metropolitanas, enfrentam ao buscar recursos
para investimentos em infraestrutura. Observamos que, no cenário atual de tendência
ultraliberal, háa redução ou o retrocesso na implementação de instrumentos de gestão social do
solo urbano; em seguida, retomamos o debate sobre o financiamento urbano local despertando
elementos de participação social. Os municípios metropolitanos da RMNatal funcional são
dependentes de transferências governamentais para obter recursos e precisam explorar novas
alternativas para superar a restrição de investimentos, devido à falta de uma estrutura de política
urbana mais centralizada e focada por parte do Governo Federal.
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Por outro lado, a propriedade imobiliária, na maioria das cidades, é frequentemente
marcada por gestões ineficientes, que negligenciam amplamente a capacidade de recuperação
de mais-valias urbanas por meio de impostos como o Imposto Predial e Territorial Urbano
(IPTU) e o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI). Como resultado, a grande
maioria da população urbana permanece à mercê dos efeitos prejudiciais de uma distribuição
causada pelos benefícios decorrentes da urbanização.
O que se observa comumente é que os recursos provenientes das transferências
intergovernamentais e da arrecadação do IPTU e do ITBI podem ser direcionados para áreas
urbanas valorizadas, ocupadas por setores de renda média, geradas na falta de um efeito
redistributivo na cidade. No entanto, quando esses tributos são geridos de forma adequada,
contribuem para o reconhecimento do seu potencial pedagógico de contestação e de resistência.
Ao serem cobrados de forma justa e alocados nas áreas mais carentes de infraestrutura, eles têm
o potencial de reduzir as desigualdades socioespaciais e de promover uma maior consciência
cívica e de participação na comunidade.
Dessa forma, a questão inicial que surge é: como que os impostos imobiliários (IPTU e
ITBI) podem contribuir para que o município gere uma receita própria, tornando-se uma fonte
de investimento na cidade? Isso permitiria financiar obras de infraestrutura e equipamentos
coletivos que beneficiam a população local, ao mesmo tempo em que se cumprem objetivos
como a efetivação da função social da cidade e da propriedade, além de garantir o direito à
cidade para a população, como padrão pela Reforma Urbana e numa visão mais ampla.
Financiamento das cidades: os desafios para a efetivação da reforma urbana e do direito
à cidade
A compreensão do direito à cidade enquanto um direito humano é um conceito
relativamente recente nas sociedades contemporâneas. Ele surgiu na década de 1960, na obra
do pensador francês Henri Lefebvre, que o definiu como o direito à vida urbana, transformada,
renovada [...], o lugar do encontro e a prioridade do valor de uso (Lefebvre, 2001, p. 118). Ao
longo do final do século XX, o direito à cidade foi oficialmente reconhecido em várias cartas e
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tratado internacionalmente, passando a ser reivindicado nas Constituições e legislações
nacionais, à medida que se tornou evidente a necessidade de buscar uma qualidade de vida
urbana igualitária para todos os habitantes das cidades.
No contexto brasileiro, a questão urbana emergiu durante as Reformas de Base na
década de 1960. De acordo com Luiz Cesar Ribeiro (2018), essa questão foi parte de uma
estratégia para promover o desenvolvimento nacional e romper com a dinâmica de crescimento
e pobreza prevalecente. Nesse sentido, a dimensão urbana desse projeto foi marcada pelo rápido
crescimento industrial e pelas precárias condições urbanas resultantes do êxodo de mais de 30
milhões de pessoas do campo para as cidades. Essas cidades passaram a ser compreendidas
como produtos e replicadoras do nosso padrão periférico de desenvolvimento capitalista,
caracterizadas pela concentração de riqueza e de exclusão social (Ribeiro, 2018, p. 39).
No debate sobre a Reforma Urbana, vários aspectos são fundamentais. Isso inclui a
gestão social do solo, que busca regular de forma pública a produção do ambiente construída,
desmercantilizando-o. Além disso, destaca-se a necessidade de inverter as prioridades na
alocação dos recursos públicos, direcionando-os, principalmente, para as despesas sociais, e de
buscar a universalização do bem-estar urbano através da democratização do acesso aos serviços
e equipamentos coletivos. Para isso, são necessárias reformas na gestão democrática da cidade
e na redistribuição dos custos da urbanização, incluindo mudanças no âmbito do poder
executivo municipal, visando a implementação de um novo modelo de políticas públicas que
atendam às demandas sociais (Ribeiro, 1994).
No que diz respeito ao Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257/01), a realidade não é
diferente: mais de 20 anos após a sua aprovação, percebe-se a dificuldade enfrentada pelos
municípios na implementação de seus instrumentos. Santos (2017) aponta uma das
dificuldades, que reside no fato de que, a partir da Constituição Federal de 1988, os municípios
foram reconhecidos como entes federativos, porém, suas especificidades, como o tamanho e
sua integração na rede urbana, não foram levadas em consideração.
Ainda que tenham ocorrido avanços nos últimos 30 anos, é comum constatar a
subutilização dos instrumentos urbanísticos, tributários e jurídico-políticos pelas prefeituras.
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Esses instrumentos têm o potencial de aumentar a arrecadação local, porém, devido à falta de
modernização da base tributária e à falta de ênfase na gestão social do solo urbano, não são
plenamente aproveitados.
Com o objetivo de abordar a questão do financiamento das cidades latino-americanas, a
Agence Française de Développement (AFD), o Instituto de Pesquisa Aplicada (IPEA) e a
Fundação Ciudad Humana realizaram um estudo específico em 2014 que aponta, no contexto
de restrições financeiras, para o desafio enfrentado pelos gestores urbanos em utilizar uma
variedade de instrumentos de financiamento para implementação de suas políticas (Cavé et al.,
2014).
A arrecadação de uma parcela das mais-valias decorrentes do desenvolvimento urbano
deve ser reconhecida como uma fonte crucial de financiamento para as cidades e pode ser
aplicada de várias maneiras, seja através de um imposto predial e territorial urbano (IPTU), que
incide de forma estável e recorrente, ou por meio de cobranças pontuais. No entanto, em cidades
brasileiras com mais de 500 mil habitantes, a arrecadação de IPTU representa apenas 10% das
receitas totais. De maneira geral, nos países da América Latina, a cultura fiscal ainda é
considerada frágil e a compreensão da contraprestação de impostos territoriais na troca de
serviços públicos de qualidade não está plenamente estabelecida na opinião pública, devido a
obstáculos como a desigualdade de renda, a alta informalidade, a diversidade dos regimes
fundiários e os padrões de ocupação do solo (Cavé et al, 2014).
Ermínia Maricato (2015) enfatiza a importância da Reforma Tributária como um
elemento crucial para alcançar a Reforma Urbana, uma vez que está relacionada a instrumentos
que visam promover a justiça social. Entre esses instrumentos, destaca-se a necessidade de de
atualização regular dos valores das plantas genéricas para a cobrança do Imposto Predial e
Territorial Urbano (IPTU), a fim de capturar de forma precisa a preservação imobiliária. Além
disso, a possibilidade de implementar a cobrança progressiva de impostos sobre terrenos
ociosos desempenha um papel fundamental na redução da especulação imobiliária.
De acordo com Nabil Bonduki (2018), é essencial promover o protagonismo municipal
na formulação da política urbana. Para superar os desafios políticos locais relacionados ao
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cumprimento da função social da propriedade, é necessária uma atuação governamental federal
que exija uma agenda mínima a ser incluída nos planos diretores e implementados pelos
municípios. Nesse sentido, os municípios devem efetivamente praticar as ferramentas
protegidas no Estatuto da Cidade, em consonância com seus Planos Diretores e Leis Orgânicas,
a fim de recuperar as mais-valias urbanas e redistribuí-las de maneira mais equitativa entre as
diversas camadas sociais e áreas da cidade, especialmente nas regiões mais carentes de
infraestrutura e de serviços urbanos. Isso criará as condições necessárias para garantir uma boa
qualidade de vida urbana para todos os cidadãos.
Região Metropolitana de Natal: uma breve caracterização
A formação inicial da Região Metropolitana de Natal teve início na década de 1970,
quando começou a ser identificado o processo de metropolização, evidenciado por diversos
fenômenos metropolitanos, como a conurbação e o transbordamento. No entanto, somente por
meio da Lei Complementar Estadual n°152, de 16 de janeiro de 1997, a Região Metropolitana
de Natal (RMN) foi oficialmente estabelecida, inicialmente com a inclusão de seis municípios
(Natal, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante, Extremoz, Macaíba e Cea-Mirim).
Atualmente, a RMN é composta por 15 municípios
4
, conforme ilustrado na Figura 1
(Clementino et al., 2019).
A Região Metropolitana de Natal abrange municípios com diferentes graus de
urbanização e de integração, resultando em dinâmicas mais articuladas em alguns (Natal,
Parnamirim, Macaíba, São Gonçalo do Amarante e Extremoz) e menor grau de integração em
outros municípios no contexto da dinâmica metropolitana (Ceará-Mirim, São José do Mipibu,
Nísia Floresta, Monte Alegre, Vera Cruz, Maxaranguape, Ielmo Marinho, Arês, Goianinha e
Bom Jesus).
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2020), a Região
Metropolitana de Natal (RMN) abrange uma área territorial de 3.683,74 km², representando 7%
4
A RMNatal é composta pelos seguintes municípios: Natal; Parnamirim; São Gonçalo do Amarante; Extremoz;
Macaíba; Ceará-Mirim; São José de Mipibu; Nísia Floresta; Monte Alegre; Vera Cruz; Maxaranguape; Ielmo
Marinho; Arês; Goianinha e Bom Jesus.
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de todo o território do estado do Rio Grande do Norte. A região possui aproximadamente
1.606.218 habitantes, o que corresponde a 46% da população total do estado. Dessa forma, a
RMN se destaca como a área de maior concentração populacional do estado, sendo o município
de Natal o principal centro urbano da região.
Figura 1: Região Metropolitana de Natal
Fonte: IBGE (2020); Acervo do Observatório das Metrópoles - Núcleo Natal (2021).
Quando se analisa a dimensão econômica, é observada uma significativa concentração
do Produto Interno Bruto (PIB) do estado do Rio Grande do Norte na Região Metropolitana,
sendo o município de Natal o de maior representatividade nessa escala metropolitana, seguido
por Parnamirim, São Gonçalo do Amarante, Macaíba e Extremoz. Em relação aos setores
econômicos, destaca-se o setor terciário como o de maior desempenho, enquanto os setores
primário e secundário apresentam uma menor intensidade produtiva (Gomes et al., 2015).
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Explorando caminhos para uma tributação imobiliária e política urbana na Região
Metropolitana Funcional de Natal
A autonomia financeira dos municípios está baseada na gestão de tributos de sua
competência e no aumento das receitas provenientes de transferências governamentais. No
entanto, apenas alguns municípios brasileiros conseguem arrecadar de forma significativa por
conta própria, especialmente os de médio e de grande porte, que possuem setores econômicos
fortes. Em contraste, os municípios de menor porte dependem, principalmente, das
transferências intergovernamentais (Santos, 2017). Além disso, observa-se que os tributos
imobiliários, que estão diretamente relacionados à propriedade imobiliária, frequentemente têm
uma arrecadação baixa devido a diversos fatores como a falta de atualização de cadastros, a
falta de interesse político, a alta inadimplência, entre outros. Os municípios não devem
renunciar às transferências entre governos, é claro, mas podem reduzir sua dependência relativa
e direcionar recursos locais de acordo com a dinâmica específica e local do mercado
imobiliário.
A arrecadação do IPTU nas cidades brasileiras é notadamente inferior em comparação
com outras cidades latino-americanas. Além disso, essa arrecadação concentra-se,
principalmente, nos municípios com muitos imóveis comerciais. Essa situação pode ser
atribuída a vários fatores, incluindo a prevalência de cadastros desatualizados e a alta taxa de
inadimplência nos municípios (Carvalho Júnior, 2016).
Fernandes (2016) revela que os municípios frequentemente enfrentam grandes
obstáculos devido à baixa arrecadação de impostos, como o Imposto Predial e Territorial
Urbano (IPTU), o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e a Contribuição de
Melhoria. Além disso, eles enfrentam dificuldades na gestão dos instrumentos afetados nos
Planos Diretores. Nessa mesma linha de pensamento, Santos (2013) observa que, no Brasil, a
arrecadação de tributos imobiliários não acompanhou o crescimento do Produto Interno Bruto
(PIB) na década de 2000, e a fraca autonomia municipal está relacionada à dependência
histórica do governo federal, que direcionam os investimentos de acordo com suas prioridades.
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No contexto dos municípios que compõem a Região Metropolitana de Natal (RMNatal)
funcional, é possível observar, por meio do Gráfico 1, uma análise da arrecadação do Imposto
Predial e Territorial Urbano (IPTU) e do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) ao
longo da série histórica de 2013 a 2021, com base nos dados fornecidos pelo Tesouro Nacional.
Os resultados revelam uma disparidade considerável no crescimento da arrecadação
entre Natal e os demais municípios. Em 2021, a arrecadação de IPTU de Natal se aproxima de
R$ 250 milhões, enquanto a de ITBI supera os R$ 50 milhões. Parnamirim segue em segundo
lugar, ultrapassando a marca de R$ 50 milhões em arrecadação de IPTU, em 2021, e alcançando
R$ 30 milhões em arrecadação de ITBI no mesmo ano. São Gonçalo do Amarante apresenta
arrecadação de IPTU e ITBI de R$ 7,3 milhões e R$ 4,8 milhões, respectivamente. Macaíba
registra R$ 9,9 milhões em IPTU e R$ 1,3 milhões em ITBI, enquanto Extremoz atinge R$ 3,9
milhões em IPTU e R$ 6,3 milhões em ITBI.
Além disso, os cinco municípios demonstram uma relativa estabilidade na arrecadação
do ITBI. No entanto, em relação ao IPTU, Natal e Parnamirim apresentam um crescimento
contínuo no valor total arrecadado ao longo dos anos, ao passo que, nos demais municípios,
esse crescimento é incipiente.
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Gráfico 1: Evolução da Arrecadação do IPTU e ITBI nos Municípios da RMNatal funcional
(2013-2021)
Fonte: Siconfi/Tesouro Nacional (2022). Elaborado pelos autores.
Ao analisar a relação entre a arrecadação do Imposto Predial e Territorial Urbano
(IPTU) e do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), com a população estimada
durante os anos considerados, é possível observar que, embora apresentem valores totais mais
expressivos, essa diferença se torna menos significativa quando seguida de forma per capita
nos cinco municípios. Natal e Parnamirim continuam liderando em termos de arrecadação per
capita do IPTU, enquanto Extremoz se destaca em relação ao ITBI, apresentando uma
arrecadação per capita mais substancial em comparação com os demais municípios.
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Gráfico 2: Arrecadação do IPTU E ITBI per capita na RMNatal funcional (2013-2021)
Fonte: Siconfi/Tesouro Nacional (2022); IBGE (2022). Elaborado pelos autores.
Para compreender as despesas com infraestrutura urbana, foram selecionados os valores
gastos por função com urbanismo (infraestrutura urbana, serviços urbanos, transporte coletivos
urbanos e administração geral), habitação, saneamento e gestão ambiental. O somatório dessas
funções fora categorizado como despesas com desenvolvimento urbano e, em seguida, foi
realizado um cruzado dos dados das despesas com desenvolvimento urbano e as estimativas
populacionais do IBGE para cada ano analisado, chegando-se aos valores de despesas com
desenvolvimento urbano per capita, apresentados no Gráfico 3.
No ano de 2014, Natal se destaca novamente por uma arrecadação per capita que
ultrapassou os 900 reais. Nos demais anos analisados, os valores do IPTU per capita variaram
entre R$ 408,91 (2015) e R$ 540,60 (2018). Parnamirim registrou o valor per capita mais baixo
em 2015, atingindo R$ 161,38, e o mais alto em 2020, com R$ 453,20. São Gonçalo do
Amarante apresentou variações entre R$ 275,51 em 2017 e R$ 873,07 em 2021. Macaíba teve
a menor arrecadação per capita em 2013, com R$ 144,98, e a maior em 2019, com R$ 294, 99.
Por fim, Extremoz teve os números mais baixos entre os cinco municípios, com apenas R$
13,20 em 2014, porém, a partir de 2017, registrou um crescimento significativo, alcançando R$
720,25 em 2020.
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LEÔNCIO, Érica Milena Carvalho Guimarães; SILVA, Gabriel Rodrigues da; SILVA, Alexsandro Ferreira Cardoso da. A TRIBUTAÇÃO
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um estudo de caso da Região Metropolitana funcional de Natal. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 22, pp. 60-78, setembro-dezembro
de 2023.
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Gráfico 3: Despesas com Desenvolvimento Urbano per capita na RMNatal funcional (2013-
2021)
Fonte: Siconfi/Tesouro Nacional (2022); IBGE (2022). Elaborado pelos autores
Uma análise das despesas com desenvolvimento urbano na RMNatal funcional revela
que os municípios alocam uma proporção menor de suas receitas para investimentos nas
cidades, esperando ultrapassar os 20%. Ao analisar as despesas per capita, observe-se que Natal,
São Gonçalo e Extremoz se destacaram ao apresentarem os valores mais expressivos nos
últimos anos. No entanto, de maneira geral, esses valores ainda giram em torno de R$ 500,00
por habitante.
Além disso, uma análise das receitas tributárias dos municípios em questão, juntamente
com os valores recebidos por meio de fluxos de transferências, revela claramente que esses
municípios não conseguem gerar recursos próprios suficientes para atender às suas
necessidades, incluindo o desenvolvimento urbano. O Gráfico 4 ilustra de forma evidente que
as transferências provenientes do governo federal, dos governos estaduais, das instâncias
multigovernamentais e dos convênios são a principal fonte de sustento dos municípios. No
entanto, a maioria dessas transferências possui destinos específicos, como saúde, educação e
assistência social, ou estão relacionados a programas e a projetos governamentais voltados para
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infraestrutura urbana, que muitas vezes não correspondem à principal demanda da população
desses municípios.
Gráfico 4: Receitas Tributárias e Transferências Correntes na RMNatal (2013-2021)
Fonte: Siconfi/Tesouro Nacional (2022). Elaborado pelos autores
Os dados apresentados evidenciam as dificuldades em equilibrar a arrecadação
proveniente da propriedade nos municípios com as despesas destinadas ao financiamento das
cidades. Mesmo com um aumento nas receitas tributárias durante o período analisado, fica claro
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que esses valores estão longe de serem suficientes para suprir as necessidades municipais. Essa
situação revela uma falta de compreensão sobre a importância da garantia imobiliária no
investimento do desenvolvimento urbano na RMNatal funcional, que continua dependente de
transferências diretas ou de programas, de projetos e de convênios, entre outros, provenientes
de outras esferas protegidas.
Com base nas reflexões de Cláudia de Césare (2018), é possível observar que, no Brasil,
o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) representou, entre os anos
de 2000 e 2016, uma parcela entre 5% e 6% da receita corrente dos municípios, correspondendo
a cerca de 0,42% e 0,52% do Produto Interno Bruto (PIB). No entanto, estudos indicam que o
IPTU poderia arrecadar entre 0,9% e 1,15% do PIB. A autora ressalta que em muitos municípios
brasileiros a arrecadação do IPTU é simbólica, apresentando um desempenho per capita inferior
nos municípios de menor porte, com até 5 mil habitantes, registrando valores de R$ 2,72 na
região Norte e R$ 2,15 na região Nordeste. Por outro lado, os municípios com mais de 500 mil
habitantes, situados nas regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste, apresentam resultados per capita
muito mais expressivos, próximos de R$ 200 (De Cesare, 2018).
A análise da situação da RMNatal funcional revela que a arrecadação de impostos
imobiliários e outros instrumentos fiscais e tributários para promoção do desenvolvimento
urbano é insuficiente. O financiamento das cidades ocorre de forma fragmentada, dependendo,
principalmente, de projetos e de recursos provenientes do governo federal ou estadual.
Além disso, é importante ressaltar que muitos desses investimentos foram realizados
durante o período de atuação do Ministério das Cidades (2013 a 2018), o que resultou em uma
maior dependência dos municípios em relação ao governo federal. Durante esse período, o
governo federal desempenhou um papel ativo no desenvolvimento das cidades, enquanto os
municípios atuaram de forma mais passiva, recebendo os projetos e os recursos certos pela
União e com garantias mínimas para a execução de obras federais.
Dessa forma, constata-se uma limitação significativa na autonomia municipal em
relação ao poder de decisão e de investimento público em infraestrutura e equipamentos
urbanos nos últimos anos no Brasil. A capacidade de arrecadação dos municípios está no centro
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dessa questão, uma vez que, como mencionado anteriormente, existe uma grande disparidade
entre as receitas tributárias, especialmente do IPTU e do ITBI, e as despesas relacionadas ao
desenvolvimento urbano. Essa lógica de dependência financeira dos municípios segue um
padrão observado em outras cidades latino-americanas, como apontado por diversos estudiosos
do tema.
Considerações finais
Diante dos desafios enfrentados no contexto urbano, a Conferência Popular pelo Direito
à Cidade destacou a importância de uma reforma tributária abrangente no país. No eixo temático
"Recursos Públicos e Orçamento", foi ressaltada a necessidade de priorizar o aumento dos
impostos sobre grandes fortunas, propriedades (com exceção das manobras para o interesse
social) e renda, bem como a devida tributação de bens de luxo, atualmente isentos de restrito.
Essas medidas visam promover uma distribuição mais equitativa dos recursos e contribuir para
a construção de cidades mais justas e esperadas.
A busca por uma tributação mais eficiente sobre o patrimônio imobiliário tem se tornado
uma necessidade cada vez mais evidente para alcançar a justiça fiscal em nosso país. Nesse
sentido, é crucial que os proprietários imobiliários nos municípios encontrem meios para
enfrentar as demandas reais locais, além de cumprirem suas funções extrafiscais. Isso inclui a
recaptura adequada das mais-valias urbanas, possibilitando uma redistribuição de renda e
viabilizando melhorias direcionadas ao desenvolvimento urbano. É fundamental promover uma
reflexão aprofundada sobre a eficácia desses controles tributários, a fim de estabelecer um
sistema justo e equitativo que promova a justiça social e contribua para a construção de cidades
mais inclusivas e conscientes.
O estudo realizado por Cavé et al. (2014) ressalta a importância de explorar o potencial
dos dispositivos tributários como uma estratégia para promover o empoderamento financeiro
dos municípios e melhorar a qualidade de vida dos seus habitantes. Essas descobertas reforçam
a necessidade de políticas públicas que incentivem uma abordagem mais efetiva na utilização
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desses instrumentos fiscais, visando a promoção do desenvolvimento sustentável e equitativo
das cidades latino-americanas.
A busca por alcançar os objetivos de autonomia financeira e de desenvolvimento urbano
local, sustentados pelos próprios municípios, requer uma reflexão e proposição de programas
de destaque, de parcerias e de estímulos entre os entes federativos. Embora existam diretrizes
e estratégias para atingir esses objetivos, é importante reconhecer que as receitas provenientes
da propriedade nos municípios ainda estão aquém do necessário. Diante dessa realidade, torna-
se necessário pensar em uma gestão pública mais efetiva e atualizada, com o objetivo de
maximizar a eficiência tributária e obter resultados mais inteligentes.
Diante das considerações expostas, é fundamental que a agenda de captura de mais-
valias urbanas, já estabelecida na legislação, seja aprimorada, visando alcançar maior alcance.
Para isso, é necessário concentrar esforços na atualização da base cadastral imobiliária,
promovendo um controle social mais efetivo dos instrumentos mais utilizados e fomentando a
formação de quadros técnicos especializados e comprometidos com a temática da arrecadação
local. Além disso, é crucial envolver o governo estadual, especialmente no contexto
metropolitano, como um parceiro e apoiador das iniciativas locais.
Nesse sentido, é importante que o governo estadual financie estudos e levantamentos
que possuam uma abordagem regional, a fim de sustentar os custos que pequenos municípios
não conseguem arcar. É válido considerar a criação de estruturas técnico-metropolitanas que
promovam um suporte especializado aos municípios, fortalecendo assim a capacidade de
arrecadação e de planejamento urbano de forma colaborativa e integrada. Essas ações conjuntas,
que envolvem aprimoramento técnico, controle social e parcerias entre diferentes esferas
governamentais, são fundamentais para sustentar o desenvolvimento urbano sustentável e para
promover uma maior autonomia financeira dos municípios, garantindo assim uma gestão
eficiente e equitativa dos recursos públicos.
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