Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
NUNES, Leila Cristina Sampaio Melo; LOCATEL, Celso Donizete. Equidade e Contextualização na BNCC: limites e possibilidades para a
educação crítica e cidadã no ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 23, e102323, 2024.
Submissão em: 01/02/2024. Aceito em: 16/11/2024.
ISSN: 2316-8544
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SEÇÃO ARTIGOS
Equidade e Contextualização na BNCC:
limites e possibilidades para a educação crítica e cidadã no ensino de Geografia
Equity and Contextualization at BNCC:
limits and possibilities for critical and citizenship education in Geography teaching
Equidad y Contextualización en BNCC:
límites y posibilidades de la educación crítica y ciudadana en la enseñanza de la
Geografía
DOI: https://doi.org/10.22409/eg.v10i23.61715
Leila Cristina Sampaio Melo Nunes
1
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN),
Rio Grande do Norte, Brasil
e-mail: leilasampaio28@gmail.com
Celso Donizete Locatel
2
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN),
Rio Grande do Norte, Brasil
e-mail: celso.locatel@gmail.com
Resumo
O presente artigo analisa a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e seu impacto na educação, com ênfase nas
orientações para o Ensino Médio voltadas para o ensino de Geografia. A pesquisa qualitativa, com suporte
bibliográfico e documental, questiona se o modelo proposto pode inadvertidamente perpetuar práticas
educacionais que reproduzem as desigualdades sociais e atendem aos interesses dominantes da classe burguesa,
em vez de promover uma educação que verdadeiramente transforme a sociedade. Os resultados revelam que,
apesar de a BNCC enfatizar a contextualização e a adaptabilidade curricular, ainda impõe um modelo restritivo ao
exigir um currículo mínimo que não se adequa as diversidades e desigualdades regionais. Conclui-se que, para
uma educação realmente inclusiva e transformadora, é necessário que os currículos sejam elaborados com a
participação ativa dos professores, gestores e comunidades, respeitando as necessidades e realidades locais, para
assim combater a reprodução das desigualdades sociais.
Palavras-chave
Ensino Médio; Práticas educacionais; Interesses dominantes; Currículo; Reprodução.
1
Licenciada em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) (2017); especialista em
Ensino de Geografia pela Universidade Cândido Mendes (UCAM) (2019); Mestre pelo Programa de Mestrado
Profissional de Geografia da UFRN (2022). Atua como professora de Geografia na rede estadual de ensino do Rio
Grande do Norte.
2
Possui graduação em Geografia pelo Centro Universitário de Jales (UNIJALES) (1991), graduação em Pedagogia
pela UNIJALES (1993), mestrado (2000) e doutorado (2004) em Geografia pela Universidade Estadual Paulista
Júlio de Mesquita Filho (UNESP), com estágio de doutorado na Universidade de Barcelona (UB) (2003).
Atualmente, é professor associado da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), ministrando aulas
nos cursos de Licenciatura e Bacharelado em Geografia. Integra o corpo docente do curso de Tecnologia em Gestão
de Cooperativas.
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Abstract
This article analyzes the National Common Curricular Base (BNCC) and its impact on education, with an emphasis
on the guidelines for Secondary Education aimed at the teaching of geography. The qualitative research, supported
by bibliographic and documentary sources, questions whether the proposed model may inadvertently perpetuate
educational practices that reproduce social inequalities and serve the dominant interests of the bourgeois class,
rather than promoting an education that genuinely transforms the society. The findings reveal that, despite the
BNCC's emphasis on contextualization and curricular adaptability, it still imposes a restrictive model by enforcing
a minimum curriculum that does not accommodate regional diversities and inequalities. It is concluded that, for
education to be truly inclusive and transformative, curricula must be developed with the active participation of
teachers, administrators, and communities, respecting local needs and realities in order to combat the reproduction
of social inequalities.
Keywords
Secondary Education; Educational practices; Dominant interests; Curriculum; Reproduction.
Resumen
El presente artículo analiza la Base Nacional Común Curricular (BNCC) y su impacto en la educación, con énfasis
en las orientaciones para la Educación Secundaria enfocados a la enseñanza de la geografía. La investigación
cualitativa, con soporte bibliográfico y documental, cuestiona si el modelo propuesto puede, inadvertidamente,
perpetuar prácticas educativas que reproducen las desigualdades sociales y atienden a los intereses dominantes de
la clase burguesa, en lugar de promover una educación que verdaderamente transforme la sociedad. Los resultados
revelan que, a pesar de que la BNCC enfatiza la contextualización y la adaptabilidad curricular, aún impone un
modelo restrictivo al exigir un currículo mínimo que no se adapta a las diversidades y desigualdades regionales.
Se concluye que, para una educación realmente inclusiva y transformadora, es necesario que los currículos sean
elaborados con la participación activa de los profesores, gestores y comunidades, respetando las necesidades y
realidades locales, para así combatir la reproducción de las desigualdades sociales.
Palabras clave
Educación Secundaria; Prácticas educativas; Intereses dominantes; Currículo; Reproducción;
Introdução
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento normativo em
concordância com o Artigo 210 da Constituição Federal de 1988 que orienta o desenvolvimento
de um currículo mínimo para o Ensino Fundamental no Brasil. Em conformidade com esse
artigo, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), no inciso IV do Artigo 9,
destacou a participação obrigatória de Estados e Municípios na elaboração das competências
e diretrizes que orientariam a elaboração do currículo para a educação básica (Brasil, 2018).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) foi modificada, em 2017, para incluir a
determinação de direitos e objetivos de aprendizagem específicos para o Ensino Médio, além
das competências e habilidades comuns à Educação Básica, conforme estabelecido pela Lei nº
13.415/2017 (Reforma do Ensino Médio). De acordo com a BNCC, ao adotar essa abordagem,
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as decisões pedagógicas devem ser direcionadas para o desenvolvimento de competências
(Brasil, 2018, p. 13).
O presente artigo orienta-se pelo entendimento de que não é viável a concepção de um
modelo único de educação para o país, ainda que considerado uma base. Tal modelo não leva
em conta as diversidades e desigualdades regionais nos contextos sociais e educacionais, as
necessidades de aprendizagem de cada grupo, a autonomia das escolas e professores, além das
reais dificuldades de cada unidade escolar, que abrangem desde a carência de recursos
pedagógicos e de profissionais, até dificuldades estruturais.
Ao observar a proposta de desenvolvimento de competências idênticas para diferentes
grupos em realidades totalmente distintas, surgiram os seguintes questionamentos iniciais: a
BNCC pode influenciar práticas de ensino que reproduzam a sociedade? Quem são os
interessados em promover um modelo de ensino que se distancia da educação para a
transformação social? O que os professores da Educação Básica podem fazer para irem além
do modelo proposto e promoverem a educação como uma forma de transformar a sociedade?
Para responder às perguntas, foi feita a leitura crítica da BNCC, paralela à leitura
bibliográfica de obras como as de Girotto (2017), Aguiar (2018) e Lopes (2019), que deram
suporte às interpretações do documento, para a compreensão do que estava nas entrelinhas, das
ideias implícitas que promovem práticas de ensino voltadas à reprodução da sociedade.
Portanto, esta é uma pesquisa qualitativa, com suporte bibliográfico e documental. Com os
resultados, espera-se demonstrar qual é a influência da BNCC sobre práticas de ensino que se
distanciam da educação como forma de transformação da sociedade, bem como incentivar as
secretarias de ensino e os professores da educação básica a analisarem criticamente as normas
que chegam até as escolas de maneira verticalizada, propondo adaptações às propostas
normativas que promovam a educação para além do reprodutivismo.
Existem diversas perspectivas sobre o papel da educação na sociedade. Luckesi (1990)
as analisa e classifica, destacando inicialmente aquela que considera a educação como uma
forma de reprodução da sociedade, sugerindo que ela é usada principalmente para perpetuar
as ideologias dominantes, alinhadas aos interesses da burguesia. Nessa visão, a educação é o
meio pelo qual a sociedade mantém e forma sua força de trabalho, um fator principal na
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estrutura da produção de bens materiais. A educação qualifica tecnicamente e, ao mesmo tempo,
submete os indivíduos a normas sociais estabelecidas, garantindo a manutenção do discurso
dominante. Assim, a escola se torna uma das instituições que atuam em favor da reprodução de
grupos hegemônicos.
Antes de buscar orientar seus planejamentos com base nas habilidades exigidas pela
BNCC, os professores devem ter a compreensão clara dos objetivos que pretendem alcançar e
daqueles essenciais para a formação dos sujeitos. Para a efetiva transformação social, é
indispensável ir além das determinações de habilidades pré-definidas que orientam a
reprodução da sociedade por meio da educação. Diante disso, destaca-se a importância do
protagonismo dos professores na elaboração de seus planejamentos, delineando objetivos gerais
e específicos para além dos parâmetros da Base e em sintonia com as necessidades do seu
público.
Desafios e implicações da BNCC na Educação Básica: equidade e contextualização
A BNCC estabelece que os currículos da Educação Básica devem ser formulados e
contextualizados conforme as realidades locais, enquanto as competências e diretrizes devem
ser comuns nacionalmente. Lopes (2019) questiona a imposição da proposta curricular de
abrangência nacional apresentada pela BNCC, argumentando que existem diversas realidades
presentes nas escolas de todo o país. O autor alerta que, apesar de propor a contextualização, a
BNCC é o documento que efetivamente orienta e, ao mesmo tempo, restringe as interpretações
possíveis pelas secretarias, escolas e professores.
Segundo a Base, o compromisso com a formação integral na Educação Básica tem como
objetivo desenvolver as dimensões intelectual e pessoal, abrangendo os aspectos afetivos,
simbólicos, físicos, morais, éticos e sociais. A educação integral, de acordo com a BNCC, é a:
[...] construção intencional de processos educativos que promovam aprendizagens
sintonizadas com as necessidades, as possibilidades e os interesses dos estudantes e,
também, com os desafios da sociedade contemporânea. Isso supõe considerar as
diferentes infâncias e juventudes, as diversas culturas juvenis e seu potencial de criar
novas formas de existir (Brasil, 2018, p. 14).
Na leitura da introdução da BNCC, destacou-se um ponto específico sobre a equidade
como referência para as decisões curriculares e práticas pedagógicas. O texto aborda a
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naturalização das desigualdades sociais, propondo que incorporar a ideia de equidade nas
práticas escolares e de ensino é essencial para superar a exclusão e a marginalização de
determinados grupos (Brasil, 2018, p. 15). Diante disso, é crucial verificar se o documento
oferece orientações específicas para lidar mais diretamente com essas questões, incentivando
práticas de ensino voltadas para a transformação social.
À União são atribuídas tarefas importantes, como a coordenação do processo e a
correção das desigualdades. No entanto, ainda não está claro quais medidas serão adotadas para
mitigar essas desigualdades e equalizar a educação em todo o país.
Nesse regime de colaboração, as responsabilidades dos entes federados serão
diferentes e complementares, e a União continuará a exercer seu papel de coordenação
do processo e de correção das desigualdades. [...] Compete ainda à União, como
anteriormente anunciado, promover e coordenar ações e políticas em âmbito federal,
estadual e municipal, referentes à avaliação, à elaboração de materiais pedagógicos e
aos critérios para a oferta de infraestrutura adequada para o pleno desenvolvimento da
educação (Brasil, 2018, p. 21).
Uma questão persistente em relação à abordagem da equidade pela BNCC é se as
desigualdades nas escolas são discutidas no planejamento social, econômico e político do país,
para serem efetivamente resolvidas pelas instituições responsáveis. A desigualdade na
educação, que reflete a desigualdade social no país, será superada principalmente por meio de
políticas públicas, indo além de ações equitativas pontuais. Para garantir a prática educativa
equitativa, é necessário um planejamento adequado, alocação de recursos e, acima de tudo, o
reconhecimento dos efeitos da desigualdade social sobre a educação.
A BNCC destaca a importância da contextualização para adaptar os currículos às
características locais. O documento delineia pontos para estruturar práticas que representem a
realidade local, permitindo que professores e escolas abordem o cotidiano e as vivências dos
sujeitos. Isso possibilitaria a construção de novos conhecimentos e a percepção mais precisa da
realidade vivida.
Apesar da importância da contextualização e da adaptabilidade curricular, a BNCC
impõe um desafio ao determinar um modelo de currículo único. Na visão de Lopes (2019), não
necessidade nem possibilidade de existência de um currículo único para todas as escolas,
pois os currículos precisam ser construídos para atender demandas e necessidades diversas.
Freire (1987) reforça essa perspectiva ao defender que a educação deve partir da realidade
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concreta dos educandos, promovendo uma pedagogia da libertação que valorize suas culturas e
experiências. A educação a partir da realidade concreta permite que os sujeitos compreendam
melhor suas próprias vidas e as transformações sociais ao seu redor, tornando-se agentes críticos
e ativos na sociedade. Saviani (2013) complementa essa visão, enfatizando que a escola deve
ser um espaço onde se adquirem conhecimentos que dialogam com as necessidades e os
problemas sociais dos alunos.
A contextualização e adaptabilidade do currículo são fundamentais para uma educação
que realmente faça sentido para os estudantes e que responda às suas necessidades e realidades
locais. Porém, para que a educação seja transformadora e inclusiva, os currículos devem ser
construídos com a participação ativa de professores, gestores e comunidades, permitindo a
abordagem mais personalizada e contextualizada, pois estão inseridos direta ou indiretamente
no cotidiano dos alunos.
Formação integral no Ensino Médio: entre a cidadania e o mercado de trabalho
Após a revisão da introdução do documento, a análise se concentrou na seção dedicada
ao Ensino Médio, na qual se constatou que as primeiras palavras da BNCC (Brasil, 2018, p.
463) expressam uma preocupação com a formação dos sujeitos para o mercado de trabalho e
para o exercício da cidadania, o que gera alguns questionamentos: é possível equilibrar a
preparação dos sujeitos para o mercado de trabalho e o desenvolvimento das suas habilidades
criativas, o pensamento crítico, além do estímulo ao exercício da cidadania ativa? Como
preparar sujeitos para o mercado de hoje, no qual atuarão no futuro, quando as tecnologias
modificam os ambientes e as relações de trabalho constantemente?
Sem mencionar diretamente as implicações da formação para o mercado de trabalho nas
escolas, Freire (1987) critica qualquer abordagem educacional que reduza os sujeitos a meros
instrumentos para atender às demandas da classe dominante, sem considerar sua plena
humanidade e potencial como agentes de mudança social. Seguindo uma linha de raciocínio
semelhante, Saviani (2013) enfatiza a importância da escola como um espaço onde os
indivíduos adquirem os conhecimentos e habilidades necessários para se tornarem cidadãos
participativos e críticos. Ele defende uma educação que além da mera transmissão de
conteúdos, buscando desenvolver o pensamento reflexivo e a capacidade analítica dos sujeitos.
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Ao abordar as juventudes, o Ensino Médio e seus propósitos, o documento resume as
funções que a escola deve desempenhar para se adequar à diversidade desse público, visando
estimular seu protagonismo na singularidade dos seus processos de escolarização. No entanto,
nas considerações iniciais, não são mencionados de forma objetiva os aspectos relacionados às
desigualdades sociais ou estruturais que impactam negativamente as perspectivas dos sujeitos,
especialmente os menos favorecidos. Além disso, não orientações nesta seção que
incentivem práticas de uma educação transformadora.
A interpretação crítica da BNCC, que é a base dos currículos, possibilita que os
professores realizem as adaptações necessárias para uma educação transformadora. No entanto,
até as possibilidades de interpretação são restringidas pelo próprio documento. Apesar dessas
restrições, é viável considerar, como pertinentes à proposta, questões intrínsecas à realidade dos
indivíduos, que são sujeitos atuantes no espaço geográfico, conforme apresentado na BNCC:
O mundo deve lhes ser apresentado como campo aberto para investigação e
intervenção quanto a seus aspectos políticos, sociais, produtivos, ambientais e
culturais, de modo que se sintam estimulados a equacionar e resolver questões legadas
pelas gerações anteriores e que se refletem nos contextos atuais , abrindo-se
criativamente para o novo (Brasil, 2018, p. 463).
As desigualdades persistentes resultantes da gestão ineficiente do território nacional
impactam o presente e o futuro dos indivíduos. Portanto, é essencial desenvolver a habilidade
de leitura crítica do espaço geográfico para compreender as contradições reproduzidas pela
estrutura social, que demonstra pouco interesse em assegurar os direitos básicos da população,
afetando principalmente a classe trabalhadora.
Em consonância com o Artigo 35 da LDB, a BNCC delineia as finalidades do Ensino
Médio, que são: consolidar e aprofundar os conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental;
oferecer preparação básica para o trabalho e a cidadania; aprimorar o educando como pessoa
humana; e proporcionar a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos
produtivos (Brasil, 2018). Essas finalidades estão alinhadas com o que é apresentado na
introdução do documento em relação à busca pela formação integral. O texto esclarece que a
preparação para o trabalho não visa inserir os sujeitos precocemente no mercado, mas capacitá-
los para adquirir competências que favoreçam uma postura ativa, crítica, criativa e responsável,
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possibilitando que sigam seus projetos de vida e se adaptem à realidade com maior aptidão
(Brasil, 2018).
Ainda que tenha como objetivo incentivar a autonomia dos sujeitos, a questão
permanece controversa, pois o que se pretende não condiz com o que é orientado:
Em outros termos, o texto da BNCC afirma constantemente o protagonismo juvenil,
a pluralidade, a diversidade, a construção do currículo na escola, porém a organização
por competências contraria tais princípios, tentando impor limites e metas às possíveis
formas de organização curricular na escola e mesmo aos possíveis e diferentes
itinerários formativos (Lopes, 2019, p. 70).
Um dos objetivos da BNCC é que a nova estrutura curricular do Ensino Médio conceda
aos jovens a liberdade de fazer suas escolhas, mas essas escolhas são limitadas pelas
predefinições de futuro idealizadas por um grupo de pessoas para outro, conforme a organização
por competências proposta no documento.
As finalidades do Ensino Médio, mencionadas anteriormente, fundamentam a
construção das competências e habilidades exigidas nesta etapa. A identificação dessas
exigências é o ponto de partida para a necessária reelaboração dos currículos, conforme
indicado pela BNCC. Esta aponta que o modelo único de currículo possui um excesso de
elementos curriculares e métodos educacionais distantes das culturas juvenis, das exigências do
mercado de trabalho e das dinâmicas e questões sociais contemporâneas (Brasil, 2018).
Enquanto a BNCC critica o excesso de componentes curriculares e estabelece os saberes
mínimos para garantir o desenvolvimento dos sujeitos, Aguiar (2018) argumenta que não
cabe à BNCC restringir a aprendizagem impondo um currículo mínimo. A autora defende uma
educação que valoriza a liberdade e a diversidade de ideias, visando, entre outras coisas, superar
as desigualdades entre regiões e grupos sociais.
É importante considerar, como eixo fundamental de uma proposta de direitos e
objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, a garantia dos princípios
constitucionais de liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento,
a arte e o saber, bem como o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas. [...]
Todas essas proposições se articulam a garantir a democratização do acesso e
permanência do estudante nas instituições educativas com condições de participação
e aprendizagem e desenvolvimento, visando superar as sérias assimetrias regionais e
sociais (Aguiar, 2018, p. 19).
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A BNCC propõe que a escola de Ensino Médio represente, por meio do Projeto de Vida,
os aspectos da realidade social, capacitando os sujeitos a alcançarem seus objetivos pessoais e
desenvolvendo suas capacidades de forma holística. A escola desempenha igualmente o papel
de guiar os alunos em suas decisões, promovendo seu desenvolvimento nas esferas pessoal,
social e profissional. Isso envolve assegurar a aquisição dos conhecimentos essenciais e apoiar
a construção de competências e habilidades alinhadas com as escolhas futuras dos sujeitos, com
ênfase no mundo do trabalho. Como destacado por Lopes (2019, p. 68): ressoam em todo o
texto [...] rastros de um viés eficientista, na medida em que as aprendizagens consideradas
necessárias são aquelas sintonizadas com os desafios da sociedade contemporânea.
Lopes (2019) ressalta ainda que a BNCC reforça o modelo de educação que exige dos
sujeitos o alcance de metas predefinidas; assim, a proposta de integração curricular do Ensino
Médio não permite a flexibilidade dos currículos, controlando o projeto de vida dos sujeitos.
Para a efetiva educação transformadora, não é aceitável restringir a formação dos indivíduos,
já que qualquer elemento subjetivo no processo educativo escaparia dessa restrição.
Em vez de estabelecer restrições, ao elaborarem os currículos, as secretarias precisam
considerar as necessidades apontadas pelos gestores e professores das unidades escolares, os
quais convivem diretamente com o público e os desafios da educação. A partir dessa
compreensão, é possível elaborar estratégias para atender às demandas reais. Simplesmente
aceitar as orientações da BNCC na sua integralidade é colaborar com a perpetuação dos
discursos hegemônicos que atravessam as normas.
Os Itinerários Formativos foram criados como opção de flexibilização dos conteúdos
para o Ensino Médio, tendo quatro eixos estruturantes que formam a base para elaboração dos
currículos locais, específicos para os Itinerários. As possibilidades de ampliação da oferta dos
Itinerários se limitam ao suporte, estrutura e recursos que cada escola possui. Sendo assim, a
escola e, principalmente, a rede pública de ensino, não têm total autonomia para gerenciar os
Itinerários ofertados, pois está sujeita às instituições superiores que possam atender as
necessidades de recursos das escolas. Como reflexo disso, os estudantes oriundos da classe
trabalhadora não possuem opções formativas, tendo que seguir o Itinerário que a escola pode
ofertar. Sobre essa questão, Lopes (2019, p. 67) afirma que: “o tão enfatizado protagonismo
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juvenil, associado à escolha do que estudar, torna-se submetido às possibilidades de escolas e
redes, algo que, para seu estabelecimento, a juventude não tem o poder de interferir
diretamente”.
A Competência Específica I e o papel da educação na formação de cidadãos ativos e
críticos
Ao analisar as orientações para desenvolvimento das competências específicas da Área
de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, enfatizou-se a Competência Específica I e as
habilidades relacionadas diretamente à formação dos sujeitos como cidadãos ativos, conscientes
dos processos cotidianos que os cercam.
A Competência Específica I propõe que o estudante do Ensino Médio desenvolva a
capacidade de:
Analisar processos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais nos âmbitos
local, regional, nacional e mundial em diferentes tempos, a partir da pluralidade de
procedimentos epistemológicos, científicos e tecnológicos, de modo a compreender e
posicionar-se criticamente em relação a eles, considerando diferentes pontos de vista
e tomando decisões baseadas em argumentos e fontes de natureza científica (Brasil,
2018, p. 571).
Os conteúdos implícitos nessa competência podem exercer influência direta no
cotidiano dos sujeitos, são inerentes à realidade socioespacial e formam competências analíticas
sobre o espaço geográfico. O posicionamento crítico, nesse contexto, implica não apenas na
análise individual de cada processo, mas na busca por compreender sua dinâmica, as inter-
relações entre eles e o espaço. Isso implica afastar-se da visão fragmentada dos objetos de
estudo, uma vez que os fenômenos e processos não ocorrem de forma isolada.
A Competência Específica I destaca a importância da cidadania:
A construção da cidadania é um exercício contínuo, dinâmico e que demanda a
participação de todos para assegurar seus direitos e fazer cumprir deveres pactuados
por princípios constitucionais e de respeito aos direitos humanos. Assim, para que os
estudantes compreendam a importância de sua participação e sejam estimulados a
atuar como cidadãos responsáveis e críticos, essa competência específica propõe que
percebam o papel da política na vida pública, discutam a natureza e as funções do
Estado e o papel de diferentes sujeitos e organismos no funcionamento social, e
analisem experiências políticas à luz de conceitos políticos básicos (Brasil 2018, p.
578).
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Estimulando os alunos como cidadãos, os conteúdos focados no desenvolvimento dessa
competência os capacitariam a compreender suas responsabilidades sociais e a desenvolver a
capacidade crítica em relação ao lugar onde vivem e aos quais estão conectados. No entanto, é
importante que os currículos locais e os professores ampliem essa abordagem, trabalhando
conteúdos que permitam aos indivíduos desenvolver a habilidade de identificar e analisar o
contexto social, relacionando-o aos sujeitos e suas ações, que corroboram para a manutenção
da realidade desigual que impacta negativamente suas vidas.
Outra questão tratada na Competência Específica I que pode se alinhar à proposta de
educação para além do reprodutivismo trata dos Direitos Humanos. Ao abordar essa questão
em sala de aula, é necessário ir além das orientações da BNCC, pois, conforme Nunes (2022,
p. 49), no documento, “omitem-se os sujeitos e a estrutura que violam os Direitos Humanos e
deslegitimam seus preceitos, algo essencial para o completo entendimento das origens e
manutenção das desigualdades e injustiças sociais”.
A implementação dessa competência deve ser acompanhada do esforço contínuo para
contextualizar e adaptar os currículos às realidades locais, fortalecendo a capacidade crítica dos
estudantes. Somente através de uma abordagem educacional que reconheça e confronte as
desigualdades estruturais será possível formar cidadãos que não apenas compreendam sua
realidade, mas também estejam preparados para transformá-la. A educação deve ser vista como
um processo dinâmico e inclusivo, capaz de promover a participação ativa e a cidadania crítica,
contribuindo para uma sociedade mais democrática e equitativa.
Por outro lado, um aspecto do documento que se associa ao modelo de educação como
reprodução da sociedade é a influência e o interesse de agentes do capital sobre a proposta da
Base. Girotto (2017, p. 67) menciona duas instituições diretamente ligadas à elaboração da
BNCC: o Banco Mundial e a Fundação Lemann. Lopes (2019) identificou outros interessados
em sua implementação, especialmente nos itinerários formativos, como a Fundação Roberto
Marinho, o ItSocial, o Instituto Natura e o Instituto Península. A participação direta ou
indireta de instituições que compõem a classe dominante é uma demonstração da influência
desse grupo sobre os caminhos da educação brasileira. Com base nessa leitura, Nunes (2022)
afirma que:
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Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
NUNES, Leila Cristina Sampaio Melo; LOCATEL, Celso Donizete. Equidade e Contextualização na BNCC: limites e possibilidades para a
educação crítica e cidadã no ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 23, e102323, 2024.
Submissão em: 01/02/2024. Aceito em: 16/11/2024.
ISSN: 2316-8544
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[...] a educação tem sido, também, instrumento de manutenção da hegemonia,
beneficiando grupos dominantes que encontraram na educação uma fonte de
acumulação de capital, com o apoio dos representantes do Estado brasileiro, aqueles
que deveriam prezar pela democratização da educação e pela transformação da
sociedade para que se tornasse justa, como bem assinala a Constituição (Nunes 2022,
p. 54).
Os grupos dominantes estão empenhados em se apropriar das análises das situações de
desigualdade impostas pelo capitalismo. Segundo Santos (2014), esses grupos disseminam a
ideia de que a desigualdade é natural, mantendo assim as estruturas de dominação em uma
sociedade injusta que serve aos interesses do capital. Para eles, é crucial moldar as mentalidades
das massas, fazendo com que aceitem tais injustiças como parte inevitável da vida em
sociedade, estabelecendo um comportamento padrão que minimize questionamentos e
resistência à hegemonia dos grupos dominantes.
A influência de agentes do capital na elaboração da BNCC revela um aspecto
preocupante da educação brasileira: a possibilidade de que as políticas educacionais sejam
moldadas mais pelos interesses econômicos de grupos dominantes do que pelas necessidades
reais dos sujeitos e da sociedade. Essa situação demanda a vigilância constante e o esforço
coletivo para garantir que a educação cumpra seu papel emancipador, promovendo a
democratização do conhecimento e a formação de cidadãos críticos e atuantes.
Para enfrentar essa realidade, educadores, gestores e a sociedade civil como um todo
precisam estar atentos e engajados na construção de um currículo que reflita as demandas e
necessidades locais, e que promova uma educação crítica e transformadora. Assim, será
possível romper as amarras do sistema que favorece a reprodução das desigualdades e construir
uma sociedade mais justa e equitativa. Em vez de reproduzir o modelo de sociedade desigual,
a educação deve ser um elemento de transformação, pelo qual os sujeitos possam desenvolver
plenamente suas capacidades e contribuir para a construção de um futuro mais justo para todos.
Considerações Finais
A política neoliberal seguida pelo Estado, que privilegia o crescimento econômico,
utiliza a educação como um dos meios para esse crescimento, moldando-a por meio de normas,
políticas e documentos. Com isso, a educação passa a ter como objetivo principal a formação
para o trabalho e a reprodução do capital. O poder político atua sobre os conteúdos pedagógicos
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AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
NUNES, Leila Cristina Sampaio Melo; LOCATEL, Celso Donizete. Equidade e Contextualização na BNCC: limites e possibilidades para a
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por meio de documentos normativos, da gestão das políticas e programas educacionais,
buscando inclusive ou exclusivamente atender aos interesses do capital.
Por estar em posição de dependência financeira de instituições internacionais, a exemplo
do Banco Mundial, o Brasil, como um país em desenvolvimento, precisa aceitar as imposições
dessas instituições, que atuam diretamente sobre as políticas educacionais das redes públicas
de ensino. Disfarçadas de políticas de desenvolvimento, essas imposições são recebidas pela
sociedade como um caminho de esperança para um futuro melhor (Soares, 2020).
Este artigo buscou demonstrar como a BNCC contém, de forma implícita e explícita,
discursos e interesses hegemônicos que influenciam o trabalho diário dos professores da
educação básica. No entanto, essa influência nem sempre é percebida pelos docentes. Para
alcançar esse objetivo, foram analisados trabalhos anteriores de outros pesquisadores, cuja
leitura analítica revelou que, mesmo quando os professores se propõem a realizar uma leitura
crítica da BNCC, é complexo identificar orientações contrárias à educação transformadora
presentes nas entrelinhas do documento.
Portanto, é recomendável que, além da leitura da BNCC, os professores consultem
trabalhos que analisem esse documento. Essas análises podem ajudar os docentes a identificar
as orientações que influenciam suas práticas de ensino. Ao compreenderem as intenções
implícitas na BNCC, os professores podem se autoavaliar e verificar se suas práticas
pedagógicas estão alinhadas com um modelo de educação que reproduz a sociedade.
É essencial que os sujeitos se reconheçam como parte integrante da sociedade,
compreendendo seus deveres e direitos. Isso lhes permite identificar quando seus direitos são
negados ou distribuídos de maneira desigual. O espaço geográfico reflete essas desigualdades
e a violação dos direitos básicos, embora os impactos dessas injustiças atinjam negativamente
apenas uma determinada classe social, a classe trabalhadora.
Nesse sentido, a Geografia escolar é considerada especialmente relevante, pois é
responsável por formar percepções espaciais que abrangem tanto os aspectos físicos quanto as
diversas relações sociais que moldam o cotidiano. Auxiliar os indivíduos a se perceberem como
sujeitos inseridos em uma sociedade com classes sociais antagônicas, bem como a
reconhecerem seu papel dentro dessa estrutura, é fundamental para alcançar a liberdade da
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AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
NUNES, Leila Cristina Sampaio Melo; LOCATEL, Celso Donizete. Equidade e Contextualização na BNCC: limites e possibilidades para a
educação crítica e cidadã no ensino de Geografia. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, nº 23, e102323, 2024.
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classe oprimida. Dessa forma, o ensino da Geografia deve, entre seus demais objetivos,
estabelecer conexões com a realidade vivida e incitar reflexões sobre o modelo de sociedade
que suprime a liberdade e a dignidade da classe trabalhadora, que poderão ser plenamente
alcançadas por meio da justiça social efetiva.
Referências
AGUIAR, M. A. da S. Relato da resistência à instituição da BNCC pelo Conselho Nacional de
Educação mediante pedido de vista e declarações de votos. In: AGUIAR, M. Â. da S;
DOURADO, L. F. (Org). A BNCC na contramão do PNE 2014- 2024: avaliação e
perspectivas. Recife: ANPAE, 2018.
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Disponível em:
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf.
Acesso em: 15 jan. de 2024.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
GIROTTO, E. D. Dos PCNs a BNCC: o ensino de geografia sob o domínio neoliberal. Geo
UERJ, Rio de Janeiro, n. 30, p. 419-439, 2017. Disponível em:
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LOPES, A. C. Itinerários formativos na BNCC do Ensino Médio: identificações
docentes e projetos de vida juvenis. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 13, n. 25, p. 59-75,
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LUCKESI, C. C. Filosofia da Educação. São Paulo: Cortez, 1990.
NUNES, L. C. S. M. Por um ensino de geografia para além do reprodutivismo: sequência
didática sobre classes sociais, desigualdade e cidadania. 2022. 135f. Dissertação (Mestrado em
Geografia) Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2022.
SANTOS, M. O Espaço do Cidadão. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2014.
SAVIANI, D. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2013.
SOARES, F. P. A influência do Banco Mundial e da OCDE na educação básica no Brasil
e no ensino de geografia. São Paulo, 2020. Disponível em:
https://periodicos.ufsm.br/geografia/article/view/41843/html. Acesso em: 07 jan. 2024.