Ensaios de Geografia
Essays of Geography | POSGEO-UFF
AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
CARLOS, Thalles Martins Soares; GOMES, Marcos Antônio Silvestre. Desigualdades socioespaciais e contradições na produção do espaço
urbano de Rio das Ostras/RJ. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 12, nº 25, e122525, 2025.
Submissão em: 11/05/2025. Aceito em: 10/08/2025.
ISSN: 2316-8544
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SEÇÃO ARTIGOS
Desigualdades socioespaciais e contradições na produção do espaço urbano de Rio das
Ostras/RJ
Socio-spatial inequalities and contradictions in the production of urban space in Rio das
Ostras/RJ
Desigualdades socioespaciales y contradicciones en la producción del espacio urbano en
Rio das Ostras/RJ
DOI: https://doi.org/10.22409/4e7hqz43
Thalles Martins Soares Carlos
1
Universidade Federal Fluminense (UFF)
Rio de Janeiro, Brasil
e-mail: martins_thalles@yahoo.com.br
Marcos Antônio Silvestre Gomes
2
Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)
Minas Gerais, Brasil
e-mail: gomesmas@yahoo.com.br
Resumo
A partir da década de 2000, constatou-se na cidade de Rio das Ostras/RJ um processo de expansão urbana e
crescimento demográfico que quadruplicou sua população em um período de 24 anos, resultando numa
acelerada e desigual urbanização no município. Nesta perspectiva, este artigo analisa as desigualdades
socioespaciais e as contradições da produção do espaço, a partir da análise da infraestrutura e serviços urbanos
nos bairros da pesquisa. A base metodológica pauta-se em pesquisa qualitativa nos bairros centrais e
periféricos, trabalhos de campo, pesquisa documental e aplicação de questionários semiestruturados junto aos
moradores dos bairros selecionados. Os resultados da análise indicaram contradições entre o centro e a
periferia, áreas com sobreposição de carências, como a falta de pavimentação, rede de esgoto, água encanada,
acesso a aparelhos culturais e de lazer e a precarização dos serviços públicos nos bairros periféricos e de maior
concentração demográfica, principalmente nos bairros Praia Âncora, Cidade Beira Mar e Cidade Praiana, entre
outros problemas comuns para quem vive nestas localidades. Em contraposição, os bairros centrais, tais como,
Costazul e Jardim Mariléa, demonstram uma reprodução das formas e conteúdos capitalistas próprios das
camadas de alta renda e serviços especializados, sobretudo, voltados ao turismo, centralização da infraestrutura
e cuidados públicos, o que resulta em diferentes níveis de desigualdades no tecido urbano de Rio das Ostras.
Palavras-chave
Produção do espaço; Desigualdade socioespacial; Infraestrutura Urbana; Serviços Urbanos; Rio das Ostras.
1
Bacharel e Mestre em Geografia pelo Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense (UFF) -
Campos dos Goytacazes.
2
Doutor em Geografia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Docente associado do
Departamento de Geografia da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Docente colaborador do
Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFF - Campos dos Goytacazes.
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Abstract
From the 2000s onwards, the city of Rio das Ostras/RJ experienced a process of urban expansion and
demographic growth, which quadrupled its population in a period of 24 years, resulting in rapid and unequal
urbanization in the municipality. From this perspective, this article analyzes socio-spatial inequalities and the
contradictions of space production, based on analysis of urban infrastructure and services in the research
neighborhoods. The methodological approach is based on qualitative research in central and peripheral
neighborhoods, fieldwork, documentary analysis, and the application of semi-structured questionnaires with
residents of selected neighborhoods. The analysis revealed contradictions between the center and the periphery,
with areas marked by overlapping deficiencies, such as lack of paving, sewage systems, piped water, access to
cultural and leisure facilities, and the deterioration of public services in peripheral and more densely populated
neighborhoods, particularly in Praia Âncora, Cidade Beira Mar, and Cidade Praiana, among other common
issues faced by residents of these locations. In contrast, the central neighborhoods, such as Costazul and Jardim
Mariléa, demonstrate a reproduction of the capitalist forms and contents typical of high-income groups and
specialized services, especially aimed at tourism, centralization of infrastructure, and public maintenance, which
results in different levels of inequalities in the urban fabric of Rio das Ostras.
Keywords
Production of space; Socio-spatial inequality; Urban Infrastructure; Urban Services; Rio das Ostras.
Resumen
A partir de la década de 2000, se constató en la ciudad de Rio das Ostras/RJ un proceso de expansión urbana y
crecimiento demográfico que cuadruplicó su población en un período de 24 años, resultando a una urbanización
rápida y desigual en el municipio. Desde esta perspectiva, este artículo analiza las desigualdades socioespaciales
y las contradicciones en la producción del espacio, mediante el examen de la infraestructura y los servicios
urbanos en los barrios de investigación. La base metodológica se fundamenta en una investigación cualitativa en
barrios centrales y periféricos, trabajo de campo, análisis documental y aplicación de cuestionarios
semiestructurados a los residentes de los barrios seleccionados. Los resultados del análisis indicaron
contradicciones entre el centro y la periferia, áreas con superposición de carencias, como la falta de
pavimentación, red de alcantarillado, agua potable, acceso a equipamientos culturales y recreativos, y la
precarización de los servicios públicos en los barrios periféricos y con mayor concentración demográfica,
principalmente en los barrios Praia Âncora, Cidade Beira Mar y Cidade Praiana, entre otros problemas comunes
para quienes viven en estas localidades. En contraposición, los barrios centrales, como Costazul y Jardim
Mariléa, demuestran una reproducción de las formas y contenidos capitalistas propios de las capas de altos
ingresos y servicios especializados, sobre todo, orientados al turismo, centralización de la infraestructura y
cuidados públicos, lo que resulta en diferentes niveles de desigualdades en el tejido urbano de Rio das Ostras.
Palabras clave
Producción del espacio; Desigualdad socioespacial; Infraestructura Urbana; Servicios Urbanos; Rio das Ostras.
Introdução
O processo de urbanização capitalista consiste em uma cadeia de transformações de
características econômicas, culturais, demográficas, territoriais e sociais. A cidade capitalista
surge da ação orquestrada de diferentes agentes sociais que estruturam o espaço de acordo
com seus interesses e capacidades de atuação. No Brasil, um país com dimensões
continentais, as cidades possuem características bem diferentes em seus processos de
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formações socioespaciais, entretanto, com algumas características em comuns, presentes não
só no Brasil, como em outros países da América latina, a despeito da desigualdade
socioespacial nas estruturas, formas e funções entre distintos bairros que compõem cada
cidade.
Nesse sentido, convém destacar que o direito à cidade se orienta sobre a distribuição
equitativa dos benefícios e obrigações decorrentes da urbanização ou da liberdade individual
de acessar recursos urbanos, como observado por Harvey (1980, 2014). Ele envolve, de fato,
o direito coletivo de criar uma cidade diferente (Lefebvre, 2000, 2001, 2002, 2016). A
preocupação com a desigualdade no acesso a serviços de infraestrutura urbana impõe-se como
uma questão significativa para geógrafos, planejadores, pesquisadores, gestores e ativistas
urbanos, e essa dimensão tem sido objeto de reflexão há muito tempo no contexto do
pensamento sobre cidades no Brasil, especialmente em relação à justiça urbana e sua
interseção no planejamento e nas políticas públicas.
A problemática urbana reside especialmente nos espaços de desigualdades, em que as
carências de alguns são sobrepostas pelo acesso às benesses da urbanização por outros, os que
detém maior poder aquisitivo, que podem escolher os melhores lugares para morar. Assim,
outros grupos sociais de baixa renda se aglomeram em áreas destituídas de ou com
infraestrutura básica precária.
A cidade de Rio das Ostras, no estado do Rio de Janeiro (Figura 1), nos últimos 20
anos, passou por um processo de expansão urbana e crescimento demográfico, apresentando
aspectos da materialização do desenvolvimento geográfico desigual e contraditório na sua
estrutura urbana. Oficialmente criada em 1992 após um plebiscito de emancipação, tornando-
se independente do município de Casimiro de Abreu, a cidade faz divisa ao norte com o
município de Macaé, ao sul e oeste com Casimiro de Abreu, e ao leste é margeado pelo
Oceano Atlântico.
O espaço intraurbano do município, nos revela uma cidade dotada de contradições e
conflitos de interesses, onde se expressa uma lógica global capitalista que visa maximizar o
lucro e o bem-estar social, especialmente para uma parcela dos habitantes que pertencem a
grupos sociais de maior renda. Isto decorre pela produção e reprodução do espaço urbano sob
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a égide do capital, em um paradoxo entre o desenvolvimento e interesses econômicos e as
questões e temas sociais.
Isto posto, é relevante analisar a problematização dos desdobramentos da produção do
espaço urbano de Rio das Ostras a partir de três perspectivas: 1) análise da infraestrutura e
serviços urbanos dos bairros elencados na pesquisa; 2) o processo de expansão urbana nas
últimas duas décadas e 3) a análise da perspectiva dos moradores sobre os aspectos
socioespaciais dos bairros em que residem.
Figura 1 – Localização do Município de Rio das Ostras/RJ
Fonte: IBGE (2023). Organizado pelos autores (2025).
Essas questões até aqui destacadas despertaram o interesse em compreender neste
artigo as características das desigualdades socioespaciais e as contradições na produção do
espaço urbano de Rio das Ostras. Como recorte espaço-temporal, considera-se a expansão
urbana entre os anos de 2003 e 2024, que abrange a fase de aceleração demográfica nesse
período em que o município quadriplicou sua população e as formações socioespaciais dos
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bairros durante esse período, em especial, os bairros centrais de Costazul e Jardim Mariléa, e
os bairros periféricos de Praia Âncora, Cidade Praiana e Cidade Beira Mar.
Segundo Rodrigues (2007), a disparidade socioespacial é resultado do processo da
urbanização capitalista, sendo uma consequência da reprodução ampliada do capital que se
mantém como uma condição para a persistência da desigualdade social. A luta pelo direito à
cidade revela as adversidades e dificuldades enfrentadas pela maioria dos habitantes. Essa luta
é uma resposta à permanência e perpetuação da desigualdade urbana e do pensamento
dominante imposto por uma minoria com maior poder de capital, onde buscam transformar os
espaços segregados, que vinculam a mesma condição de vida, em espaços propícios para a
mudança e luta social ao direito à vida urbana digna.
A presença e aparente ausência do Estado aprofunda contradições inerentes ao modo
de produção capitalista. A presença diz respeito, entre outras dinâmicas, à definição
do salário-mínimo, às normas jurídicas de apropriação e propriedade da terra, à
legislação de uso da terra e edificações, à implantação de infra-estrutura [sic] e
equipamentos de uso coletivo. O Estado parece ausente ao definir salários
insuficientes para a reprodução da vida, não prover o acesso universal aos meios e
equipamentos de uso e consumo coletivo. Frequentemente se relaciona à falta ou à
precariedade de moradia, saneamento, de estabelecimentos de ensino, de tratamento
de saúde, de transportes coletivos com a ausência de investimento estatal no urbano
que não atenderia às necessidades de criar condições de reprodução e do aumento
populacional (movimento migratório e crescimento vegetativo). Num aparente
paradoxo, a presença do Estado ao estabelecer as condições gerais de reprodução é
entendida como ausência do urbano. Ficam ocultas, desse modo, causas da
perpetuação da desigualdade socioespacial (Rodrigues, 2007, p. 74).
Rodrigues (2007, p. 87) destaca que “a luta pelo direito à cidade é a luta pelo direito à
vida [...] que o espaço segregado produto do desenvolvimento desigual e combinado do
capitalismo não continue a ser condição de permanência, mas que se torne condição de
mudança”. Em um município que tem recursos milionários advindos dos royalties da
produção de petróleo da Bacia de Campos, ocorrem contradições entre o desenvolvimento
econômico e o desenvolvimento social de bem-estar. Por consequência, torna-se padrão a
expansão periférica desordenada e a favelização da maior parte da sociedade. Tais problemas
poderiam ser resolvidos no futuro por meio do empreendimento de infraestrutura de um modo
geral, intervenção governamental e um planejamento apropriado com o investimento de
políticas públicas.
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Propondo entender a geografia do município e suas transformações ao longo do tempo
e espaço, para alcançar os objetivos expostos, aplicou-se a pesquisa qualitativa como método
de análise e a investigação do fenômeno estudado. Segundo Silva e Mendes (2013), a
abordagem qualitativa em Geografia busca entender, a partir da compreensão e investigação
de um objeto de estudo, suas representações, opiniões, percepções, atitudes, entre outros
aspectos, a relação do fenômeno estudado com o objetivo do pesquisador.
Segundo Pessôa e Ramires (2013), a metodologia em amostragem na pesquisa
qualitativa geográfica têm diferentes abordagens. Conforme apontam os autores, a abordagem
qualitativa está relacionada à intensidade dos fenômenos, com o objetivo de aprofundar o
entendimento de grupos, segmentos e micro realidades que se manifestam em crenças,
relações, costumes e práticas.
Nos trabalhos de campo e na sistematização dos dados, utilizou-se a pesquisa não
probabilística, que, conforme Pessôa e Ramires (2013), é uma técnica de seleção de
amostragem para pesquisa que não se baseia em probabilidades ou aleatoriedade. Essa
amostragem seleciona um grupo de entrevistados de uma população maior, tendo em vista
que a pesquisa não abrange a totalidade dessa grande população. Assim, optou-se por
trabalhar com a amostragem por tipicidade ou intencionalidade, que é uma técnica de
amostragem não probabilística. Nessa metodologia, os elementos selecionados para a amostra
são escolhidos pelo critério do pesquisador, uma vez que podem obter uma amostra
representativa usando uma delimitação, o que resulta em economia de tempo e recurso
(Pessôa; Ramires, 2013).
Foi utilizada a variedade de tipos para delimitar o tamanho da amostra. Nos termos de
Pessôa e Ramires (2013), os participantes são selecionados e agrupados com base em um
critério fundamental de homogeneidade, no caso da pesquisa foram entrevistados os que
compartilham a residência no mesmo bairro.
Durante os anos de 2022, 2023 e 2024, foram realizados 12 trabalhos de campo para a
pesquisa. Esses trabalhos foram nos bairros Praia Âncora, Cidade Praiana e Cidade Beira
Mar, que no decorrer do processo de expansão urbana do município, transformaram-se em
bairros caracterizados pelo crescimento populacional acelerado e pela infraestrutura urbana
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insuficiente e precária, e os bairros Jardim Mariléa, que é conhecido por ser residência dos
grupos de alta renda, e o Costazul, principal bairro do município, onde se localiza o circuito
de eventos, bares, restaurantes, entre outros atrativos do setor turístico da cidade. Esses
bairros concentram uma infraestrutura e serviços urbanos melhor estruturados, incluindo
pavimentação, iluminação pública de qualidade, rede de transporte acessível e uma maior
variedade de estabelecimentos comerciais e de lazer. Essa infraestrutura atrai tanto moradores
de alta renda, quanto turistas.
Em síntese, foram feitas 100 entrevistas de questionário semiestruturado, 20 em cada
bairro. O questionário da pesquisa abordou questões sobre nível de escolaridade, renda,
condições de habitação, infraestrutura urbana, características da área de residência e do acesso
aos serviços básicos, entre outros aspectos.
É importante destacar que as entrevistas com os moradores não tiveram a pretensão de
atingir uma verdade absoluta, elas constituem um pequeno recorte para a confecção deste
artigo resultado de uma discussão ampla em dissertação de mestrado, na busca de
compreender as opiniões dos residentes sobre a cidade que habitam. Sublinha-se no trabalho,
as opiniões sobre a infraestrutura e serviços urbanos e a percepção do espaço de seus bairros e
o município que vivem, sempre respeitando as diferentes visões de mundo e opiniões sobre a
cidade.
É trabalhado no artigo os dados estatísticos governamentais do Censo do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, sobre questões de infraestrutura, tais
como, rede de iluminação pública, pavimentação de ruas e rede de água encanada nos
domicílios. O uso dos dados do Censo de 2010 justificou-se porque até o referido mês de
fevereiro de 2025, no qual este trabalho foi concluído, o IBGE não havia divulgado os dados
referentes ao Censo de 2022 sobre os setores censitários do município.
Dinâmicas do processo de crescimento urbano de Rio das Ostras/RJ
Conforme Gomes (2010), através do decreto 066/91 de 13 de setembro de 1990, do
Governo do Estado do Rio de Janeiro, determinou-se a realização de um plebiscito no distrito
de Rio das Ostras, 3° Distrito de Casimiro de Abreu na época, com o intuito de criar o
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Município de Rio das Ostras. O resultado desse plebiscito foi a esmagadora vitória do “Sim”,
com aproximadamente 95% do total de votos. Então, em 10 de abril de 1992, o governador
Leonel Brizola oficializou a criação do Município de Rio das Ostras.
O acelerado crescimento demográfico no município começa nos anos 2000 (Tabela 1).
Em 2003 a população de Rio das Ostras era de 42.024 pessoas e em 2022 saltou para 156.491
mil. O município quadruplicou sua população em 20 anos, o que acarretou vários problemas
urbanos, principalmente na questão de habitação, infraestrutura e serviços públicos em geral.
Tabela 1 – Dados demográficos do município de Rio das Ostras/RJ (2003-2022)
Fonte: IBGE (2023). Organizado pelos autores (2025).
O principal fator para o crescimento demográfico foi a descoberta de petróleo na Bacia
de Campos durante a década de 1970, seguida pela instalação da Petrobras em Macaé nos
anos 1980 e 1990. A indústria petrolífera gerou impactos, tanto positivos quanto negativos,
que resultaram em diferentes aspectos acerca das contradições na produção do espaço, entre o
desenvolvimento econômico e a desigualdade social e econômica (Gomes, 2010).
A indústria petrolífera tem atraído trabalhadores em busca de emprego e renda,
contribuindo significativamente para o desenvolvimento da região. Os benefícios advindos
dessa atividade incluem o pagamento de royalties e participações especiais, que aumentam as
receitas municipais e impulsionam o crescimento econômico. A Bacia de Campos destaca-se
como a maior reserva petrolífera do Brasil e abriga o maior número de campos produtores de
petróleo do país.
Esses recursos são concebidos para beneficiar os municípios, o que visa aprimorar a
qualidade de vida de seus habitantes. Contudo, frequentemente observa-se que esses recursos
são gerenciados de modo ineficaz pelos municípios, com um planejamento urbano que
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privilegia uma camada da sociedade, e, em muitos casos, sem a participação popular nas
decisões políticas, o que resulta na vivência de problemas comuns às grandes metrópoles
(Gomes, 2010).
A economia do petróleo junto ao turismo e o comércio são os maiores geradores de
empregos em Rio das Ostras. O turismo é o segundo vetor de maior investimento no
município, o que abrange rede de lojas, eventos, hotéis etc. O município de Rio das Ostras é
cercado por praias que atraem milhares de turistas todos os anos, como as praias do Centro,
Costazul, Joana, Itapebussus, entre outras. A cidade tem 15 praias no seu circuito turístico.
Rio das Ostras experienciou diretamente a vivência de ser um município que atrai
investimentos em serviços, comércio, construção de grandes hotéis, shoppings e restaurantes
nos últimos anos. Por outro lado, o competitivo setor imobiliário ocasiona grande parte da
desigualdade socioespacial entre os bairros. Na cidade há uma grande valorização dos bairros
mais próximos da praia, o que acarreta uma divisão desigual do investimento público entre as
localidades.
A cidade, que hoje, segundo o IBGE (2022), tem 156.491 mil habitantes está dividida
em 58 bairros e localidades conforme os dados organizados pela Secretaria de Gestão de
Pessoas (SEGEP) no ano de 2022. Os bairros que compõem o mosaico do município (Figura
2) oferecem uma diversidade de características e atrativos que conquistam moradores e
visitantes de diferentes perfis. Como já mencionado, um dos bairros mais conhecidos é o
Costazul, famoso por suas praias e infraestrutura turística bem desenvolvida. Com uma
atmosfera tranquila, Costazul é um destino popular no município. Ao lado do Costazul, estão
os bairros Recreio, Boca da Barra, Jardim Bela Vista, Enseada das Gaivotas, entre outros. No
bairro Centro se concentram os principais serviços, comércios e órgãos públicos. Com uma
dinâmica característica do centro municipal, o bairro oferece uma variedade de opções de
entretenimento, compras e gastronomia, além de ser palco de eventos culturais e festivais ao
longo do ano. Lá também se encontra a principal praça da cidade, conhecida como São Pedro,
em frente à praia do Centro. Lindeiros ao Centro, encontram-se os bairros Extensão do
Bosque e Chácara Mariléa.
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Além destes, Rio das Ostras conta com outros bairros periféricos como Praia Âncora,
ao Norte, que tem ao lado os bairros Village e Jardim Mariléa. Na parte Sul do município
estão localizados os bairros Cidade Beira Mar, ao lado Cidade Praiana que são vizinhos dos
bairros Palmital e Serra Mar. Outro destaque é o bairro Mar do Norte, no extremo Norte do
município. A Figura 2 representa o mapa de distribuição dos bairros no tecido urbano
municipal, com destaque para os bairros analisados na pesquisa.
Figura 2 – Mapa de localização dos bairros no município de Rio das Ostras/RJ
Fonte: IBGE (2023) e ESRI Open Street (2023). Organizado pelos autores (2025).
Nota-se que os bairros periféricos têm maior densidade demográfica, ao Norte, o Praia
Âncora, por exemplo, tem o maior número de domicílios, 6.350, e de pessoas, 21.500, (Tabela
2), que é duas vezes mais que os bairros ao Sul, Cidade Praiana e Cidade Beira Mar, com
2.900 domicílios e 9.414 pessoas e 2.904 domicílios e 8.891 pessoas, respectivamente (Tabela
2). Já os bairros Centrais e de médio e alto padrão, têm menos domicílios e menos pessoas,
isto é, ao Leste do município o bairro Costazul, que tem loteamento mais recente que os três
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citados acima, tem 1.550 domicílios e 4.500 pessoas (Tabela 2) e, ao Oeste, Jardim Mariléa,
bairro tradicional de classe média-alta, tem 2.800 domicílios e 8.690 pessoas (Tabela 2).
Tabela 2 – Dados demográficos dos bairros da pesquisa em Rio das Ostras/RJ
Fonte: SEGEP/Rio das Ostras (2022). Organizado pelos autores (2025).
Conforme Gomes (2010), no período de 2000 a 2004, diversas iniciativas voltadas
para o turismo e melhorias estruturais foram implementadas no município, isso incluiu a
duplicação da Rodovia Amaral Peixoto que corta todo o município e a revitalização da orla do
bairro Costazul e a intervenção na Lagoa do Iriry. A duplicação da rodovia desempenhou um
papel crucial na aprimoração do sistema viário, contribuindo também para a segurança de
pedestres e ciclistas. A reforma da orla de Costazul para o turismo e a intervenção na Lagoa
do Iriry não apenas impulsionou a valorização imobiliária nas localidades, mas também
proporcionaram uma infraestrutura aprimorada para os residentes e visitantes.
Nos trabalhos de campo, foi possível notar, principalmente nas localidades Praia
Âncora, Cidade Praiana e Cidade Beira Mar, a falta de gestão do espaço urbano. Embora
esses loteamentos tenham sido originalmente aprovados pela prefeitura, nota-se que seu
processo de ocupação resultou em edificações construídas muitas vezes sem critérios técnicos
ou alvarás municipais, com abertura desordenada de becos e vias irregulares.
Esses bairros de baixa renda apresentam notáveis diferenças no estilo de construção,
no zoneamento, na oferta de serviços coletivos, como postos de saúde, áreas de lazer, espaços
para prática esportiva e opções de transporte. A lógica da cidade capitalista, ao promover um
processo de despolitização do espaço urbano e marginalizar territórios considerados
economicamente periféricos, converte o planejamento urbano em uma ferramenta de gestão
empresarial. Muitas vezes, a gestão pública transforma a cidade em um sujeito competitivo,
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urbano de Rio das Ostras/RJ. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 12, nº 25, e122525, 2025.
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onde os resultados predominam, mesmo que sejam maquiados para manter uma imagem
comercial (Cavalcante, 2014).
Na Figura 3, apresentamos um mapa de uso e cobertura do solo de Rio das Ostras
entre os anos de 2010 e 2021. É possível constatar um espraiamento do tecido urbano na
direção norte do município, principalmente nas áreas dos bairros Praia Âncora, Mar do Norte
e da Zona especial de negócios. Outro aspecto relevante é que grande parte do território
municipal é ocupada por pastagens e áreas campestres, caracterizando uma significativa
presença rural, especialmente nos distritos de Cantagalo e Rocha Leão. Em contraste, o
processo de urbanização concentrou- se de forma marcante ao longo da faixa litorânea.
Figura 3 – Mapa de uso e cobertura do solo do Município de Rio das Ostras/RJ
Fonte: IBGE (2023) e ESRI Light Gray Canvas (2023). Organizado pelos autores (2025).
Em resumo, a urbanização em Rio das Ostras pode ser verificada por três aspectos:
pelo crescimento populacional, que se fixou predominantemente na área litorânea do
município; pelo acelerado crescimento demográfico a partir dos anos 2000 com a instalação
da Petrobras no município vizinho de Macaé, que atraiu trabalhadores para Rio das Ostras; e a
partir da atividade do turismo, que na estação de verão, entre os meses de dezembro e março,
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quadruplica o número de pessoas na cidade, aliado à especulação imobiliária sobre esse setor
da economia municipal.
Nos últimos 20 anos, o município cresceu desordenadamente, influenciado por
diversos agentes sociais e econômicos. De um lado têm-se os bairros centrais, com uma
infraestrutura organizada no setor de serviços urbanos, do outro lado encontram-se os bairros
que crescem desenfreadamente em um processo desigual de acesso à estrutura urbana.
A discrepância entre os bairros centrais e periféricos pode acarretar desafios
substanciais, tais como a escassez de acesso a serviços essenciais, infraestrutura precária e
disparidades socioeconômicas. É imprescindível que as políticas públicas se empenhem em
atenuar tais disparidades e busquem fomentar um desenvolvimento mais equitativo e
sustentável em toda a área urbana.
O que revelam os indicadores oficiais do censo do IBGE de 2010
O Censo do ano de 2010 em Rio das Ostras, mostrou dados que nos ajudam a
compreender a desigualdade socioespacial no município. As informações usadas na pesquisa
foram direcionadas para os setores de infraestrutura e serviços urbanos, tais como, iluminação
pública, ruas não pavimentadas e rede de água encanada. Esses dados foram, entre os
encontrados, aqueles que melhor se relacionaram com os objetivos da pesquisa. Neste caso,
foram escolhidas as residências particulares permanentes, distribuídas em 221 áreas
censitárias. O IBGE não especifica o número de domicílios e pessoas em cada setor
censitário, mas o consenso é de que os bairros com maiores números demográficos tendem a
ter mais setores.
É crucial apontar que a metodologia utilizada para a criação de cada mapa pode variar.
Quando o IBGE (2010) disponibiliza os dados na unidade territorial geográfica dos setores,
esses dados (renda, educação, infraestrutura etc.) não são necessariamente representados de
modo uniforme. Cada mapa pode adotar uma abordagem distinta para a representação dos
dados, levando em conta critérios específicos de cada mapa e objetivos particulares de cada
análise.
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O percentual da rede de iluminação pública do município é ilustrado na Figura 4. A
taxa de cobertura da rede pública varia entre 90% e 97% nas localidades Centrais e Leste,
apresentando a maior cobertura. As áreas Sul e Norte do município (destacadas com um
círculo vermelho na figura) têm os menores índices, que variam entre 80% e 93%. As áreas
com menor percentual de iluminação sinalizam lugares que necessitam de mais atenção e
investimento.
Figura 4 – Mapa do índice da rede de iluminação pública em Rio das Ostras/RJ
Fonte: IBGE (2010). Organizado pelos autores (2025).
Por outro lado, áreas com alta percentagem de iluminação indicam lugares bem
servidos por esta infraestrutura de forma mais eficiente e abrangente. Nos bairros mais
carentes, a situação muitas vezes é oposta, com deficiências na infraestrutura de iluminação.
Essa assimetria na iluminação pública provoca restrição do acesso aos espaços
públicos durante a noite. A falta de iluminação adequada pode limitar as atividades
recreativas, culturais e de lazer realizadas após o anoitecer, o que reduz as oportunidades de
convívio social e de aproveitamento dos espaços urbanos por parte da população.
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A Figura 5 expõe os setores que não têm pavimentação nas ruas do município. Grande
parte dos bairros periféricos em Rio das Ostras não têm pavimentação, e isso sinaliza a
desigualdade de acesso à infraestrutura entre os bairros. Têm-se os setores com as cores mais
claras na legenda, com menor concentração de setores relatando a falta de pavimentação nas
zonas Central, Leste e Oeste (0 a 10, 10 a 42 e 42 a 90 setores). Diferente da realidade das
localidades ao Sul e Norte que apresenta de (90 a 152 e 153 a 221 setores) sem pavimentação
ou precários com falta de manutenção nas ruas (destacado com um círculo vermelho na
figura). Com isso, no interior destes bairros, 131 setores apresentaram pavimentação
ineficiente. Deve-se sublinhar que os bairros periféricos têm mais setores que os bairros
centrais, principalmente pelo número de domicílios e pessoas. Exemplo disso é o bairro Praia
Âncora, maior bairro do município e que tem múltiplos setores censitários em seu recorte
espacial municipal.
Figura 5 – Mapa dos setores que não existem pavimentação nas ruas em Rio das Ostras/RJ
Fonte: IBGE (2010). Organizado pelos autores (2025).
Por outro lado, em bairros mais carentes e periféricos, a pavimentação de ruas é
regularmente inexistente. As vias podem ser de terra batida, com buracos, lama em períodos
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chuvosos e falta de drenagem adequada. Isso não apenas dificulta a circulação de veículos e
pedestres, mas também aumenta os riscos de acidentes, danificações em veículos e problemas
de saúde relacionados à poeira e à lama. Esta situação é bem comum para quem mora no
maior bairro da cidade, Praia Âncora.
A discrepância na pavimentação de ruas entre bairros é uma realidade bem discutida
na seção seguinte deste artigo. Ao passo que em alguns bairros é possível encontrar ruas bem
pavimentadas, com asfalto de qualidade e boa infraestrutura viária, em outros, a situação é
bem diferente, com ruas esburacadas, sem calçamento adequado e com falta de manutenção.
Nos bairros mais privilegiados e de renda alta, é comum encontrar ruas pavimentadas com
asfalto de boa qualidade, bem-sinalizadas e com calçadas adequadas para pedestres, como é o
caso dos bairros Costazul e Jardim Mariléa. Essas áreas frequentemente recebem mais
investimentos em infraestrutura urbana por parte das autoridades municipais, além de contar
com ações de manutenção regulares.
A Figura 6 aponta a falta da rede de água encanada nos domicílios. Grande parte do
bairro Praia Âncora e das localidades ao Norte e Sul, apresentaram uma variação entre 100 a
140 e 140 a 221 de setores que relataram a ineficiência da rede de água encanada. Portanto,
121 setores tiveram domicílios nos bairros periféricos que relataram a falta de acesso à água
encanada ou, quando disponível, o abastecimento ocorre de forma irregular, com frequentes
interrupções (destacados com um círculo vermelho na figura).
Em contraste, os bairros Centrais e das áreas ao Leste, possuem uma infraestrutura de
abastecimento de água mais consolidada. Nessas áreas, apenas um número reduzido de
setores censitários entre 0 a 20 ou 20 a 60 setores relatou a ausência de rede de água encanada
nos domicílios, o que evidencia uma cobertura mais eficiente nesses locais.
Por outro lado, em bairros de baixa e média renda o acesso à água pode ser um desafio
diário. Muitas famílias nesses bairros dependem de fontes alternativas de água, como poços
artesianos, cisternas ou até mesmo água de chuva coletada de forma improvisada. Ademais, a
falta de infraestrutura de saneamento básico nessas áreas pode resultar em problemas por
contaminação e doenças transmitidas pela água. Para enfrentar essa problemática, é
fundamental que o governo municipal adote políticas públicas que promovam a equidade no
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acesso à água potável em todos os bairros da cidade. Isso inclui investimentos em
infraestrutura de abastecimento de água e saneamento básico em áreas carentes,
implementação de programas de conscientização sobre o uso responsável da água e promoção
da participação da comunidade na gestão e conservação dos recursos hídricos.
Figura 6 – Mapa dos setores sem rede de água encanada nos domicílios em Rio das Ostras/RJ
Fonte: IBGE (2010). Organizado pelos autores (2025).
Em linhas gerais, os dados do censo do IBGE (2010) apresentados acima, demonstram
um quadro de desigualdade socioespacial na cidade. De um lado, entre os bairros de maior
renda per capita, destacam-se as localidades de Costazul, Jardim Mariléa, Boca da Barra,
entre outros. Nessas localidades o acesso à água, pavimentação das ruas, limpeza urbana,
iluminação pública de qualidade, entre outros aspectos são garantidos pelo poder municipal.
Esta situação difere da realidade dos bairros periféricos das áreas Norte e Sul do município,
que cresceram de forma desordenada sem infraestrutura adequada para o bem-estar da
população.
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O que dizem os moradores: entrevistas, levantamentos de campo e análises quanto ao
acesso desigual à cidade.
A situação habitacional e de infraestrutura urbana reflete uma clara divisão
socioterritorial no município, marcada pela desigualdade. Como esboçado, os bairros
Costazul e Jardim Mariléa são onde residem as populações de renda mais elevada, enquanto
os bairros Cidade Praiana, Cidade Beira Mar e Praia Âncora concentram famílias de baixa
renda.
Segundo Corrêa (1989), a organização espacial e a produção do espaço urbano não são
aleatórias, posto que decorrem de ações dos agentes sociais que produzem e modelam o
espaço urbano. A população com menor poder econômico e político fica reprimida pela
atuação dos demais agentes e permanecem com a parcela do solo urbano que, além de ser
pouco valorizada, recebe poucos investimentos públicos. Côrrea salienta ainda que o agente
social Estado é o principal organizador da produção do espaço urbano, condicionando o uso
das terras públicas e serviços públicos essenciais para a população e empresas, tais como,
sistema viário, calçamento, rede de água, rede de esgoto, iluminação pública, parques, coleta
de lixo, entre outros serviços públicos.
A problemática deste trabalho decorre do fato de que os bairros com maior número de
domicílios têm uma estrutura de serviços públicos precários ou ausentes. Os moradores de
alguns bairros não têm rede de esgoto, iluminação pública eficiente, rede de água encanada,
manutenção de praças públicas, pavimentação nas ruas, estímulo para o comércio na
localidade, saneamento básico em alguns bairros, entre outras deficiências comuns para quem
vive nessas localidades. Uma realidade bem diferente de outros bairros melhor assistidos pelo
poder público. A consequência desta segregação imprime no espaço urbano uma desigualdade
socioespacial entre bairros vizinhos, separados muitas vezes por uma rua.
No entanto, é através da implementação de serviços públicos, como sistema viário,
calçamento, água, esgoto, iluminação, parques, coleta de lixo etc, interessantes tanto
às empresas como à população em geral, que atuação do Estado se faz de modo mais
corrente e esperado. A elaboração de leis e normas vinculadas ao uso do solo, entre
outras normas de zoneamento e o código de obras, constituem outro tributo do estado
do que se refere ao espaço urbano. E é decorrente de seu desempenho especialmente
desigual enquanto provedor de serviços públicos, especialmente aqueles que servem
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à população, que o Estado se torna o alvo de certas reivindicações de segmentos da
população urbana (Corrêa, 1989, p. 24-25).
O processo de urbanização em Rio das Ostras, como evidenciado, deu-se, em certa
medida, sobre algumas áreas desprovidas de serviços e infraestrutura, o que indica lacunas no
espaço urbano quanto às condições adequadas de habitação e moradia que acompanhassem o
crescimento demográfico em um curto período de tempo. Por condições adequadas de
habitação, entende-se moradia digna o mesmo que o Estatuto da Cidade, que estabelece
diretrizes para a política urbana (Lei Federal 10.257), ou seja, aquela área urbana que é
atendida por abastecimento de água, esgotamento sanitário, energia elétrica, iluminação
pública, coleta de lixo, vias pavimentadas, transporte coletivo de passageiros e equipamentos
urbanos, tais como, escolas, hospitais, áreas de lazer, praças públicas, entre outros serviços
urbanos essenciais para o bem-estar e qualidade de vida.
Parágrafo único. Para todos os efeitos, esta Lei, denominada Estatuto da Cidade,
estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da
propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos
cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.
Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das
funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes
gerais:
I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana,
à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos
serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;
[...] (Brasil, Lei Federal nº 10.257, 2001).
Essas características apontadas na Lei Federal são encontradas em diferentes bairros
do município de Rio das Ostras. De um lado o bairro Praia Âncora, que assume muitas
carências e onde grande parte do bairro foi ocupado de maneira irregular ao lado da restinga,
o que provoca vários problemas relacionados à enchente no período de chuva; do outro, o
bairro Costazul com grande vazio urbano, com forte especulação imobiliária por ser perto da
orla e com mais ampla infraestrutura.
Como forma de aproximação da realidade, demonstra-se, adiante, análises subsidiadas
por figuras a partir de 100 entrevistas com os moradores dos bairros periféricos Praia Âncora,
Cidade Praiana, Cidade Beira Mar e dos centrais Jardim Mariléa e Costazul. As entrevistas
oportunizam um contato direto com os residentes locais, o que permite explorar suas
percepções, opiniões e vivências. Assim, ao ouvir as vozes da comunidade, pôde-se obter uma
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compreensão contextualizada dos desafios enfrentados, das conquistas alcançadas e das
necessidades latentes.
As Figuras mostram os resultados da pesquisa com a população quanto à percepção da
qualidade de infraestrutura urbana de alguns dos bairros de Rio das Ostras. As categorias de
qualidade são divididas em “Excelente”, “Razoável” e “Ruim”. Cada bairro tem uma barra
colorida correspondente que indica o número de entrevistados que opinaram em categorias
específicas das perguntas.
Como indicado na Figura 7, os bairros centrais apresentam um maior número de
quatro ou mais salários-mínimos (R$ 1.302), enquanto, nos bairros periféricos, o quantitativo
de dois ou três salários-mínimos é mais comum, o que caracteriza uma classe social com
menor poder aquisitivo residente nestes bairros. No Costazul, nenhum entrevistado tinha
apenas um salário-mínimo na receita financeira. A renda é um tópico inevitavelmente
delicado nas entrevistas, seja no contexto de pesquisas acadêmicas ou questionários de
mercado. Ao abordar essa questão, é preciso estar cientes da sensibilidade que envolve a
discussão de aspectos financeiros pessoais. Este cuidado é fundamental para garantir a coleta
de dados precisos e a preservação da confiança e do conforto dos entrevistados. Portanto, a
renda é sempre uma informação delicada para o entrevistado, o que pode não revelar com
exatidão a realidade, sobretudo entre aqueles que têm maior renda.
Figura 7 – Renda mensal entre os entrevistados dos bairros de Rio das Ostras/RJ
Fonte: Trabalho de Campo (2023). Organizado pelos autores (2025).
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De acordo com a Figura 8, o bairro Praia Âncora, em particular, apresenta uma
situação preocupante, com uma das suas principais ruas (Bougainville) sem asfalto, sem rede
de esgoto, iluminação pública e ausência da rede de água encanada em grande parte do bairro,
apesar de ser o maior adensamento populacional do município. Os bairros Cidade Praiana e
Cidade Beira Mar também apresentam um número baixo de excelente e alto no quesito ruim e
razoável. Nos bairros Costazul e Jardim Mariléa, o número de excelentes foi baixo, o que
representa uma problemática na cidade como um todo, que tem uma malha urbana precária e
ineficiente em grande parte.
Áreas periféricas e bairros com infraestrutura precária frequentemente sofrem com
ruas sem pavimentação, iluminação inadequada e pouca ou nenhuma sinalização que dificulta
o trânsito de veículos e coloca em risco a segurança de pedestres, além de favorecer
alagamentos e acúmulo de lixo. Em períodos de chuvas intensas, a falta de drenagem eficiente
nessas áreas aumenta os riscos de enchentes, tornando as vias intransitáveis e afetando a
mobilidade dos moradores, que muitas vezes enfrentam desafios para chegar ao trabalho ou à
escola, o que é bem comum nos bairros periféricos. As Figuras 9, 10 e 11 ilustram
respectivamente a malha viária dos bairros Praia Âncora, Cidade Praiana e Costazul,
evidenciando as disparidades nos padrões de urbanização.
Figura 8 – Avaliação entre os entrevistados sobre a qualidade das ruas e avenidas em seu
bairro em Rio das Ostras/RJ
Fonte: Organizado pelos autores (2025).
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Figura 9 – Rua dos Bouganvilles, bairro Praia Âncora, Rio das Ostras/RJ
Fonte: Trabalho de Campo, 16 jun. 2023.
Figura 10 – Rua Vitória no bairro Cidade Praiana, Rio das Ostras/RJ
Fonte: Trabalho de Campo, 10 set. 2023.
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Figura 11 – Av. Gov. Roberto Silveira, bairro Costazul, Rio das Ostras/RJ
Fonte: Disponível em: https://earth.google.com/web/. Acesso em: 13 jun. 2024.
Pode-se observar, nas anteriormente destacadas, as estruturas e as paisagens dos
bairros. Os periféricos com estruturas e padrões arquitetônicos mais tradicionais, simples, ruas
sem asfaltamento, sem rede de drenagem e as casas de tijolo exposto e sem apartamentos ou
regimes condominiais regulamentados nos bairros, diferentemente do bairro Costazul, onde a
paisagem demonstra residências de médio e alto padrão, com estrutura urbana consolidada.
Segundo a Figura 12, Costazul e Jardim Mariléa têm avaliações semelhantes a respeito
da coleta de lixo e limpeza urbana, com a maioria considerando o serviço razoável. No Praia
Âncora, a maioria avaliou como ruim. Cidade Praiana tem uma distribuição mais equilibrada
entre razoável e ruim, enquanto em Cidade Beira Mar a maioria também considera o serviço
ruim. Nos bairros periféricos é bem comum o acúmulo de lixo nas praças, falta de
manutenção nos canais e valas, entre outros aspectos típicos da falta de limpeza urbana.
A limpeza urbana nos bairros desempenha um papel fundamental na promoção da
saúde pública, no bem-estar dos moradores e na preservação do meio ambiente. Manter as
ruas, praças e outros espaços públicos limpos vai além da estética, contribui para garantir um
ambiente saudável, seguro e sustentável para todos os seus habitantes. É um esforço conjunto
que envolve tanto o poder público quanto a comunidade, e que traz benefícios diretos para a
qualidade de vida e o desenvolvimento das áreas urbanas. Promover e manter a limpeza
urbana deve ser uma prioridade contínua.
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Figura 12 – Avaliação dos entrevistados sobre o serviço de coleta de lixo e limpeza
urbana no seu bairro em Rio das Ostras/RJ
Fonte: Organizado pelos autores (2025).
Conforme a Figura 13, a maioria dos entrevistados nos bairros periféricos respondeu
que as praças são péssimas e razoáveis, e nenhum entrevistado classificou as praças como
excelentes. Por exemplo, a principal praça do bairro Praia Âncora (Figura 14) está há anos
sem manutenção e sem nenhum brinquedo funcionando. Em contrapartida, nos bairros
centrais, o nível de excelente e razoável é maior do que o de péssimo. Por exemplo, a
principal praça do Costazul (Figura 15) é melhor estruturada e tem equipamentos urbanos de
qualidade. A diferença de estruturas, formas e funções entre os dois bairros representa a
desigualdade de acesso aos equipamentos urbanos de qualidade e na própria gestão do espaço
urbano pela prefeitura.
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Figura 13 – Grau de satisfação dos entrevistados sobre as praças públicas do seu
bairro em Rio das Ostras/RJ
Fonte: Organizado pelos autores (2025).
Figura 14 – Praça pública do bairro Praia Âncora, Rio das Ostras/RJ
Fonte: Trabalho de Campo, 16 jun. 2023. Organizado pelos autores.
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Figura 15 – Praça pública no bairro Costazul, Rio das Ostras/RJ
Fonte: Disponível em: https://www.turismo.rj.gov.br/cidades/rio-das-ostras/. Acesso em: 20 jan. 2024.
Como mostra a Figura 16, a maioria dos moradores dos bairros afastados do centro do
município responderam que a rede de esgoto e o fornecimento da rede de água encanada é
ruim. Em Praia Âncora e Cidade Beira Mar, a rede de esgoto e água encanada ligadas às
residências é inexistente em parte desses bairros, com dejeto sendo despejado nos canais
fluviais das localidades. Nos bairros centrais, como Costazul, nenhum entrevistado respondeu
que a rede de esgoto e a rede de água é ruim, variando entre excelente e razoável. Porém,
tanto o bairro Costazul quanto o Jardim Mariléa têm praticamente todas as residências
interligadas à rede de esgoto e à rede de abastecimento de água.
Nos bairros periféricos a situação é grave, com parte dele não tendo água encanada;
quando têm, o serviço é insuficiente e precário, com falta de água durante diversos dias no
ano. Muitos moradores dependem de caminhões-pipa para abastecer suas casas. Essa falta de
infraestrutura contribui para um ciclo de vulnerabilidade, pois a falta de acesso regular à água
impacta a saúde pública, dificultando a manutenção da higiene e aumentando a incidência de
doenças. Acrescenta-se que os custos com alternativas como caminhões-pipa são elevados,
pesando no orçamento das famílias de baixa renda, que já enfrentam dificuldades financeiras.
Esse cenário ressalta a urgência de políticas públicas que priorizem o saneamento e a
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AO CITAR ESTE TRABALHO, UTILIZAR A SEGUINTE REFERÊNCIA:
CARLOS, Thalles Martins Soares; GOMES, Marcos Antônio Silvestre. Desigualdades socioespaciais e contradições na produção do espaço
urbano de Rio das Ostras/RJ. Ensaios de Geografia. Niterói, vol. 12, nº 25, e122525, 2025.
Submissão em: 11/05/2025. Aceito em: 10/08/2025.
ISSN: 2316-8544
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distribuição equitativa de recursos básicos, garantindo que todos tenham acesso a um serviço
de qualidade.
Figura 16 - Avaliação dos entrevistados sobre o saneamento básico no seu bairro em Rio
das Ostras/RJ
Fonte: Organizado pelos autores (2025).
Em síntese, com as análises expostas, ficou claro que as condições entre bairros de
periferia e áreas de alto padrão apresenta contrastes significativos, que influenciam nas
condições em que cada indivíduo se apropria da cidade. Nos bairros de periferia, muitas vezes
caracterizados por uma infraestrutura urbana precária, a qualidade de vida pode ser desafiada
por questões como a falta de saneamento básico, ruas não pavimentadas e acesso limitado a
serviços essenciais. Já em áreas de alto padrão, a qualidade de vida é frequentemente
associada a uma infraestrutura mais ampla e de melhor qualidade. Ruas asfaltadas, áreas
verdes bem cuidadas, sistemas de saneamento eficientes e segurança pública mais efetiva são
características comuns. As residências, muitas vezes, são maiores e equipadas com
tecnologias modernas.
Considerações Finais
Diante da análise apresentada neste artigo, verificou-se que a desigualdade
socioespacial se manifesta de diferentes formas no espaço urbano. Desde sua emancipação
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CARLOS, Thalles Martins Soares; GOMES, Marcos Antônio Silvestre. Desigualdades socioespaciais e contradições na produção do espaço
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político-administrativa em 1992, Rio das Ostras vem passando por um processo de
crescimento demográfico, influenciado significativamente por setores do turismo e da
indústria do petróleo na configuração do seu espaço urbano. Este crescimento acelerado
resultou em uma expansão desigual, onde bairros das camadas sociais de alta renda recebem
uma infraestrutura de qualidade e serviços públicos eficientes, enquanto bairros das camadas
sociais de baixa renda enfrentam deficiências significativas nesses mesmos aspectos.
Apesar do crescimento populacional, o município apresenta recursos, em especial dos
royalties do petróleo da Bacia de Campos e das atividades da economia turística. No entanto,
observa-se na paisagem da maioria dos bairros da pesquisa a falta de gestão do espaço. Por
exemplo, existem localidades sem acesso a água encanada em uma cidade de fartos recursos
financeiros. Isso difere dos bairros ocupados pelas camadas de maior renda, como os bairros
Costazul e Jardim Mariléa, onde a gestão e a infraestrutura são bem diferentes daqueles
encontrados nos bairros periféricos.
A desigualdade socioespacial se reflete nessas diferenças de acesso e no processo
seletivo de lugares que receberão os recursos da prefeitura para os serviços básicos. No bairro
Praia Âncora, por exemplo, não existe uma praça pública bem conservada para o lazer, sendo
evidente na paisagem do bairro a falta de limpeza pública, entre outros aspectos já debatidos e
constantemente cobrados pelos moradores do bairro em relação à gestão do local.
As contradições e desigualdades entre as áreas centrais e bairros das camadas ricas em
relação às periferias pobres são nítidas. Os investimentos e obras, assim como a manutenção,
evidenciam a diferenciação espacial que ocorre na produção do espaço urbano. Um dos
problemas da gestão urbana, que deveria ser para resolver essas desigualdades e promover um
zoneamento urbano coerente com a formação socioespacial de cada realidade, é que muitas
vezes foge dessa realidade.
Em resumo, a análise do trabalho indica contradições entre centro e periferia, áreas
com justaposição de carências, com a falta de pavimentação das ruas, rede de esgoto, água
encanada nas casas, acesso a aparelhos culturais e de lazer e a precarização dos serviços
públicos nos bairros periféricos e de maior concentração populacional, principalmente nos
bairros Praia Âncora, Cidade Beira Mar e Cidade Praiana, entre outros problemas comuns
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para os citadinos. Em contraste, os bairros centrais, tais como, Costazul e Jardim Mariléa
demonstram uma reprodução das formas e conteúdos capitalistas próprios das camadas de alta
renda e serviços especializados, sobretudo, voltados ao turismo, centralização da
infraestrutura e investimentos públicos, o que aprofunda as desigualdades no tecido urbano de
Rio das Ostras.
Assim, nota-se que a classe trabalhadora, por insuficiência salarial e por conta das
condições de produção e reprodução de moradia e da sociedade, habita em condições
precárias e desiguais que se diversificam em casas insalubres, ocupações irregulares e de
edifícios abandonados, mas também em favelas, loteamentos populares, concentrados na
periferia geográfica do município, em que o adensamento populacional é agravado pelo fato
de se residir em bairros distantes dos centros de serviços, das ofertas de postos de trabalho,
entre outros problemas. Esta é, grosso modo, a realidade de muitas famílias residentes dos
bairros periféricos do município de Rio das Ostras.
Referências
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diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília,
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