Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
DAL PONT, Karina Rousseng; SAWAF, Mayra Bianca dos Passos; MILLÉO, Paula. Artes Geográficas: imagens, poesia, arte urbana, papéis
coloridos, canetinhas e tintas para a composição de práticas de ensino na Geografia Escolar. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, 23,
e102317, 2024.
Submissão em: 16/02/2024. Aceito em: 02/09/2024.
ISSN: 2316-8544
Este trabalho está licenciado com uma licença Creative Commons
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SEÇÃO ARTIGOS
Artesanias Geográficas:
imagens, poesia, arte urbana, papéis coloridos, canetinhas e tintas para a composição de
práticas de ensino na Geografia Escolar
Geographic Arts:
images, poetry, urban art, colored paper, markers and paints as a means of composing
teaching practices in School Geography
Artesanías Geográficas:
imágenes, poesía, arte urbano, papeles de colores, rotuladores y pinturas para la
composición de prácticas docentes en Geografía Escolar
https://doi.org/10.22409/eg.v10i23.61995
Karina Rousseng Dal Pont
1
Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Paraná, Brasil
e-mail: karinardalpont@gmail.com
Mayra Bianca dos Passos Sawaf
2
Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Paraná, Brasil
e-mail: mayrasawaf@gmail.com
Paula Milléo
3
Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Paraná, Brasil
e-mail: paulamilleo@gmail.com
Resumo
Este artigo busca refletir sobre a Didática e as práticas de ensino na Geografia Escolar. A partir da apresentação
de duas pesquisas de final de curso, buscamos compreender como a imersão nas escolas públicas junto ao
Programa de Residência Pedagógica torna possível ressignificar as práticas de ensino na Geografia Escolar para
além de uma monocultura escolar. Partimos da noção de Vera Candau sobre didática e as monoculturas escolares
como um modo de ativar a criação e invenção de artesanias geográficas, em diálogo com a pedagogia engajada de
bell hooks e Paulo Freire. A metodologia utilizada foi a cartografia como perspectiva de pesquisa pós-crítica em
educação ao acompanhar os processos pedagógicos nas escolas por meio da observação participante, escrita em
diários, análise do currículo de Geografia e livros didáticos, além da proposição de oficinas sobre conflitos
socioambientais e a percepção urbana. Essa foi a ferramenta metodológica criada como meio de problematizar
ausências curriculares e os modos hegemônicos de ensinar Geografia nas escolas. Da permanência no Programa
de Residência Pedagógica são construídas práticas de ensino e pesquisa na educação geográfica que priorizam
mais os modos e maneiras do fazer pedagógico, como composição de exercícios de atenção ao mundo, abrindo
espaços para a inventividade e a construção de gramáticas insurgentes na Geografia Escolar.
Palavras-chave
Educação geográfica; Programa de Residência Pedagógica; Geografia escolar.
1
Professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) desde 2019. Licenciada em Geografia pela Universidade
do Estado de Santa Catarina (2004), Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais (2008) e
Doutora em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (2018).
2
Graduada em Geografia pela Universidade Federal do Paraná (Licenciada). Está vinculada ao Laboratório
Pedagógico de Geografia (LABOGEO), e é bolsista residente do Programa Residência Pedagógica do Curso de
Geografia. Atua como professora de Geografia na rede privada de ensino de Curitiba.
3
Graduanda em Geografia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), atuando, no momento, nos laboratórios
de Licenciatura e de Geografia Urbana realizando Residência Pedagógica e Iniciação Científica.
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DAL PONT, Karina Rousseng; SAWAF, Mayra Bianca dos Passos; MILLÉO, Paula. Artes Geográficas: imagens, poesia, arte urbana, papéis
coloridos, canetinhas e tintas para a composição de práticas de ensino na Geografia Escolar. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, 23,
e102317, 2024.
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Abstract
This article seeks to reflect on Didactics and teaching practices in School Geography. Based on the presentation
of two end-of-course surveys, we seek to understand how immersion in public schools together with the
Pedagogical Residency Program makes it possible to give new meaning to teaching practices in School Geography
beyond a school monoculture. We start from Vera Candaus notion of didactics and school monocultures as a way
of activating the creation and invention of geographic crafts, in dialogue with the engaged pedagogy of bell hooks
and Paulo Freire. The methodology used was cartography as a post-critical research perspective in education when
monitoring pedagogical processes in schools, through participant observation, the keeping of diaries, analysis of
Geography curriculum and textbooks, in addition to proposing workshops on socio-environmental conflicts and
urban perception. This methodological tool created as a means of problematizing curricular absences and the
hegemonic ways of teaching Geography in schools. During the stay in the Pedagogical Residency Program,
teaching and research practices in geographic education are built that prioritize more the ways and means of
pedagogical practice, such as the composition of exercises of attention to the world, opening spaces for
inventiveness and the construction of insurgent grammars in School Geography.
Keywords
Geographic education; Pedagogical Residency Program; School Geography.
Resumen
Este artículo busca reflexionar sobre la Didáctica y las prácticas docentes en Geografía Escolar. A partir de la
presentación de dos encuestas de fin de curso, buscamos comprender cómo la inmersión en escuelas públicas junto
con el Programa de Residencia Pedagógica permite resignificar las prácticas de enseñanza en Geografía Escolar
más allá de una monocultura escolar. Partimos de la noción de didáctica y monocultivos escolares de Vera Candau
como forma de activar la creación e invención de artesanías geográficas, en diálogo con la pedagogía
comprometida de Bell Hooks y Paulo Freire. La metodología utilizada fue la cartografía como perspectiva de
investigación poscrítica en educación a la hora de monitorear procesos pedagógicos en las escuelas, a través de la
observación participante, la escritura de diarios, el análisis de los currículos y libros de texto de Geografía, además
de proponer talleres sobre conflictos socioambientales y urbanos. percepción. Esta fue la herramienta
metodológica creada como medio para problematizar las ausencias curriculares y las formas hegemónicas de
enseñar Geografía en las escuelas. Durante la estancia en el Programa de Residencia Pedagógica se construyen
prácticas docentes e investigativas en educación geográfica que priorizan más los modos y medios de la práctica
pedagógica, como la composición de ejercicios de atención al mundo, abriendo espacios para la inventiva y la
construcción de gramática insurgentes en Geografía Escolar.
Palabras clave
Educación geográfica; Programa de Residencia Pedagógica; Geografía escolar.
Introdução
A pedagogia engajada afirma que cada sala de aula é diferente, que as estratégias têm
de ser constantemente modificadas, inventadas e reconceitualizadas para dar conta de
cada nova experiência de ensino (hooks, 2017, p. 21).
A pedagogia engajada anunciada por bell hooks nos pistas de como ressignificar a
Didática e as práticas pedagógicas no ensino da Geografia Escolar. Compreendendo as
diferenças inerentes ao fazer pedagógico, as estratégias (didáticas) precisam ser constantemente
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modificadas, caso se anseie por uma educação geográfica emancipadora. A própria área da
Didática nos últimos anos ressignificou seus princípios e postulados de ensino ao desfazer a
ideia de uma área de conhecimento puramente instrumentalizadora e/ou técnica ao propor
diálogos com temas emergentes de cada tempo e, principalmente, com os sujeitos em seus
diferentes contextos de aprendizagem.
Assim, podemos pensar sobre as escolhas e os modos como é possível seguir com as
pesquisas, os processos formativos e as práticas pedagógicas na educação geográfica: limitar a
formação à instrumentalização técnica dos fazeres pedagógicos, submissos a um modelo
uniforme de formação, ou abrir espaço e colocar sob suspeita certos tempos, objetos,
materialidades, temas e atividades de estudo. A escola, simulacro do fazer social, reflete as
transformações nos modos de comunicação e cognição, mediada pelas tecnologias
informacionais.
Não podemos negligenciar o uso de tais ferramentas, mas também não podemos apostar
na aniquilação dos fazeres manuais, como a escrita à mão, a leitura em voz alta, a escrita em
cadernos de campo, ou seja, a produção de exercícios da atenção. Estar atento é estar presente
no que se prepara, lê, escreve, fala e organiza para um grupo ou alguém. Segundo Jorge Larrosa
e Karen Rechia (2018, p. 59), esses fazeres compõem artesanias, modos de fazer na ação
pedagógica, mediados pelos “artefatos do professor, que são ferramentas, os instrumentos e as
tecnologias do seu ofício”.
Nos processos formativos de professores e professoras, por vezes essas discussões são
aligeiradas e sobrepõem-se aos diferentes modos e coexistências de práticas pedagógicas em
vez de reconhecê-las como articuladoras de identidades plurais junto aos processos
pedagógicos. Para questionar ou ir além de aceitar uma cultura única e/ou uma didática, as
relações nos processos formativos de professores e professoras, assim como nas escolas e nos
demais espaços educativos, demandam outros exercícios de leituras de mundo.
Vera Candau (2016), ao discutir sobre os novos enfrentamentos da Didática, afirma ser
imprescindível articular as diferenças culturais a um entendimento de superação das
desigualdades sociais, caso contrário continuaremos a contribuir para a formação de uma terra
arrasada pelas “monoculturas escolares” (Candau, 2016). Superar as desigualdades sociais é
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necessariamente levar em conta que o acesso à internet, computadores e toda a estrutura
necessária para a “inclusão digital” ainda está distante em nosso país. Basta lembrar dos
processos excludentes e das disparidades de acesso ao ensino remoto vivenciados recentemente
com a pandemia de covid-19.
Do ponto de vista das ciências agrárias, monocultura é toda forma de plantio de uma
cultura única em espaços de grandes extensões que tornam homogêneas as paisagens. Além da
formação de uma paisagem única, a monocultura exaure o solo pelo uso excessivo de insumos
agrícolas, sementes transgênicas e agrotóxicos. Nada mais nasce ou floresce numa terra de
monocultura. Parte-se do entendimento de que os processos de subjetivação docente ainda são
constituídos por essas monoculturas educativas desde o tempo em que permanecemos nas
escolas, seguindo pela universidade. À vista disso está a importância de reconhecer as
contradições e desafios à ação docente, que passam por questões éticas, estéticas e políticas.
Precisamos não somente estar atentos às formas, metodologias, diretrizes e princípios
do trabalho docente, mas alargar as esferas desse trabalho às experiências que eduquem a
sensibilidade, a escuta e o exercício da presença nos tempos e espaços educativos. É nesse
sentido que a participação de licenciados e licenciandas em programas como o Residência
Pedagógica
4
alarga os universos de leitura dos fazeres e dos sujeitos escolares. O cotidiano
vivenciado semanalmente nas escolas e as ações formativas são espaços propositivos para a
criação de uma pedagogia e, por que não, de uma didática engajada, que conta de provocar
reflexões sobre o que parece dado e imutável nas escolas, da aceitação de impositivos
tecnológicos em detrimento das artesanias escolares: o uso do quadro, o caderno de anotações,
a leitura, os exercícios, a composição e produção de materialidades.
4
O Programa de Residência Pedagógica da UFPR tem a finalidade de valorizar o trabalho docente e apoiar a
formação de estudantes de licenciatura em instituições blicas de ensino superior. O programa envolve estudantes
e professores (da educação superior e da educação básica) e está estruturado em diversos projetos de intervenção
em escolas de educação básica, com o objetivo de propiciar a interação formativa entre estudantes universitários
e professores das escolas e contribuir para elevação do padrão de qualidade da educação básica. Os projetos, na
medida em que estão integrados ao cotidiano das escolas da rede pública de educação, permitem aproximar a
educação superior da educação básica e incentivar as escolas públicas a tornarem-se protagonistas nos processos
formativos dos seus futuros professores. Para saber mais o que foi desenvolvido, visite o perfil
https://www.instagram.com/rpgeoufpr/. Acesso em: 22 mai. 2024.
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Da mesma forma, é ofertado um tempo de permanência nas escolas. Podem percorrer
seus espaços, observar e (re)conhecer as práticas pedagógicas dos professores e professoras que
os recebem, compreender as gestualidades da ação docente, como o corpo e a voz preenchem
os espaços, além de analisar os materiais didáticos e as propostas de ensino. É importante pensar
e planejar juntos outros modos de ocupar esse espaço público, de exercitar sua presença de ser
cuidadoso no que se diz e faz.
Nesse sentido, as experiências apresentadas neste artigo partem de duas acadêmicas
licenciadas do Curso de Geografia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) que construíram
seus projetos de pesquisa e o trabalho de conclusão de curso a partir da imersão no Programa
de Residência Pedagógica (PRP) do Curso de Geografia da UFPR entre 2022 e 2024 em escolas
públicas da cidade de Curitiba/PR, junto a turmas do ano do Ensino Fundamental. Buscamos,
com essa imersão nas escolas e no PRP, compreender como é possível ressignificar as práticas
de ensino na Geografia Escolar para além de uma monocultura escolar. A metodologia utilizada
foi a cartografia como perspectiva de pesquisa pós-crítica em educação ao acompanhar os
processos pedagógicos nas escolas por meio da observação participante, escrita em diários,
análise do currículo de Geografia e livros didáticos, além da proposição de oficinas sobre
conflitos socioambientais e a percepção urbana.
Apresentamos neste texto uma breve revisão teórica que alicerça a construção das
pesquisas e, na sequência, as duas pesquisas de final de curso de Licenciatura em Geografia,
detalhando alguns dos processos metodológicos, principalmente as oficinas realizadas com
estudantes do ano do Ensino Fundamental. As considerações finais enfocam esse percurso
formativo, iniciado junto ao PRP e finalizado com as pesquisas que derivaram dessa imersão
pedagógica na escola pública.
Tomar a escola como “tempo livre”
Utilizando as imagens das monoculturas como meio, além de processos que também
habitam as pesquisas em educação e a formação docente, pretende-se com este artigo apresentar
menos as monoculturas escolares e mais o que pode ser insurgente no processo de formação
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e102317, 2024.
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de professoras e professoras no ensino superior e na construção de práticas pedagógicas e
investigativas na Geografia Escolar contemporânea.
De acordo com Lana de Souza Cavalcanti (1999), é com a Geografia Escolar que se
permite que os estudantes leiam suas realidades espaciais como as práticas de organização e
gestão da cidade. Em outras palavras, o cidadão se torna cidadão com a contribuição de várias
instâncias, destacando-se a escola (Cavalcanti, 1999, p. 1). Permeadas pela escola, essas
práticas exigem, como nos ensina Paulo Freire (2019), que a docência e a boniteza andem
juntas, pois ensinar exige ética e estética.
Nesse sentido, esta pesquisa busca colocar em diálogo temas da Geografia Escolar,
como Geografia urbana e as barragens hidrelétricas, e o encontro com diferentes linguagens,
como a arte, a arte urbana e as produções de imagens em sala de aula. Nesse encontro, é possível
desconcertar algumas certezas do currículo oficial, dos materiais didáticos, do que nos impõem
legisladores, e abri-las a experimentações estéticas, poéticas e sensíveis como constituidoras de
um “reservatório de imagens para invenção” (Ferraz, 2014, p. 6). Esta invenção se pela
construção de exercícios de atenção a esses artefatos culturais e escolares para pensarmos juntas
e juntos de que modo podemos fazer/ser diferentes. Ao mesmo tempo, atendem ao que nos
oferece bell hooks (2017) sobre a questão de dar conta de inventar novas estratégias para cada
nova experiência de ensino.
No livro “Em defesa da escola”, Jan Masschelein e Maarten Simons apresentam uma
noção de escola derivada da noção de espaço educativo grego denominado skholé, que significa
tempo livre para o estudo e a prática oferecida às pessoas que não tinham nenhum direito a ele
de acordo com as ordens vigentes” (Masschelein; Simons, 2014, p. 9). Essa produção de tempo
livre, ainda segundo os autores, transforma o conhecimento e as habilidades em bens comuns,
podendo dar a todos, independentemente de suas capacidades e origens, a possibilidade de “sair
de seu ambiente conhecido para superar e renovar (e, portanto, mudar de forma imprevisível) o
mundo” (Masschelein; Simons, 2014, p. 26). A configuração desse tempo livre não é de um
tempo de lazer, mas de pensamento, estudo e exercício.
Amparada em metodologias e técnicas de como se constituir uma boa didática, a
formação inicial é constituída por um conjunto de objetos, formas e caminhos que contribuem
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para o processo de subjetivação docente. Compreendendo-se junto a Gilles Deleuze e Félix
Guattari (1995) que o sujeito não é o ponto de partida, mas um modo produzido por um conjunto
de relações, torna-se imprescindível questionar essas relações e criar possibilidades de
mobilizar o pensamento e o estudo pela construção de exercícios de atenção, além de abrir
alguns espaços na formação inicial docente, ressignificando em outras formas de ler, apresentar
e aumentar o mundo.
Especificamente no caso da Rede Estadual do Paraná, que acompanhamos com o PRP,
além de questionar e buscar problematizar os “saberes indispensáveis à prática docente” (Freire,
2019, p. 23), soma-se a precarização do ensino dada pela política de plataformização
5
das
práticas pedagógicas. Ou seja, o governo investe milhões em programas e plataformas digitais
que devem ser utilizadas tanto por professores em sala de aula como por estudantes em casa,
contrariando as premissas de uma “pedagogia engajada” (hooks, 2017) ou de práticas
emancipadoras. O que observamos ao longo dos meses de permanência nas escolas foi um
enrijecimento dos modos de fomentar o desenvolvimento do pensamento espacial em função
do uso de atividades como questionários prontos e slides sem o mínimo critério de qualidade
ou de relações com as vivências dos sujeitos. Portanto, nesse jogo entre ensino e aprendizagens
plataformizadas, encontra-se um emaranhado de questões que necessitam de enfrentamentos,
principalmente no que diz respeito às prerrogativas do processo formativo, como apresentar,
objetivar, explicar, transmitir e avaliar.
Quando os imperativos dos processos pedagógicos são tornados mantras no cotidiano
formativo e substituídos pura e simplesmente por ações mecânicas, eles dizem pouco sobre a
pluralidade da educação, constituindo o que Carlos Skliar afirma ser uma “pedagogia
5
Consideramos neste artigo a noção de plataformização, devido ao uso de plataformas digitais que as escolas
estaduais do Paraná adotaram desde o período da pandemia de sars-cov19, tanto para realização de atividades
didático-pedagógicas por parte dos estudantes como modo de organização do trabalho pedagógico de professores
e professoras da Educação Básica. Trata-se do uso de mais de 5 plataformas e aplicativos que oferecem desde
atividades complementares aos estudos presenciais a meios de monitoramento da presença de estudantes em sala
de aula. Toda essa gama de plataformas foi implementada sem o diálogo com as comunidades escolares, o que
gera inúmeros problemas e questionamentos, tais como: a baixa qualidade da produção de material didático
ofertada a professores e estudantes; a falta de infraestrutura das escolas; a escassez de acesso dos estudantes tanto
a internet em casa, como equipamentos para o acesso (falta de computadores e telefones celulares); a utilização de
dados sensíveis de estudantes e professores por empresas de tecnologias; os contratos milionários com as
empresas; a vigilância e a retirada da autonomia docente de sua ação pedagógica, entre outros.
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embrutecedora” (Skliar, 2003, p. 233). Este seria um embrutecimento que passa pelo
enrijecimento do corpo, pelo modo como percebemos o outro em suas expressões e dimensões
identitárias de classe, origem, aparência física, gênero, etc.
Desta forma, as duas pesquisas que seguem, articuladas ao Curso de Licenciatura em
Geografia e ao PRP, buscarão apresentar, cada qual em sua singularidade temática, propostas
pedagógicas e investigativas como um modo de perfurar esse embrutecimento. As oficinas
foram as estratégias escolhidas como dispositivo didático inventivo para as aulas de Geografia
junto a estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental para o combate às monoculturas escolares.
Ao abrir um “tempo livre” nas aulas de Geografia, junto à criação de dinâmicas, utilizando
imagens, papéis, revistas, cola e tesoura para a produção de desenho e colagens, tensiona-se a
passividade dos processos formativos frente às “tecnologias para o ensino e aprendizagem”
(Larrosa; Rechia, 2018) e busca-se a invenção de exercícios de atenção aos temas da Geografia
Escolar.
Para analisar e compreender esses cenários complexos que foram se apresentando ao
logo das pesquisas, utilizamos como metodologia a cartografia como perspectiva pós-crítica de
pesquisas em educação. Essa é nossa aposta ao “acompanhar processos, desenhar as redes de
força à qual o objeto ou fenômeno em questão se encontra conectado, dando conta de suas
modulações e de seu movimento permanente” (Barros; Kastrupp, 2012, p. 57). Para desenhar
essas “redes de força” e produzir os dados para as pesquisas, utilizamos os diários de campo
como espaço para as escritas do que era vivenciado cotidianamente nas escolas e com as turmas
pesquisadas, análise do currículo e de livros didáticos de Geografia, a produção de imagens,
tanto das escolas como das atividades realizadas, a observação participante, parte fundamental
do acompanhamento dos processos didáticos e do trabalho do professor e, por fim, o
planejamento e execução das oficinas pedagógicas a partir das temáticas investigadas pelas
pesquisadoras.
A seguir, apresentaremos as pesquisas, realizadas na mesma escola estadual, localizada
no bairro Tarumã, de Curitiba, com turmas do ano do Ensino Fundamental. A primeira é
sobre conflitos ambientais e atingidos por barragens hidroelétricas e, num segundo momento,
sobre a questão urbana e modos de percepção da cidade de Curitiba.
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Produzindo imagens que narram diferentes realidades para as usinas hidrelétricas
Durante a vida escolar nas aulas de Geografia, mediada pelo currículo oficial e pelos
materiais didáticos, somos ensinadas a olhar as usinas hidrelétricas apenas como construções
fantásticas que geram desenvolvimento e benfeitorias para todos. Esse tema gera fascínio nas
crianças, principalmente devido ao tamanho das construções e sua engenharia. Porém, para
além do que ensinam esses dispositivos oficiais, podemos problematizar que, antes de aquelas
usinas ocuparem aquele imenso lugar, havia pessoas, animais, plantas, cidades, vilarejos e
histórias que foram alagadas por lagos artificiais.
Para isso, é preciso conhecer outras leituras presentes no contexto de construção de
usinas hidrelétricas, principalmente aquelas pelo viés das questões socioambientais. Diante
disso, buscamos compreender como o tema dos conflitos socioambientais no contexto de
construção de usinas hidrelétricas é trabalhado nas escolas, como os materiais didáticos
apresentam essa questão e se seria possível transgredir esses modos únicos de se olhar para essa
temática pela utilização de outras linguagens e abordagens em sala de aula.
Foi por intermédio do Programa de Residência Pedagógica de Geografia que tivemos a
oportunidade de estar próximas da sala de aula e desenvolver a pesquisa junto a uma turma do
ano do Ensino Fundamental da Rede Estadual de Ensino, na cidade de Curitiba. Para
entender como o tema poderia ser abordado, buscamos analisar primeiramente a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) (Brasil, 2017). Ao buscar no documento dos Anos Finais do Ensino
Fundamental utilizando a nomenclatura conflitos socioambientais e as usinas hidrelétricas,
nada foi encontrado. Mudando os termos de busca para “conflitos” e “social”, e enfim foi
possível encontrar o tema na componente curricular Geografia no 7°, e anos. Encontramos
cinco habilidades propostas que se articulam muito mais às questões genéricas de conflitos
territoriais, movimentos de fronteira, fluxos econômicos e numa única habilidade no 8º ano que
apresenta o termo “movimentos sociais”, mas nenhum termo que articule as discussões sobre
conflitos socioambientais.
Posteriormente, a procura ocorreu em livros didáticos da Coleção Araribá de Geografia
(2024), que faz parte do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD). Nos
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volumes pesquisados, as usinas hidrelétricas (UHE) aparecem em todos os livros do Ensino
Fundamental II (do 6° ao ano) relacionadas à geração de energia nos rios de planaltos de
cada região, país ou continente estudado. Porém, o conflito socioambiental relacionado com a
construção de usinas hidrelétricas (UHE) aparece especificamente nos volumes do e anos.
No livro do 6° ano, o assunto aparece após a explicação de como é o funcionamento de
uma usina relacionada com a construção da UHE de Belo Monte, situada no rio Xingu, no Pará:
“A construção de uma hidrelétrica muitas vezes afeta não somente as condições naturais da
região, como também o modo de vida dos povos que a habitam” (Projeto Araribá, 2024, p. 32).
O livro apresenta um trecho de uma reportagem que aborda a precarização do modo de vida na
região depois do licenciamento para a construção da usina: a insegurança alimentar, a
dificuldade de locomoção e escoamento de mercadorias, impactos da geração de renda e nas
famílias, costumes e tradições, por ter levado em conta o impacto nas comunidades que também
viviam ali. Havia também perguntas sobre os pontos negativos na construção de uma usina
hidrelétrica e qual a opinião do/da estudante sobre os problemas e benefícios dessa construção.
Na sequência, o livro apresenta dois textos, um sobre “o lado obscuro do modelo de
desenvolvimento do Brasil”, que conta sobre o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragem)
e a UHE de Itá, e outro que mostra a questão socioambiental da UHE de Belo Monte. Os textos
são expostos seguidos de perguntas que levam à reflexão e à fixação dos temas.
No livro do 7° ano, as UHEs aparecem como exemplos de geração de energia, como e
quanto de energia produzem, as obras em prol do “desenvolvimento” e sua importância para
cada região do Brasil. Porém, o tema do conflito socioambiental é tratado também com
destaque, em um capítulo que aborda várias questões socioambientais e também cita os
impactos causados pelas hidrelétricas.
Alguns assuntos não são abordados pela BNCC (2017), ou uma citação superficial
do termo, que pode impactar a abordagem do assunto. As editoras dos livros didáticos podem
optar por não abordar os conflitos socioambientais em função dessa superficialidade na citação
de termos como conflito”. Poderia, por exemplo, haver citações mais específicas nas
habilidades para que os livros abordassem mais o tema dos conflitos socioambientais em usinas
hidrelétricas. Em contrapartida, a série de livros analisados apresentou o tema no 6° ano, e não
Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
DAL PONT, Karina Rousseng; SAWAF, Mayra Bianca dos Passos; MILLÉO, Paula. Artes Geográficas: imagens, poesia, arte urbana, papéis
coloridos, canetinhas e tintas para a composição de práticas de ensino na Geografia Escolar. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, 23,
e102317, 2024.
Submissão em: 16/02/2024. Aceito em: 02/09/2024.
ISSN: 2316-8544
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havia uma habilidade que contemplava o tema na BNCC. Isso significa que o livro desenvolve
mais assuntos do que apenas os previstos pela BNCC para aquele ano.
Diante do que foi encontrado nos livros sobre o assunto, verificamos que, nos livros
didáticos, as imagens usadas para representar qualquer tipo de conflito socioambiental são
escassas. Geralmente, são utilizadas imagens das usinas prontas ou recortes de floresta sem
a presença de indivíduos. Essas imagens transmitem uma ideia de que naquele lugar não havia
pessoas. Mesmo com breves discursos sobre os conflitos e questões da população existentes
nesses espaços, isso não é representado nos livros didáticos por meio das imagens. Segundo
Ivaine Tonini (2013, p. 179):
As imagens podem ser pensadas como um aparato cultural, com finalidade de
formação e subjetivação e, tal como veiculada em materiais escolares (principalmente
o livro didático por ser o mais usual), estariam se valendo de certos dispositivos de
poder que entram em jogo para capturar identidades ali inscritas. Assim, as imagens
são veículos dos significados e das mensagens simbólicas produzidas
discursivamente.
Por meio das imagens, as ideias, os conceitos e as discussões podem ser usados como
ferramenta pedagógica para as/os estudantes entenderem melhor o espaço geográfico e os
conflitos socioambientais. Se essas imagens não aparecem, o que pode ser transmitido, no caso
dos conflitos socioambientais referentes às construções de usinas, é que o problema é
irrelevante, ou que o problema existe, mas não necessidade de discutir sobre ele, por ser
supostamente pequeno em relação ao desenvolvimento que essas obras trazem. Entretanto,
apostamos que as imagens podem ser usadas para “educar os olhos”, como afirma Wenceslao
Machado Oliveira Júnior:
Educar os olhos não é somente fazê-los ver certas coisas, valorar certos temas e cores
e formas, mas é, sobretudo, construir um pensamento sobre o que é ver; sobre o que
são nossos olhos como instrumentos condutores do ato de conhecer, levando-nos
mesmo a acreditar que ver é conhecer o real, é ter esse real diante de nós (Oliveira
Júnior, 2009, p. 34).
A falta das imagens sobre os conflitos socioambientais e dos textos pode deixar de
mostrar uma parte real dessas relações, que nem sempre são tranquilas, entre a necessidade de
desenvolvimento de um país ou região e os atingidos diretamente por essas obras. Ainda mais
se lembrarmos de eventos recentes no país, como os de Mariana e Brumadinho, em Minas
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Gerias, e dos impactos sofridos tanto pela população como pela natureza, destroçados pelos
rejeitos das barragens de minérios.
Pensando nessas lacunas imagéticas e discursivas nos livros didáticos, bem como na
falta de disponibilidade de conteúdos sobre esse assunto para os estudantes, planejamos e
executamos uma oficina no segundo semestre de 2023 com estudantes do 9° ano que abordasse
a temática investigada, buscando construir outras imagens como forma de construir outras
narrativas sobre os conflitos socioambientais e os atingidos por barragens.
A oficina sobre conflitos socioambientais e usinas hidroelétricas
Para que a oficina fosse organizada, buscamos inspirações em vivências formativas
anteriores no Museu Oscar Niemeyer (MON), como a exposição “Mariana, do artista Christian
Cravo. As imagens, expostas em uma sala, mostram o que aconteceu em Mariana depois do
rompimento da barragem. A partir dessas vivências, escolhemos trabalhar com imagens
retiradas do documentário “Arpilleras: atingidas por barragens bordando a resistência”
6
(2019)
como uma forma de “educar os olhos” (Oliveira Júnior, 2009). Produzido pela equipe do
Movimento dos Atingidos por Barragens
7
(MAB), o documentário relata a vida de dez mulheres
depois de serem atingidas por barragens. Entretanto, escolhemos uma dessas mulheres como
protagonista para a retirada das imagens, Claídes Helga Kohwald. A história dela foi escolhida
por se cruzar com a história da construção da UHE de Itá, em Santa Catarina. Claídes foi uma
das primeiras mulheres a participar do MAB e teve sua vida transformada depois da obra da
usina. No documentário, ela mesma mostra como era e como ficou sua casa, que está na área
de inundação do reservatório da usina.
A oficina ocorreu em duas aulas seguidas, de 50 minutos cada. Chegamos à sala de aula
com olhares sendo lançados para a caixa com diversos materiais e ouvimos algumas perguntas:
“aquilo é tinta!?”, “será que é pra gente!?”. Isso significava que havia uma curiosidade no ar.
Quando todos se sentaram e tivemos a atenção, explicamos que aquelas aulas faziam parte de
6
O documentário se encontra disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=PEu-AATb3TU. Acesso em:
10 fev. 2024.
7
Para conhecer mais sobre o MAB, acesse: https://mab.org.br/. Acesso em: 10 fev. 2024.
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uma oficina. Não falamos o tema. A estratégia era que os estudantes, ao verem as imagens,
falassem o que viesse à cabeça. Definimos, pela potência das imagens, que na oficina os
estudantes seriam apresentados às imagens inicialmente sem contexto, e posteriormente teriam
o contato com a situação da qual as imagens foram extraídas.
Mostramos cinco imagens extraídas do documentário que tinha Claídes em cena.
Ouvimos os mais diversos comentários, como: “ela está triste; parece frio; tem plantas, têm
água, é uma ilha?; a Rapunzel presa no castelo; parece a Dora Aventureira; uma floresta, uma
construção abandonada”.
Depois de ouvir os comentários sobre as cinco imagens, perguntamos que história as
imagens contavam para eles. As duas respostas que mais marcaram foram: a história imaginada
por uma estudante sobre uma senhora que viajava o mundo e escrevia em um diário o que via
e mostrava para as pessoas; e a outra sobre uma senhora que teria perdido sua casa e tempos
depois tinha voltado para ver como estava. Essa última estava bem próxima da realidade.
Em seguida, contamos a história de Claídes para os estudantes, que se surpreenderam
muito com sua luta pelos direitos das pessoas atingidas por barragens. Todos viram o quanto
era sofrido voltar apenas para ver sua casa onde morava anos atrás e encontrá-la em meio ao
mato, por ser uma área de inundação do lago artificial construído para a UHE de Itá.
Apresentamos mais detalhes sobre a construção da UHE, falamos sobre as pessoas que
moravam na cidade de Itá e foram realocadas para outros lugares, sobre as construções, os
conflitos socioambientais que ocorreram ali e ainda ocorrem em outros lugares nos quais usinas
são construídas.
O próximo passo da oficina foi propor aos estudantes que modificassem as cinco
imagens que acabaram de ver sobre a história de Claídes, ao ponto de que as próximas pessoas
que vissem as imagens modificadas conseguissem entender pelo menos um pouco sobre o
conflito socioambiental ocorrido ali por decorrência da construção da UHE. Pudemos explorar
materiais e artefatos escolares com os quais há muito tempo não tínhamos contato nas escolas,
devido à plataformização das atividades.
Levamos para a sala de aula papéis coloridos, tintas, papel celofane colorido, revistas
para recorte, fitas adesivas coloridas, mapas e trechos de poemas com temáticas próximas ao
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que seria abordado. Formamos cinco grupos, e cada um pegou uma imagem e uma caixa com
os mais diversos tipos de materiais escolares para começar as produções. Durante as produções,
fomos conversando com cada grupo para entender qual seria a ideia que gostariam de passar
com aquela nova imagem que estavam desenvolvendo. Das cinco imagens produzidas,
destacamos três.
Na Figura 1, temos a personagem Claídes no centro da colagem, ocupando um espaço
que parece ser a abertura de uma janela, e ao seu redor inúmeras palavras recortadas de revistas,
como “adeus”, “um rio pálido”, “vidas em ruínas”, “terra fantasma” e “sem casa, sem
esperança". Uma das palavras foi escrita nos papéis coloridos, e os estudantes usaram seus
próprios corretivos para detalhes. Essas palavras soturnas expressavam de certo modo a história
de alguém que viu sua casa e uma cidade inteira sumirem pela água e pela construção da usina.
Parecendo que, com a inundação, uma parte da memória e das vivências da comunidade
também afundam. O comentário feito pelas estudantes foi: “Juntamos rias palavras que a
gente achou que pudessem mostrar para as outras pessoas o que ela passou e fizemos essa água
(apontando para o celofane azul) para mostrar a inundação” (Anotações no diário de campo,
outubro de 2023).
Figura 1 Palavras
Fonte: Acervo das autoras, 2023.
Na Figura 2, Claídes está de costas, atravessando o que parecia ser uma abertura entre
um cômodo e outro de uma casa, agora tomada pela vegetação. As/os estudantes comentaram:
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“A casa dela está sendo inundada por causa da construção da usina. Eu imagino quadros aqui
(apontando para parede) e cortina. Antes ela morava aqui” (Anotações no diário de campo,
outubro de 2023).
Nessa produção, imaginaram como seria a casa antes da construção da usina e usaram
a figura de uma usina hidrelétrica e uma frase de Claídes, que diz: mesmo que eles indenizem
muito bem, os sentimentos eles nunca vão indenizar”. Ao usarem o papel celofane azul para
representar a água, quiseram passar a ideia de uma inundação acontecendo. Escolheram também
trechos do poema “Adeus a sete quedas” (1982), de Carlos Drummond de Andrade, que foi
entregue junto aos outros matérias disponíveis nas caixas. A seguir segue o trecho destacado
pelos estudantes:
Faz-se do movimento uma represa,
Da agitação faz-se um silêncio
Empresarial, de hidrelétrico projeto.
Vamos oferecer todo o conforto
Que luz e força tarifadas geram
À custa de outro bem que não tem preço,
Nem resgate, empobrecendo a vida
Na feroz ilusão de enriquecê-la.
(Drummond, 1982, p. 34)
Figura 2 Casa
Fonte: Acervo das autoras, 2023.
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Na Figura 3, Claídes está de costas observando o rio Paraná e o local onde existia a
antiga cidade de Itá. Esse grupo usou várias imagens de revistas e colou algumas casas, mesas
com frutas, um mapa com a localização da usina, a imagem de alguns indígenas, a frase “Povos
indígenas: sujeitos da história” e a palavra “saudade” feita com a junção de várias letras. As/os
estudantes relataram que: “debaixo daquele rio tinham pessoas, cidades e histórias. Hoje,
tem água e ela não consegue mais visitar onde ela morava, ela tem saudade. Colocamos os
índios porque eles estavam ali antes e tiveram que sair dali” (Anotações no diário de campo,
outubro de 2023).
Figura 3 “Saudade”
Fonte: Acervo das autoras, 2023.
A percepção espacial urbana na produção de conhecimentos na Geografia Escolar
Pelas vivências junto ao PRP, foi possível escolher a temática para o desenvolvimento
da pesquisa sobre “Percepção espacial em Geografia Urbana” com uma turma de ano do
Ensino Fundamental. Após alguns meses de observação e diagnóstico da turma a ser trabalhada,
juntamos informações sobre os temas que estavam estudando e que tipo de atividades obtinham
maior participação, bem como buscamos compreender o ritmo das aulas e da escola a fim de
extrair o máximo da experiência para nossas formações. Optamos pelo ano por terem a
carga necessária para o exercício do pensamento crítico sobre suas realidades e o espaço urbano
em que vivem.
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O PRP e o professor preceptor
8
permitiram que tivéssemos maior liberdade do que nas
disciplinas de estágios obrigatórios. Portanto, tivemos mais autonomia para decidir o tema a ser
trabalhado na pesquisa de final de curso. Buscamos referências das vivências enquanto
estudantes da educação básica ao lembrar do que sentíamos falta nas aulas de Geografia em
comparação ao aprendido na graduação. Consideramos conceber a Geografia enquanto visão
de mundo, na qual a realidade a suas apreensões se manifestam espacialmente, e que considera
a humanidade e a sociedade produtora e reprodutora ativa das espacialidades e fenômenos,
como nos ensina Lana Cavalcanti (2009).
A partir disso, optamos pelo tema espaço urbano devido à sua forte relação com o
exercício da cidadania, que viria a ser costurado com percepção espacial, a qual nos ajuda a
enxergar quem somos dentro de tudo isso. Os demais assuntos abordados, a exemplo de city
marketing, arte urbana e o uso de imagens, foram aparecendo no decorrer da pesquisa.
Doreen Massey, no texto “A mente geográfica” (2017), afirma ser possível relacionar
metodologicamente as imaginações geográficas e os preconceitos dos sujeitos sobre as cidades.
Trazendo para o contexto de Curitiba, refletimos como o city marketing influencia nessas
visões, e como os estudantes representariam seus espaços vividos.
Mariana de Oliveira Pimentel (2012), a partir dos slogans de Curitiba cidade
ecológica”, a cidade mais tecnológica do mundo e dos demais elementos culturais que
envolvem o imaginário coletivo curitibano, destaca que a construção desses ideais vem de
diversas fontes (propagandas políticas, planos diretores e até mesmo literatura) bastante
tempo, levando a uma falsa impressão de que a capital paranaense seja homogênea no que tange
ao que é considerado desenvolvimento. Estendendo esse raciocínio às periferias, observamos
que não local para elas devido à sua complexidade e suposta desorganização espacial”,
gerando uma intensa segregação socioespacial perpetuada pelas mesmas instituições que a
consolidaram.
A partir dessas provocações, buscamos o espaço escolar como local para desconstrução
dos imaginários e preconceitos que carregamos sobre os lugares, almejando alcançar uma
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Professor preceptor é o professor de Geografia que recebe o grupo de bolsistas residentes nas escolas.
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educação emancipatória, pois é nela que ocorrem encontros e manifestações de existências,
formações e percepções, isto é, onde primeiro percebemos outros seres sociais. Consideramos
que as aulas de Geografia podem colaborar nesse processo, pois, como discorre Lívia de
Oliveira a respeito dos estudos de percepção espacial, conhecer um objeto consiste em construí-
lo ou reconstruí-lo (Oliveira, 2013). A mediação do professor pode partir dos cotidianos dos
estudantes o que lhes é familiar e passá-los por uma leitura geográfica que pode levar a
um conhecimento mais transparente, no caso da Geografia Urbana, da cidade em que vivemos,
com vistas a melhorá-la.
Nessa possibilidade de “(re)conhecer um objeto” junto aos conteúdos geográficos em
sala de aula, os docentes podem escolher linguagens mais próximas dos estudantes. Em vista
disso, escolhemos para a pesquisa a análise e utilização de imagens, bem como suas
potencialidades e significados. Por exemplo, como a “capital ecológica” é tratada nas
propagandas de turismo da prefeitura, retratando pontos turísticos centrais e contraditoriamente
vazios, vendendo uma figura de uma Curitiba descolada e ilusória. Em contrapartida, utilizamos
a visão urbana do grafiteiro curitibano Rimon Guimarães
9
por ele produzir arte urbana desde a
infância e hoje ter trabalhos espalhado pela cidade, e por diversos países do mundo. Nelas, o
grafiteiro expõe questões da negritude, faz críticas sociais e simboliza paisagens periféricas por
meio de cores e formas “embora trabalhe sobre a base dura, fria e reta do concreto urbano,
suas formas são naturais, orgânicas, sinuosas” (Sanchez, 2019, p. 9).
Sob essa perspectiva, pode-se demonstrar na aula como diferentes imagens sobre o
mesmo espaço podem apresentar narrativas diferentes, e por isso é importante percebermos
quem somos nos espaços e qual cidade queremos habitar.
Segundo a Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2017), o espaço urbano aparece
em diversas etapas da trajetória escolar, variando entre o 5° e o 9° ano do Ensino Fundamental,
geralmente acompanhado de termos como “representação”, “transformações”, “questões
ambientais”, “indústria” e outros. Dentro disso, o ano tem a maior quantidade de habilidades
relacionadas ao urbano e à cidade em si.
9
Para saber mais sobre o trabalho do artista: https://www.instagram.com/rimonguimaraes/. Acesso em:
13/02/2024.
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A percepção espacial é explicitada ainda na apresentação da disciplina, colocando-a
como intenção de aprendizado para que os educandos sejam passíveis de interpretar e
questionar a realidade (BNCC, 2017). Para o desenvolvimento da pesquisa, foi necessário
também observar o bairro no qual a escola se localiza. O bairro Tarumã fica na Regional Cajuru,
na região leste da cidade, onde várias funções foram abrigadas durante os planos de urbanização
do século XX, abrigando espaços militares, esportivos e industriais. Os estudantes são, em sua
maioria, de classe média baixa e vivem nos bairros arredores, apesar de as imediações da escola
serem residenciais.
Oficina sobre percepção ambiental urbana
Após as observações da turma, do bairro, da pesquisa em imagens, na BNCC e outros
materiais, optamos pelo planejamento e execução de uma oficina que seria realizada durante
duas aulas seguidas de 50 minutos cada. Portanto, para compreendermos com outros olhares o
local percorrido diariamente, propomos como produto final para a oficina a produção artística
de uma imagem pelos estudantes.
Num primeiro momento foi apresentado, por meio de slides, um conjunto de imagens
retiradas de propagandas das prefeituras de Curitiba e regiões metropolitanas, além de outras
propostas de olhares sobre a cidade, como arte de rua e fotografia. Na sequência, realizamos
uma introdução expositiva-dialogada sobre os temas “percepção espacial” e “Geografia
Urbana”. Também aproveitamos esse tempo para recolher informações escritas sobre os
conhecimentos prévios dos estudantes acerca da cidade e do urbano, como elementos da
paisagem, cotidiano, especificidades, acesso a meios de comunicação e transporte, o que mais
e menos gostam, utopias, entre outros. O quadro também foi utilizado a todo momento para
escrever palavras-chave e conceitos. Em seguida, comparamos e complementamos as respostas
com as imagens apresentadas a fim de verificar se estas representam nosso imaginário sobre a
cidade ou se poderiam ser mais abrangentes.
No tempo restante, foi proposta uma atividade de produção artística inspirada nos
processos do grafiteiro Rimon Guimarães. Seis grupos foram divididos e deveriam produzir,
por meio de desenho ou colagem (foram fornecidos os materiais para trabalharem, como folhas
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sulfite brancas e coloridas, lápis de cor, revistas, tesouras e colas), uma imagem que
representasse seu bairro e seu espaço vivido, diferente da Curitiba que geralmente é divulgada
nos meios de comunicação. Os estudantes foram incentivados também a redigir um parágrafo
acerca de suas visões da paisagem e do fenômeno urbano retratado.
Para a análise das produções artísticas, utilizamos a metodologia fenomenológica criada
por Salete Kozel (2019) que separa, basicamente, análise de distribuição de elementos na
imagem (perspectiva, horizontal, circular, quadros e quadras, dispersa e isolada), especificação
de ícones (paisagem natural, paisagem construída, elementos móveis e elementos humanos) e
outros aspectos e particularidades. A adoção dessa metodologia ocorreu por conta do objetivo
de apreender o que transpassa os grupos de estudantes em relação a Curitiba, principalmente,
mas também os elementos em comum, especialmente o que os representa e o que deixam em
segundo plano quando se trata de espaço urbano. Ao todo, foram produzidas seis imagens no
tempo das aulas. Separamos a análise de três delas para exemplificar a riqueza do material feito
pelos estudantes e como podemos realizar diferentes leituras sobre o urbano.
A Imagem I foi produzida por duas garotas e um garoto. Esse trio foi o que apresentou
mais dificuldade na idealização do trabalho, pois os participantes não entravam em consenso
sobre o que seria representado. O garoto relatou querer retratar futebol de alguma forma,
enquanto uma das garotas gostaria de incluir uma sapatilha de balé. Foi necessário fazer
mediação e indicar que poderiam fazer como desejassem, compondo a imagem com ambas as
figuras, mas eles se mostraram relutantes em fazer algo diferente ou mais abstrato, preferindo
desenhar com elementos mais esperados para a cidade e, de certo modo, clichês.
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Figura 4 Imagem I
Fonte: Acervo das autoras, 2023.
Por conta da demora para iniciar, informaram queo teriam tempo de pintar e finalizar
como gostariam. Com isso, observamos a presença apenas de ícones, que a princípio pareceram
dispostos de forma dispersa. Porém, após analisar por mais tempo, a imagem foi classificada
como forma horizontal, pois se trata de uma paisagem construída e natural, com uma base de
rua asfaltada e carros andando (elementos móveis), um muro representado pela figura do
grafite, a araucária, a gralha azul (retirada das imagens de Rimon oferecidas) e a nuvem de
chuva, elementos muito característicos de Curitiba, em destaque. Percebemos que foi o único
grupo a representar elementos naturais misturados à paisagem urbana.
A Imagem II foi feita por três garotas e apresenta ícones e letras. Acima se o tulo
“Catedral Basílica, e a explicação, feita num papel separado e colado com fita, está no lado
direito: Decidimos representar a Catedral Basílica Menor de Nossa Sra. da Luz dos Pinhais,
pois gostamos da paisagem que ela deixa no centro de Curitiba, apesar de ser uma paisagem
urbana”.
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Figura 5 Imagem II
Fonte: Acervo das autoras, 2023.
Consideramos a distribuição da imagem isolada, pois a edificação fica evidente no meio
e não mais elementos desenhados na composição. A paisagem é construída com equipamento
cultural e referência ao Centro Histórico de Curitiba especificamente. A peculiaridade que
destaco é a escrita [...] gostamos da paisagem que ela deixa no centro, apesar de ser uma
paisagem urbana”, pois o emprego do advérbio “apesar” contraria a expectativa de uma
construção no centro da cidade ser urbana. Isso nos leva a crer que as estudantes consideram o
urbano um conceito possivelmente caótico, com a movimentação, barulho e correria do
cotidiano, e que a Catedral Basílica seria um ponto de estética agradável e calmo em meio a
todo o resto.
A Imagem III foi feita por três garotas e um garoto, que colaboraram na ideia e nas
colagens (exclusivamente retiradas de revistas), enquanto o desenho foi majoritariamente feito
por uma das estudantes. Vemos a presença de ícones e letras, com comércios pequenos, um
deles levando o nome próprio como nome do negócio, o que remete a um bairro familiar, com
prédios grandes característicos de centros urbanos ao fundo. A distribuição da imagem é
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DAL PONT, Karina Rousseng; SAWAF, Mayra Bianca dos Passos; MILLÉO, Paula. Artes Geográficas: imagens, poesia, arte urbana, papéis
coloridos, canetinhas e tintas para a composição de práticas de ensino na Geografia Escolar. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 10, 23,
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horizontal, com base em uma rua de paralelepípedos e possivelmente asfalto, com destaque
para os comércios em casas térreas e um fundo de prédios altos e céu. Os ícones são focados
totalmente numa paisagem construída, principalmente de construções urbanas.
Figura 6 Imagem III
Fonte: Acervo das autoras, 2023.
Entre as particularidades, ressaltamos o contraste entre os elementos pessoais e
impessoais, representados pelos pequenos estabelecimentos de bairro e as grandes edificações
mais distantes, das quais não se pode extrair nenhuma informação sobre os sujeitos, que acabam
sendo apagados em meio à cidade, mostrando as diferentes funções e vivências no urbano. Essa
foi a única imagem que apresentou elementos locais das vivências cotidianas dos estudantes,
como o açougue ou o brechó, diferenciando-se das outras imagens, que trouxeram elementos
mais distantes de seus lugares, seguindo uma lógica hegemônica de apresentação da cidade.
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Análise dos resultados, ou o que nos dizem as oficinas
Michel Foucault (2011), em sua aula “Do governo dos vivos”, toma a manifestação de
verdades como formas de poder que constroem mundos. Sacralizam, definem as subjetividades
e agenciam poderes que levam à produção de corpos dóceis. Alguns dos imperativos produzidos
na escola e nos cursos de licenciatura são tomados como essas “manifestações de verdades
como forma de poder”. O currículo escolar, as legislações, as políticas de Estado são meios de
disputa entre o que fica dentro e o que é desconsiderado como essencial ao trabalho pedagógico.
Muitas vezes esse é o caminho que leva à manutenção das “monoculturas escolares” e a uma
certa acomodação nos “modos de produção de vida, a uma perda de sensibilidades e ao
enfraquecimento da potência de criação”, de acordo com Suely Rolnik (2006, p. 76).
Com as duas pesquisas realizadas no e com o cotidiano escolar, a partir das vivências e
observações realizadas junto ao PRP, buscamos justamente desacomodar nossas certezas sobre
esses imperativos pedagógicos e ampliar a própria compreensão dos objetos de análise que
levam a Didática à compreensão do que se nesse ensinar e aprender contemporâneos. Com
as artesanias geográficas, buscamos ressignificar os artefatos dos professores ao percorrer os
espaços da escola com caixas cheias de inventividades por vir, os temas e habilidades da
Geografia Escolar, assim como as práticas pedagógicas inerentes ao fazer docente.
Portanto, na oficina sobre os conflitos socioambientais e usinas hidroelétricas, com as
produções dos estudantes destacamos as palavras “saudade”, nostalgia” e “lembranças”,
mostrando os sentimentos dos estudantes ao tentar representar o que as pessoas atingidas por
barragens sentiram ao ter de sair de suas casas e abandonar seus territórios para dar lugar a uma
gigantesca obra. A água estava presente na maioria das produções, tendo sido um ponto que
representaram bem, pois muito da história dessas pessoas foi inundado com as águas. É um
mundo alagado esse apresentado pelas imagens e pela história retirada do filme “Arpillheiras”,
que desfaz nos estudantes aquela ideia de progresso e desenvolvimento sempre colada às
grandes obras do Estado, como as usinas hidrelétricas.
Pelas reações da turma ao ouvir a história e fazer as produções, verificamos que os
estudantes desconheciam tais conflitos. Mesmo o assunto estando presente nos livros didáticos,
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não se recordavam do tema ou se haviam estudado antes. Essas observações mostraram que,
mesmo que os materiais existam na escola, nem sempre as/os estudantes têm acesso às
informações contidas neles, seja por falta de interesse, seja por não estar no plano de aula do
governo aplicado pelas/os professoras/es de Geografia.
Também podemos destacar que a metodologia da oficina, com a utilização de outras
materialidades, pode ter favorecido a construção sensível de imagens, tornadas narrativas para
a questão que se buscava mobilizar: compreender os conflitos socioambientais e os impactos
das barragens hidroelétricas no cotidiano da população atingida por essas barragens. É
interessante observar que, por meio da história de uma única pessoa atingida pelas barragens,
as/os estudantes conheceram mais sobre uma perspectiva de um tipo de conflito socioambiental
e conseguiram produzir imagens que poderiam contar outras versões da história de Claídes e
outras pessoas.
Na oficina sobre percepção ambiental urbana realizada a partir dos materiais produzidos
pelos estudantes do ano, a utilização de imagens, tanto na introdução expositiva-dialogada
quanto no momento de trabalho, buscou educar a atenção para outras linguagens a fim de que
ampliassem as visões sobre o espaço urbano. Entretanto, é possível verificar que esse recurso
não foi utilizado em toda a sua potência.
Um fenômeno parecido ocorre em relação às imagens vinculadas ao city marketing, as
quais demonstram estar tão enraizadas nos imaginários que o tempo da oficina não foi suficiente
para provocar uma ruptura de pensamento. Em sua maioria, as imagens produzidas pelos
estudantes apresentavam os elementos clichês da cidade de Curitiba, como araucárias, prédios
históricos, a catedral do centro e outros.
Esses elementos das paisagens urbanas foram priorizados em detrimento de
informações sobre bairros e espaços vividos, como o próprio nome da atividade propunha, que
apareceram apenas na Figura 6. Mesmo assim, o caráter intimista e particular que o “açougue
do Jão” e o “brechó” apresentam num primeiro plano contrasta com a impessoalidade dos
prédios altos no segundo plano da mesma imagem. Mesmo o grupo que disputava se centraria
seu trabalho no futebol ou na sapatilha de balé acabou por apresentar suas percepções sobre a
cidade por meio da representação da araucária
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Esse possível bloqueio criativo é reforçado pelo sistema escolar vigente, que valoriza
seletos estilos de desenho e de arte no geral, impregnando a homogeneização dos
conhecimentos, valorizando sobremaneira a linguagem escrita e as imagens que “ilustram” os
lugares sem oferecer outras possibilidades de aprofundamento e/ou rupturas. Constatamos isso,
por exemplo, pela maior facilidade em descrever as intenções da produção da imagem nos
parágrafos escritos do que de fato realizá-las durante a oficina. Se levarmos também em
consideração toda a questão do uso das plataformas digitais como recursos pedagógicos que as
escolas estaduais do Paraná estão adotando sem o menor critério crítico desde o início de 2024,
essa limitação criativa se intensifica por gestos mecânicos de respostas a questionários ou
cópias de slides. Compreendemos, nesse contexto, que, para o professor dar conta de fazer a
chamada, apresentar os conteúdos e abrir as plataformas, o tempo de inventividade e criação de
outras propostas diferenciadas, ou “manuais”, está cada vez mais escasso. Nesse sentido é que
as oficinas como dispositivos pedagógicos tornam-se a rupturas de tempos cada vez mais
fechados e das automatizações dos planejamentos e atividades pedagógicas.
Considerações finais
É preciso propor com as pesquisas a ressignificação e descolonização dos processos
formativos, solapando a confiança nas verdades únicas sobre os dispositivos educativos que são
centrais nos modos de regular e normatizar a vida. Nada mais significativo do que refletir sobre
esse momento em que acabamos de viver junto a uma pandemia global, resultado de um modo
de vida capturado pelo consumismo e de desigualdades sociais que precarizam a vida em
benefício do capital. Trata-se da produção de um mundo e das manifestações de verdades
unificadas, do desprezo pelas ciências e do avanço de políticas públicas autoritárias. Qual
mundo desejamos produzir e compartilhar com a educação?
Trata-se, portanto, de buscar saber como é possível ressignificar as práticas de ensino
na Geografia Escolar para além de uma “monocultura escolar” ao tratar das propostas de
pesquisa e da formação de professoras e professores articulada às práticas de ensino e às/aos
estudantes que dela fazem parte. Estar nas escolas durante 18 meses junto às atividades
desenvolvidas pelo PRP colocou os licenciandos e licenciandas diante de questões profundas
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sobre o fazer docente: da leitura e apropriação do currículo escolar da Geografia até sua
problematização, o mapeamento de temáticas ausentes e de objetos de conhecimento
imprescindíveis ao fazer geográfico engajado e emancipatório.
Fazem parte desse processo os estudos e construções de metodologias que coloquem os
sujeitos escolares mais atentos e mais sensíveis ao mundo e suas desigualdades; o cultivo de
uma agrofloresta pedagógica, em detrimento das monoculturas escolares; o fazer pulsar a vida
e as possibilidades interpretativas dos fenômenos geográficos, pela oferta de “tempo livre”. Isso
possibilita a transformação de inquietações observadas ao longo do programa em propostas de
pesquisas, como essas apresentadas neste artigo, pela postura investigativa tomada pelo
exercício da docência, que amplia as reflexões e experimentações pedagógicas com os objetos
da educação geográfica.
Com nossas pesquisas, a aposta foi ativar na docência a possibilidade de criar imagens,
textos, vídeos, áudios a partir do estudo de diferentes linguagens de processos artísticos, coletar
desses trabalhos pistas de como voltar aos temas da educação geográfica e ressignificá-los. Ou
seja, produzir uma micropolítica, aquela que constrói novos modos de subjetivação, “modos de
sensibilidade, modos de relação com o outro, modos de produção e criatividade que produzam
uma subjetividade singular” (Guattari; Rolnik, 2011, p. 22).
A construção das oficinas, dos exercícios e das artesanias geográficas com cola,
tesouras, papéis coloridos, revistas e caixas visa mais às experimentações com outras
materialidades e com a abertura aos tempos escolares do que a uma explicação breve ou a
facilitação de aprendizagens. É uma abertura ao possível, ao desconhecido e às incertezas que
rompem com os tempos e modos tão marcados da escolarização e seus predicados. Desejamos
com o PRP e com as pesquisas provocar mais a sensação e as derivações subjetivas produzidas
por outros encontros nas escolas. Encontros com outras narrativas, outras imagens, outros
modos de apresentar e ler o espaço geográfico, reconhecendo em meio às imagens clichês das
cidades a construção de pedagogias engajadas, por estratégias que se modificam e nunca são as
mesmas, dando tempo e espaço para a inventividade e a construção de gramáticas insurgentes
na Geografia Escolar.
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