Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Bruno Lopes da; TROLEIS, Adriano Lima. O Sistema de Abastecimento de Água numa Perspectiva Geográfica: uma reflexão
teórica. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 11, nº 24, e112408, 2024.
Submissão em: 19/09/2023. Aceito em: 26/02/2024.
ISSN: 2316-8544
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SEÇÃO ARTIGOS
O Sistema de Abastecimento de Água numa Perspectiva Geográfica:
uma reflexão teórica
The Water Supply System from a Geographical Perspective:
a theoretical reflection
El Sistema de Abastecimiento de Agua desde una Perspectiva Geográfica:
una reflexión teórica
DOI: https://doi.org/10.22409/eg.v11i24.59954
Bruno Lopes da Silva1
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Rio Grande do Norte, Brasil.
e-mail: brunogeografialopes@gmail.com
Adriano Lima Troleis2
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Rio Grande do Norte, Brasil.
e-mail:adrianotroleis@gmail.com
Resumo
O abastecimento de água é parte integrante da totalidade espacial. Nesse contexto, objetiva-se analisar esses
sistemas de abastecimento enquanto objeto de estudo da ciência geográfica. Para alcançar esse objetivo, utilizou-
se como metodologia uma pesquisa sobre a teoria do espaço geográfico de Milton Santos e sobre as concepções
funcionais dos sistemas de abastecimento de água, por meio de uma perspectiva de análise dialética e sistêmica.
Portanto, os resultados evidenciaram a identificação funcional dos objetos e ações que fazem parte do
abastecimento de água, desde o processo de captação, até as operações de tratamento, adução, reservação e
distribuição de água. Assim sendo, as categorias da totalidade espacial proporcionaram a compreensão da
materialidade e dos aspectos empíricos da dinâmica geográfica dos sistemas de abastecimento de água.
Palavras-chave
Teoria geográfica; Sistemas hídricos; Categorias de análise.
1
Possui graduação em Geografia (Bacharelados e Licenciatura) pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN); Mestrado em Demografia (PPGDEM/UFRN); e Doutorado em Geografia (PPGe/UFRN). Professor da
rede estadual de ensino do Rio Grande do Norte. Têm desenvolvido trabalhos (tutoria e docência) na Educação a
Distância (bolsista UAB), sobretudo, nas temáticas de Saneamento Ambiental; Educação Ambiental e Geografia
do Semiárido, no âmbito do IFRN.
2
Possui graduação em Licenciatura Plena em Geografia, Mestrado e Doutorado em Geografia pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul na Área de Concentração Análise Ambiental e Territorial. Realizou o Pós-
Doutoramento na Universidade do Minho\Portugal e sua investigação esteve relacionada a criação de um Índice
que avalia a Qualidade de Sistemas de Abastecimentos de Água que está sendo aplicado em cidades Brasileiras e
Portuguesas. Atualmente é professor Associado I da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, estando lotado
no Departamento de Geografia do Centro de Ciências Humanas Letras e Artes.
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Abstract
Water supply is an integral part of the spatial totality. In this context, the objective is to analyze these supply
systems as an object of study in geographic science. To achieve this objective, research into Milton Santos' theory
of geographic space and the functional conceptions of water supply systems was used as a methodology, through
a perspective of dialectical and systemic analysis. Therefore, the results showed the functional identification of the
objects and actions that are part of the water supply, from the collection process to the water treatment, adduction,
reservation and distribution operations. Therefore, the categories of spatial totality provided an understanding of
the materiality and empirical aspects of the geographic dynamics of water supply systems.
Keywords
Geographic theory; Water systems; Analysis categories.
Resumen
El suministro de agua es una parte integral de la totalidad espacial. En este contexto, el objetivo es analizar estos
sistemas de abastecimiento como objeto de estudio en la ciencia geográfica. Para lograr este objetivo, se utilizó
como metodología la investigación de la teoría del espacio geográfico de Milton Santos y las concepciones
funcionales de los sistemas de abastecimiento de agua, a través de una perspectiva de análisis dialéctico y
sistémico. Por lo tanto, los resultados mostraron la identificación funcional de los objetos y acciones que forman
parte del abastecimiento de agua, desde el proceso de recolección, hasta las operaciones de tratamiento, aducción,
reserva y distribución del agua. Por lo tanto, las categorías de totalidad espacial proporcionaron una comprensión
de la materialidad y los aspectos empíricos de la dinámica geográfica de los sistemas de abastecimiento de agua.
Palabras clave
Teoría geográfica; Sistemas de agua; Categorías de análisis.
Introdução
A compreensão do espaço geográfico enquanto um conjunto indissociável de objetos e
ações parte de um postulado teórico cunhado por Santos (2006), que balizou a teoria geral do
espaço. Tal perspectiva serviu de base para o desenvolvimento de inúmeros estudos sobre a
totalidade espacial, com a aplicação de conceitos e categorias de análise específicas. Em termos
gerais, a discussão traz à tona a noção de totalidade espacial aplicada aos sistemas de
abastecimento de água, e em termos específicos como os objetos e ações desse sistema se
conectam funcionalmente, e se materializam empiricamente com base nas categorias de análise
(forma, função, estrutura e processo) e da teoria do espaço geográfico.
Aplicações dessa teoria têm sido desenvolvidas no campo da epistemologia da
geografia; da geografia econômica; e da geografia urbana, dentre outras áreas. Apesar dos
vários estudos desenvolvidos, uma temática pouco explorada no contexto da totalidade espacial,
é o estudo sobre sistemas de abastecimento de água. Uma breve revisão de literatura sobre o
tema, mostra que a predominância das pesquisas desenvolvidas sobre esse tema, está
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concentrada no campo das ciências exatas, sobretudo, nas áreas de engenharia sanitária e
engenharia civil. Trabalhos como os de Dacach (1975), Lana (1997); Tucci; Hespanhol;
Cordeiro Netto (2001); Tsutiya (2006); dentre outros, comprovam essa predominância, com
uma abordagem que prioriza a dimensão técnica do abastecimento de água, sem considerar a
dimensão territorial ou espacial.
Nesse contexto, coloca-se como problematização dessa pesquisa a necessidade de uma
discussão geográfica sobre os sistemas de abastecimento de água, por considerar que
determinadas combinações e configurações dos objetos e ações desses sistemas, sejam
desenvolvidas a partir da teoria da totalidade espacial. Dessa forma, coloca-se como elementos
de problematização, as seguintes questões: como os sistemas de abastecimento de água podem
ser analisados no contexto da totalidade espacial? Como as categorias forma, função, estrutura
e processo podem ser aplicadas para o estudo desses sistemas? Como a teoriza do espaço
geográfico, cunhada por Milton Santos pode auxiliar no desenvolvimento de uma abordagem
territorial desses sistemas?
Além disso, o delineamento desse problema de pesquisa traz como principal
contribuição o fortalecimento da geografia no temário das pesquisas sobre sistemas de
abastecimento de água, principalmente no que concerne à análise de risco de colapso hídrico;
elaboração de planos diretores; e gestão de recursos das águas superficiais e subterrâneas.
Portanto, objetiva-se com essa abordagem analisar os sistemas de abastecimento de água
enquanto objetos geográficos, tendo como exercício empírico a aplicação das categorias forma,
função, estrutura, e processo no seu estudo.
A construção analítica das seções temáticas dessa discussão está organizada da seguinte
maneira: na primeira seção, analisa-se o espaço geográfico e sua estrutura sistêmica; na segunda
seção, discute-se uma abordagem sobre materialidades e funcionalidades dos sistemas de
abastecimento de água; e na terceira, propõe-se o exercício de aplicação empírica das categorias
de análise dos sistemas de abastecimento de água.
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O espaço geográfico e sua estrutura sistêmica
Considerar o espaço enquanto objeto de estudo da ciência geográfica, e inseri-lo no
âmbito de uma teoria geral, que possa abranger os ramos temáticos dessa ciência, é justamente
circunscrever o espaço no âmbito de uma totalidade. O espaço enquanto totalidade seria uma
unidade na qual estariam inseridos um conjunto de elementos que dialogam entre si, partes que
se somam e interagem, e que ao serem analisadas de forma holística dão origem justamente a
essa totalidade (Santos, 1985).
E quando se fala em totalidade espacial trata-se de uma perspectiva de análise que
engloba os diferentes elementos do espaço, tanto os de cunho físico quanto os de caráter
humano. Para Christofoletti (1999, p. 1) essa abordagem é necessária para “compreender como
as entidades ambientais físicas expressam-se em organizações espaciais, se estruturam e
funcionam como diferentes unidades complexas em si mesmas e na hierarquia de alinhamento”.
Trata-se, na verdade, de uma concepção de mundo que analisa o espaço em termo holísticos,
enquanto um organismo, uma totalidade dotada de partes que dialogam entre si.
Para dar sustentação a essa discussão utilizou-se como teoria balizadora, a proposta
epistemológica de Milton Santos, que trata sobre o espaço geográfico, sua natureza, categorias
de análise, e totalidade espacial. Na literatura geográfica, outras teorias e abordagens também
discutem o espaço de forma holística, como os pressupostos da teoria geossistêmica que
dialogam e contribuem para o aprofundamento da teoria do espaço geográfico, sobretudo, no
que concerte análise e delimitação dos sistemas ambientais.
Partindo desse princípio, a teoria que sustenta essa visão da totalidade espacial é a que
considera o espaço como sendo “um conjunto indissociável, solidário e também contraditório,
de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro
único no qual a história se dá”. Do ponto de vista físico ou geossistêmico, esses objetos e ações
se materializam através de um todo, “complexo e integrado onde circulação de energia e
matéria e onde ocorre exploração biológica, inclusive aquela praticada pelo homem”
(Troppmair; Galina, 2006, p. 81).
Em outros casos, os objetos e ações, podem ser entendidos como subsistemas. No caso
de um sistema de abastecimento de água, por exemplo, os seus subsistemas seriam: subsistema
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de captação; subsistema de tratamento; subsistema de adução; subsistema de reservação; e
subsistema de distribuição. Nesse caso específico, a definição e delimitação dos subsistemas se
com base propriedades locacionais (onde), atributos temáticos (o que) e temporais (quando),
aliado as suas funcionalidades (Christofoletti, 1999). Ressalta-se que essa abordagem sobre
sistemas, na geografia, coloca em evidências as variáveis ambientais, sendo que o espaço
geográfico agrega em sua totalidade uma teia de elementos, tanto físicos quanto humanos. Por
isso, escolheu-se a abordagem miltoniana, como teoria norteadora da discussão, por evidenciar
aspectos relacionados a dinâmica das atividades humanas sobre o espaço.
Através dessa linha de pensamento o espaço é analisado de modo dialético, e isso
havia sido pré-concebido por Bertrand (1968, p. 1). Segundo esse pesquisador, a paisagem
global (totalidade) é o resultado da combinação dinâmica, portanto instável, de elementos
físicos, biológicos e antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros, [...] um
conjunto único e indissociável, em perpétua evolução”, que representam objetos e ações em
constante movimento.
Atualmente, esses objetos e ações podem ser claramente identificadas nas pesquisas
realizadas sobre Totalidade e lugar; Sucessão e coexistência; Psicosfera e tecnosfera; Global e
local; Verticalidade e horizontalidade; Circuito superior e circuito inferior; Estado e mercado;
Fixos e fluxos; Espaço luminoso e espaço opaco; Cidadão e consumidor, dentre outras
aplicações (Santos, 1985).
Além disso, uma outra forma de se pensar essa teoria é através da abordagem das
categorias: forma, função, estrutura e processo. O procedimento metodológico de
hierarquização e organização taxionômica de categorias, é uma prática comum no que concerne
a delimitação empírica das escalas dos sistemas ambientais, um exemplo disso, foram as
categorias têmporo-espaciais propostas por Bertrand (1968) para o estudo da paisagem: zona,
domínio, região, geossistema, geofáceis e geótopo. Por uma questão de incompatibilidade
escalar, em muitos estudos, torna-se impossível aplicar essas categorias, por isso, uma
alternativa é a utilização das noções de forma, função, estrutura e processo, que leva em
consideração a totalidade do espaço e suas diferentes formas de uso.
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A totalidade (espaço geográfico) organiza-se na condição de sistema, dotado de uma
complexidade funcional que abrange relações de unidade e de multiplicidade em sua estrutura.
Por apresentar essa natureza complexa, o espaço enquanto totalidade, para ser entendido precisa
ser decomposto do ponto de vista abstrato, o que possibilita separar suas unidades e
individualidades, e com isso realizar o processo de cisão das partes, obtendo o todo, pois
segundo Santos (2006, p. 76) “o conhecimento da totalidade pressupõe, assim, sua divisão”.
No caso do espaço geográfico, quando se analisa um de seus recortes, como por
exemplo, um bairro, uma cidade, uma região ou um estado, estar-se dissecando as
singularidades e a essência dessas partes, o que será de suma importância para o entendimento
do funcionamento da totalidade, quando todas as partes analisadas forem articuladas e
agregadas sistemicamente (Santos, 1994).
Além da análise relacional e sistêmica dos fatos, vale salientar que uma outra forma dos
estudos geográficos adquirirem concretude, é trabalhar no contexto de uma realidade empírica.
Essa perspectiva de método que engloba o fazer científico, caracterizada pela transição do
conhecimento abstrato para o concreto, foi estudada por também Althusser (1978), segundo o
qual, esse procedimento se constitui em uma estratégia de dar forma (concretude) a um
conteúdo teórico (abstrato), o que na geografia é alcançado por meio da operacionalização de
seus conceitos e categorias de análise, aplicados a uma dada realidade concreta.
Nesse sentido, a noção de espaço geográfico se caracterizaria enquanto um produto
conceitual abstrato, que adquire concretude analítica quando representa empiricamente uma
materialidade espacial específica, ou um sistema ou estrutura geográfica. Uma das sugestões de
método propostas por Santos (2014) para se alcançar essa realidade empírica, é adotando-se a
técnica como critério de delimitação e representação das formas de concretude espacial.
Na concepção de Santos (2006, p. 35):
A materialidade artificial pode ser datada, exatamente, por intermédio das técnicas:
técnicas da produção, do transporte, da comunicação, do dinheiro, do controle, da
política e, também, técnicas da sociabilidade e da subjetividade. As técnicas são um
fenómeno histórico. Por isso, é possível identificar o momento de sua origem. Essa
datação é tanto possível à escala de um lugar, quanto a escala do mundo. Ela é também
possível à escala de um país, ao considerarmos o território nacional como um conjunto
de lugares.
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Assim, a dimensão geográfica da técnica envolve uma variedade de atividades humanas,
com as mais diversas funcionalidades, podendo ser identificadas e empiricizadas nas mais
diferentes realidades escalares. Nesses sistemas técnicos um fluxo ou armazenamento de
matéria e energia, e isso mostra que os fenômenos geográficos se encontram em inter-relação,
sendo que não existe nenhuma parte do espaço geográfico, enquanto totalidade, que não se
inclua nessa teia de inter-relações dos sistemas técnicos (Rodriguez; Silva; Cavalcanti, 2007).
Cabe ressaltar também, que através do estudo dos objetos técnicos torna-se possível não apenas
dar concretude ao espaço, como também ao tempo, pois o processo de evolução técnica de um
espaço evidencia as diferentes etapas e períodos em que cada um de seus objetos foi construído.
Essa conjuntura organizacional evidencia que o espaço não existe por si só, mas sua
existência está ligada aos diferentes usos que se superpõem ao longo do tempo sobre a
superfície terrestre. Uma das formas de se identificar com mais concretude esses usos, é através
da análise da evolução dos sistemas técnicos sobre o espaço. Para compreender esse processo,
Santos desenvolveu a noção de meio técnico-científico-informacional (Santos, 1994; Santos,
2006; Santos; Silveira, 2014).
Em linhas gerais, o meio técnico-científico-informacional se define pelo emprego e
incorporação da ciência, da tecnologia, e da informação ao espaço geográfico. Nesse processo
de materialidade do espaço, “se instala um novo sistema de natureza”, onde o predomínio
de uma natureza artificializada, cujas ações e o desenvolvimento das atividades estão cada vez
mais dependentes da ciência, da tecnologia e da informação (Santos, 1994, p. 20-21).
Trata-se da definição de um meio geográfico no qual a ciência, tecnologia, e informação
são tratados de forma integrada e sistêmica, uma vez que essa tríade analítica apresenta, em
termos empíricos, relações de articulação funcional entre si, no processo de uso das diferentes
parcelas do espaço geográfico.
Dentro dessa lógica, Santos (2006, p. 160) salienta que:
Podemos então falar de uma cientificização e de uma tecnicização da paisagem. Por
outro lado, a informação não apenas está presente nas coisas, nos objetos técnicos,
que formam o espaço, como ela é necessária à ação realizada sobre essas coisas. A
informação é o vetor fundamental do processo social e os territórios são, desse
modo, equipados para facilitar a sua circulação.
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Assim, o uso do território passa com o advento desse meio, a apresentar equipamentos
e sistemas técnicos que favorecem a circulação das informações, o desenvolvimento de eventos,
ações e processos voltados para uma finalidade específica. Atrelado a isso a criação de
normas e de mecanismos jurídico-políticos, para facilitar o funcionamento integrado desse
meio, e dos objetos aos quais ele está associado.
O espaço possui assim, um conteúdo técnico, atrelado a um conteúdo normativo. Para
Santos (2006, p. 153) “o espaço, por seu conteúdo técnico, é regulador, mas um regulador
regulado, que as normas administrativas [...] é que, em última análise, determinam os
comportamentos”. O fato de as normas determinarem os comportamentos, implica direta ou
indiretamente na forma pela qual ocorrerá o uso do território, podendo esse uso ser decorrente
de uma ação externa ao território, ou de eventos que são gerados e desenvolvidos localmente
no próprio território. A relação entre território e norma, além de seu aspecto regulador,
apresenta também um caráter vertical (normatizações por meio de lógicas externas) e um caráter
horizontal (normatizações decorrentes de lógicas e de arranjos internos).
Para que essa natureza de sistema técnico, seja evidenciada no contexto de um sistema
de abastecimento de água, é preciso que este sistema seja analisado como um todo. Por esse
motivo, o primeiro movimento analítico é o de entender conceitualmente o que é um sistema
de abastecimento de água (materialidades e funcionalidades), para que depois seja possível
discuti-lo enquanto sistema técnico, responsável pelo uso de um determinado território.
Materialidades e funcionalidades dos sistemas de abastecimento de água
Estudos sobre sistemas de abastecimento de água tem sido predominantemente
desenvolvidos nas últimas décadas por engenheiros civis, engenheiros sanitaristas dentre outros
profissionais. Diante desse cenário, a presente pesquisa abarcou para compor seu estado da arte,
diversas pesquisas sobre sistemas de abastecimento de água. Destacam-se nesse cenário, os
estudos desenvolvidos por Dacah (1975); Lana (1997); Lieshout (2016); Srivastwa; Kabra
(2023), Tsutiya (2006); Tucci; Hespanhol; Cordeiro Netto (2001), entre outros.
Com relação as análises desenvolvidas por Dacah (1975), concluiu-se que os sistemas
de abastecimento de água devem ser projetados, construídos e operados para fornecer água
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potável, em quantidade e qualidade suficientes, dentro dos níveis de pressão adequados,
considerando os diversos pontos de consumo. Para alcançar essa finalidade, o sistema em si, é
composto por um conjunto de unidades operacionais de captação, adução, tratamento,
reservação e distribuição.
Dentro dessa lógica operacional, cada unidade é responsável pelo desenvolvimento de
funções específicas, que ao serem analisadas de forma integrada correspondem ao
abastecimento de água em sua totalidade. Na captação, por exemplo, objetiva-se a retirada de
água do manancial, para atender ao consumo humano, e posterior tratamento, adução e
distribuição. Um dos problemas recorrentes associados a captação e aos seus sistemas técnicos,
é o fato de muitas vezes a população consumidora estar situada em uma cota topográfica bem
superior ao local de captação, o que foi identificado por Lieshout (2016), ao analisar os sistemas
de abastecimento de água na Inglaterra.
Tal operação pode ser realizada junto a um rio, lagoa, ou através da perfuração de poços
tubulares ou em aquíferos, e após ser captada é transportada (aduzida) para as unidades de
reservação e de tratamento, antes de ser distribuída, e esse transporte é realizado mediante um
sistema de adutoras ou sistema de adução. Nesse sentido, a função da adutora além de
transportar a água, realiza a conexão entre as diversas partes do sistema de abastecimento,
caracterizando-se como um importante elo de articulação dentro desse complexo sistema
(Dacah, 1975).
Além do sistema de adução, o abastecimento de água envolve mais três elementos:
reservação, tratamento e distribuição. Se por um lado as adutoras são os principais elementos
de articulação de um sistema de abastecimento de água, por outro, os reservatórios têm como
função principal promover a regularização e a normalidade dos níveis de água dentro do sistema
como um todo. É por meio dos reservatórios que o excesso de água é armazenado, nas horas
em que o consumo é baixo, podendo servir também para disponibilizar água para distribuição
nos casos de interrupção do transporte de água por uma adutora (Srivastwa; Kabra, 2023).
Cabe ressaltar, que a água existente nos reservatórios pode encontrar-se tratada, ou
ainda irá passar por processo de tratamento, nas estações destinadas a esse objetivo. Mas
independentemente disso, todo o volume de água de um sistema de abastecimento deve passar
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por processo de tratamento, antes de ser distribuído para a população. É nesse processo que
ocorre a remoção das impurezas existentes na água, bem como a remoção de microrganismos
que causem mal à saúde.
Somente após esse processo de tratamento (remoção das impurezas e adequação aos
padrões de potabilidade), é que a água pode ser distribuída para o consumo da população, que
se constitui na última etapa de um sistema de abastecimento de água. O processo de distribuição
é desenvolvido mediante uma rede de tubulações, que são estruturas responsáveis por conduzir
a água para os diversos pontos de consumo de uma dada comunidade, seja uma cidade, um
bairro, um loteamento, ou até mesmo uma região administrativa (Brasil, 2005).
O que se percebe nessas diferentes nuances sobre sistemas de abastecimento de água,
ligadas principalmente à engenharia, é que a dimensão estrutural e funcional do sistema de
abastecimento de água é claramente destacada, seja por meio da ênfase dada aos aspectos
sanitários; aos aspectos de gestão; ou aos aspectos hidrográficos. Porém, uma outra dimensão
de análise dessa discussão deve ser apresentada, que é a geográfica, tendo em vista a
importância da delimitação e funcionalidade desse sistema por meio das quatro categorias da
totalidade espacial: forma, função, estrutura e processo.
Nesse sentido, um sistema de abastecimento corresponde a um conjunto de objetos
técnicos responsáveis pelo fornecimento de água dentro dos padrões de potabilidade para a
população, e em quantidade e pressão adequadas (Lieshout, 2016; Santos; Silveira 2014;
Srivastwa; Kabra 2023; Tsutiya, 2006). Dessa forma, é através da combinação de categorias
de análise geográficas, que o abastecimento de água ganha concretude espacial, passando esse
sistema a ser tratado analiticamente na condição de objeto geográfico.
Categorias de análise geográficas aplicadas ao estudo dos sistemas de abastecimento de
água
A compreensão de um sistema de abastecimento de água enquanto objeto de estudo da
geografia, pressupõe, a aplicação e operacionalização de categorias de análise geográfica para
o estudo desse sistema. Por esse motivo, a discussão sobre a geograficidade dos sistemas de
abastecimento de água, deve ser realizada a partir das categorias da totalidade espacial, uma
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vez que essas categorias além de dialogarem sistemicamente frente a uma realidade empírica,
apresentam concretude espacial, em termos de conteúdo.
Segundo Santos (1985, p. 37), essas categorias podem ser compreendidas a partir da:
Forma: “aspecto visível de uma coisa. Refere-se, ademais, ao arranjo ordenado de
objetos, a um padrão. Tomada isoladamente, temos uma mera descrição de fenômenos
ou de um de seus aspectos num dado instante do tempo”.
Função: “tarefa ou atividade esperada de uma forma, pessoa, instituição ou coisa”.
Estrutura: “implica a inter-relação de todas as partes de um todo; o modo de
organização ou construção”.
Processo: “pode ser definido como uma ação contínua, desenvolvendo-se em direção a
um resultado qualquer, implicando conceitos de tempo (continuidade) e mudança”.
Ao idealizar as categorias de análise da totalidade espacial, Santos (1985) pensou em
uma proposta de método que pudesse realizar a leitura do espaço de modo a entender o seu
movimento; os seus conteúdos; suas interações/combinações; e articulação do todo com suas
partes. Por esse motivo, considera-se essas categorias como sendo as mais adequadas quando
se quer analisar a realidade empírica de um sistema de objeto e de ações, no âmbito da geografia.
Portanto, o exercício analítico dessa discussão é justamente aplicar essas quatro
categorias, para o estudo de sistemas de abastecimento de água, uma vez que, tais sistemas
possuem formas, funções, estruturas, e processos, que o tornam parte integrante da totalidade
espacial. Assim, torna-se necessário entender como cada uma dessas categorias podem ser
aplicadas para análise desse tipo de sistema, em particular.
No caso das formas associadas ao sistema de abastecimento de água, no que se refere
as bacias hidrográficas e os aquíferos, é preciso explicar como tais formas surgem e evoluem,
o que na maioria das vezes está relacionado a forças endógenas (interior do planeta) e exógenas
(exterior do planeta) que atuam conjuntamente no processo de gênese e evolução do relevo. É
de suma importância ter essa compreensão, pois formas e processos (forças) são dois pilares da
dinâmica hidrológica e hidrográfica, isso porque o reajuste nas variáveis dos processos resultará
em um novo equilíbrio, e por consequência, em uma nova forma (Christofoletti, 1999) podendo
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AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Bruno Lopes da; TROLEIS, Adriano Lima. O Sistema de Abastecimento de Água numa Perspectiva Geográfica: uma reflexão
teórica. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 11, nº 24, e112408, 2024.
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assim, interferir no funcionamento dos sistemas de abastecimento de água associados a essas
formas.
Um exemplo de formas associadas aos sistemas de abastecimento de água são as bacias
de drenagem fluvial. Essas bacias enquanto forma do sistema de abastecimento de água,
relacionam-se as características das encostas, ou seja, da área compreendida entre os fundos de
vale e os topos da superfície terrestre. Essas unidades geomorfológicas são provenientes de
processos erosivos e\ou deposicionais, que em função do gradiente topográfico e gravitacional,
favorecem o fluxo de matéria e energia, entre os topos e os fundos de vale. Tal configuração
geomorfológica dá origem às bacias hidrográficas, uma área da superfície terrestre que drena
água, sedimentos e materiais dissolvidos para uma saída comum (Coelho Netto, 1998).
Em termos de estruturação, essas bacias subdividem-se em canais cada vez menores de
jusante para montante. Os cursos iniciais que fluem diretamente do subsolo para originar a bacia
são chamados cursos de primeira ordem, que se juntam aos demais cursos, formando rios de
segunda ordem e assim por diante, aque os tributários formem um canal único e principal.
Esse conjunto de rios, e suas respectivas áreas drenadas, dão origem a unidade de planejamento
dos recursos hídricos (Penteado, 1983).
Além disso, a origem de uma bacia de drenagem também pode estar relacionada a
movimentos epirogenéticos, que resultam das forças internas do planeta. Em regiões
submetidas a esses movimentos é muito comum a existência de estruturas como vales
alongados, denominadas grabens, intercalados com elevações topográficas chamadas horsts.
Tal fenômeno foi um dos responsáveis pela formação da bacia hidrográfica do rio Paraíba do
Sul, que drena áreas dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Por outro lado, no que tange as formas de cunho subterrâneo, os aquíferos são os que
adquirem maior relevância no contexto de um sistema de abastecimento de água, pois são
nessas fontes onde os poços tubulares são construídos para a captação de água. Os aquíferos
enquanto unidades geológicas são caracterizadas como sendo formações portadoras de
quantidades significativas de água, cuja origem está associada principalmente a rochas do tipo
sedimentar (Carneiro; Campos, 2012).
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Os aquíferos apresentam também uma classificação segundo a natureza do material
saturado, a qual se baseia em três categorias: aquíferos porosos; aquíferos fraturados; e
aquíferos cársticos. Ressalta-se, que a análise desses aquíferos deve levar em consideração
parâmetros hidrogeológicos ou hidrodinâmicos, como nível estático, transmissividade, vazão,
condutividade hidráulica, e coeficiente de armazenamento, entre outros, pois é por meio desses
parâmetros que será possível avaliar a capacidade de explotação e a disponibilidade hídrica em
termos de reserva (Palmier, 2010).
Em relação aos aquíferos porosos, um dos parâmetros que merecem ser destacados em
sua caracterização, é a porosidade. Matematicamente, a porosidade total ou volumétrica pode
ser expressa como sendo a razão entre o volume de vazios (Vv) e o volume total (Vt) de um
solo ou rocha. De forma mais específica, também a porosidade eficaz, que diz respeito a
quantidade de água efetivamente liberado por unidade de volume de um determinado material,
em função da ação gravitacional. Essas características contribuem para o armazenamento e a
transmissividade de água entre os constituintes da rocha ou solo, dando origem ao aquífero
poroso (Almeida, 2016).
A constituição dessa formação geológica está relacionada a materiais provenientes do
intemperismo de rochas preexistentes, ou atém mesmo de solos produzidos pela decomposição
de arenitos, e rochas sedimentares. Os poços tubulares perfurados nesse tipo de aquífero podem
fornecer “água de boa qualidade, em volumes que podem atingir 500 m³/h de vazão” (Carneiro;
Campos, 2012, p. 804).
Já os aquíferos fraturados, são formados por rochas ígneas ou magmáticas, conhecidas
como rochas do cristalino. Nesse tipo de hidrogeologia, a presença de água está diretamente
relacionada à existência de fendas ou fissuras, as quais tendem a diminuir de dimensão com o
aumento da profundidade. Além disso, a vazão média dos poços construídos em rochas
cristalinas varia de 2 a 3 m³/h (Palmier, 2010). Essa é uma das explicações que justifica a pouca
perfuração de poços tubulares em áreas abrangidas por escudos cristalinos.
Além dos aquíferos fraturados, há também os de origem cárstica. De acordo com Silva,
A. (2008, p. 154) “o fenômeno é o conjunto de transformações que ocorrem em uma região de
rochas carbonáticas como consequência da circulação da água”. Portanto, as regiões cársticas
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responsáveis pelo armazenamento de água subterrânea, são denominadas aquífero cársticos, os
quais apresentam um conjunto de características que o tornam singular, em comparação com
os demais aquíferos.
Na concepção de Silva (2008, p. 153), as principais características desse aquífero são:
Presença de extensas zonas sem correntes de águas superficiais, inclusive em climas
úmidos;
Ocorrência de depressões, mais ou menos grandes, cuja drenagem é subterrânea;
Existência de cavidades no subsolo pelas quais circulam correntes de água subterrâneas;
Pequeno valor de escoamento superficial;
Anomalias na direção do fluxo de água com relação ao gradiente potenciométrico
regional;
Grande diferença entre a média e a mediana da distribuição estatística dos valores de
permeabilidade;
Muita variação, de um lugar para outro, dos valores do coeficiente de armazenamento e
da transmissividade.
Essas características do aquífero cárstico mostram que sua dinâmica hidrogeológica
apresenta grande variabilidade, no que se refere aos processos e transformações que envolvem
o meio carbonático. Assim, os valores dos parâmetros hidrodinâmicos desse tipo de aquífero,
como vazão, transmissividade, nível estático, condutividade hidráulica, entre outros, pode
variar muito de uma área para outra, pois em regiões de elevada pluviosidade (acima de 2000
mm/ano), a tendência é que os fenômenos cársticos sejam mais intensos, ao passo que, em
regiões de menor nível pluviométrico, os processos sejam de menor magnitude (Palmier, 2010;
Silva, 2008)
Esses aquíferos, considerando as suas peculiaridades, podem, direta ou indiretamente,
estar articulados a um determinado sistema de abastecimento de água. Esse sistema em si,
possui um conjunto de funções, que ao estarem articuladas sistemicamente, proporcionam a
captação e a distribuição de água para uma certa população. Na cidade de Natal/RN (Brasil),
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por exemplo, os aquíferos Dunas e Barreiras, são as fontes subterrâneas a partir das quais os
poços tubulares captam a água que abastece boa parte do município (Melo; Figueiredo, 1990).
Nesse caso, as funções desse sistema estão relacionadas a operações técnicas
específicas, tais como: a captação (retirada de água do manancial em quantidade capaz de
atender ao consumo); a adução (destina-se a conduzir a água desde a captação até a comunidade
abastecida); o tratamento (responsável por tratar a água para adequá-la aos padrões de
potabilidade); a reservação (funcionalidade responsável por regularizar as variações entre as
vazões de adução e de distribuição e condicionar as pressões na rede de distribuição); e a
distribuição (destina-se a conduzir a água, através de tubulações, para os diversos pontos de
consumo da comunidade) (Dacach, 1975).
No sistema de abastecimento essas funções não podem ser analisadas de forma isolada
ou separada, pelo contrário, elas precisam ser tratadas analiticamente como um sistema de
ações, onde cada função implica no desenvolvimento da função subsequente. Ressalta-se
também que a composição orgânica desse sistema de ações tem como pilares de sustentação a
ciência e a técnica, pois em cada uma das funções descritas, uma racionalidade específica,
para cumprir uma função determinada no sistema de abastecimento de água, e um suporte
material técnico que está sendo empregado, para proporcionar a operacionalização dessas
funcionalidades técnicas (Santos, 2006).
Esse conjunto de funcionalidades (funções) técnicas visa atender as demandas de
abastecimento da população, considerando sua estrutura socioeconômica, e seus diferentes
segmentos. Assim, a articulação dessas funcionalidades visa proporcionar o abastecimento de
água em quantidade e qualidade legais, para uma população, considerando para isso os
diferentes perfis de consumo relacionados à sua estrutura socioeconômica.
Uma das categorizações dessa estrutura diz respeito à classificação dos diferentes tipos
de consumidores, os quais estão subdivididos em quatro grupos: doméstico; comercial;
industrial; e público. A existência dessa classificação parte do princípio de que o consumo e a
forma de uso da água são diferentes, o que exige dos órgãos gestores, o estabelecimento de
políticas e cobranças tarifárias distintas (Tsutiya, 2006).
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Com relação aos consumidores domésticos, a água utilizada por eles serve para suprir uma série
de necessidades relacionadas à salubridade humana e a manutenção da própria residência.
Nesse sentido, os moradores podem usar a água para beber; para higiene pessoal; para
o preparo de alimentos; para lavagem de roupa; para irrigação de jardins; e para uma infinidade
de outras atividades. A variabilidade do nível de consumo relacionado a essas diferentes
atividades domésticas, está associado a um conjunto de variáveis, como as características físicas
e ambientais da residência; a renda familiar; a pressão da rede de distribuição e a qualidade da
água que chega à residência; a forma de tarifação a que está submetida à residência; bem como
as características culturais da comunidade (Tsutiya, 2006).
No caso da tarifação, estudos apontam que a renda da população tem relação inversa com o
quantitativo de água consumido nas residências. Ficou evidenciado que elevações nas taxas de
tarifações implicavam na redução do consumo, assim como, as reduções no valor da tarifa
contribuíam para a elevação do quantitativo de água consumido residencialmente (Dalmônica,
2014; Grande et al, 2016; Pequeno, 2009).
Nesse sentido, a elevação do valor de tarifação, pressupõe-se que as residências
compostas por pessoas de baixa renda, são as que tem o consumo mais comprometido, em razão
de não terem condições financeiras para arcar com os valores tarifados pela empresa prestadora
do serviço de abastecimento de água.
Outras variáveis podem influenciar também na composição desse consumo, taxa de
crescimento da população e o nível de instrução dos moradores. Com relação ao crescimento
populacional, na fase de concepção do sistema de abastecimento são feitas projeções para inferir
as áreas espaciais com maior tendência ao incremento demográfico. A partir dessas
informações, pode-se deduzir quantitativamente qual será o cômputo das vazões e cargas de
consumo de água demandadas por uma determinada população, em áreas específicas (Libânio
et al, 2010; Tsutiya, 2006).
Além disso, Costa (2010) constatou em suas análises que o nível de instrução de uma
população pode influenciar na qualidade do abastecimento de água. Tal premissa parte do
princípio de que em uma população com melhor nível educacional, o grau de conscientização
dos consumidores com relação ao uso equilibrado da água é mais difundido, uma vez que, trata-
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se de pessoas que têm um maior acesso aos meios e ferramentas responsáveis pela difusão das
informações educacionais.
Nesse sentido, a constatação feita por esse autor colocou em evidência que nas áreas
onde havia uma grande concentração de chefes de família com poucos anos de estudo ou sem
instrução, a vulnerabilidade socioeconômica dessa população, aos problemas relacionados ao
abastecimento de água era mais alta (Costa, 2010). Por conta disso, a variável educacional deve
ser levada em consideração no processo de análise da estrutura socioeconômica de um sistema
de abastecimento de água.
Dentro dessa estrutura socioeconômica, destaca-se também o consumo comercial, que
engloba uma variedade de empreendimentos comerciais, de diferentes segmentos, como bares,
padarias, restaurantes, lanchonetes, hospitais, hotéis, postos de gasolina, shoppings centers,
farmácias, entre outros. Para (Libânio et al, 2010), dentro dessa classificação, quando se analisa
o consumo entre os diferentes estabelecimentos uma variação significativa. Estimativas
realizadas apontam que em creches o consumo médio diário é de 50 L/capita; em hospitais 250
L/leito; em hotéis 120 L/hóspede; prédios de apartamento 400 L/dormitório; e restaurantes 25
L/refeição (Silva, 2019).
Essas informações trazem à tona a evidência de que dependendo da localização e do
porte dos estabelecimentos comerciais em uma cidade, por exemplo, é possível definir áreas de
maior e de menor pressão sobre o sistema de abastecimento de água, em razão da diferenciação
e da magnitude do consumo dos estabelecimentos comerciais de diferentes dimensões. Assim,
é possível afirmar que as estruturas estão implantadas desigualmente no espaço, cujo aspecto
locacional está relacionado ao padrão socioeconômico da população. Isso foi constatado por
Srivastwa e Kabra (2023) o estado indiano de Bihar, os quais concluíram que o acesso as
estruturas e serviços de abastecimento de água, estão restritos a determinados grupos de
pessoas, ou seja, a segregação socioeconômica reflete-se no acesso ou não a determinados
recursos, dentre eles a água.
Com respeito ao consumo industrial, Tsutiya (2006) salienta que essa modalidade de
consumidores se subdivide em cinco categorias: uso humano; uso doméstico; água incorporada
ao produto; água utilizada no processo de produção; e água perdida ou para usos não rotineiros.
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O consumo humano envolve todo o volume de água usado em banheiros; banho; alimentação
e em lavagem de utensílios. O uso doméstico, por sua vez, abrange a água utilizada na limpeza
em geral e na manutenção da área do estabelecimento. Por outro lado, a água incorporada ao
produto, refere-se ao volume de água usado na constituição do bem que está sendo produzido,
como por exemplo, a água usada para fabricação de shampoos; de bebidas; e na produção de
alimentos.
também o volume de água usado no processo de produção, em que a água não é
incorporada ao produto, como ocorre na geração de vapor, na produção de argamassa e na
lavagem de roupas em lavanderias. Atrelado a esse aspecto, ressalta-se também o volume de
água que é perdido ou usado de forma não rotineira nas atividades industriais, tais como o uso
de água em incêndios e para a lavagem de reservatórios.
A outra categoria de consumo, refere-se ao consumo público, ou seja, a água utilizada
para a manutenção de órgãos pertencentes ao poder público municipal, estadual ou federal.
Todo o volume de água consumida no processo de manutenção de praças, parques, escolas,
universidades, vias públicas, hospitais, maternidades, entre outros (Libânio et al 2010).
Nesse contexto, essa estrutura socioeconômica variada da população, com os seus
diferentes tipos de consumidores, que envolvem pessoas físicas e pessoas jurídicas, faz com
que a pressão de consumo sobre o sistema oscile entre as diferentes áreas de uma cidade, por
exemplo. Para dar conta da variedade de níveis de consumo e de consumidores, de diferentes
magnitudes e perfis socioeconômicos, é necessário que a equipe gestora do sistema de
abastecimento de água disponha de processos jurídicos e institucionais de regulação eficientes,
com vistas a atender as demandas de consumo de todas as categorias de consumidores.
Esses processos de regulação determinam a maneira pela qual se dará o uso do território
por um sistema de abastecimento em todas as suas fases. Trata-se de mecanismos jurídicos
idealizados para promover o pleno funcionamento do sistema, tais como a Política Nacional de
Saneamento Básico; Os Planos Diretores de Abastecimento de Água; Os Planos Diretores
Municipais para gestão urbana; os consórcios Intermunicipais de Bacias Hidrográficas; as
resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), para o uso das águas, entre
outros.
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A Política Nacional de Saneamento sico, por exemplo, é um mecanismo jurídico
voltado para o estabelecimento das diretrizes nacionais do saneamento. Em seu artigo 2º, essa
política traz à tona uma série de princípios fundamentais, dentre eles, a universalização e a
integralidade do acesso aos serviços de abastecimento de água; esgotamento sanitário; limpeza
urbana; e drenagem e manejo de águas pluviais (Brasil, 2007). Consequentemente, todos os
planos, projetos e ações desenvolvidas no campo do saneamento básico devem levar em
consideração a Política Nacional de Saneamento Básico.
Para os sistemas de abastecimento de água, por exemplo, a Política Nacional de
Saneamento Básico, exige a elaboração de planos diretores de abastecimento de água. Esses
planos correspondem a um conjunto de processos normativos, que envolvem programas,
projetos e ações, voltadas para atingir metas e objetivos específicos em relação ao
funcionamento do sistema de abastecimento de água.
Segundo Vieira, Tatsuta e Kusaba (2008) os planos diretores de abastecimento de água
baseiam-se nas características da estrutura urbana municipal, e nos aspectos hidrográficos
locais e regionais. Além disso, esse plano deve ser formulado e implantado de forma
participativa, ou seja, considerando as demandas e anseios da sociedade civil e dos diversos
agentes públicos e privados, que compõem a população consumidora. Para alcançar esse
objetivo, os planos diretores de abastecimento de água, envolvem quatro etapas específicas:
diagnóstico técnico-operacional do sistema; definição de diretrizes para o funcionamento do
sistema de forma eficiente; elaboração de novas concepções funcionais para o serviço de
abastecimento de água; realização de audiências, e consultas públicas junto à população.
Diante disso, considera-se esses planos como sendo mecanismos de regulação, através
dos quais o órgão responsável pela prestação do serviço de abastecimento de água, define
normas de gerenciamento operacional para o sistema; metas de expansão; regime tarifário;
medição e faturamento; bem como medidas de contingência e emergência, dentre outros
aspectos (Brasil, 2007). Quando implantadas na escala intraurbana, essas normas devem estar
em consonância com os planos diretores municipais de gestão urbana, os quais apresentam em
sua estrutura normativa, requisitos específicos, direcionados para o serviço de abastecimento
de água.
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O plano diretor municipal, em sua essência visa estabelecer princípios, diretrizes, e
conteúdos para a definição dos direitos da propriedade municipal (Cymalista, 2006),
constituindo-se assim, em um instrumento básico da política de desenvolvimento urbano
municipal, considerando os agentes públicos e privados que usam o espaço da cidade de forma
sistêmica (NATAL, 2007). Dentre os conteúdos que fazem parte de um plano dessa natureza,
há elementos que abrangem as estruturas e as funcionalidades do sistema de abastecimento de
água.
Assim, a aplicação das categorias de análise geográfica para o estudo de sistemas de
abastecimento, constitui-se em uma estratégia teórico-metodológica que insere a abordagem
desses sistemas no temário da geografia. Além disso, a operacionalização dessas categorias
possibilita ao geógrafo o desenvolvimento de ações de planejamento territorial voltadas
especificamente para gestão dos sistemas de abastecimento de água, sobretudo, no que concerne
ao arranjo e funcionamento dos seus objetos técnicos.
Considerações Finais
Ao realizar a discussão sobre sistemas de abastecimentos de água numa perspectiva
geográfica, uma das primeiras constatações obtidas foi a de que o espaço possui uma natureza
sistêmica, ou seja, há uma interrelação entre objetos e ações; materialidades e funcionalidades.
Por conta disso, pode-se considerar a viabilidade teórica e empírica de se estudar os sistemas
de abastecimento de água à luz da teoria da totalidade espacial.
Constatou-se que os sistemas de abastecimento de água, enquanto elementos da
totalidade espacial, podem ser classificados como sistemas técnicos, uma vez que, desde o
processo de captação, ao processo de distribuição de água, um conjunto de estruturas operam
de modo coordenado, contínuo e integrado. Tal aparato técnico visa o fornecimento de água em
quantidade e qualidade suficiente para abastecer as diversas localidades do espaço geográfico.
Com relação a dimensão empírica da análise geográfica, a operacionalização das
categorias da totalidade espacial (forma, função, estrutura e processo), abrangeu de forma
integral os elementos do sistema de abastecimento de água. Ficou em evidência, que o sistema
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de abastecimento de água possui formas, específicas, como por exemplo, as fontes de
abastecimento superficial e subterrâneo.
Esse arranjo composto pelas formas, funções, e pela estrutura socioeconômica, é
normatizada e regulamentada pelos diversos instrumentos jurídicos e institucionais
responsáveis pela gestão do sistema de abastecimento de água. Nesse processo de gestão, estão
incluídas as políticas nacionais de saneamento; os planos diretores de abastecimento de água;
os consórcios de bacias; as resoluções, leis e portarias aplicadas aos recursos hídricos e sistemas
de abastecimento de água.
Desse modo, o estudo dos sistemas de abastecimento de água pela geografia, à luz das
categorias de análise da totalidade espacial, se constitui em uma proposição teórica e
metodológica apoiada em novos referenciais de análise, ou seja, categorias geográficas.
Ressalta-se que tal proposição não objetivou negar ou refutar os estudos realizados por outras
áreas, mas sim, apresentar uma abordagem alternativa para o estudo dos sistemas de
abastecimento de água.
Tal abordagem constitui-se também em um modelo de análise geográfica aplicada ao
estudo dos sistemas de abastecimento de água, com categorias e conceitos próprios da totalidade
espacial. O aprofundamento e operacionalização desse modelo, pode servir de paradigma para
o desenvolvimento das ações de planejamento e gestão dos sistemas de abastecimento de água,
principalmente em relação, ao contingenciamento dos riscos de colapso hídrico, pois alguns
problemas e anomalias desses sistemas estão associadas a configuração espacial e
funcionamento de algumas de suas estruturas (objetos técnicos).
A utilização dessas categorias de análise geográfica é uma ferramenta importante nos
planos diretores de abastecimento de água e nas questões relacionadas ao planejamento e gestão
dos recursos hídricos. Em termos empíricos, os desdobramentos da operacionalização dessas
categorias podem resultar em análises mais complexas, como a construção de sistemas de
indicadores; a elaboração de índices de risco; e o estabelecimento de cruzamentos e correlação
de variáveis, fazendo com que esse modelo de análise, além de possuir uma proposta teórica
bem delimitada, apresente também uma série de possibilidades futuras de aplicações com
respeito a abordagem geográfica dos sistemas de abastecimento de água.
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Referências
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saneamento básico; cria o Comitê Interministerial de Saneamento Básico; altera as Leis
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Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SILVA, Bruno Lopes da; TROLEIS, Adriano Lima. O Sistema de Abastecimento de Água numa Perspectiva Geográfica: uma reflexão
teórica. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 11, nº 24, e112408, 2024.
Submissão em: 19/09/2023. Aceito em: 26/02/2024.
ISSN: 2316-8544
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