Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SACRAMENTO, Ana Claudia Ramos; MORAES, Diego Nascimento. O CONTEXTO DA PRÁTICA DOS PROFESSORES DE
GEOGRAFIA: Documento de Orientação Curricular do Estado do Rio de Janeiro. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 23, e102303,
2024. Submissão em: 31/01/2024. Aceito em: 01/04/2024.
ISSN: 2316-8544
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SEÇÃO ARTIGOS
O Contexto da Prática dos Professores de Geografia:
Documento de Orientação Curricular do Estado do Rio de Janeiro
The Context of Geography Teachers’ Practice:
Rio de Janeiro State Curriculum Guidance Document
El Contexto de la Práctica del Profesorado de Geografía:
Documento de Orientación Curricular del estado de Río de Janeiro
DOI: https://doi.org/10.22409/eg.v10i23.61685
Ana Claudia Ramos Sacramento1
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Faculdade de Formação de Professores (UERJ-FFP),
Rio de Janeiro, Brasil
e-mail: ana.sacramento@uerj.br
Diego Nascimento Moraes2
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Faculdade de Formação de Professores (UERJ-FFP),
Rio de Janeiro, Brasil
e-mail: diegomoraes201618@gmail.com
Resumo
Os professores são parte da construção dos documentos educacionais, pois não os colocam em prática, como
também dão novos significados a eles de acordo com suas concepções teórico-metodológicas. O texto objetiva
analisar como os professores de Geografia interpretam, contestam e reconstroem o Documento de Orientação
Curricular do Estado do Rio de Janeiro (DOC-RJ, 2019), no campo da prática. A partir da metodologia qualitativa,
tendo como base um roteiro de questionário aplicado a vinte e sete professores, buscou-se compreender quem são
eles, suas ponderações a respeito do documento e como foi possível colocar em prática, principalmente, levando
em consideração a pandemia da Covid-19. Os resultados mostram a falta de conhecimento de vários professores a
respeito do documento; desse modo, não sendo possível uma discussão mais aprofundada, inclusive da disciplina
Geografia. Verificou-se que muitos dos docentes entrevistados, se basearam na Orientação Curricular anterior para
planejar e dar prosseguimento às aulas. Isto demonstrou a falta de diálogo da Secretaria de Estado de Educação do
Rio de Janeiro (SEEDUC-RJ) com os professores para debater o novo documento.
Palavras-chave
Contexto da prática; Documento Curricular do Estado do Rio de Janeiro; Geografia.
1
Doutora em Geografia Física pela DG-FFLCH-USP e Professora Associada do Departamento de Geografia da
Faculdade de Formação de Professores, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Pós-doutoranda em Geografia
pelo Programa de Pós-graduação em Geografia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
2
Licenciando em Geografia pela Faculdade de Formação de Professores, Universidade do Estado do Rio de
Janeiro.
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SACRAMENTO, Ana Claudia Ramos; MORAES, Diego Nascimento. O CONTEXTO DA PRÁTICA DOS PROFESSORES DE
GEOGRAFIA: Documento de Orientação Curricular do Estado do Rio de Janeiro. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 23, e102303,
2024. Submissão em: 31/01/2024. Aceito em: 01/04/2024.
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Abstract
Teachers are part of the construction of educational documents, as they not only put them into practice, but also
give them new meanings in accordance with their theoretical-methodological conceptions. The text aims to analyze
how Geography teachers interpret, contest and reconstruct the Curricular Guidance Document of the State of Rio
de Janeiro (DOC-RJ, 2019), in the field of practice. Using qualitative methodology, based on a questionnaire script
applied to twenty-seven teachers, we sought to understand who they are, their considerations regarding the
document and how it was possible to put it into practice, especially considering the Covid-19 pandemic. The results
show the lack of knowledge of several teachers regarding the document; therefore, a more in-depth discussion is
not possible, including the subject of Geography. It was found that many of the teachers interviewed were based
on previous Curricular Guidance to plan and continue classes. This demonstrated the lack of dialogue between the
State Secretary of Education of the Rio de Janeiro (SEEDUC-RJ) and teachers to debate the new document.
Keywords
Context of practice; Rio de Janeiro State Curriculum Document; Geography.
Resumen
Los docentes son parte de la construcción de los documentos educativos, pues no sólo los ponen en práctica, sino
que también les otorgan nuevos significados de acuerdo con sus concepciones teórico-metodológicas. El texto
tiene como objetivo analizar cómo los profesores de Geografía interpretan, cuestionan y reconstruyen el
Documento de Orientación Curricular del Estado de Río de Janeiro (DOC-RJ, 2019), en el campo de la práctica.
Utilizando una metodología cualitativa, basada en un itinerario de preguntas aplicado a veintisiete docentes,
buscamos comprender quiénes son, sus consideraciones sobre el documento y cómo fue posible ponerlo en
práctica, especialmente teniendo en cuenta la pandemia de Covid-19. Los resultados muestran el desconocimiento
de varios docentes respecto al documento; por lo tanto, no es posible una discusión más profunda, incluyendo el
tema de Geografía. Se encontró que muchos de los docentes entrevistados se basaron en Orientaciones Curriculares
previas para planificar y continuar las clases. Esto demostró la falta de diálogo entre la Secretaría de Estado de
Educación del Río de Janeiro (SEEDUC-RJ) y los docentes para debatir el nuevo documento.
Palabras clave
Contexto de la práctica; Documento Curricular del Estado de Río de Janeiro; Geografía.
Introdução
A Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro tem vivenciado desde 2020 a
implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), com o texto do ensino
fundamental publicado no final de 2017, bem como os textos curriculares construídos pelos
estados e municípios brasileiros. Questionamentos e ponderações têm sido feitos para analisar
os resultados iniciais sobre a demanda enviada para as Secretarias de Educação de todo país.
Cada estado e município têm suas singularidades, propondo e promovendo diferentes
articulações de suas políticas educacionais para gerenciar suas demandas internas e externas.
A escolha por trazer o Documento de Orientação Curricular do Estado do Rio de Janeiro
(DOC-RJ, 2019), construído pela Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro
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(SEEDUC-RJ), está em compreender os impactos das políticas educativas e curriculares no
contexto local e como essa prática acontece. A escolha específica dos professores de Geografia
para análise deste estudo está associada à ação de formação dos autores do texto, professores-
geógrafos, ao fato de serem professores efetivos ou contratados da SEEDUC, e por estarem em
atuação e terem que trabalhar com o documento apresentado pela Secretaria. Além disso, a
Geografia é um componente curricular que objetiva analisar as mudanças espaciais e
territoriais, sendo objeto dos anos iniciais e finais do ensino fundamental.
A escolha pela temporalidade 2020-2021 foi feita a fim de compreender os marcos
iniciais da implementação do documento, bem como entender alguns impactos iniciais a partir
dele. Assim, a partir das ideias de Santos (1978) sobre o contexto espacial, considera-se que o
estado do Rio de Janeiro é uma porção do espaço que estabelece um conjunto representativo de
relações sociais com seus processos e funções, se materializando territorialmente.
Destaca-se a relevância geográfica do objeto de estudo, pois os impactos nos
documentos curriculares atingem diretamente o ensino de Geografia, a formação inicial de
professores em Geografia, o trabalho docente de Geografia e os contextos espaciais das escolas
e dos estudantes na construção do conhecimento geográfico. Além disso, a construção e a
desconstrução de pensamentos geográficos e da ciência geográfica estão presentes nos
documentos propostos pelas Secretarias de Educação dos diferentes estados e municípios.
Dessa forma, com o intuito de garantir a obrigatoriedade das mudanças educacionais
estabelecidas pela BNCC (2018), no início da pandemia da Covid-19, sem ponderar todas as
questões de saúde, de educação e de sobrevivência dos professores e estudantes, como também,
sem um diálogo aberto com eles, foi implementado o DOC-RJ.
E o que isso significou para os professores de Geografia? De acordo com Sacramento, Frigério
e Azevedo (2021), diferentes estados tiveram diferentes leituras, interpretações e práticas
pedagógicas de acordo com suas próprias realidades.
Assim, o texto tem a pretensão de analisar como os professores de Geografia
interpretam, contestam e reconstroem o DOC-RJ (2019) no campo da prática, a partir da leitura
sobre o contexto da prática de Ball e Bowe (1992), Mainardes (2006), Lopes e Macedo (2011),
para pensar como o currículo local se manifesta na prática. Este estudo é parte da bolsa de
pesquisa intitulada “As reformas nas Políticas blicas Educacionais Brasileiras: o caso das
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Ciências Humanas e da disciplina Geografia na Formação de Professores”, do Procientista da
UERJ no período de 2021 a 2024, que propõe, como um dos objetivos, avaliar os impactos das
políticas públicas educacionais na formação dos professores do estado do Rio de Janeiro.
Compreende-se que as políticas educacionais são produções estruturadas em diferentes
contextos, por isso Ball e Mainardes (2011, p. 14) argumentam que: “Elas não são, no entanto,
fixas e imutáveis e podem ser sujeitas a interpretações e traduções e compreendidas como
respostas a problemas da prática”. Essas políticas estão em constante movimento porque não
são fixas. Logo, os agentes estão se organizando e se reestruturando para colocar em prática as
necessidades inerentes aos governos vigentes.
A partir da metodologia qualitativa com foco no estudo de caso e na análise crítica,
relacionada ao contexto da prática de Ball e Bowe (1992), Mainardes (2006), Lopes e Macedo
(2011), buscou-se compreender, depois de um ano da implementação do DOC-RJ, por meio de
questionário realizado em 2021, como os professores de Geografia da SEEDUC-RJ analisam o
DOC-RJ e ponderam suas atividades pedagógicas. Para tanto escolhemos para análise: a) a
concepção de elaboração do documento, b) os aspectos gerais do documento; c) a função
pedagógica; d) a definição de Ciências Humanas, e) os elementos teórico-metodológicos da
Geografia; f) as habilidades pertinentes com a escala local e regional; g) os objetivos da
Geografia. Essas variáveis foram escolhidas para compor este texto e contextualizar o leitor a
respeito de alguns aspectos gerais do DOC-RJ, além de destacar elementos que contribuem para
pensar a Geografia.
O texto está dividido em cinco seções: a primeira aborda conceitualmente o significado
dos contextos de Ball e Bowe (1992), levando em consideração o contexto da prática; a segunda
destaca a metodologia qualitativa com foco na análise crítica de um roteiro de entrevista com
vinte e sete professores; a terceira, uma breve análise do Documento de Orientação Curricular
do Estado do Rio de Janeiro; a quarta, sobre os professores da pesquisa do ponto de vista da
identificação e formação profissional; e a quinta aborda o contexto, propriamente dito, da
prática desses professores.
Contexto da prática e seu papel para analisar os professores de Geografia do estado do
Rio de Janeiro
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SACRAMENTO, Ana Claudia Ramos; MORAES, Diego Nascimento. O CONTEXTO DA PRÁTICA DOS PROFESSORES DE
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As políticas voltadas para a educação básica têm causado diferentes leituras a respeito
do papel atual dos professores dentro das reformas fomentadas pelo Governo Federal e os entes
estaduais e municipais. A necessidade de compreender como os professores têm assumido esta
tarefa na prática, ajuda a construir uma ideia a respeito das questões pertinentes sobre aquilo
que Ball e Bowe (1992) têm buscado mostrar sobre as influências, planejadas no campo do
contexto de influência , materializadas no campo da produção de texto , e interpretadas,
contestadas e reconstruídas no campo da prática. Além disso, Mainardes (2006) destaca a
ampliação por Ball (1994) da discussão para mais dois contextos: o contexto dos resultados
(efeitos) e o contexto da estratégia política. Dessa maneira, não se pode limitar o debate pelo
documento em si, mas como a interpretação aparece para os sujeitos que estão envolvidos no
processo dos múltiplos sentidos e contextos que cada um atribui ao receber os documentos
educacionais, de maneira geral.
Segundo Mainardes (2006), esses contextos estão relacionados entre si, contudo, o
são lineares, podendo aparecer suas diferentes dimensões, a partir de como os contextos, de
acordo com os agentes, estão envolvidos nas disputas e nos embates de domínio sobre eles. A
pretensão no texto não é aprofundar todos os pontos em si, somente o contexto da prática.
Especificamente desde 2010, tem se visto mais atentamente a formação e a
concretização das políticas educacionais no Brasil. No campo do contexto de influência, os
autores Libâneo (2014), Lima (2007), Pereira e Sacramento (2019), dentre outros, apontam para
as discussões referentes às influências internacionais na construção das políticas nacionais.
No campo da produção textual, a construção se materializa nos textos políticos,
articulados ao que está na idealização do campo da influência. Em se tratando da BNCC, Lopes
(2018), Macedo (2014, 2018), Pereira, Costa e Cunha (2015), Morais, Sacramento, Oliveira e
Moraes (2018), dentre outros, também potencializaram vários debates.
No contexto dos resultados ou efeitos, preocupa-se com questões de justiça, igualdade
e liberdade individual e, por último, o contexto de estratégia política, que envolve a
identificação de um conjunto de atividades sociais e políticas, as quais seriam necessárias para
lidar com as desigualdades criadas ou reproduzidas pela política investigada.
O Plano Nacional de Educação (2014), com as metas colocadas para melhoria da
Educação Básica, traz pontos a respeito da Base Nacional Comum Curricular (2018) e a
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SACRAMENTO, Ana Claudia Ramos; MORAES, Diego Nascimento. O CONTEXTO DA PRÁTICA DOS PROFESSORES DE
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necessidade de reorganização regional e local para que as demandas referentes ao cumprimento
das metas sejam realizadas de maneira efetiva. Por isso, a implementação da BNCC,
correspondente ao Ensino Fundamental, se faz necessária pelas unidades federativas, para se
adequarem por força de lei aos seus documentos curriculares.
Destarte, a implicação desse texto está em pensar: O que é o contexto da prática? Ball e
Bowe (1992) salientam que o contexto da prática seria onde a política está sujeita à leitura,
interpretação e reconstrução pelos sujeitos que produzirão esses conhecimentos a partir daquilo
que compreendem dos textos para a realidade da prática. Assim, a política se traduz nos efeitos
e possíveis mudanças e transformações significativas dentro da política original. Dessa forma,
as políticas não podem simplesmente ser postas, pois estão sujeitas à interpretação e, portanto,
a serem reestruturadas (Mainardes, 2006).
Por isso, é importante pensar que cada instituição, por meio de sua particularidade e
singularidade, se reorganiza politicamente em diferentes aspectos da educação. Desse modo,
elas passam por diferentes processos, transformando a política original. Entende-se aqui que a
SEEDUC-RJ, ao implementar o DOC-RJ, compreenderá as mudanças também necessárias para
o seu funcionamento, pois os professores de Geografia podem dar ou não novos sentidos e
significados a ele. Para Lopes e Macedo (2011), o contexto da prática se torna uma arena na
qual a política produz efeitos e consequências, isto é, em que os professores de Geografia da
SEEDUC podem reconstruir suas leituras e práticas, partindo de sua própria compreensão,
elaborando, assim, novas formas de interpretação e análise sobre o DOC-RJ de Geografia.
Nesse momento, compreende-se como as políticas entram em ação e são desenvolvidas,
por meio das práticas dos professores no contexto da sala de aula. Portanto, “[o] contexto da
prática é um espaço de intensa produção de políticas educacionais, onde os sujeitos têm o poder
de decidir, a partir dos embates e conflitos locais, o que é importante reelaborar ou “descartar”.
É nesse espaço que as políticas ganham ‘corpo’” (Rodrigues; Barbosa, 2016, p. 112).
Considera-se eminente ponderar que os professores são parte ativa nas mudanças
educacionais, de forma que não podem estar de fora do processo. Eles precisam estar em
movimento, integrados a todas as ações realizadas nos diferentes entes federativos e outros
movimentos educacionais, para que possam também manifestar suas ponderações e questões a
respeito das políticas educacionais.
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Os professores e demais profissionais exercem um papel ativo no processo de
interpretação e reinterpretação das políticas educacionais e, dessa forma, o que eles
pensam e no que acreditam têm implicações para o processo de constituição das
políticas e suas implicações no contexto da prática, arena de construção de políticas
(Ball; Bowe, 1992).
Sendo assim, não se pode entender o contexto da prática apenas como uma etapa de
implementação de políticas, pois os professores são sujeitos ativos, não tendo suas funções
limitadas a atender às exigências das políticas controladoras de todo o processo organizacional,
político e pedagógico. Pelo contrário, eles são aqueles que se colocam e se manifestam como
parte desse processo.
Procedimento para análise do contexto da prática dos professores de Geografia do Estado
do Rio de Janeiro
O desenvolvimento da metodologia qualitativa se faz a partir do estudo de caso, tendo
como base pensar a análise do método dialético para interpretar os fenômenos relacionados ao
desenvolvimento dela; neste caso, o objeto são as leituras e as interpretações dos professores
de Geografia a respeito do DOC-RJ (2019).
Segundo Netto (2011, p. 25), o papel do sujeito é de “ser capaz de mobilizar um máximo
de conhecimentos, criticá-los, revisá-los e deve ser dotado de criatividade e imaginação”. Dessa
maneira, entender que o método dialético se torna a forma de discurso entre duas ou mais
pessoas que possuem diferentes pontos de vista sobre um mesmo assunto, mas que pretendem
estabelecer a verdade por meio de argumentos fundamentados.
Defende-se o estudo de caso nesta pesquisa, porque para Ludke e André (2013), o caso
é sempre bem delimitado, pois tem um interesse próprio, singular; ainda que possa ser similar
a outros casos. Entende-se que a delimitação seja necessária para que se possa avaliar melhor o
caso específico dos professores de Geografia da Secretaria de Estado de Educação do Rio de
Janeiro (SEEDUC).
A delimitação do estudo tem como base a identificação dos elementos-chave e dos
contornos aproximados do problema. Tais informações são, então, analisadas sistematicamente
durante toda a pesquisa e os resultados obtidos devem ser expostos no relatório a última
etapa do estudo de caso. Embora explicitadas numa sequência, essas fases não ocorrem num
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encadeamento linear, contudo se interceptam em vários momentos, sugerindo um movimento
constante no confronto teoria-empiria (Ludke; André, 2013).
Por se tratar também da articulação entre o contexto de influência, da produção de texto
e, principalmente, o campo da prática (Ball; Bowe, 1992; Mainardes, 2006), não se pode limitar
a discussão pelo documento em si, do DOC-RJ, mas sim, como a interpretação é realizada pelos
sujeitos que estão envolvidos no processo dos múltiplos sentidos e contextos, e como cada um
os atribui ao receber os documentos educacionais de maneira geral.
Assim, os procedimentos foram realizadas da seguinte forma: 1) levantamento
bibliográfico, 2) análise do Documento de Orientação Curricular do Rio de Janeiro da disciplina
Geografia, a fim de compreender quais são os elementos presentes nos documentos, como
forma de intervenção dos conhecimentos geográficos; 3) construção de roteiro de questionário
com treze perguntas constituídas para pensar o DOC-RJ, com o intuito de compreender as suas
práticas e desafios frente às novas políticas curriculares; 4) envio do questionário para cinquenta
professores, com resposta de vinte e sete; 5) análise das respostas.
O material do questionário foi elaborado e enviado por formulário Google Forms para
os e-mails e contatos de WhatsApp de cinquenta professores de Geografia, tendo sido
respondido por vinte e sete deles. Os professores selecionados atuam em diferentes municípios
do estado do Rio de Janeiro, a fim de se obter uma amostragem de diferentes lugares, não sendo
colocadas as perguntas referentes à BNCC. Foram ao todo oito perguntas para identificação,
cinco sobre a atuação profissional e cinco sobre a DOC-RJ, conforme apresentado no quadro
1.
Quadro 1 Roteiro do questionário
(I) IDENTIFICAÇÃO DO (A) PROFESSOR (A)
1. Nome
2. E-mail
3. Instituição onde se graduou em Geografia.
Ano que concluiu a graduação.
4. Licenciatura: ( ) Sim ( ) Não
5. Bacharel: ( ) Sim ( ) Não
6. Possui especialização: ( ) Sim ( ) Não Qual foi o ano de conclusão? E em qual instituição?
7. Possui mestrado: ( ) Sim ( ) Não Qual foi o ano de conclusão? E em qual instituição?
8. Possui doutorado: ( ) Sim ( ) Não Qual foi o ano de conclusão? E em qual instituição?
(II) ATUAÇÃO PROFISSIONAL
1. Há quantos anos é professor de Geografia: 0 a 5 anos ( ); 6 a 10 anos ( ); 11 a 15 anos ( ); 16 a 20 anos ( );
21 a 25 anos ( ); mais de 26 anos.
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GEOGRAFIA: Documento de Orientação Curricular do Estado do Rio de Janeiro. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 23, e102303,
2024. Submissão em: 31/01/2024. Aceito em: 01/04/2024.
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2. Em que rede de ensino trabalha
Na rede privada, em qual município?
Quantas horas? 01 a 16 h, 16 a 20h, 20 a 32 h.
Na rede municipal, em qual município?
Quantas horas? 16 h, 32 h.
Na rede federal, em qual município?
Quantas horas? 12 h, 16h, 30h, 40 h.
3. Qual é seu vínculo empregatício na rede estadual? Contrato efetivo/concursado
4. Em qual nível de ensino atua na rede estadual? ( ) Ensino Fundamental anos iniciais; ( ) Ensino fundamental
anos finais; ( ) ensino médio e ensino superior.
Em qual nível de ensino atua em outra rede? ( ) Ensino Fundamental anos iniciais; ( ) Ensino fundamental
anos finais; ( ) ensino médio e ensino superior.
5. Em qual estado?
(III B) CONHECIMENTO SOBRE O DOC-RJ
1. Como ocorreu o processo de elaboração do DOC-RJ?
2. Foi informado (a) sobre a implementação do DOC-RJ? Em caso positivo, como, onde ou por quem?
3. Foi em alguma reunião relacionada ao DOC-RJ? Em caso positivo, qual seu entendimento sobre o
documento?
4. Como compreende a distribuição das unidades temáticas e habilidades?
5. Consegue identificar quais elementos da Geografia são predominantes no DOC-RJ?
6. A implementação do DOC-RJ está sendo possível em sua escola? Como você está ensinando a disciplina
Geografia neste momento?
Fonte: Sacramento; Moraes (2021).
Documento de Orientação Curricular-RJ de Geografia: implicações no contexto da
prática
A SEEDUC-RJ produziu seu próprio currículo, denominado Documento de Orientação
Curricular do Estado do Rio de Janeiro de Geografia, em 2019. Este texto tem como objetivo
cumprir as recomendações do Ministério da Educação para mobilizar uma série de
competências e habilidades a fim de promover a aprendizagem dos estudantes, bem como
reorganização da gestão pedagógica nas escolas, baseando-se nas diretrizes da BNCC e em
documentos normativos da educação nacional. Com isso, é realçada a importância de um
documento que priorize uma base curricular comum que possa ser sólida nas escolas de todo o
estado do Rio de Janeiro.
O estado do Rio de Janeiro conta com uma diversidade cultural, regional, educacional,
econômica e ambiental diferenciada, permitindo a leitura espacial de múltiplas maneiras.
Assim, seus noventa e dois municípios e suas regiões de governo têm forma, conteúdo, função,
processos e resultados que permitem construir cenários diversos, no qual Santos (1996)
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argumenta ser um fenômeno técnico, uma das principais condições históricas de transformação
do espaço, juntamente com outros processos econômicos, culturais e políticos.
O estado tem a terceira maior população do Brasil e foi classificado como o segundo
mais rico do país (IBGE, 2022). Desta forma, ainda é um espaço de articulação nacional, de
certa maneira, de um centro cultural, político e econômico como sede do poder, de parte do
centro financeiro do país e sede de empresas públicas e privadas que atuam não só no território
brasileiro, mas também no latino-americano. Portanto, pensar sua política educacional é parte
dessa relação de compreensão espacial do estado.
O DOC-RJ (2019) é parte do contexto da produção do texto. Sendo assim, ele está
impregnado de ideologias advindas do texto da BNCC, que representam os textos políticos
vinculados ao Governo Federal. Sendo construído para atender as demandas estabelecidas pelo
Ministério da Educação (MEC) num contexto neoliberal, de restrição democrática e jurídica.
Esse currículo apresenta elementos iguais ou similares à BNCC (2018) como forma de
alinhamento de concepções pedagógica, ideológica e filosófica, bem como sugestões de temas
a serem descritos no documento para padronizar o conhecimento nas salas de aula. A reforma
aconteceu:
dentro das pressões seletivas do Estado e das forças mercadológicas que imperam nos
últimos anos no Brasil. Desde a década de 1990 diversas propostas curriculares
pautaram-se em antigas estratégias do mundo dos negócios. Enquanto as ações são
ajustadas para garantir a própria manutenção do capital, é reforçada a preservação das
desigualdades sociais, culturais e econômicas (Barbosa, 2021, p. 98).
O DOC-RJ (2019) é fruto da ação colaborativa entre a União Nacional do Dirigentes
Municipais de Educação Municipais de Educação (UNDIME-RJ), a Secretaria de Estado de
Educação (SEEDUC-RJ), a União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação do Rio de
Janeiro (UNCME-RJ) e o Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro (CEE-RJ) (DOC-
RJ, 2019). Por consequência, ao longo de 2018,
as equipes da SEEDUC e da UNDIME trabalharam na produção de uma orientação
curricular para o Estado do Rio de Janeiro de forma alinhada à BNCC. O grupo de
redatores e coordenadores contou com 25 (vinte e cinco) professores de redes
municipais, estadual e das escolas privadas, bem como pesquisadores da área da
educação vinculados a universidades. Foram realizados cinco seminários regionais, a
fim de compartilhar as experiências do grupo com profissionais de educação, bem
como houve a coleta de contribuições por meio virtual (SEEDUC, 2019, p. 10).
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AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SACRAMENTO, Ana Claudia Ramos; MORAES, Diego Nascimento. O CONTEXTO DA PRÁTICA DOS PROFESSORES DE
GEOGRAFIA: Documento de Orientação Curricular do Estado do Rio de Janeiro. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 23, e102303,
2024. Submissão em: 31/01/2024. Aceito em: 01/04/2024.
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Abordando uma visão mais crítica deste documento, o texto de apresentação do
documento curricular do Estado do Rio de Janeiro traz alguns problemas, sendo um deles o fato
de ser uma reprodução direta da Base Nacional Comum Curricular. Além de também apresentar
incoerência na parte metodológica. Barbosa (2021), em sua dissertação de mestrado, traz
diferentes discussões a respeito desse tema.
Outro ponto destacado no documento é avaliar o que os estudantes devem “saber” e o
que devem “saber fazer” (SEEDUC, 2019, p. 23). A lógica está de acordo com a base comum
do currículo (Lopes; Macedo, 2011), ou seja, a ideia de uma organização prévia que não é
questionada.
Durante o processo de formação, o documento visava beneficiar os professores nos
processos pedagógicos, auxiliando nas suas práticas de ensino aprendizagem, agindo como um
instrumento que poderia ajudar tanto os alunos quanto os professores a concretizarem seus
objetivos dentro da sala de aula. Contudo, como destacado por Barbosa (2021), alguns
professores das escolas da rede estadual foram requisitados a fazer uma avaliação crítica, mas,
de fato, as discussões não foram ampliadas para que todos da rede pudessem participar. Mesmo
as audiências públicas o tiveram essa contemplação. Daí vem a necessidade de saber como
os professores de Geografia tiveram conhecimento desse documento e suas discussões a
respeito do DOC-RJ.
O DOC-RJ começa definindo a área das Ciências Humanas com os mesmos princípios
da Base Nacional Comum Curricular: “[...] essa é a proposta da Base Nacional Comum
Curricular, documento norteador para a construção do Documento de Orientação Curricular do
Estado do Rio de Janeiro” (SEEDUC, 2019, p. 391). No texto introdutório, ocorre uma
apresentação sobre as Ciências Humanas baseada na BNCC e, assim como a BNCC, o DOC-
RJ não define a origem das Ciências Humanas. Essa área tem como discussão geral pensar o
ser humano como aquele que produz o espaço a partir de determinadas formas históricas, por
ser o principal sujeito das mudanças sociais. Os espaços são construídos por meio de diversos
fatores: sociais, econômicos, entre outros.
O DOC-RJ para o ensino de Geografia apresenta uma discussão com pouco fundamento
do ponto de vista teórico-metodológico, além de não evidenciar quais são os conceitos
geográficos importantes para serem trabalhados com os estudantes. Assim como a BNCC, o
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SACRAMENTO, Ana Claudia Ramos; MORAES, Diego Nascimento. O CONTEXTO DA PRÁTICA DOS PROFESSORES DE
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foco de análise são os anos finais (6° ao ano) do ensino fundamental. O quadro de
habilidades, nos anos finais, sofreu apenas oito mudanças com conteúdos relacionados ao Rio
de Janeiro.
Também foram encontrados problemas relacionados à Geografia apresentada como, por
exemplo, as bibliografias que não se relacionam com os textos. Com isso, se torna uma
disciplina descaracterizada, desfigurada, sem conexão clara no campo do conhecimento e da
ciência. Portanto, com essas problemáticas, a implementação do DOC-RJ, para alguns
professores, se torna um desafio no que tange à aplicação do documento dentro da sala de aula.
Analisando de maneira geral, somente os alunos do e anos têm habilidades
referentes às temáticas relacionadas ao estado do Rio de Janeiro, e temas fundamentais não são
tratados nos anos finais do componente curricular Geografia. As habilidades referentes aos anos
8º e 9º são cópias da BNCC.
Na parte “Geografia: Anos Finais do Ensino Fundamental”, O DOC-RJ entra em
contradição, pois:
Ainda no contexto do documento, se repensou de forma mais simples, o papel da
educação e do ensino de Geografia, destacando sua importância da inserção social, do
estudo local, o conhecimento do Rio de Janeiro como espaço transformado e a
necessidade de adaptar às exigências do mundo contemporâneo (SEEDUC, 2019, p.
398).
Desse modo, questiona-se: qual seria a lógica de criar um currículo estadual (DOC-RJ),
se nele, os anos finais do ensino fundamental, em Geografia, se baseiam quase que totalmente
na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e apresentam poucas informações sobre o estudo
local?
Pode-se corroborar, a partir da análise de Barbosa sobre a Geografia, que
o padrão das habilidades nacionais continua completamente igual ou muito
semelhante. O DOC-RJ aponta mais para os riscos de uma centralização curricular e
de uma prescrição para o que significa ser professor e aluno. Quando define
estritamente comportamentos, requer sujeitos passivos sem originalidade. Os efeitos
podem ser tanto materiais quanto ideológicos na imposição do currículo oficial
(Barbosa, 2021, p. 98).
Sendo assim, compreende-se, com a leitura do documento, que este é parte da
construção de um conjunto de pessoas que escreveram, partindo de um pouco de vista mais
geral e por especialistas dos diferentes componentes curriculares, no caso da Geografia. Por
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isso, observa-se que as discussões referentes às habilidades descritas sobre o Rio de Janeiro
deveriam ser a parte dos 40% significativos para trabalhar a Geografia, como destacado no
próprio material.
Os sujeitos do contexto da prática: quem são?
Os professores são aqueles que proporcionam no contexto da prática as relações teórico-
práticas dos documentos curriculares, os quais proporcionam e recebem essas políticas, dando
novos significados, sentidos, interpretações e análises diferenciadas. Eles leem e traduzem os
escritos a partir de suas diferentes concepções teórico-metodológicas e suas experiências
vivenciadas no cotidiano escolar.
Foram convidados cerca de cinquenta (50) professores de Geografia que atuam na rede
de escolas públicas no estado do Rio de Janeiro, tendo vinte e sete deles respondido ao
questionário. O questionário foi enviado entre 20 de fevereiro a 20 de abril de 2021, e contém
quatro eixos de perguntas no total: (I) identificação geral do professor; (II) atuação profissional;
(IIIA) Conhecimento sobre a BNCC - componente Geografia (não explorado neste texto) e
(IIIB) Conhecimento sobre o DOC-RJ - componente Geografia.
Os vinte e sete (27) professores serão identificados como P1, P2, e assim
sucessivamente. Neste primeiro momento, serão analisados os dados mais gerais, tais como, (I)
identificação dos professores e (II) atuação profissional.
A primeira pergunta está relacionada à instituição de formação de graduação, uma vez que todos
os professores são licenciados em Geografia, sendo um formado fora do estado do Rio de
Janeiro, na Universidade de São Paulo (USP); todos formados entre 1996 a 2015 (Gráfico 1).
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Gráfico 1 Instituição de formação de graduação dos professores de Geografia da SEEDUC-
RJ
Fonte: Sacramento; Moraes (2021).
Desses professores, sete têm bacharelado em Geografia, vinte e dois possuem
especializações em diferentes áreas de formação (Tabela 1), doze deles têm mestrado nas
seguintes instituições: UERJ-FFP (Universidade do Estado do Rio de Janeiro Faculdade de
Formação de Professores) (5), UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) (3), UFF
(Universidade Federal Fluminense) (2), UFF Campos Goytacazes (1) e IPUR-UFRJ (Instituto
de Planejamento Urbano Universidade Federal do Rio de Janeiro (1), e dois cursando
doutorado na UFF.
Tabela 1 Instituto de formação da especialização dos professores de Geografia SEEDUC-
RJ
INSTITUTO SUPERIOR
QUANTIDADE
UERJ
7
UERJ-FFP
6
UFF
3
Colégio Pedro II
2
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Universidade Católica de Petrópolis
1
Faculdade São Luiz
1
IFRJ
1
Universidade Veiga de Almeida
1
Fonte: Sacramento; Moraes (2021).
Pode-se analisar, que parte dos professores tem buscado se aperfeiçoar nos diferentes
níveis, tendo 40% deles realizado o mestrado. A formação tem se tornado um aspecto relevante
para se pensar em meios de transformar esses contextos impostos pelas Secretarias.
Em relação ao tempo de magistério, conforme Tabela 2, 55% dos professores estão na
faixa entre 6 a 10 anos e de 11 a 15 anos entre 30%, ou seja, 85% numa faixa de amadurecimento
profissional. Esses professores trabalham em mais de uma escola, além da Secretaria de
Educação do Estado do Rio de Janeiro (SEEDUC). Sendo dezenove deles, em diferentes redes
municipais, seis em redes privadas e um, em rede federal; em média acima de trinta e duas horas
semanais.
Tabela 2 Tempo de magistério dos professores de Geografia SEEDUC
QUANTIDADE DE PROFESSORES
1
14
8
2
2
0
Fonte: Sacramento; Moraes (2021).
O tempo de magistério é importante para destacar as ações didático-pedagógicas dos
professores, bem como seu processo de identidade profissional. Sendo assim, esses professores
têm certo tempo de serviço, o que implica em determinadas atitudes em relação à maneira
como lidam com as renovações curriculares, os problemas vinculados a elas, a organização e
planejamento didático, dentre outros elementos que compõem as dinâmicas das ações nas
escolas. Além das escolas estaduais, dezenove desses professores ministram aulas em escolas
municipais, quatro em escolas privadas e um, em uma escola federal. No momento, vinte e
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quatro professores têm dupla jornada em duas instituições, e três deles têm duas matrículas no
estado ou aumento de carga horária.
Em relação ao tempo de aula, na rede estadual, dezenove lecionam 30h e oito lecionam
16h; na rede municipal, três lecionam 12h, treze lecionam 16h e um leciona 40h; na rede
privada, quatro entre 0 a 16h e dois entre 20 a 32 horas.
De acordo com o contexto espacial na rede estadual, os professores estão localizados
em diferentes municípios do estado do Rio de Janeiro, os quais apontam para a análise dos
impactos da atuação deles nesses lugares, com base na organização dos municípios por região
de governo apresentado aqui: região metropolitana, região norte fluminense e região das
baixadas litorâneas. Cada município tem suas particularidades em relação às dinâmicas e
fenômenos dos seus diferentes contextos, o que implica também nos deslocamentos das técnicas
e nos movimentos dos objetos e nas pessoas nestes lugares, afetando também a dinâmica de
como os professores concebem e estruturam suas práticas para relacionar os fenômenos
espaciais locais. São Gonçalo - 7 professores, Rio de Janeiro - 5, Itaboraí - 3, Cachoeiras de
Macacu, Campos de Goytacazes, Duque de Caxias, Niterói, Nova Iguaçu, Queimados, Rio das
Ostras, São João de Meriti, Seropédica - 1 cada. Dois não responderam (Figura 1).
Atuam em escolas das redes municipais do estado do Rio de Janeiro: Rio de Janeiro - 6,
Itaboraí - 2, Magé- 2, Itaguaí, Macaé, Mesquita, Cachoeiras de Macacu, Nova Iguaçu, Rio das
Ostras, São João de Barra - 1 cada. Dois não responderam se atuam em escolas das redes
municipais no estado do Rio de Janeiro.
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Figura 1 Mapa de Localização das escolas de atuação dos professores da Secretaria do
Estado de Educação do Rio de Janeiro
Fonte: Dados de Sacramento; Moraes (2021); organizado por Silva (2023).
O contexto da prática dos professores de Geografia sobre DOC-RJ
Esta parte da resposta corresponde ao item do questionário: (IIIB) Conhecimento sobre
o DOC-RJ componente Geografia, no qual os professores tinham que responder se ele saberia
informar como ocorreu a elaboração do DCO-RJ; se ele sabia sobre sua implementação; se
tinha ido a alguma reunião a respeito do DOC-RJ; se tinha entendimento sobre o DOC-RJ; se
sabiam dizer quais os elementos da Geografia são predominantes; se a implementação do DOC-
Geografia-RJ tem sido possível em sua escola e como está ensinando a disciplina Geografia
neste momento.
De acordo com Ball, Maguire e Braun (2016, p. 14), os professores são os agentes do
contexto da prática:
[...] esses textos não podem ser simplesmente implementados. Eles têm de ser
traduzidos a partir do texto para a ação colocados em prática , em relação à história
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e ao contexto, com os recursos disponíveis”. Sabendo disso, cada espaço onde a
política precisa ser alcançada possui seus próprios interesses, demandas e
perspectivas, que não cabem ser negligenciados.
Em vista disso, verifica-se a importância de compreender as ações e propostas dos
professores de Geografia frente às demandas trazidas pela implementação do DOC-RJ. Assim,
essas respostas são consequências reais vivenciadas dentro do terceiro contexto, o contexto da
prática.
A respeito de como ocorreu o processo de elaboração do Documento de orientação
Curricular do Estado do Rio de Janeiro (DOC-RJ), dezenove (19) professores envolvidos não
tiveram conhecimento deste processo de formação do documento, sendo eles os P1, P2, P4, P5,
P6, P7, P9, P10, P11, P12, P14, P15, P19, P22, P23, P24, P25, P26 e P27. Entretanto, oito (8)
docentes estiveram cientes dessas informações. A título de exemplo, a P1 e a P3 tiveram
diferentes experiências em relação ao processo de elaboração: a P1 afirmou que, quando entrou
na rede de ensino, o documento estava pronto, enquanto a P3 participou de encontros
realizados com os docentes para debater sobre a formação do DOC-RJ. O P8 disse que foi por
meio de “uma consulta pública pelos professores”. P13 disse “que teve professores
selecionados”. P16 afirmou: “Houve uma comissão orientada por técnicos do MEC”; P17
declarou: “O documento foi formulado por professores da rede e professores doutores”; P 18
sinalizou que foi discutido “por reuniões e GT”. P 20 alegou: “Por imposição do SEEDUC, que
realizou algumas poucas consultas públicas”, e P 21 disse que aconteceu entre 2018 e 2019,
através de reuniões com os representantes das secretarias estadual e municipal de educação,
sem a participação dos docentes em regência”.
Barbosa (2021, p. 92) chama a atenção para o fato de que os professores continuam
tendo pequena e marginal participação nos processos vinculados às demandas curriculares, por
meio de limitadas contribuições no texto.
Além disso, vinte e dois deles disseram que sabiam da implementação do documento
enquanto cinco não estavam cientes. Somente um professor foi em alguma reunião a respeito
do DOC-RJ. Somente seis responderam como souberam dessa implementação:
P8: Nas escolas, por parte das direções como mero formalismo. E por palestras de
professores de Geografia, de esclarecimento para nós professores da Educação básica
que muitas vezes não estamos bem-informados por diversos motivos. Ressalto a
presença da UERJ-FFP, na escola, importante maneira de militância nas bases.
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P13: Por meio da direção da escola.
P17: Na rede municipal de Mesquita. Uma professora que compôs a comissão do
estado fez uma fala conosco sobre a proposta. Depois, esse documento apareceu na
minha caixa de e-mail enviado pela escola sem qualquer debate.
P18: Reunião pedagógica.
P20: Inicialmente, na escola mesmo. Entre burburinhos de professores. Mas a busca
pela compreensão foi pessoal.
P21: Pelos diretores da escola.
De acordo com as respostas dos professores, em relação à implementação do DOC-RJ
em suas escolas, dezessete (17) encontraram dificuldades em colocar em prática esse
documento. Portanto, os professores ainda estavam utilizando o documento antigo como
parâmetro para suas aulas. Os professores 2, 3, 4, 6, 10, 15, 17, 19, 20, 21 e 24 compartilham
dessa mesma linha de raciocínio; eles analisam esse novo documento, destacando as
dificuldades na aplicação durante o período de pandemia, com as aulas remotas, fugindo dos
conteúdos e informações mais relevantes do atual momento.
Em relação à Geografia em si, sobre quais elementos são predominantes, os Professores
18 e 26 foram os únicos que trouxeram respostas sobre quais os elementos predominantes da
Geografia presentes no DOC-RJ, sobre a qual a P18 disse: “Acredito que os conceitos
geográficos são norteadores de todo o processo. Lugar, escala, paisagem, território, região e
espaço são caminhos para todo o conteúdo que é proposto sob a condição interdisciplinar”.
Contudo, a P26 trouxe a resposta: “Não. A Geografia apresentada é superficial”. Com esse
comentário, nota-se que a presença da Geografia no documento aparece como um apanhado de
indefinições, que dificulta sua aplicação teórica dentro da sala de aula. Os demais professores
não responderam essa informação.
Para finalizar a respeito da implementação do DOC-Geografia-RJ, se vinha sendo
possível na escola e como estava sendo ensinado, dezesseis professores responderam essa
questão, mas de diferentes formas. Uma das questões pontuadas foi sobre a necessidade de
implementar o DOC-RJ no meio da pandemia da Covid-19, levando em consideração que
muitos professores não tinham ainda se apropriado de leituras sobre o documento, enquanto
muitos não o conheciam. Por que em diferentes casos as práticas do ensino remoto o foram
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as mesmas para todos? Muitos estudantes não tiveram acesso à internet, isto implicando o uso
de plataformas, como o WhatsApp e o Facebook, e outros usaram material impresso, sem poder
ter contato com o docente. Isso aconteceu em diferentes municípios do estado do Rio de Janeiro
e foi relatado pelos professores nos textos, a seguir. Desse modo, Carlos (2020) corrobora essa
realidade ao mostrar que:
o cotidiano (além de ser uma repetição de atividades ao longo do dia e da semana)
contempla, de modo mais complexo, como são usados e representados os espaços-
tempos dedicados e necessários à realização da vida, bem como o modo como esse
processo se realiza diferencialmente: nem todos tem acesso a redes de computadores,
celulares e a internet rápida. E muitos, nem comida na dispensa (p. 13).
Não diretamente, mas percebe-se que a autora contribui para tratar da vivência tanto dos
professores como dos estudantes, das diferentes necessidades inerentes ao trabalho, mas da
própria vida cotidiana. Não ter um celular, uma rede de internet rápida e nem comida, foram e
são marcas ainda vivenciadas por muitos que não tiveram condições de trabalhar de maneira
adequada, ficando doentes, desestabilizados emocionalmente, desnutridos. Mas ao mesmo
tempo, no caso do docente, ter que continuar a organizar suas dinâmicas de trabalho inerentes
às condições.
De acordo com a pesquisa, os professores trouxeram informações distintas em relação
ao processo de ensino-aprendizagem durante a pandemia da Covid-19, além de mencionar se a
implementação do documento estava sendo possível em suas escolas e como cada professor
ensinava Geografia durante aquele momento; demonstrado nas respostas abaixo.
P1: Aulas ao vivo e envio de materiais e atividades online.
P2: Utilizando um currículo e adaptando ao livro didático disponível.
P14: A implementação, por se tratar de escola pública, é de decisão individual de cada
profissional.
P17: Em tempo normal, sim.
De acordo comas respostas dos professores 1, 2, 14 e 17, a implementação desses
materiais, em suas respectivas instituições de trabalho, estava sendo utilizada com mais vigor,
sendo trabalhados de diferentes formas.
P3: Não está em curso.
P4: Ninguém da minha escola falou sobre esse documento.
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P6: Ainda não. Estou seguindo em parte o currículo básico com projetos que não
cabem no currículo básico. Devido ao seu aspecto generalizador e pouco próximo às
vivências dos estudantes.
P16: Não foi discutido na escola. Fazendo uso do currículo que já utilizava.
P18: Não. Encontro dificuldades porque os professores não compreendem o trabalho
que tento desenvolver. Eles só executam um ensino tradicional mesmo.
P19: Não. Ainda não tivemos orientação sobre a implementação do documento.
P21: Documento ainda não foi repassado para a escola. Estou seguindo as orientações
curriculares anteriores, mas alterei a disposição de alguns temas alinhando à BNCC.
Com as respostas dos professores 3, 4, 6, 16, 19, 18 e 21, nota-se que o documento não
foi repassado para as escolas, juntamente com a falta de informação necessária para a
implementação deste documento.
P9: Em geral, não me oriento pelo currículo oficial. Por exemplo, sigo uma
determinada cronologia quanto a processos de formação da Terra e formação do
capitalismo, a partir de algum conceito da ciência geográfica.
P20: Não. Especialmente porque nesse contexto de pandemia o ensino-aprendizado
não está ocorrendo de forma regular.
P26: Não tem sido possível eu estou ensinando geografia de acordo com que acho
necessário e importante.
Observando os padrões dessas respostas, compreende-se que elas dialogam entre si, com
algumas ressalvas. O P9 não trabalha diretamente com o currículo oficial, o P26 leciona,
segundo afirma, da forma mais benéfica para os alunos. Contudo, o P20 traz o fator pandemia
como um elemento dificultador no processo de ensino e aprendizagem, alegando um
movimento irregular na educação neste período.
Por fim, o P24 diz: “Pelo que percebo, a implementação será feita ‘na marra’, com os
professores tendo que trabalhar como conseguirem, com pouca ou nenhuma instrução
específica. No momento, estamos utilizando a ferramenta ‘Aplique-se’, da SEEDUC-RJ”. Com
isso, entende-se que a implementação, segundo o professor, “será feita na obrigatoriedade, e
que o professor encontre soluções plausíveis para pôr em prática este documento, mesmo sem
auxílio nenhum”.
Os demais professores, P5, P7, P8, P9, P10, P11, P12, P13, P15, P22, P23, P25 e P27,
não informaram essa resposta no questionário. Não sabemos o porquê da falta de resposta, mas
aventamos a possibilidade de que tenha havido alguma dificuldade em responder esse
questionamento, uma vez que não tiveram contato direto com o documento até o momento da
investigação.
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Dessa forma, no primeiro ano de implementação, analisa-se as dificuldades, salientando
que “[i]sso envolve identificar processos de resistência, acomodações, subterfúgios e
conformismo dentro e entre as arenas da prática, e o delineamento de conflitos e disparidades
entre os discursos nessas arenas(Mainardes, 2006, p. 50). Nota-se resistências e acomodações
no processo vinculado ao DOC-RJ, provocando uma reflexão sobre o papel dos professores no
primeiro ano de sua aplicação no estado do Rio de Janeiro, em meio a pandemia da Covid-19:
será que isso era necessário?
Considerações finais
Diante das discussões e dos resultados expostos, é perceptível a falta de diálogo da
SEEDUC com os professores de Geografia da rede. Pode-se analisar através das respostas
dadas, a falta de conhecimento no momento em que a investigação estava sendo
desenvolvida do que significa o DOC-RJ e o componente curricular Geografia, inclusive,
mediante a pandemia da Covid-19.
Respondendo à pergunta inicial: o que significa para os professores terem implementado
o DOC-RJ nos anos de 2020 e 2021? Pode-se considerar que eles praticamente ignoraram o
documento e construíram suas práticas, partindo do que já conheciam ou do que era pertinente
para eles, uma vez que não tinham conhecimento dele. Por que não tinham conhecimento?
Muitos alegaram que suas escolas não realizaram debates acerca dessa temática. Também é
importante salientar que grande parte deles possui duas matrículas, e as dificuldades em
acompanhar reuniões extras torna sua participação inviável, pois os docentes precisam se
deslocar de uma escola a outra para trabalhar.
Sendo assim, pode-se considerar que, com base no objetivo proposto, de como os
professores interpretam, contestam e reconstroem suas práticas, o contexto de suas atuações
mostra a relevância de se construir com os professores os diferentes aspectos das políticas
educacionais. Fazer audiências públicas para ouvir os professores, no intuito de se dizerem
democráticos e abertos, não atende essas demandas. Como salientado por Barbosa (2021), esses
artifícios só demonstram uma construção coletiva superficial, tendo em vista que a elaboração
do documento é construída e concebida por poucos docentes que trabalham na SEEDUC.
Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
SACRAMENTO, Ana Claudia Ramos; MORAES, Diego Nascimento. O CONTEXTO DA PRÁTICA DOS PROFESSORES DE
GEOGRAFIA: Documento de Orientação Curricular do Estado do Rio de Janeiro. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 23, e102303,
2024. Submissão em: 31/01/2024. Aceito em: 01/04/2024.
ISSN: 2316-8544
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Em relação ao componente curricular Geografia, as práticas foram embasadas em outros
documentos enviados pela SEEDUC, não no DOC-RJ. Em vista disso, os professores
reconstruíram suas práticas pedagógicas fundamentadas no que designaram ser importante para
eles e para os estudantes, evidenciando, assim, a falta de preocupação com o uso do documento,
levando em consideração mais de um ano de sua implementação.
Os professores pesquisados estavam passando por diferentes processos, de adaptação
de uma nova realidade presente para todos, de buscar compreender como ensinar em um
momento de incertezas, no qual vidas estavam sendo perdidas, seus estudantes vivenciando
diferentes dinâmicas na vida cotidiana, as escolas passando por processos de reorganização
administrativa e pedagógica para se adequarem às diferentes realidades, conforme estudaram
Sacramento, Frigério e Azevedo (2021). Assim, compreende-se que os resultados obtidos
podem ser parte e consequência de um contexto geográfico, político, social e educativo
excepcional: o do início de implementação dos documentos prescritivos de currículo, o dos
governos autoritários no âmbito estadual e no federal e a grave crise nacional da pandemia da
Covid-19, sem que tenham sido consideradas as dinâmicas e as situações excepcionais que
seriam vivenciadas neste período.
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