CACOS DE DEUS, CACOS DE CASA E CACOS DE RECUSA

Shards of god, shards of house, and shards of refusal
Fragmentos de dios, fragmentos de casa y fragmentos de rechazo

Resumo Este relato acadêmico reflete as noções de metabolismo, coreografia e epidemia (seja a de HIV, nos anos 1980, ou de Covid, nos anos 2020) sobre o trabalho videográfico Einstein Remix, de Diambe da Silva, criado a partir do poema homônimo de Ricardo Aleixo, que é sua matéria prima. Desdobramentos sobre o pensamento implicado da filosofia Ubuntu e o conceito de coreopolítica de André Lepecki decorrem deste trabalho, que acaba por criar outros poemas pela prática do erro.
Palavras-chave metabolismo; coro; coreografia; Ricardo Aleixo; escultura

Abstract This academic report reflects the notions of metabolism, choreography and epidemic (whether HIV in the 1980s or Covid in the 2020s) on the videographic work Einstein Remix, by Diambe da Silva, created from the poem of the same name by Ricardo Aleixo, which is its raw material. Unfoldings on the implicit thought of the Ubuntu philosophy and André Lepecki's concept of choreopolitics follow from this work, which ends up creating other poems through the practice of error.
Keywords metabolism; chorus; choreography; Ricardo Aleixo; sculpture

Este documento é distribuído nos termos da licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial 4.0 Internacional (CC-BY-NC)

© 2022 Diambe da Silva

* Para Alessandra Vanucci.
Diambe da Silva (1993, RJ) é artista visual e tem um corpo de trabalho marcado pelo uso de matérias vivas, sendo recorrente o recurso de tecidos, raízes alimentares amefricanas, gravuras e coreografias que relacionam arquiteturas com movimentos espontâneos em elaborações plurais. Sua poética resulta em estruturas móveis, esculturas vivas, desenhos de fogo, mantos e outras variantes. E-mail: euvc989@gmail.com. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-5697-2878

Diambe da Silva *
(Artista independente, Brasil)

Resumen Este informe académico reflexiona sobre las nociones de metabolismo, coreografía y epidemia (ya sea el VIH, en los años 80, o el Covid, en los años 2020) en la obra videográfica Einstein Remix, de Diambe da Silva, creada a partir del poema homónimo de Ricardo Aleixo, que es su materia prima. De este trabajo surgen desdoblamientos sobre el pensamiento implícito de la filosofía Ubuntu y el concepto de coreopolítica de André Lepecki, que acaba creando otros poemas a través de la práctica del error.
Palabras clave metabolismo; coro; coreografia; Ricardo Aleixo; escultura

Buscando definir o que é a vida no texto “O que restará da biologia do século XX?” (1997), Manfred Eigen afirma, ainda em 1993, derivando dos estudos genéticos que conhecemos da epidemia de Aids no seu ponto ápice: a vida é um conjunto de condutas análogas a um programa genético. Situações vitais são complexos que envolvem processos celulares, tecnologia genética, capacidades heterogêneas, materiais contidos e continentes para genomas. Fundamentalmente a vida se dá em sistemas encapsulados; e o que determina a diferença entre o que vive e o que não vive são três fatores: a vida seria fundamentalmente autorreplicante, mutante e metabólica. Segundo o autor, essas três características diferenciam seres vivos de seres não-vivos, critério orgânico que faz, por exemplo, vírus serem em si diferentes de bactérias. Essa diferença está baseada no movimento autônomo de um corpo para viver, lidar com instabilidades e criar desvios por meio de informações que são carregadas, processadas e buscando se manter viva, automultiplicando. Se, dentro de um sistema orgânico, um mutante melhor adaptado é encontrado, criando variações, a distribuição anterior se torna errante e instável. Metabolismo é lidar com a instabilidade, no sistema complexo de processamento de variações que existe em organismos vivos. A criação de informação no mundo vivo nos ajuda a entender a pergunta que Eigen atualiza sobre o que é vida? A vida é, de algum jeito, autorreferente e inerentemente organizada. Eu não sou bióloga, nem ocidental, mas não desconsidero que essa reflexão me ajudou a entender o panorama do que estamos vivendo hoje.

Essa definição de vida, uma vida que carrega códigos, sequências de símbolos e que é essencialmente criadora de teorias dinâmicas que por si criam nexos e fenótipos, parece hoje ser interessante para pensar arte em meio a uma pandemia da CoViD-19. É cedo para traçar paralelos entre essa epidemia e aquela, do HIV, que se manifestam em formas extremamente diferentes de contágio e letalidade, assim como em seus indicadores etários, de sexo/gênero e nos seus efeitos corpóreos. Pode-se dizer que, entre os anos de 1982 e 1996, a AIDS, ocasionada pelo vírus do HIV, foi uma doença quase 100% letal, porque afetava diretamente o sistema imunológico, criando uma deficiência. Nisso, difere do vírus Sars, que ocasiona a CoViD, uma crise respiratória em incidência menor do risco letal. A quantidade de óbitos em função do número de contágios é o que determina a letalidade de uma infecção. Desse jeito, embora o HIV tenha sido mais letal, o Sars tem sido mais mortal no Brasil do que o HIV1 foi no auge do seu contágio. As duas epidemias criam alterações até então inesperadas na atitude das pessoas e no hábito de se movimentarem e de interagirem. Em nível erótico ou ambiental, são caminhos que abruptamente geram diferenças a longo prazo. O entendimento da vida enquanto um código é também conhecimento pertinente para pensar a vida e a arte enquanto programa e enquanto movimento.

Einstein Remix é um trabalho que fiz sobre variações do poema de mesmo nome do escritor Ricardo Aleixo. Esse poema, que é todo escrito de maneira visual, foi enviado a diversas de minhas amigas e parceiras durante a pandemia e pedi a elas que me lessem, pela primeira vez, em uma videochamada que estava sendo gravada, intimamente, com cada uma delas. Todas elas leram de jeitos diferentes umas das outras.

A leitura de Walter Benjamin (1993), sobre a breve história da fotografia, me fez pensar sobre o valor da imagem fotográfica no seu estatuto de não-arte. Aquilo que Benjamin valora na fotografia é seu caráter de experimentação, ou seja, naquilo que nela dificilmente seria comercializável, até o momento em que o autor escrevia. A fotografia fazia parte de um mundo fabricado, era uma morte com a gestualidade da pintura, por exemplo. Ao fim do seu ensaio, o autor alemão também assemelha a fotografia à evidência de um crime, no que se pergunta “Mas existe em nossas cidades um só recanto que não seja o local de um crime?” A mim vale a pergunta porque considero que a arte, como um todo, é testemunha de crimes e expropriações, exclusividades, exclusões. A experimentação com Einstein Remix dentro da minha experiência busca alargar a noção corrente de coreografia como lugar exclusivo do palco. A dança pode ir para um sentido mais amplo. Proponho criar uma orquestra, que surge em homenagem a Ricardo Aleixo, aqui assume o lugar de um coro, movendo essas noções para além do espaço de confinamento, seja do teatro, seja de nossas casas: vale aqui como movimento, escultórico, íntimo. Também me valho da definição de aura, que segundo Benjamin é aquilo que ronda “uma figura singular, composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante por mais próxima que ela esteja”, porque esses encontros foram sempre únicos. Desse jeito, a coisa única e distante me foi útil enquanto situação.

É necessário afirmar que o poema visual de Ricardo Aleixo é o ponto de partida desse trabalho. Se Benjamin afirma que a fotografia é destruidora do academicismo da pintura, o poema de Ricardo se usa da figura de Deus para aludir a uma escrita que a princípio rompe e também compactua os princípios físicos de Einstein, inventor da teoria da relatividade, teoria em que os campos de energia cinética se interrelacionam mutuamente, criando interdependências e variações.

Ricardo Aleixo lembra em entrevista de 2002 ao programa de televisão Veredas Literárias que a fortuna crítica se avoluma sobre seu trabalho à medida que seu projeto literário se tornava mais nítido: misturar a experimentalidade entre poema e imagem com as mitopoéticas afrodiaspóricas2, espaços e tempos diferentes. Einstein Remix tem, nitidamente, relação com a herança da poesia concreta, que é uma das bases da formação poética/cultural/ética do autor, que vê nesse movimento a “defesa radical da invenção em um país que aposta no atraso”. Ricardo afirma que escolhe para si, com liberdade, essa influência, o que quer dizer que permite ser influenciado por ela e influir sobre ela. Influir sobre algo é sempre uma inserção no campo, é “se misturar com o sujo da vida”, diz Aleixo. No poema Einstein Remix são misturados espaços preenchidos por fragmentos de palavras e outros que são ocupados por lacunas. Nele, mesclam-se formas quadradas, semelhante a um jogo xadrez, que alude ao espaço racional, ordenado, dicotômico e maniqueísta, entre preto e branco, mas cujo conteúdo em si não é nem ordenado, nem dicotômico nem maniqueísta.

A relação de influência que guarda com a herança da poesia concreta é evidente: é um trabalho que ganha força em um campo verbivocovisual, ou seja, alude a palavra, voz e imagem de uma só vez. A influência do poema concreto canônico, como aqueles dos irmãos Campos, nesse poema e em outros trabalhos contemporâneos de Ricardo não encerra a expressão do artista mineiro a esse movimento. No campo da imagem, especificamente este poema é composto como uma trama de núcleos que se relacionam mutuamente e que, por fim, ganham significado mais nítido quando lidos à moda ocidental: da esquerda para direita, de baixo para cima e assim sucessivamente, seguindo cada um dos quadrados preenchidos por fragmentos de palavras. Ainda assim, a poesia de Ricardo Aleixo muito se guia pela mitopoética afrobrasileira e pode ser entendida enquanto encruzilhada: território próprio do encontro entre ruas diferentes, lugar de Exu, um criador de pegadinhas, abridor das portas do tempo espiralado, o primeiro a quem se bate cabeça nas religiões brasileiras de matriz africana. Em Einstein Remix, a disposição gráfica do poema é totalmente determinante de seu conteúdo, no que a pesquisadora Thelma Scherer (2015) em seu doutorado tece comentário pertinente sobre a forma-poema, que, segundo ela, ressalta a distinção de lugares delimitados para os lugares brancos e os negros, afirma que o maniqueísmo faz parte dessa forma que, segundo ela, permite às palavras dançarem em face da distinção absoluta. O espaço maniqueísta também se dá em referência a um deus que está em jogo e, sobre a diagramação, ela afirma:

Sabemos que uma qualquer outra disposição visual do poema faria com que a leitura fosse completamente diferente. Ele não pode ser apresentado em outro formato, a não ser que seja traduzido. [...] O que não impede que o próprio poeta ou pessoa alheia o traduza para canção, vídeo, gif etc., e até mesmo para outra disposição gráfica – que incorreria em outro poema (SCHERER, 2015, p. 106).

Para mim, a relação intuitiva com o trabalho veio antes de qualquer pesquisa. Meu interesse nasceu em meio à pandemia de CoViD, quando eu andava lendo esse poema do Ricardo Aleixo para algumas pessoas minhas parceiras, até que um dia em vez de ler eu apenas mostrei a uma pessoa e pedi para uma pessoa ler para mim. Ela ficou um tempo juntando os pedaços, dada a organização complexa das palavras. Eu reconhecia nitidamente Ricardo Aleixo como um dançante da poesia, mas ali testemunhei a dança com o corpo de quem lê. Até minha comparsa conhecer o código de juntar os espaços, eu fiquei ouvindo curiosa um monte de cacos de som sendo juntados. Eu, que já conhecia o código e lia de jeito estável, ainda achava que o poema era aquilo que eu lia, mas então eu entendi que era também a parte em que eu ainda não entendia. Ficou, mais do que nunca, evidente que Aleixo é um artista incrível, e que os espaços vazados são determinantes para a leitura, além da própria forma do poema, tal e qual em uma gestalt ou em outros esquemas que racionalizam e relacionam a palavra com a imagem. No limite do erro de leitura, a relação entre figura e fundo acabou se mostrando coreográfica, porque ainda mais importante são os espaços vazados: era ali onde as minhas interlocutoras expressavam seu não-entendimento da forma, o grunhido e sua grande força de criar recombinações.

Vale ressaltar que a partir daqui, estou sempre me relacionando com o poema enquanto forma compartilhada, transmitida, entre coreografia e escultura de nossas intimidades, tangenciando a forma de poema na direção do conhecimento do corpo. O que passou a influenciar minha relação com ele não foi senão a afetividade, as vozes, os tempos vazios, os preenchimentos intencionados e os jeitos de lidar com os vazios da pista de dança, cada uma de nós na arquitetura de casa. A gente sabe que epidemias podem durar décadas e mexem com os nossos esquemas de sentimento, desejos de cura, possibilidades físicas, mentais, corpóreas. Nós como mundo já vivemos outras infecções e na atual epidemia nos é pedido que fiquemos distanciadas, mas certamente vamos sair desse tempo diferentes do jeito que entramos. Cabe a nós esperar para viver, espera que é, também, ação. Então eu fazia a proposta a pessoas que eu conheço “você lê um poema para mim?”, era sempre o mesmo poema, ligávamos o vídeo e batíamos papo e então eu escutava. Precisava ser a primeira vez que a pessoa encontrava esse poema e, sendo os encontros sempre únicos, eram também sempre diferentes, e eu escutando um poema todo novo. Então E. R. veio desse gesto cotidiano, mas no vídeo só entra o poema, coro, dança sentada. Eu pensava em fazer no espaço físico. Também poderia ter ficado pedindo autorização de um espaço ou recursos para montá-la em muitas telas, mas o que acabei fazendo foi desdobrar em um espaço virtual do jeito como se mostrou possível e acessível, em um primeiro momento, na plataforma digital do Pivô Satélite. Ali, essas vozes e corpos foram diagramadas em concomitância, organizando uma coreografia cacofônica.

O coro aqui acaba processando uma informação seguindo seus próprios jeitos muito diferentes para vocalizar, entender ou mesmo de silenciar. Vernant e Naquet (2014) desdobram o sentido de coro na tragédia grega , um gênero cênico, delimitado no tempo e no espaço, que tem como tema o pensamento social em conflito com as escolhas de um herói que busca fugir ao desígnio dos deuses e acaba revelando o verdadeiro sentido desses mesmos desígnios míticos. Se o herói é personagem individual que se opõe e ao mesmo tempo é inseparável do mito que lhe é designado, o coro é, nesse gênero, um personagem coletivo. Ele exprime temores, esperanças, julgamentos e sentimentos do público, sendo ao mesmo tempo coletivo e anônimo e propriamente lírico: trazem incertezas, flutuações, mudanças de sentido e revelam discordâncias em relação ao herói. Esse sentido de coro, que negocia um significado heroico ou divino, parece ser próximo do que foi experimentado como leitura coletiva de Einstein Remix, o coro enquanto forma mitopoética de lidar com um “deus que não joga xadrez” e que, na atualidade das nossas conversas, nos colocava em situação de confinamento, além de todos os outros posicionamentos que fazem os nossos corpos dissidentes serem em si pluriversais.

Existe uma palavra de origem grega, que é a “pantarreia”, palavra à qual o filósofo sul-africano Mogobe Ramose (1999) usa para referir a um pensamento que não seja fixado. Segundo ele, a linguagem pantarreica é uma linguagem em fluxo, que não seja totalmente racional nem totalmente emocional: ela é única, “baseada e basicamente holonística” (p. 8), ou seja, mutuamente racional e emocional. Ele se refere à ideia de pantarreia para se referir ao pensamento ubuntu, que prevê uma forma de linguagem não fragmentada3, em uma visão do verbo e da palavra que seja também a materialização e personificação do agente, uma língua que segundo o autor é ao mesmo tempo gerúndia e gerundiva.

Dentro do pensamento ubuntu, uma filosofia dos povos Zulu, Suati, Dedele e Ossa, da região sul do continente africano, existe uma implicação total entre perceber e agir. Agir é estar percebendo e isso faz sentido a todas pessoas que praticam a língua bantu, agindo de modo ubuntu4 e eu uso dessa filosofia para aludir, segundo um viés não-ocidental de pensamento, o reentendimento da língua colonial e ocidental que estou usando aqui, enquanto uma forma de movimento e ação. Tomando como exemplo o provérbio Kosa ga e theeletswe e duletse (em português, “sentada você não pode ouvir a música”), a percepção da música, na língua bantu e no pensamento ubuntu, prevê e significa agir junto com ela, dançando. A partir dessa ideia, podemos reconhecer outramente o hábito ocidental de espectação, muito caro ao teatro, ao cinema, música, literatura (você provavelmente está sentada agora) e às artes da cena em geral, que entendemos como permanecer imóvel em frente ao trabalho de arte, em estado de contemplação. Dentro desse pensamento, separar a emoção contemplativa da ação de estar imóvel diz respeito a um estado de fragmentação do ser, o que não deixa de ser, também, um corpo implicado em todo esforço na sua fragmentação sensível. Nesse sentido, posso influir sobre o ditado de que estar espectando, esperando, é também estar agindo. Com isso, concluo: a partir dessa filosofia de total implicação, mesmo a postura de espectadora não é uma postura anulada, mas uma postura ativa, que diz respeito a uma coreografia dos corpos. Ou seja, estar imóvel é também estar dançando.

Se corriqueiramente, nós, ocidentalizadas, aceitamos a espectação como postura de anulação, é porque age de jeito eficaz um enunciado poderoso e legitimado em diversas instâncias: nós caímos no consenso que enquanto espectadoras nosso corpo está separado de outros estados, impossibilitado de ser, também, ao mesmo tempo atrizes, ou agentes. Uma filosofia de implicações, em vez do pensamento fragmentado, nos coloca em um lugar mais ativo mesmo quando estamos sentadas, esperando. Desse jeito, considero que Einstein Remix segue uma partitura de movimento, entre preto e branco, vazio e cheio, móvel e imóvel, e extrapola esses maniqueísmos que só podem ser analisados do ponto de vista de quem pensa se são felizes, ou infelizes ao se cumprirem, se agem intencionalmente de boa ou de má-fé, mais do que sejam “verdadeiros” ou “falsos” (TAYLOR, 2020, p. 49).

Ainda sobre pôr em cena Einstein Remix, dessa vez como coreografia e também como recusa a um enunciado único que pudesse estar expresso naqueles versos, e mais ainda sobre o processo de incorporação dos enunciados, André Lepecki, no seu texto Or, the task of the dancer (2013), comenta a noção de política em Hannah Arendt, deplorada no seu texto A condição humana, em que se refere ao “movimento político” (p. 13) como algo que pelo menos até agora ainda não sabemos fazer. O “at least not yet” é o ponto de partida do texto de Lepecki, que se dedica principalmente a entender o que seria a ideia de movimento político, fazendo nessa ideia de movimento convergirem as práticas de mobilidade em performance e as mobilizações políticas em cenários urbanos. O autor faz também convergir na ideia de política, a noção arendtiana do que seria um exercício experimental de liberdade5, com a noção de Jacques Rancière, para quem o regime estético é um regime político, capaz de partilhar sensibilidades e criar dissensos. O lugar de onde Lepecki parte, nesse texto, é a conjunção entre “política” e “liberdade”, no que podemos o mote “não aprendemos a nos mover politicamente, pelo menos não ainda”, e a partir daí entender “não aprendemos a nos mover com liberdade, pelo menos não ainda”. Se a coreografia é em si um sistema de obediência, o que podemos inferir das coreografias do teatro, das coreografias de escola de samba e também das coreografias militares, assim como todas as artes de espectação o são, porque esperam que você obedeça, o autor se apropria do ponto de vista de Arendt para afirmar que a coreografia, a dança, o movimento, apesar de estar sempre relacionada a um enunciado imperativo, é também empobrecida quando se resume à relação imediata entre falar e obedecer. Essa relação de transmissão do movimento seria em si menos política. O exercício da liberdade se expressaria no posicionamento dos corpos uns em relação aos outros, como a partir de algo sempre provisório e incompleto, mesmo que relacionado a um rigor imperativo, no caminho de ser reiniciado, porque ainda inconformado. multitude e divergência.

Para mim é difícil aludir no meu trabalho à coreografia enquanto um campo consolidado, mesmo no ponto de vista de Lepecki. Na verdade, o que intenciono é alargar à noção de coreografia, assim como alargar a minha prática escultórica junto a essa noção. Quando entendi que este seria um codinome provisório para alguns de meus conjuntos de trabalho foi, contraditoriamente, porque eu necessitava aludir a um campo consolidado como álibi, para poder agir em situações que demandam poder porque exigiriam de mim o uso da liberdade. Essas situações acabam sendo felizes enquanto coreografias, embora eu pudesse ter usado outros termos, como performance (mas eu não acho que seja o caso), motim (palavra imediatamente relacionada à política, que agiria contra mim) ou escultura social (termo que não teria jurisprudência para falar com a polícia). A percepção dessa face como coreografia, que se deu a partir da situação Devolta, na praça Tiradentes em vinte dois de janeiro de dois mil e vinte foi tranquila e conversada junto de minhas cúmplices, envolvia, assim como se deu, uma estratégia para escapar do enquadramento de policiais, monarquistas e de críticos de arte. Os policiais, principalmente, eu mapeei semanas antes, em termos de ritmo, tempos, posições na praça e rondas. A partir desse momento, a leitura de André Lepecki, o pensamento ubuntu e a noção de criminalidade me foram pertinentes.

Vejo portanto uma relação de cumplicidade junto às pessoas que trabalham comigo nos trabalhos que chamo de coreográficos, que são, por fim, trabalhos de fuga, numa forma de colaboração que escapa ao dinheiro, à tecnologia e a outros bens que seriam finitos, ou, como diz Jota Mombaça “SOMOS SIMULTANEAMENTE TORNADAS INCÓGNITAS E LEVADAS A LUTAR PELA LINGUAGEM” (MOMBAÇA, 2017, p. 25): a cumplicidade, numa luta sempre derrotada, quanto mais se usa, mais se tem, ao contrário dos recursos do dinheiro e outros materiais ou tecnologias, que acabam à medida que são usados. Nesse sentido, as coreografias que tenho usado são anti-coreografias: elas esperam a ação inesperada, elas são agidas por anti-corpos, que somos nós enquanto dissidências, e são coreografadas apenas o necessário para agir uma situação que torne segura a nossa exceção. Não há coreografia, mas, ao mesmo tempo, vem havendo coreografia no que faço. Desse modo, o processo que me relaciona com o poema Einstein Remix, de Ricardo Aleixo, se torna também uma coreografia como venho trabalhando essa prática: maneira incorporada e não ensaiada de criar desvios dos enunciados já esculpidos, escultura de novos enunciados. Talvez eu devesse usar outra palavra que não essa, mas acredito que usando essa palavra eu torno o campo mais largo e possível para corpos como o meu, que fogem à regra e buscam jeitos estéticos de expressar suas recusas.

Einstein Remix, de Ricardo Aleixo in Pesado demais para poesia.

3x Einstein Remix, de Diambe

Agrade Camiz

Deus não joga dados

Blefe

Arde

Porque arde

Joga porque sabe jogar

mãos

Abed

Joga

Por que?

Porque mal sabe

É

Estar

Estar deus

não joga

Porque não sabem

Atar

Deus não joga

Amaré

Deus não joga amarelinha porque não sabe (risos)

Gente?

Deus não joga batalha naval

porque não sabe a

fundar

Porque não sabe afundar

Deus não joga memória

Porque não sabe blefar

Oxe

Dificil isso aqui de encontrar?

Oje Onjo, por que rebater

Deus não joga paciência porque não sabe esperar

Eu todinha!

Deus não joga xadrez

Vou voltar

Deus não joga dados, porque não sabe somar

Deus não joga cartas, porque não sabe blefar

Deus não joga vôlei, porque não sabe sacar

Deus não joga futebol, porque não sabe chutar

Deus não joga basquete, porque não sabe encestar

Deus não joga par ou impar, porque não sabe perder

Deus não joga sinuca, porque não sabe matar

Deus não joga amarelinha, porque não sabe saltar

Deus não joga batalha naval, porque não sabe afundar

Deus não joga memória, porque não sabe...

Acabei de ler esse e esqueci

Por que não sabe? Escolher!

Deus não joga porque.. pôquer, porque não sabe arriscar

Deus não joga pingue pongue, porque não sabe rebater

Deus não joga paciência porque não sabe esperar

Deus não joga xadrez

Millena Lizia

Deus não joga dados

Porque não sabe, soma

volêi

Porque nãos

Porque não sabe

Enc

não joga sino campo

Abes car deus não esta

Deus não joga porque não sabe atar

Escolher de

usna

Ong porque não sabe

Deus não joga xadrez

não sabe esperar

Paciencia

Arc

deus não joga,

pinga

Dar, deus,

Não, jogabe

Besaltar,

deus não,

ota

nãos, atebe erde deu

linha porque não sá

dar, deus não joga game

arque não sabe afun

e não sabe arrsicar,

rebater

deus não jô

joga porque arque,

deus não joga amaré

linha porque não sá dar,

deus não joga-me

Mori, a por quem

A osa, ong porque não sabe esta ardeu

Não joga quem não sabe atar

Fago? Utebe u por quê?

Taspe, or que não sabe

Abescar, deus não jota por que não sabe em que

Não sabe, perdeu

Bessá, altar deus não jota

Arde

Deus não joga car

Abescar, avolei por que não?

Não joga, basta

Vet, nãos

Sabe per deu

Paro

Parou impá

Par ou impar

Porque linha

Por quem usa

Ar que não sabe afun

Joga porque

Por que? Porque não sabe arriscar

Rebater deus não jô

Gapa paciência porque não sabe esperar

Deus não joga xadrez

Não joga dados

Blefe, arde

Deus não joga

Porque não ousa

E soma volêi por quem

Não, por quem não sabe em q

Não joga sinuca por ogar batalha naval

Bis

Colher

De

Usna

Ogarfo tebol

Porque taspe porque não sabe

Arde na

Arde usna, usna o joga car

Porque não sabe e soma

Velêi por que não

Porque não sabe em ques

Não joga sinuca

Po oga, batalha naval

Bis

Colher de usna

Morí

Morri por quem ousa

Gueime, game, mi

E não sabe arriscar, rebater, eus

Não jô

Não yo

Ciencia ape gata e não

Sabe esperar

Arne vica opua

Loes, cam renal

Oes puouê auoá

Ersn junk si

Die nuá e ablua toes

Arlina secrina puoe

Ouar ji te ank aepe nu

Erz ju, erz ju no

E uoak

Euoá arná erzjusissi

Bel belrne bernenem die argh iassa-as

E euá que ao beú, uáen

Lá aka eipe uo, uo nos

Gaerna Naem

Ist peú auá irque opioue

Esse jota bliu eneuaene

Oáca o-oeavii cá opeú-po

Loes auoá

Arzju-ci dieuna diarsna peúoê

Eipo que nãos

Não porque não

Não sabe por que não

Besta deus, não

Mor

Morrí porque não sabe

Não

Não

Colher na

Xadrez, esperar ciência

Ad-nuô, rebater de usno joga

Auá jo

E não sabe arriscar ois quer

Ospe quer uê o arque uo

Die no ar deus

Amaré-linha porque oassa

Não sabe arde deu besta deu saltar

Deus não esnuassissí

Noai-iá, oaoaê oaeuacê

Ar narque num

que há cê

não deus ar cabesabe

Ulp por que tues taspe arde não usa avolêi por que não

Porque na

Sabe

Porque sabe sabe som, som

Blefar deusna joque

Não saberque utar deu parlo

Paro impar porque deus

Num joga amaré

Aquém não sabe afume

Afuinhão aquém não sabe arriscar

Paciência, rebater, não

Paciência, não esperar

Não, xadrez

Não, não,

Escolher-na

Não matar

Batalhar

Batalhana val

Morí, saltar vou

Não sinuca

Sinuca estar não saber ogan

Por que

Por que

Essabe

Abe Deus, joga porque sabe

Há porque deus jox abe joga

Eu joga

Não pé, ar, não afun ô

Por que rebater? Não arriscar

Paciência não

Não esperar

Não xadrez

Escolher na

Alô, nave mãe?

Walla Capellobo

Lova eipou rave naus

Para vena ossabe encar

Lajê onisse kapó bessa

Letar

Deus morí apor, quem assar

Be-es corlherde linha porcá

Ossá

Deus jô angô maré

Paro olimpo atoá redeu

Vete basa arde naus deus

Acar, sabe encê deus sabe,

Fun

Ojo pope oonan quem?

Azar tá bate dinu kapó

Jaca tocar nar naus vena

Acar sabe asta eu

Não oan jipó noado

Lata, rata sácar pota

Nabe colher di deus

Quem?

Ousa por naus enur ana

Basa uta eu, duda

Dabe zabe sino nupo osa kapo

Deu eipou uma soja joça

Suê não emtar

Quem sabe fun deus

A internet está morta? Não se trata de uma pergunta metafórica. Nem que a internet esteja disfuncional, inútil ou fora de moda. Pergunta-se o que aconteceu com a internet depois que ela deixou de ser uma possibilidade. Literalmente, se ela está morta, como foi que morreu e quem foi que a matou.

Mas como alguém pode pensar que a internet acabou, quando ela está cada vez mais potente? Quando não apenas incita, mas captura inteiramente a imaginação, a atenção e a produtividade das pessoas, em maior intensidade que em qualquer outro momento de sua história? Nunca houve tantas pessoas dependentes, imbricadas, vigiadas e exploradas pela rede. A internet hoje parece esmagadora, espetacular e sem nenhuma outra alternativa imediata. Provavelmente a internet não está morta. Ela parece ter se totalizado. Ou mais precisamente: ter se espalhado por toda parte!

Diferentemente do que se pensa, a internet implica uma dimensão espacial. Seu sinal não está em todos os lugares. Hoje, mesmo quando as redes parecem se multiplicar exponencialmente, muitas pessoas ainda não possuem acesso à internet ou simplesmente não fazem uso dela. Mesmo assim, a rede continua se expandindo em outra direção. Ela começa a circular no modo offline. Mas como isso começou?

Se lembram do levante romeno em 1989, quando manifestantes invadiram estúdios de TV para fazer história? Naquele momento, as imagens mudaram de função. Transmissões em estúdios de TV ocupados tornaram-se eventos cataclísmicos – extrapolando registros ou documentos. Desde então, tornou-se claro que imagens não são interpretações objetivas ou subjetivas de uma condição pré-existente ou meramente aparências falaciosas. Imagens são como nós, enlaçamentos de energia e matéria que migram entre diferentes suportes, moldando e afetando pessoas, paisagens, políticas e sistemas sociais. As imagens adquiriram uma estranha habilidade de proliferar, transformar e ativar. Por volta de 1989, as imagens de televisão começaram a caminhar através das telas, em direção à realidade.

Esse desenvolvimento foi acelerado quando a infraestrutura da internet começou a suplementar as redes de TV com seus circuitos de circulação de imagens. De repente, os pontos de transferência se multiplicaram. Telas se tornaram onipresentes, para não falar das próprias imagens, que podem ser copiadas e dispersadas com o toque de um dedo.

Dados, sons e imagens agora estão rotineiramente transitando para além das telas, em um estado bruto diferenciado. Superam os limites dos canais de dados e materializam-se. São encarnadas como protestos ou produtos, como reflexos de lentes, arranha-céus ou tanques pixelados. Imagens tornam-se desplugadas e desequilibradas, e começam a se aglomerar no espaço fora da tela. Elas invadem cidades, transformando espaços em sites e realidade em bens imóveis. Elas se materializam como um junkspace, invasões militares e cirurgias plásticas mal feitas. Elas se alastram por e para além das redes, contratam e expandem, atrasam e tropeçam, disputam, abominam, surpreendem e atraem.

Olhe ao seu redor: ilhas artificiais imitam plantas geneticamente modificadas. Consultórios odontológicos se vendem como sets de filmagem de comerciais de carro. Maçãs dos rostos são retocadas da mesma maneira que cidades inteiras fingem ser tutoriais do CAD no YouTube. Obras de arte são enviadas por e-mail para aparecer em lobbies bancários criados em softwares de aviões de caça. Nuvens gigantes de armazenamento se precipitam como horizontes em locais desertos. Entretanto ao se tornarem reais, a maioria das imagens é substancialmente alterada. Elas são traduzidas, torcidas, feridas e reconfiguradas. Elas mudam de disposição, entorno e giro. Um clipe pintando as unhas torna-se um protesto no Instagram. Um upload desce como uma shitstorm. Um gif animado se materializa como um pop up em uma fila de aeroporto. Em alguns lugares, parece que arquiteturas inteiras de sistema NSA foram construídas – mas somente depois que o Google as traduz, vemos estoques de carros onde janelas espelhadas em um único sentido estão voltadas para dentro. Ao sair da tela, as imagens são distorcidas, dilapidadas, incorporadas e reorganizadas. Elas erram seus alvos, entendem mal seu propósito, erram suas formas e cores. Elas caminham, caem e voltam a aparecer nas telas.

Corporate Cannibal (2008), videoclipe em preto e branco de Grace Jones, descrito por Steven Shaviro como um exemplo fundamental do afeto pós-cinemático, é um caso a ser pensado. A essa altura, a fluidez descontraída e a modulação da figura pós-humana de Jones já está fixada como um modelo de austeridade infraestrutural. Eu poderia jurar que os cronogramas de ônibus de Berlim seguem esse modelo com consistência – eternamente esticando e forçando o espaço, o tempo e a paciência humana. Os destroços do cinema se rematerializam como investimentos em ruínas ou “Centros de Dominação Informacional”. Mas se o cinema estourou no mundo moderno para se tornar parcialmente real, também é preciso reconhecer que ele realmente explodiu. E provavelmente também não sobreviveu a essa explosão.

Pós-Cinema

Já faz muito tempo que as pessoas sentem que o cinema está um tanto sem vida. O cinema hoje é acima de tudo um estímulo para se comprar novas televisões, sistemas de projeção caseira e iPads com tela retina. Já faz muito tempo que ele se tornou uma plataforma para vender produtos franqueados – passando longas-metragens de futuros jogos de PlayStation em cinemas sanitizados. Se tornou aquilo que Thomas Elsaesser chama de complexo militar-industrial de entretenimento.

Todo mundo tem sua própria versão de quando e como o cinema morreu, mas eu pessoalmente acredito que ele foi estilhaçado quando, no curso da guerra da Bósnia, um pequeno cinema em Jajce foi destruído por volta de 1993. Lugar onde a República Federal da Iugoslávia foi fundada durante a 2ª Guerra Mundial, pelo Conselho Antifascista para a Libertação Nacional da Iugoslávia (AVNOJ). Eu tenho certeza de que o cinema também foi apunhalado em muitos outros momentos e lugares. Ele foi baleado, executado, morto de fome, foi sequestrado no Líbano e na Argélia, na Chechênia e na República Democrática do Congo, assim como em muitos outros lugares de conflito no pós-Guerra Fria. Não somente se retraiu como se tornou indisponível e, depois da superação do desastre, se estabilizou como obra de arte, como escreveu Jalal Toufic. Foi morto, ou pelo menos entrou em coma permanente.

Mas vamos voltar à pergunta inicial. Nos últimos anos muitas pessoas – praticamente todo mundo – têm percebido que a internet está estranha. Está obviamente completamente vigiada, monopolizada e sanitizada pelo senso comum, direitos autorais, controle e conformismo. Parece tão vibrante quanto um novo cinema multiplex nos anos noventa passando Star Wars Episódio 1 repetidamente. A internet foi atingida por um franco-atirador na Síria, um drone no Paquistão ou uma granada de gás lacrimogêneo na Turquia? Está em um hospital em Port Said com uma bala em sua cabeça? Ela cometeu suicídio pulando de uma janela de um Information Dominance Center? Mas não há nenhuma janela nesse tipo de estrutura. E não há paredes. A internet não está morta. Ela está morta-viva e está em todos os lugares.

Eu sou um computador de redstone do Minecraft

Então, o que quero dizer com a internet ter se mudado para o offline? Instantaneamente, ela cruzou a tela, multiplicou displays, transcendeu redes e cabos para se tornar inerte e inevitável. Alguém poderia imaginar o desligamento geral de todos os acessos online ou de todas as atividades de usuários. Nós podemos até estar desplugados, mas não significa que estamos a salvo. A internet persiste offline como um modo de vida, vigilância, produção e organização – uma forma de voyeurismo intenso somada com opacidade máxima. Imagine uma internet cheia de objetos sem sentido que se “curtem” uns aos outros, reforçando as regras de poucos que compõem quase-monopólios. Um mundo de conhecimento privatizado, patrulhado e defendido pelas empresas avaliativas. De máximo controle somado com intenso conformismo, onde carros inteligentes fazem compras de mercado até um míssil vir e acabar com tudo. A polícia bate à sua porta para lhe prender por um download – após lhe “identificar” no YouTube ou em uma câmera de segurança. Eles o ameaçam colocar na prisão por propagar conhecimento de investimento público? Ou talvez implorem que você faça o Twitter cair para impedir uma insurgência. Aperte suas mãos e deixe-os entrar. Eles são a internet de hoje em dia em 4D.

A condição totalizadora da internet não é uma interface, mas um ambiente. Mídias mais antigas, assim como pessoas imageadas, estruturas imageadas e objetos-imagem, são inscritos como temas nas redes. O espaço das redes é em si um médium, ou o que quer que queiram chamar de médium, no estado promíscuo e póstumo em que se encontra hoje em dia. É uma forma de vida (e morte) que contém, assimila e arquiva todas as formas prévias de mídia. Nesse espaço midiático fluido, imagens e sons se transformam em diferentes corpos e aparelhos, adquirindo cada vez mais problemas e hematomas ao longo do caminho. Além disso, não são somente as formas que migram pelas telas, mas também as funções. Computação e conectividade permeiam a substância e a transformam em matéria-prima para previsões algorítmicas, ou para formar potenciais blocos de construção em redes alternativas. Assim como os computadores de redstone do Minecraft são capazes de usar minerais virtuais para calcular operações, materiais vivos e mortos estão cada vez mais integrados com a performance da nuvem, lentamente transformando o mundo em uma placa mãe multiníveis.

Mas há também nesse espaço uma esfera de liquidez, de tempestades iminentes e climas instáveis. É o reino que vai da complexidade à loucura, rodando estranhos loops de feedback. Uma condição em parte criada por humanos, mas somente em parte controlada por eles, indiferente a qualquer coisa, a não ser seu movimento, energia, ritmo e complicação. É o espaço dos ronin da antiguidade, samurais sem mestres, freelancers apropriadamente chamados de “homens e mulheres onda”, que flutuam em um mundo fugaz de imagens, estagiários da deep web imersos em soap lands. Nós achávamos que era um problema no sistema de encanamento, mas então como esse tsunami entupiu minha pia? Como que esse algoritmo secou o campo de arroz? E quantos trabalhadores estão desesperadamente escalando essa nuvem ameaçadora que flutua no horizonte agora, tentando espremer alguma qualidade de vida, tentando apalpar a neblina que a qualquer momento pode se transformar tanto em uma instalação artística imersiva quanto em uma demonstração política ensopada em gás lacrimogêneo de alta qualidade?

Pós-Produção

Mas se as imagens começaram a transbordar pelas telas invadindo sujeitos e objetos, a maior e bastante negligenciada consequência disso é que a realidade agora consiste amplamente de imagens; ou melhor, de coisas, constelações e processos previamente evidenciados como imagens. Isso significa que não é possível entender a realidade sem entender cinema, fotografia, modelagem 3D, animação e outras formas de imagens estáticas ou em movimento. O mundo está imbuído dos cacos de imagens prévias, assim como imagens editadas, photoshopadas, agrupadas nas pastas de spam e na lixeira. A realidade em si é pós-produzida e roteirizada, afetos renderizados como efeitos de pós-produção. Longe de serem opostos separados por um intransponível abismo, imagem e mundo são em muitos casos somente versões um do outro. Entretanto eles não são equivalentes, mas deficientes, excessivos e desiguais em relação um ao outro. E essa lacuna entre eles abre espaço para especulações e intensa ansiedade.

Nessas condições, a produção se transforma em pós-produção, agora que o mundo pode ser não apenas entendido, mas também alterado por suas ferramentas. As ferramentas da pós-produção: edição, correção de cor, filtragem, cortes e afins não almejam a representação. Elas se tornaram meios de criação, não somente de imagens, mas também do mundo e seus rastros. Uma hipótese: com a proliferação digital de todo tipo de imagem, de repente um excesso de mundo ficou disponível. O mapa, para usar a famosa fábula de Borges, não somente se tornou equivalente ao mundo, mas o excedeu. Uma quantidade vasta de imagens cobre a superfície do mundo – literalmente no caso da fotografia aérea – em uma confusa pilha de camadas. O mapa explode em um território material que está cada vez mais fragmentado e também emaranhado com ele: em uma instância, a cartografia do Google Maps quase levou a um conflito militar.

Enquanto Borges apostou que o mapa poderia se definhar, Baudrillard, por outro lado, especulou que a realidade estava se desintegrando. Na verdade, as duas possibilidades se multiplicaram e agora se confundem uma com a outra: em aparelhos portáteis, postos de controle e entre edições. Mapa e território encontram-se um ao outro para realizar traços em painéis táteis, como parques temáticos ou arquiteturas setorizadas. Camadas imagéticas são fixadas como estratos geológicos enquanto equipes da SWAT patrulham carrinhos de compra da Amazon. A questão é que ninguém consegue aguentar isso. Essa bagunça extensa e exaustiva precisa ser editada em tempo real: filtrada, escaneada, sortida e selecionada ‒ em diferentes versões da Wikipédia, em geografias estratificadas, libidinais, logísticas e desequilibradas.

Esse processo assinala um novo papel para a produção de imagens e, consequentemente, também para as pessoas que lidam com elas. Trabalhadores de imagem agora lidam diretamente com um mundo feito de imagens, e possivelmente podem fazer tudo muito mais rápido do que antes. Mas a produção também se misturou com circulação ao ponto de se tornarem indistinguíveis. A difusão da fábrica/ateliê/Tumblr com as compras online, coleções oligárquicas, empresas imobiliárias e arquitetura de vigilância. Hoje, o local de trabalho pode acabar se tornando um algoritmo rebelde que comanda seu disco rígido, seus olhos e seus sonhos. E amanhã talvez você tenha que dançar até a insanidade.

À medida que a rede transborda para uma nova dimensão, a produção de imagens se transporta para muito além do confinamento de campos especializados. Tornando-se pós-produção em massa em uma era de criatividade de multidão. Hoje, quase todo mundo é artista. Estamos argumentando, fraudando, enviando spams, curtindo em corrente ou subalternizando as diferenças. Estamos com tique nervoso, tuitando e brindando por uma forma de arte relacional solo, por um alto processamento dual e uma taxa fixa para smartphones. A circulação de imagem hoje em dia funciona pela propagação de pixels em órbita através do compartilhamento estratégico de conteúdo absurdo, neo-tribal, majoritariamente produzido nos EUA. Objetos improváveis, gifs de celebridades felinas e um aglomerado de imagens anônimas nunca vistas proliferam e flutuam através de corpos humanos via wi-fi. Poderíamos pensar nos resultados como uma nova forma vital de arte folclórica, se houvesse alguém preparado para revisar em sua totalidade a definição de folclore e também a de arte. As novas formas de contar histórias usando emoji e as ameaças de estupro tuitadas estão ambas criando e rasgando comunidades frouxamente conectadas por um déficit de atenção compartilhado.

Circulacionismo

Contudo essas coisas não são tão novas quanto parecem. Aquilo que a vanguarda soviética do século XX chamou de produtivismo – que marcou a entrada da arte no ciclo produtivo da fábrica – poderia agora ser substituído pelo circulacionismo. Circulacionismo não é sobre a arte de criar uma imagem, mas de pós-produzir, lançar e acelerar a imagem. É sobre as relações públicas das imagens através de redes sociais, sobre propaganda e alienação, sobre ser vazio do jeito mais suave possível.

Lembram como os artistas produtivistas Mayakovsky e Rodchenko criavam cartazes publicitários de produtos adocicados para a NEP? Seriam os comunistas entusiastas do fetichismo de commodities? Crucialmente, se o circulacionismo fosse reinventado, surgiria a partir de curtos-circuitos em redes pré-existentes, contornando e driblando amizades corporativas e monopólios de discos rígidos. Ele poderia se tornar a arte de recodificar ou reconfigurar o sistema pela exposição da escopofilia estatal, da conformidade do capital e da vigilância varejista. Claro que o circulacionismo atual poderia dar tão errado quanto seu predecessor, por se alinhar com o culto stalinista de produtividade, aceleração e exaustão heroica. O produtivismo histórico foi – vamos ser honestos – totalmente inefetivo e derrotado precocemente por um aparato burocrático sobrecarregado de vigilância e dispositivos de fomento empregatício. E é bem provável que o circulacionismo – em vez de reestruturar a circulação – pode acabar sendo apenas um ornamento para uma internet que parece cada vez mais com um shopping center vazio, com nada além de franquias do Starbucks pessoalmente gerenciadas por Joseph Stalin.

Será que o circulacionismo pode alterar o disco rígido e o software da realidade; seus afetos, sentidos e processos? Enquanto o produtivismo deixou poucos rastros em uma ditadura sustentada pelo culto ao trabalho, poderia o circulacionismo mudar a condição de globos oculares, insônia e exposição pessoal em uma fábrica algorítmica? Estariam os stakhanovistas do circulacionismo atual em fazendas bangladeshianas, minando ouro virtual em campos prisionais chineses ou produzindo consentimento corporativo em série sobre esteiras rolantes digitais?

Livre Acesso

No livre acesso está a consequência definitiva da internet se mover offline. Se imagens podem ser compartilhadas e circuladas, por que não poderia todo o resto ser disponibilizado também? Se dados podem se mover pelas telas, também podem suas encarnações materiais se moverem pelas vitrines e outros invólucros. Se os direitos autorais podem ser driblados e questionados, por que a propriedade privada não pode? Se alguém pode compartilhar um prato em jpeg no Facebook, por que não uma refeição real? Por que não aplicar o uso justo para espaços, parques e piscinas? Por que reivindicar livre acesso ao JSTOR e não ao MIT – ou qualquer outra escola, hospital ou universidade? Por que invasões a supermercados não descarregam como nuvens de dados? Por que não abrir as fontes de água, energia e champanhe Dom Perignon?

Se o circulacionismo vier a gerar algum sentido, ele deve se mover para o mundo offline de distribuição, de disseminação de recursos 3D, de música, terra e inspiração. Por que não se abster lentamente de uma internet morta-viva para construir algumas outras ao seu lado?

Notas

Revista Poiésis, Niterói, v. 23, n. 40, p. 136-154, jul./dez. 2022. [DOI: https://doi.org/10.22409/poiesis.v23i40.52323]

STEYERL, Hito; PIETROLUONGO, Amanda; VELLOSO, Beatriz Pimenta; CAETANO, Gabriel de França. Um excesso de mundo

Ricardo Aleixo, Einstein Remix in Pesado demais para poesia.

3x Einstein Remix, de Diambe

Agrade Camiz

Deus não joga dados

Blefe

Arde

Porque arde

Joga porque sabe jogar

mãos

Abed

Joga

Por que?

Porque mal sabe

É

Estar

Estar deus

não joga

Porque não sabem

Atar

Deus não joga

Amaré

Deus não joga amarelinha porque não sabe (risos)

Gente?

Deus não joga batalha naval

porque não sabe a

fundar

Porque não sabe afundar

Deus não joga memória

Porque não sabe blefar

Oxe

Dificil isso aqui de encontrar?

Oje Onjo, por que rebater

Deus não joga paciência porque não sabe esperar

Eu todinha!

Deus não joga xadrez

Vou voltar

Deus não joga dados, porque não sabe somar

Deus não joga cartas, porque não sabe blefar

Deus não joga vôlei, porque não sabe sacar

Deus não joga futebol, porque não sabe chutar

Deus não joga basquete, porque não sabe encestar

Deus não joga par ou impar, porque não sabe perder

Deus não joga sinuca, porque não sabe matar

Deus não joga amarelinha, porque não sabe saltar

Deus não joga batalha naval, porque não sabe afundar

Deus não joga memória, porque não sabe...

Acabei de ler esse e esqueci

Por que não sabe? Escolher!

Deus não joga porque.. pôquer, porque não sabe arriscar

Deus não joga pingue pongue, porque não sabe rebater

Deus não joga paciência porque não sabe esperar

Deus não joga xadrez

Millena Lizia

Deus não joga dados

Porque não sabe, soma

volêi

Porque nãos

Porque não sabe

Enc

não joga sino campo

Abes car deus não esta

Deus não joga porque não sabe atar

Escolher de

usna

Ong porque não sabe

Deus não joga xadrez

não sabe esperar

Paciencia

Arc

deus não joga,

pinga

Dar, deus,

Não, jogabe

Besaltar,

deus não,

ota

nãos, atebe erde deu

linha porque não sá

dar, deus não joga game

arque não sabe afun

e não sabe arrsicar,

rebater

deus não jô

joga porque arque,

deus não joga amaré

linha porque não sá dar,

deus não joga-me

Mori, a por quem

A osa, ong porque não sabe esta ardeu

Não joga quem não sabe atar

Fago? Utebe u por quê?

Taspe, or que não sabe

Abescar, deus não jota por que não sabe em que

Não sabe, perdeu

Bessá, altar deus não jota

Arde

Deus não joga car

Abescar, avolei por que não?

Não joga, basta

Vet, nãos

Sabe per deu

Paro

Parou impá

Par ou impar

Porque linha

Por quem usa

Ar que não sabe afun

Joga porque

Por que? Porque não sabe arriscar

Rebater deus não jô

Gapa paciência porque não sabe esperar

Deus não joga xadrez

Não joga dados

Blefe, arde

Deus não joga

Porque não ousa

E soma volêi por quem

Não, por quem não sabe em q

Não joga sinuca por ogar batalha naval

Bis

Colher

De

Usna

Ogarfo tebol

Porque taspe porque não sabe

Arde na

Arde usna, usna o joga car

Porque não sabe e soma

Velêi por que não

Porque não sabe em ques

Não joga sinuca

Po oga, batalha naval

Bis

Colher de usna

Morí

Morri por quem ousa

Gueime, game, mi

E não sabe arriscar, rebater, eus

Não jô

Não yo

Ciencia ape gata e não

Sabe esperar

Arne vica opua

Loes, cam renal

Oes puouê auoá

Ersn junk si

Die nuá e ablua toes

Arlina secrina puoe

Ouar ji te ank aepe nu

Erz ju, erz ju no

E uoak

Euoá arná erzjusissi

Bel belrne bernenem die argh iassa-as

E euá que ao beú, uáen

Lá aka eipe uo, uo nos

Gaerna Naem

Ist peú auá irque opioue

Esse jota bliu eneuaene

Oáca o-oeavii cá opeú-po

Loes auoá

Arzju-ci dieuna diarsna peúoê

Eipo que nãos

Não porque não

Não sabe por que não

Besta deus, não

Mor

Morrí porque não sabe

Não

Não

Colher na

Xadrez, esperar ciência

Ad-nuô, rebater de usno joga

Auá jo

E não sabe arriscar ois quer

Ospe quer uê o arque uo

Die no ar deus

Amaré-linha porque oassa

Não sabe arde deu besta deu saltar

Deus não esnuassissí

Noai-iá, oaoaê oaeuacê

Ar narque num

que há cê

não deus ar cabesabe

Ulp por que tues taspe arde não usa avolêi por que não

Porque na

Sabe

Porque sabe sabe som, som

Blefar deusna joque

Não saberque utar deu parlo

Paro impar porque deus

Num joga amaré

Aquém não sabe afume

Afuinhão aquém não sabe arriscar

Paciência, rebater, não

Paciência, não esperar

Não, xadrez

Não, não,

Escolher-na

Não matar

Batalhar

Batalhana val

Morí, saltar vou

Não sinuca

Sinuca estar não saber ogan

Por que

Por que

Essabe

Abe Deus, joga porque sabe

Há porque deus jox abe joga

Eu joga

Não pé, ar, não afun ô

Por que rebater? Não arriscar

Paciência não

Não esperar

Não xadrez

Escolher na

Alô, nave mãe?

Walla Capellobo

Lova eipou rave naus

Para vena ossabe encar

Lajê onisse kapó bessa

Letar

Deus morí apor, quem assar

Be-es corlherde linha porcá

Ossá

Deus jô angô maré

Paro olimpo atoá redeu

Vete basa arde naus deus

Acar, sabe encê deus sabe,

Fun

Ojo pope oonan quem?

Azar tá bate dinu kapó

Jaca tocar nar naus vena

Acar sabe asta eu

Não oan jipó noado

Lata, rata sácar pota

Nabe colher di deus

Quem?

Ousa por naus enur ana

Basa uta eu, duda

Dabe zabe sino nupo osa kapo

Deu eipou uma soja joça

Suê não emtar

Quem sabe fun deus

NOTAS

1 O vírus do HIV foi isolado pela primeira vez em 1982 como responsável pela AIDS, deficiência imune que facilita doenças oportunistas e que tem letalidade decrescente no mundo desde 2004 (dados encontrados em https://www.unaids.org/en/resources/fact-sheet, acesso em 9/4/2021) e, no Brasil, desde 2007 com a quebra de patente do Efavirenz, medicamento, à sua época inovador, que tem efeito antirretroviral e que, como tal, é distribuído pelo SUS desde 1996, com a lei 9.313 (dados encontrados em http://www.blog.saude.gov.br/index.php/promocao-da-saude/53684-tratamento-brasileiro-contra-hiv-aids-se-consolida-como-referencia-mundial, acessados em 9/4/2021). Segundo o filme documentário How to Survive a Plague, de David France, os anos iniciais dessa epidemia tiveram como epicentro os Estados Unidos e registram uma média de 500.000 mortes por ano em nível global. No Brasil a taxa de mortalidade em decorrência de AIDS é decrescente desde 2010 e a detecção do HIV é decrescente desde 2012. Os indicadores de desenvolvimento da imunodeficiência (AIDS) é de 57% para pessoas autodeclaradas pretas e pardas ainda em 2020 (indicadores do Ministério da Saúde disponíveis em http://indicadores.aids.gov.br/, acessados em 9/4/2021). O estudo de Fernando Alves Jota (FioCruz), intitulado Os Antirretrovirais através da história, da descoberta até os dias atuais (2011), aponta 205.000 óbitos em decorrência de AIDS somente no Brasil, entre 1982 e 2008, sendo 84% dos casos na faixa etária entre 24 a 49 anos. No primeiro ano da epidemia de CoViD-19 (2020-2021), testemunhamos no Brasil mais de 300 mil óbitos desde o primeiro caso, sob negligência do governo federal. O vírus Sars-cov produz uma doença de relativamente baixa mortalidade percentual, mas que se prolifera de maneira fácil pela respiração, pelo ar e pelo toque, tornando-se um grave problema de saúde pública. A forma de as pessoas se aproximarem e se relacionarem certamente mudou desde então. Embora os dois vírus sejam incomparáveis em seus impactos, os dados estatísticos são relevantes de serem colocados em paralelo, dada a proliferação global e as mudanças comportamentais diversas que ambos vetorizam de modo amplo.

2 ALEIXO, Ricardo; SOUZA, Helton, 2002, 6’.

3 A insistência desse assunto, no campo da linguagem, se deve à falsa oposição entre “ser” e “vir a ser” no pensamento ocidental, quando comparada com pensamento linguístico que deriva do ubuntu, totalmente relacionado com aqueles que praticam a língua bantu, que é um pensamento em fluxo, chamado de reomodo, um modo que, na sua estrutura, não estabelece a divisão sujeito-verbo-objeto (estrutura ocidental que distingue, por exemplo, ser, vir a ser e vindo a ser). No reomodal, todos os princípios do ser são moventes, verbais, posto que o ser é móvel na expressão bantu.

4 ban é o plural de umu, que é a palvra que se refere à substância concreta de ubu, de um jeito que ban (-ntu) e ubu (-ntu) são de algum jeito indissociáveis e mutuamente implicados. O que define ban (-ntu) é o próprio ubu (-ntu), termo equivalente a ser, enquanto umu é o concreto, algo equivalente ao ente, é nisso que se baseia filosoficamente, com base da língua em que esses povos se expressam: quem fala bantu está praticando o pensamento ubuntu.

5 Livre tradução de “experimental exercise of freedom” (LEPECKI, 2020, p. 16).

REFERÊNCIAS

ALEIXO, Ricardo. Pesado demais para a ventania. São Pualo: Editora Todavia, 2018.

ALEIXO, Ricardo; SOUZA, Helton. Vereda literária, 2002, disponível em https://www.youtube.com/watch?v=VxhtykUPTA4. Acesso em 9/4/2021.

BENJAMIN, Walter. Pequena história da fotografia. In Mágia e técnica, arte política. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993, p. 91-106.

EIGEN, Manfred. O que sobrará da biologia do século XX? In MURPHY, Michael P.; O’NEAL, Luke A. J. (Org.). O que é a vida? São Paulo: UNESP, 1997.

FRANCE, David. How to survive a plague, 104’, Estados Unidos, 2012.

JOTA, Fernando. Os Antirretrovirais através da história, da descoberta até os dias atuais. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2011.

LEPECKI, André. Choreopolice and Choreopolitics: or, the task of the dancer. The Drama Review, v. 4, p. 20, Massachussetts Institute of Technology, 2013. Disponível em https://direct.mit.edu/dram/article/57/4%20(220)/13/42769/Choreopolice-and-Choreopolitics-or-the-task-of-the. Acesso em 9/4/2021.

MOMBAÇA, Jota. O mundo é meu trauma. Piseagrama, Belo Horizonte, n. 11, p. 20-25, 2017. Disponível em https://piseagrama.org/o-mundo-e-meu-trauma/. Acesso em 9/4/2021.

SILVA, Diambe. Pivô entrevista Diambe, 2021. Disponível em https://www.pivo.org.br/blog/pivo-entrevista-diambe-da-silva/. Acesso em 9/4/2021.

TAYLOR, Diana. Politics of presence. Durham: Duke University Press, 2020.

RAMOSE, Mogobe B. African Philosophy through Ubuntu. Harare: Mond Books, 1999, p. 49-66.

VERNANT, Jean-Pierre; VIDAL-NAQUET, Pierre. Mito e Tragédia na Grécia Antiga. São Paulo: Perspectiva, 2014.