DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
Estética e resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
DOI: https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v12i22.
Resumo
: O objetivo deste artigo é contextualizar o surgimento do Teatro Madalena no debate sobre
os direitos das mulheres e na cena artística brasileira Este artigo pretende entender como a luta pelo
direito e pela a inclusão é possível por meio da arte, mesmo q
desfavoráveis. Serve também para pensarmos quais as escolhas que o feitas nesse projeto, quais
propostas e os discursos que foram privilegiados.
Palavras-chave
: teatro Madalena, mulher; gênero, Teatro do Oprimido, di
Estética y resistencia en red en el
Resumen
: El propósito de este artículo es contextualizar el surgimiento del Teatro Madalena en el
debate sobre los derechos de las mujeres y en la escena artística
comprender cómo la lucha por los derechos y la inclusión es posible por medio del arte, incluso
cuando la realidad y los momentos son desfavorables. También sirve para reflexionar sobre qué
elecciones se hacen en este proy
Palabras clave
: Teatro Magdalena, mujer; teatro, derechos civiles, inclusión.
Aesthetics and resistance in network in the scene of the
Abstract
debate on women's rights and in the Brazilian artistic scene. This article intends to understand how the
struggle for rights and inclusion is possible through art, ev
serves to think about what choices are made in this project, what proposals and discourses were
privileged.
Keywords
: Madalena Theater, woman; gender, Theater of the Oppressed, civil rights, inclusion.
1
Marcos Horário Gomes Dias. Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
PUC/SP. Professor de pós-
graduação e graduação no Centro Universitário Assunção (UNIFAI) e
Universidade São Judas Tadeu (USJT) e no Museu de Arte Sacra de Sã
mail: marcos.dias@saojudas.br
-
2
Maria Bernardete Toneto. Doutoranda em Ciências, linha de pesquisa em Comunicação e Cultura,
pelo Programa de Pós Graduação em Integração da América Latina, da Universidade de São Paulo
(Prolam/USP), Brasil. E-mail:
bernatoneto@gmail.com
Recebido em 09/08/2021, aceito para publicação em 25/01/2022 e disponibilizado online em
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
Estética e resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
DOI: https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v12i22.
51149
Marcos Horácio Gomes Dias
Maria Bernardete Toneto
: O objetivo deste artigo é contextualizar o surgimento do Teatro Madalena no debate sobre
os direitos das mulheres e na cena artística brasileira Este artigo pretende entender como a luta pelo
direito e pela a inclusão é possível por meio da arte, mesmo q
uando a realidade e os momentos o
desfavoráveis. Serve também para pensarmos quais as escolhas que são feitas nesse projeto, quais
propostas e os discursos que foram privilegiados.
: teatro Madalena, mulher; gênero, Teatro do Oprimido, di
reitos civis, inclusão.
Estética y resistencia en red en el
Teatro das Oprimidas
: El propósito de este artículo es contextualizar el surgimiento del Teatro Madalena en el
debate sobre los derechos de las mujeres y en la escena artística
brasileña. Este artículo pretende
comprender cómo la lucha por los derechos y la inclusión es posible por medio del arte, incluso
cuando la realidad y los momentos son desfavorables. También sirve para reflexionar sobre qué
elecciones se hacen en este proy
ecto y cual propuestas y discursos se privilegiaron.
: Teatro Magdalena, mujer; teatro, derechos civiles, inclusión.
Aesthetics and resistance in network in the scene of the
Teatro das Oprimidas
: The purpose of this article is to contextualize the emergence of
Teatro Madalena
debate on women's rights and in the Brazilian artistic scene. This article intends to understand how the
struggle for rights and inclusion is possible through art, ev
en when reality are unfavorable. It also
serves to think about what choices are made in this project, what proposals and discourses were
: Madalena Theater, woman; gender, Theater of the Oppressed, civil rights, inclusion.
Marcos Horário Gomes Dias. Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
graduação e graduação no Centro Universitário Assunção (UNIFAI) e
Universidade São Judas Tadeu (USJT) e no Museu de Arte Sacra de
o Paulo (MAS), Brasil. E
-
https://orcid.org/0000-0003-4815-8360
Maria Bernardete Toneto. Doutoranda em Ciências, linha de pesquisa em Comunicação e Cultura,
pelo Programa de Pós Graduação em Integração da América Latina, da Universidade de São Paulo
bernatoneto@gmail.com
- https://orcid.org/0000-
0002
Recebido em 09/08/2021, aceito para publicação em 25/01/2022 e disponibilizado online em
01/03/2022.
191
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Estética e resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Marcos Horácio Gomes Dias
1
Maria Bernardete Toneto
2
: O objetivo deste artigo é contextualizar o surgimento do Teatro Madalena no debate sobre
os direitos das mulheres e na cena artística brasileira Este artigo pretende entender como a luta pelo
uando a realidade e os momentos são
desfavoráveis. Serve também para pensarmos quais as escolhas que o feitas nesse projeto, quais
reitos civis, inclusão.
: El propósito de este artículo es contextualizar el surgimiento del Teatro Madalena en el
brasileña. Este artículo pretende
comprender cómo la lucha por los derechos y la inclusión es posible por medio del arte, incluso
cuando la realidad y los momentos son desfavorables. También sirve para reflexionar sobre qué
ecto y cual propuestas y discursos se privilegiaron.
Teatro das Oprimidas
Teatro Madalena
in the
debate on women's rights and in the Brazilian artistic scene. This article intends to understand how the
en when reality are unfavorable. It also
serves to think about what choices are made in this project, what proposals and discourses were
: Madalena Theater, woman; gender, Theater of the Oppressed, civil rights, inclusion.
Marcos Horário Gomes Dias. Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
graduação e graduação no Centro Universitário Assunção (UNIFAI) e
o Paulo (MAS), Brasil. E
-
Maria Bernardete Toneto. Doutoranda em Ciências, linha de pesquisa em Comunicação e Cultura,
pelo Programa de Pós Graduação em Integração da América Latina, da Universidade de São Paulo
0002
-7002-2534
Recebido em 09/08/2021, aceito para publicação em 25/01/2022 e disponibilizado online em
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Minha primeira pergunta,
que por último enuncio, será:
Ó maravilha! Sois humana ou
divina? Que sois?
Não maravilha, não divina,
senhor; mulher, decerto.
Diálogo entre Ferdinando e
Miranda, em
A Tempestade
Introdução
O tema
da participação
mulheres nas artes e na política
permeia
diversas discussões
sociais e acadêmicas, assim como a
ação de organizações e
da sociedade civil, que em suas
articulações incluem análises sobre
questões de gênero,
autodeterminação, di
gnidade e
igualdade.
Esse debate reitera práticas
sociais e políticas que, além de
preocupações individuais imediatas,
enfocam a totalidade das condições
sociais, em que a mudança
fundamental da ordem social envolve
as dimensões simbólicas e as relações
delas decorrentes.
Formalmente, a discussão
sobre a condição de subalternidade
feminina cresceu
na Europa e Estados
Unidos a partir das lutas de
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Minha primeira pergunta,
que por último enuncio, será:
Ó maravilha! Sois humana ou
divina? Que sois?
Não maravilha, não divina,
senhor; mulher, decerto.
Diálogo entre Ferdinando e
A Tempestade
.
da participação
das
mulheres nas artes e na política
diversas discussões
políticas,
sociais e acadêmicas, assim como a
movimentos
da sociedade civil, que em suas
articulações incluem análises sobre
questões de gênero,
gnidade e
Esse debate reitera práticas
sociais e políticas que, além de
preocupações individuais imediatas,
enfocam a totalidade das condições
sociais, em que a mudança
fundamental da ordem social envolve
as dimenes simbólicas e as relações
Formalmente, a discussão
sobre a condição de subalternidade
na Europa e Estados
Unidos a partir das lutas de
emancipação das mulheres travadas a
partir do século XIX. Mas esse
movimento não é exclusivo dos países
do Nor
te; em todo mundo o debate e
as lutas conectam-
s
imediatas locais, à situação da mulher
naquele espaço, aos direitos civis
específicos e aos movimentos
relacionados à liberdade de
comportamento e expressão.
Consequentemente, o diagnosti
cados conflitos entre os prinpios que
envolvem a luta por equidad
todas as pessoas, de todos os
gêneros, e a realidade cotidiana
concreta nos tempos e nos espaços
geográficos onde elas vivem,
sobrevivem e resistem.
envolve ideali
smo e práxis, não se
trata apenas de formalmente postular
igualdade
entre mulheres e homens,
até porque os sujeitos não são
uniformes, dadas suas diferentes
culturas e condições sociais. Esta
conjuntura envolve contestar as
condições concretas nas quais a
promessa de igualdade não é
realmente cumprida.
192
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
emancipação das mulheres travadas a
partir do culo XIX. Mas esse
movimento não é exclusivo dos países
te; em todo mundo o debate e
s
e às realidades
imediatas locais, à situação da mulher
naquele espaço, aos direitos civis
espeficos e aos movimentos
relacionados à liberdade de
comportamento e expressão.
Consequentemente, são diagnosti
-
cados conflitos entre os princípios que
envolvem a luta por equidad
e para
todas as pessoas, de todos os
gêneros, e a realidade cotidiana
concreta nos tempos e nos espaços
geográficos onde elas vivem,
sobrevivem e resistem.
Neste jogo que
smo e práxis, não se
trata apenas de formalmente postular
entre mulheres e homens,
até porque os sujeitos não são
uniformes, dadas suas diferentes
culturas e condições sociais. Esta
conjuntura envolve contestar as
condições concretas nas quais a
promessa de igualdade não é
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
O processo da resistência das
mulheres não ocorre em um cenário
linear. Desenvolve-
se em um palco em
que acontecem encontros e confrontos
entre tempo, espaço e condições.
Neste jogo de cena, desde sempre é
p
reciso considerar as condições
concretas e simbólicas das mulheres,
em especial as latino-
americanas
incluídas as brasileiras. Elas estão
alijadas da política, ausentes em
cargos de comando, sub
representadas nas escolas e
universidades, maioria entre
desempregados, exploradas como
mão de obra barata, vítimas de
estereótipos de gênero. Nas relações
socioafetivas ainda são submetidas ao
marido “chefe da
família”, socialmente
definido
como tal e detentor do
autodireito de decidir sobre a rotina, a
eco
nomia, a posse do corpo e da vida.
Como romper o silêncio imposto
às mulheres? A ação da Rede
Ma(g)dalena Internacional/Teatro das
Oprimidas vai além do
empoderamento do corpo e da voz
pelas mulheres. “Provoca” os homens,
e a própria sociedade, para não
avançarem com a discriminação.
Alerta que as próprias estruturas de
representação social são reflexos de
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
O processo da resistência das
mulheres não ocorre em um cenário
se em um palco em
que acontecem encontros e confrontos
entre tempo, espaço e condições.
Neste jogo de cena, desde sempre é
reciso considerar as condições
concretas e simbólicas das mulheres,
americanas
incluídas aí as brasileiras. Elas estão
alijadas da política, ausentes em
cargos de comando, sub
-
representadas nas escolas e
universidades, maioria entre
os
desempregados, exploradas como
mão de obra barata, vítimas de
estereótipos de gênero. Nas relações
socioafetivas ainda são submetidas ao
família, socialmente
como tal e detentor do
autodireito de decidir sobre a rotina, a
nomia, a posse do corpo e da vida.
Como romper o silêncio imposto
às mulheres? A ação da Rede
Ma(g)dalena Internacional/Teatro das
Oprimidas vai além do
empoderamento do corpo e da voz
pelas mulheres. Provoca os homens,
e a própria sociedade, para não
avançarem com a discriminação.
Alerta que as próprias estruturas de
representação social o reflexos de
uma estrutura social dominada por
homens. Nos laboratórios e em suas
produções, desnudam as diversas
formas de desigualdade institu
cionalizada. Divisã
o de trabalho,
atribuição de papéis, padrões de
representação, leis, monopólios de
teoria e interpretação, papel sexual e
heterossexismo são dimenes dessa
desigualdade que o tematizadas de
maneira constante pelos coletivos, de
maneira provocativa ou
mediadora;
radical ou moderada. Para
falar sobre as mulheres e as suas
diversas condições, não basta repetir o
velho: novas propostas estéticas
precisam ser inventadas. O que há de
novo nesse momento é a condição de
rede que as Madalenas assumem,
atingindo t
odos os continentes, em que
o Brasil e América Latina têm muito a
compartilhar.
Teatro
Em 1611, ao escrever e
encenar a peça
A Tempestade
dramaturgo inglês William
Shakespeare inseriu apenas uma
personagem feminina: Miranda. No
drama, a ingênua filha d
mago e duque de Milão, é apresentada
como uma jovem sem opinião,
193
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
uma estrutura social dominada por
homens. Nos laboratórios e em suas
produções, desnudam as diversas
formas de desigualdade institu
-
o de trabalho,
atribuição de papéis, padrões de
representação, leis, monopólios de
teoria e interpretação, papel sexual e
heterossexismo o dimensões dessa
desigualdade que o tematizadas de
maneira constante pelos coletivos, de
maneira provocativa ou
radical ou moderada. Para
falar sobre as mulheres e as suas
diversas condições, não basta repetir o
velho: novas propostas estéticas
precisam ser inventadas. O que de
novo nesse momento é a condição de
rede que as Madalenas assumem,
odos os continentes, em que
o Brasil e América Latina têm muito a
Em 1611, ao escrever e
A Tempestade
, o
dramaturgo inglês William
Shakespeare inseriu apenas uma
personagem feminina: Miranda. No
drama, a ingênua filha d
e Próspero,
mago e duque de Milão, é apresentada
como uma jovem sem opinião,
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
submissa aos mandos masculinos.
Enquanto o pai utiliza a magia para
provocar uma tempestade e o
consequente naufrágio do navio onde
viajam seus inimigos, a jovem de 15
anos se
envolvida em estratégias
de conquista de poder, em um cenário
povoado de seres etéreos.
Exilada em uma ilha com o pai
por 12 anos, Miranda é desejada
sexualmente por três personagens
masculinos: o próprio pai, que pensa
em violentá-
la; Ferdinando, filho do
de Nápoles e por quem se apaixona; e
por Caliman, um ser disforme e
selvagem, nascido na ilha, filho da
finada bruxa Sycorax e escravizado
por Próspero. Antes de ser violada
pelo amado e futuro marido, ela
confessa:
Não conheço ninguém do meu
sexo,
o me recordo de nenhum
rosto de mulher a o ser o meu
próprio ao espelho. Nunca vi
ninguém que pudesse chamar de
homem além de vo, bom
amigo, e do meu querido pai.
Ignoro as feições das pessoas
fora daqui. (SHAKESPEARE,
2014, p. 127).
Tomando a liberd
reinterpretar o drama shakespeariano,
é pertinente afirmar que o teatro traduz
a realidade, no jogo cênico em que
confluem vida e arte. Ou, como
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resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
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Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
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(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
submissa aos mandos masculinos.
Enquanto o pai utiliza a magia para
provocar uma tempestade e o
consequente naufrágio do navio onde
viajam seus inimigos, a jovem de 15
envolvida em estratégias
de conquista de poder, em um cenário
Exilada em uma ilha com o pai
por 12 anos, Miranda é desejada
sexualmente por três personagens
masculinos: o próprio pai, que pensa
la; Ferdinando, filho do
rei
de Nápoles e por quem se apaixona; e
por Caliman, um ser disforme e
selvagem, nascido na ilha, filho da
finada bruxa Sycorax e escravizado
por Próspero. Antes de ser violada
pelo amado e futuro marido, ela
Não conheço ninguém do meu
o me recordo de nenhum
rosto de mulher a não ser o meu
próprio ao espelho. Nunca vi
ninguém que pudesse chamar de
homem além de você, bom
amigo, e do meu querido pai.
Ignoro as feições das pessoas
fora daqui. (SHAKESPEARE,
Tomando a liberd
ade de
reinterpretar o drama shakespeariano,
é pertinente afirmar que o teatro traduz
a realidade, no jogo nico em que
confluem vida e arte. Ou, como
escreveu o teórico, dramaturgo e
diretor teatral Augusto Boal em seu
último artigo, publicado em 2009:
Teatro é a verdade escondida.
Desnudar essa verdade é ato de
resistência, assim como se afirmar
mulher é movimento de rebeldia, como
comprova a experiência revolucionária
da Rede Ma(g)dalena
Internacional/Teatro das Oprimidas.
Quatro séculos após a primei
encenação de
A Tempestade
Inglaterra, continuam atuais as
práticas de violência que permeiam as
relações de poder no processo de
domínio não apenas territorial, mas
cultural e simbólico. É revelador o fato
de a personagem Miranda se
reconhecer
mulher, sem saber o que a
diferencia dos homens. É mulher com
nome, sobrenome, ascendência
reconhecida, status econômico e
social comprovado, detentora de letras
que, mesmo com avero, se permite
tentar “ensinar” a Caliban as boas
maneiras. Mas mulher se
protagonismo, acessório do homem,
objeto de intenção de violência
masculina. Acima de tudo: mesmo se
definindo como gênero feminino, não
reconhece qualquer outra mulher, do
passado e do presente, nesta mesma
194
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
escreveu o teórico, dramaturgo e
diretor teatral Augusto Boal em seu
último artigo, publicado em 2009:
Teatro é a verdade escondida”.
Desnudar essa verdade é ato de
resistência, assim como se afirmar
mulher é movimento de rebeldia, como
comprova a experiência revolucionária
da Rede Ma(g)dalena
Internacional/Teatro das Oprimidas.
Quatro culos após a primei
ra
A Tempestade
ao rei da
Inglaterra, continuam atuais as
práticas de violência que permeiam as
relações de poder no processo de
domínio não apenas territorial, mas
cultural e simbólico. É revelador o fato
de a personagem Miranda se
mulher, sem saber o que a
diferencia dos homens. É mulher com
nome, sobrenome, ascendência
reconhecida, status econômico e
social comprovado, detentora de letras
que, mesmo com aversão, se permite
tentar ensinar a Caliban as boas
maneiras. Mas mulher se
m voz, sem
protagonismo, acessório do homem,
objeto de intenção de violência
masculina. Acima de tudo: mesmo se
definindo como gênero feminino, não
reconhece qualquer outra mulher, do
passado e do presente, nesta mesma
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
condição de subalternidade à
autoridade masculina.
Pode-
se considerar uma afronta
relacionar o texto de Shakespeare ao
processo de silenciamento das
mulheres, o que, paradoxalmente, leva
ao reconhecimento de um ser que tem
corpo, expressão e voz, que
cerceados e calados. Neste contexto,
M
iranda representa a mulher que usa
a voz para dizer o silêncio. De forma
indireta, corpo à inexistência a ela
imposta. Nesta trama, a protagonista
contextualiza as invisíveis a quem não
conhece. Faz um jogo revelador, mas
subalterno, diferente das dinâm
Teatro das Oprimidas, que objetiva a
resistência por meio do corpo, do
gesto, da emoção, traçando a dança
das existências femininas que o
invisibilizadas.
A invisibilidade sistêmica não
significa inexistência, muito pelo
contrário. Basta ver que
em resposta à
exclusão que tem origem em práticas
consolidadas por paradigmas
masculinistas expressos em ações de
dominação, as mulheres continuam se
articulando de forma específica,
transversal, horizontal e
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
condição de subalternidade à
se considerar uma afronta
relacionar o texto de Shakespeare ao
processo de silenciamento das
mulheres, o que, paradoxalmente, leva
ao reconhecimento de um ser que tem
corpo, expressão e voz, que
cerceados e calados. Neste contexto,
iranda representa a mulher que usa
a voz para dizer o silêncio. De forma
indireta, dá corpo à inexistência a ela
imposta. Nesta trama, a protagonista
contextualiza as inviveis a quem não
conhece. Faz um jogo revelador, mas
subalterno, diferente das dinâm
icas do
Teatro das Oprimidas, que objetiva a
resistência por meio do corpo, do
gesto, da emoção, traçando a dança
das existências femininas que são
A invisibilidade sistêmica não
significa inexistência, muito pelo
em resposta à
exclusão que tem origem em práticas
consolidadas por paradigmas
masculinistas expressos em ações de
dominação, as mulheres continuam se
articulando de forma específica,
transversal, horizontal e
interseccionalmente3
. Ocupam arenas
a partir de
ações multifacetadas e da
valorização de práticas históricas de
expressão, acolhimento e de partilha
de conhecimentos. Neste sentido, por
meio do corpo e da voz revela
importância da cultura do feminino
como instrumento de reavaliação das
contradiçõe
s dos modelos de ser e
estar no mundo, com impactos no
reconhecimento da identidade do ser
mulher.
A invisibilidade feminina é
ontológica, no sentido de existir um
consenso construído em torno de uma
suposta inferioridade humana,
expresso inclusive em não
reconhecimento social. Afinal, os
modelos de ser mulheres no mundo
3
É usado o conceito de interseccionalidade
desenvolvido pela franc
esa Silma Bilge, de
uma “teoria transdisciplinar que visa apreender
a complexidade das identidades e das
desigualdades sociais por intermédio de um
enfoque integrado. Ela [teoria] refuta o
enclausuramento e a hierarquização dos
grandes eixos da diferenciaç
as categorias de sexo/gênero, classe, raça,
etnicidade, idade, deficiência e orientação
sexual. O enfoque interseccional vai além do
simples reconhecimento da multiplicidade dos
sistemas de opressão que opera a partir
dessas categorias e
postula sua interação na
produção e na reprodução das desigualdades
sociais” (BILGE, 2009, p. 70)
195
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
. Ocupam arenas
ações multifacetadas e da
valorização de práticas históricas de
expressão, acolhimento e de partilha
de conhecimentos. Neste sentido, por
meio do corpo e da voz revela
-se a
importância da cultura do feminino
como instrumento de reavaliação das
s dos modelos de ser e
estar no mundo, com impactos no
reconhecimento da identidade do ser
A invisibilidade feminina é
ontológica, no sentido de existir um
consenso construído em torno de uma
suposta inferioridade humana,
expresso inclusive em o
reconhecimento social. Afinal, os
modelos de ser mulheres no mundo
É usado o conceito de interseccionalidade
esa Silma Bilge, de
uma teoria transdisciplinar que visa apreender
a complexidade das identidades e das
desigualdades sociais por intermédio de um
enfoque integrado. Ela [teoria] refuta o
enclausuramento e a hierarquização dos
grandes eixos da diferenciaç
ão social que são
as categorias de sexo/gênero, classe, raça,
etnicidade, idade, deficiência e orientação
sexual. O enfoque interseccional vai além do
simples reconhecimento da multiplicidade dos
sistemas de opreso que opera a partir
postula sua interação na
produção e na reprodução das desigualdades
sociais” (BILGE, 2009, p. 70)
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
não estão dados, e sim construídos na
História4.
Nascer e ser mulher
Após a Revolução Francesa
a
promulgação da Declaração dos
Direitos dos Homens e dos
Cidadãos
(1789), as relações de
gênero no mundo ocidental tornaram
se cada vez mais um tema
politicamente discutido.
A ascensão
das práticas do capitalismo moderno,
novas formas para velhas práticas de
exclusão e exploração, provocaram o
surgimento do socialismo e diversas
críticas à
sociedade que nascia. As
mulheres também faziam parte dessa
mão de obra explorada pelo sistema
industrial e enfrentavam a batalha da
construção e da manutenção da
família. Ganhavam menos que os
homens e participavam de trabalhos
pesados. O embrutecimento
companheiros por esse mesmo
sistema fazia com que sofressem
amplamente na luta pela
sobrevivência. Poderiam ser vitimadas
4
Aqui se utiliza o plural “mulheres, elaborado
por Mohanty (2008) em oposição ao conceito
de “mulher”. Conforme a autora, o segundo, no
singular, refere-se
ao “outro” ideológico e
cultural, construído discursivamente, enquanto
o primeiro, no plural, refere-
se aos sujeitos
reais.
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
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Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
não estão dados, e sim construídos na
Após a Revolução Francesa
e
promulgação da Declaração dos
Direitos dos Homens e dos
(1789), as relações de
gênero no mundo ocidental tornaram
-
se cada vez mais um tema
A ascensão
das práticas do capitalismo moderno,
novas formas para velhas práticas de
exclusão e exploração, provocaram o
surgimento do socialismo e diversas
sociedade que nascia. As
mulheres também faziam parte dessa
mão de obra explorada pelo sistema
industrial e enfrentavam a batalha da
construção e da manutenção da
família. Ganhavam menos que os
homens e participavam de trabalhos
pesados. O embrutecimento
de pais e
companheiros por esse mesmo
sistema fazia com que sofressem
amplamente na luta pela
sobrevivência. Poderiam ser vitimadas
Aqui se utiliza o plural mulheres”, elaborado
por Mohanty (2008) em oposição ao conceito
de mulher. Conforme a autora, o segundo, no
ao outro ideológico e
cultural, construído discursivamente, enquanto
se aos sujeitos
no mundo familiar e no mundo do
trabalho. A luta travada por vários
setores sociais de então permitiram
assim a criação de u
político que poderia ser usado também
pelas mulheres como crítica à uma
sociedade dominada pelos homens.
No século XX, após duas
guerras mundiais, buscou
restauração de
gênero rígidos
e o modelo de
casamento e família nuclear
modo de vida padrão para que
pudesse ocorrer uma suposta
"normalização" das condições de
vida.
Embora as mulheres tivessem
lidado com o mundo imediato por
conta própria nas condições mais
difíceis durante as
guerras tiveram
lidar com a instru
retornar ao lar e à família como o
verdadeiro lugar e destino próprio à
sua condição de gênero.
Em 1949, cenário da
reconstrução política, econômica,
social e cultural da Europa pós
Segunda Guerra Mundial, a filósofa
Simone de Beauvoir abre
volume de sua obra mais famosa,
Segundo Sexo
, com uma afirmação:
“Não se nasce mulher, torna
mulher”. A constatação desnuda uma
196
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
no mundo familiar e no mundo do
trabalho. A luta travada por vários
setores sociais de então permitiram
assim a criação de u
m vocabulário
político que poderia ser usado também
pelas mulheres como crítica à uma
sociedade dominada pelos homens.
No culo XX, após duas
guerras mundiais, buscou
-se a
restauração de
papéis de
e o modelo de
casamento e família nuclear
como o
modo de vida padrão para que
pudesse ocorrer uma suposta
"normalização" das condições de
Embora as mulheres tivessem
lidado com o mundo imediato por
conta própria nas condições mais
guerras tiveram
que
lidar com a instru
ção clara para
retornar ao lar e à família como o
verdadeiro lugar e destino próprio à
sua condição de gênero.
Em 1949, cenário da
reconstrução política, econômica,
social e cultural da Europa pós
Segunda Guerra Mundial, a filósofa
Simone de Beauvoir abre
o segundo
volume de sua obra mais famosa,
O
, com uma afirmação:
Não se nasce mulher, torna
-se
mulher. A constatação desnuda uma
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
realidade até a época pouco abordada:
não se trata de nascer menino ou
“menina”, mas de assumir uma
identidade
que, historicamente, nega o
determinismo de subalternidade de
metade da população mundial.
Também em
O segundo sexo
Beauvoir escreve: “Nunca se esqueça
que basta uma crise política,
econômica ou religiosa para que os
direitos das mulheres sejam
questionad
os. Esses direitos não o
permanentes. Você terá que manter
vigilante e atuante durante toda a sua
vida” (BEAUVOIR, 2016, p.36).
No capítulo “Os mitos de
Segundo Sexo
, Beauvoir argumenta
que desde o começo do
patriarcado os
homens tiveram nas su
as mãos todos
os poderes concretos; eles
trabalharam também para manter as
mulheres em estado de dependência;
seus códigos estabeleceram
ela; e assim foi que ela se constituiu
concretamente como o outro.
Um movimento para as mulheres
A obra f
undante do feminismo
europeu pós-
movimento sufragista do
início do século XX reconhece a
fragilidade das mulheres na sociedade
a partir da perspectiva da identidade
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
realidade até a época pouco abordada:
não se trata de nascer “menino” ou
menina, mas de assumir uma
que, historicamente, nega o
determinismo de subalternidade de
metade da população mundial.
O segundo sexo
,
Beauvoir escreve: Nunca se esqueça
que basta uma crise política,
econômica ou religiosa para que os
direitos das mulheres sejam
os. Esses direitos não são
permanentes. Você terá que manter
-se
vigilante e atuante durante toda a sua
vida (BEAUVOIR, 2016, p.36).
No capítulo Os mitos” de
O
, Beauvoir argumenta
patriarcado os
as mãos “todos
os poderes concretos; eles
trabalharam também para manter as
mulheres em estado de dependência;
seus digos estabeleceram
-se contra
ela; e assim foi que ela se constituiu
concretamente como o outro”.
Um movimento para as mulheres
undante do feminismo
movimento sufragista do
início do culo XX reconhece a
fragilidade das mulheres na sociedade
a partir da perspectiva da identidade
feminina e dos direitos constituídos,
tornando-
se propulsora da teoria
crítica feminista no
s países centrais do
capitalismo, onde a genealogia das
demandas de gênero é registrada
desde o final do século XIX.
Embora não haja consenso
sobre a gênese do movimento
feminino/feminista organizado,
convenciona se que o final do século
XIX é o período e
m que as questões
de gênero, a luta pela equidade e a
reflexão sobre o papel das mulheres
passam a ganhar espaço na pauta
política. A partir dessa época as
postulações relacionadas aos direitos
de mulheres começam a ocorrer de
maneira mais estruturada, com
criação de entidades coletivas e o
surgimento de demandas uniformes,
bem como de esforços teóricos para
dar sustentação às cobranças políticas
relacionadas à sua situação social
mulheres.
Aos ciclos de mobilização das
mulheres, surgidos nos países do
Norte5
, convencionou
5 Utiliza-
se aqui a divisão entre Norte e Sul em
vez da classificação entre Primeiro e Terceiro
Mundo. A opção baseia-
se na atual d
das ordens nacional e internacional provocada
pelo processo de globalização neoliberal e os
movimentos de posicionamento político e
social para além da ideia civil globa
197
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
feminina e dos direitos constituídos,
se propulsora da teoria
s países centrais do
capitalismo, onde a genealogia das
demandas de gênero é registrada
desde o final do século XIX.
Embora não haja consenso
sobre a gênese do movimento
feminino/feminista organizado,
convenciona se que o final do século
m que as questões
de gênero, a luta pela equidade e a
reflexão sobre o papel das mulheres
passam a ganhar espaço na pauta
política. A partir dessa época as
postulações relacionadas aos direitos
de mulheres começam a ocorrer de
maneira mais estruturada, com
a
criação de entidades coletivas e o
surgimento de demandas uniformes,
bem como de esforços teóricos para
dar sustentação às cobranças políticas
relacionadas à sua situação social
Aos ciclos de mobilização das
mulheres, surgidos nos países do
, convencionou
-se chamar
se aqui a divisão entre Norte e Sul em
vez da classificação entre Primeiro e Terceiro
se na atual d
ivisão
das ordens nacional e internacional provocada
pelo processo de globalização neoliberal e os
movimentos de posicionamento político e
social para além da ideia civil globa
l.
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
“ondas do feminismo,
contextualizando tempos de
efervescência ativa e reflexiva em que
questões específicas dominaram o
debate social. A primeira onda data do
final do século XIX. Alves e Pitanguy
(1981) classificam esse cicl
ações contra o capitalismo estatal,
marcado pelos movimentos sufragista
e operário. Sob a inspiração da
Revolução Francesa, em especial na
França tem por fundamento a
reivindicação de direitos a partir da
discrepância entre os prinpios
universa
is de igualdade e a realidade
de desigual divisão de poderes entre
homens e mulheres.
Nos Estados Unidos e na
Europa, a segunda onda se
desenvolve nos anos 1960 a 1990.
Detecta-
se, nos países do Norte, três
vertentes da segunda onda: a corrente
igualitária
, com foco na igualdade de
direitos políticos, educacionais e na
esfera do trabalho; a corrente radical,
centrada na libertação da mulher da
obrigatoriedade do papel e deveres
biológicos e de subalternidade; e a
corrente da feminitude, com foco nos
problem
as de ética e de identidade do
sujeito feminino.
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
ondas do feminismo”,
contextualizando tempos de
efervescência ativa e reflexiva em que
questões específicas dominaram o
debate social. A primeira onda data do
final do culo XIX. Alves e Pitanguy
(1981) classificam esse cicl
o como de
ações contra o capitalismo estatal,
marcado pelos movimentos sufragista
e operário. Sob a inspiração da
Revolução Francesa, em especial na
França tem por fundamento a
reivindicação de direitos a partir da
discrepância entre os princípios
is de igualdade e a realidade
de desigual divio de poderes entre
Nos Estados Unidos e na
Europa, a segunda onda se
desenvolve nos anos 1960 a 1990.
se, nos países do Norte, três
vertentes da segunda onda: a corrente
, com foco na igualdade de
direitos políticos, educacionais e na
esfera do trabalho; a corrente radical,
centrada na libertação da mulher da
obrigatoriedade do papel e deveres
biológicos e de subalternidade; e a
corrente da feminitude, com foco nos
as de ética e de identidade do
Fruto do pós-
guerra, a segunda
onda pode ser classificada como a do
feminismo contra o capitalismo
militarizado. Marcado pelo movimento
da contracultura, baseia
principalmente pela reivindicação por
espaç
o na esfera pública, que gera um
projeto intelectual e político para o
pensamento e ação.
O movimento
foi um fenômeno
cultural antissistema
que
se desenvolveu em grande parte
do mundo
ocidental entre
década de 1960 e meados da década
de 1970. O movimento agregado
ganhou ímpeto à medida que
Movimento
dos Direitos
continuava
a crescer e, com a
expansão
da extensa intervenção
militar do governo
estadunidense no
Vietnã
. À medida que os anos 1960
avançavam
, tensões
generalizadas também
desenvolveram em relação a outras
questões, e tendiam a fluir ao longo
das linhas geracionais em relação à
sexualidade humana,
mulheres, aos
modos tradicionais de
autoridade, experimentação
drogas
psicoativas e
interpretações do que seria a
verdadeira realização pessoal.
198
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
guerra, a segunda
onda pode ser classificada como a do
feminismo contra o capitalismo
militarizado. Marcado pelo movimento
da contracultura, baseia
-se
principalmente pela reivindicação por
o na esfera pública, que gera um
projeto intelectual e político para o
O movimento
da contracultura
cultural antissistema
se desenvolveu em grande parte
ocidental entre
meados da
década de 1960 e meados da década
de 1970. O movimento agregado
ganhou ímpeto à medida que
o
dos Direitos
Civis dos EUA
a crescer e, com a
da extensa intervenção
estadunidense no
. À medida que os anos 1960
, tensões
sociais
generalizadas também
se
desenvolveram em relação a outras
questões, e tendiam a fluir ao longo
das linhas geracionais em relação à
sexualidade humana,
aos direitos das
modos tradicionais de
autoridade, experimentação
com
psicoativas e
diferentes
interpretações do que seria a
verdadeira realização pessoal.
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
A afluência
do
permitiu
que grande parte da geração
da contracultura pensasse além das
necessidades materiais da vida que
preocuparam tantos
seus pais
eras anteriores. E
sse momento gerou
um número sem precedentes de
jovens potencialmente insatisfeitos
como possíveis participantes dessa
sociedade e denunciavam o
autoritarismo das
democráticas”. Foram colocados em
discussão processos de
contracepção
e a pílula, nudez pública
, normalização
do sexo antes
do
homossexualidade e
legalização
aborto.
Muitos movimentos
importantes relacionados a essas
questões nasceram e avançaram nas
décadas seguintes.
A segunda onda do movimento
de mul
heres nos países centrais
permitiu que se aprofundasse o debate
sobre o papel das mulheres que, para
além da biologia, tinham algo em
comum, nomeadamente uma história
violenta de danos e excluo que as
marginalizava, as definia como
pessoas inferiores, ex
cluídas da
participação pública, e as expunha à
violência cotidiana. Um grande
catalisador para essas
discuses foi
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
do
pós-guerra
que grande parte da geração
da contracultura pensasse além das
necessidades materiais da vida que
seus pais
nas
sse momento gerou
um número sem precedentes de
jovens potencialmente insatisfeitos
como posveis participantes dessa
sociedade e denunciavam o
autoritarismo das
sociedades
democráticas. Foram colocados em
contracepção
, normalização
do
casamento,
legalização
do
Muitos movimentos
importantes relacionados a essas
questões nasceram e avançaram nas
A segunda onda do movimento
heres nos países centrais
permitiu que se aprofundasse o debate
sobre o papel das mulheres que, para
além da biologia, tinham algo em
comum, nomeadamente uma história
violenta de danos e exclusão que as
marginalizava, as definia como
cluídas da
participação pública, e as expunha à
violência cotidiana. Um grande
discussões foi
justamente o citado trabalho de
Simone de Beauvoir. As suas
perguntas ainda estavam pertinentes
O que é uma mulher
mulher é a outra?
A diferença entre os sexos, que
ao mesmo tempo serve de justificativa
para a opressão das mulheres, não é
natural, mas cultural.
mulheres como o sexo oposto pode
ser explicada a partir dos conceitos
morais, normas e costumes
predominantes de uma cultura
acordo com essa concepção, não
existe algo como tipicamente
masculino” ou “tipicamente feminino,
mas
apenas diferenças de
comportamento entre os sexos
baseadas na socialização específica
de gênero e na divisão de tarefas
objetivo dessa luta pela emancipação
seria a abolição de todas as injustiças
e diferenças sociais espeficas de
gênero, a fim de
pessoas vivessem de acordo com
suas habilidades e preferências
individuais, em vez de se adequarem à
papéis de gênero socialmente
prescritos.
Em sua obra, Beauvoir
exorta as mulheres a não se
contentarem com sua condição de
complemento d
o homem e a
199
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
justamente o já citado trabalho de
Simone de Beauvoir. As suas
perguntas ainda estavam pertinentes
:
O que é uma mulher
? Por que a
A diferença entre os sexos, que
ao mesmo tempo serve de justificativa
para a opressão das mulheres, não é
A construção das
mulheres como o sexo oposto pode
ser explicada a partir dos conceitos
morais, normas e costumes
predominantes de uma cultura
. De
acordo com essa concepção, não
existe algo como “tipicamente
masculino ou tipicamente feminino”,
apenas diferenças de
comportamento entre os sexos
baseadas na socialização específica
de gênero e na divisão de tarefas
. O
objetivo dessa luta pela emancipação
seria a abolição de todas as injustiças
e diferenças sociais específicas de
gênero, a fim de
permitir que as
pessoas vivessem de acordo com
suas habilidades e preferências
individuais, em vez de se adequarem à
papéis de gênero socialmente
Em sua obra, Beauvoir
exorta as mulheres a não se
contentarem com sua condição de
o homem e a
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
reivindicarem sua igualdade na
sociedade em todos os aspectos, ao
mesmo tempo em que busca
desmitificar a maternidade e defende o
direito ao aborto.
Um livro da americana
Friedman
, por sua vez, marca um novo
debate nos movimentos internacionais.
Friedman
delineia uma análise crítica
da sociedade norte-
americana
que a publicidade, os meios de
comunicação de massa e outras
instituições de transmissão de
ideologia trazem
a ideia de uma
existência plena como dona de casa e
mãe. Por meio de inúmeras
entrevistas, a pesquisadora mostra
quão pouco essa ideologia
correspondia à experiência real das
mulheres.
Friedman viu a redução ao
papel de donas de casa e mães como
a causa d
o descontentamento e
insatisfação de muitas das mulheres
de classe média. Ela defende que uma
mulher poderia alcançar a si
mesma se também considerasse suas
próprias necessidades. Assim,
encontra a chave central para a
autoliberação no emprego das
mulhe
res, embora isso o exclua o
casamento e a maternidade.
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
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(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
reivindicarem sua igualdade na
sociedade em todos os aspectos, ao
mesmo tempo em que busca
desmitificar a maternidade e defende o
Um livro da americana
Betty
, por sua vez, marca um novo
debate nos movimentos internacionais.
delineia uma análise crítica
americana
. Mostra
que a publicidade, os meios de
comunicação de massa e outras
instituições de transmissão de
a ideia de uma
existência plena como dona de casa e
mãe. Por meio de inúmeras
entrevistas, a pesquisadora mostra
quão pouco essa ideologia
correspondia à experiência real das
Friedman viu a redução ao
papel de donas de casa e mães como
o descontentamento e
insatisfação de muitas das mulheres
de classe média. Ela defende que uma
mulher poderia alcançar a si
mesma se também considerasse suas
próprias necessidades. Assim,
encontra a chave central para a
autoliberação no emprego das
res, embora isso não exclua o
casamento e a maternidade.
Os debates ocorridos na
segunda onda do movimento de
mulheres levam literalmente à
“redescoberta” de problemas como
estupro, violência doméstica e abuso
sexual. Coletivos e organizações de
mulheres p
assam a discutir
publicamente assuntos privados;
mostram seus hematomas, cuidam
das vítimas e nomeiam os
perpetradores.
Ativistas de vários
grupos criam instalações de proteção,
como chamadas
de emergência,
abrigos para mulheres e cursos de
autodefesa.
Por outro lado, grupos
progressistas e vinculados à
transformação social continuam a ver
a questão das mulheres como uma
contradição secundária. A luta
primordial seria contra a desigualdade
socioeconômica
que geraria por si
as outras contra
dições. A principal
questão a ser resolvida seria aquela
entre trabalho assalariado e capital
que, por consequência, resolveria e
aboliria a opressão às mulheres, já
que essas movimentações se
estabeleceriam por si mesmas. Não
valeria a pena fundar grupos
específicos para discutir a questão
feminina, mas sim recrutá
200
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Os debates ocorridos na
segunda onda do movimento de
mulheres levam literalmente à
redescoberta de problemas como
estupro, violência doméstica e abuso
sexual. Coletivos e organizações de
assam a discutir
publicamente assuntos privados;
mostram seus hematomas, cuidam
das vítimas e nomeiam os
Ativistas de vários
grupos criam instalações de proteção,
de emergência,
abrigos para mulheres e cursos de
Por outro lado, grupos
progressistas e vinculados à
transformação social continuam a ver
a questão das mulheres como uma
contradição secundária”. A luta
primordial seria contra a desigualdade
que geraria por si
dições. A principal
questão a ser resolvida seria aquela
entre trabalho assalariado e capital
que, por consequência, resolveria e
aboliria a opressão às mulheres,
que essas movimentações se
estabeleceriam por si mesmas. Não
valeria a pena fundar grupos
espeficos para discutir a questão
feminina, mas sim recrutá
-las para a
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
luta maior contra os valores do
capitalismo dominante.
Contra esse argumento levanta
se o exemplo do patriarcado como
uma relação fundamental de
exploração e opressão, visto que
ocor
re como uma constante em quase
todas as formações sociais, inclusive
as socialistas.
Está, portanto, acima da
contradição de classe.
Essa discussão
apela ao combate imediato contra o
patriarcado, sem esperar por uma
revolução socialista que o estiv
na ordem do dia.
Nos debates
culturais, analisa-
se até os mitos
antropológicos e religiosos que
justificam a opressão das mulheres
produção cultural também é atacada,
revelando a humilhação e a submissão
das mulheres com o seu erotismo
patriarcal.
Com esse último tópico
surge assim o debate sobre a relação
entre a sexualidade e a pornografia.
Imaginem. Como seria possível
determ
inar a paternidade e
manter o princípio de herança
familiar, se a mulher resolvesse
sair do controle masculino e se
apoderar de seu corpo, de sua
liberdade sexual e de expressão?
Sair do “tal lugar de mulher? Sair
do lugar da culpa, da dívida, da
mutilaçã
o, da burka? Sair da Eva
e também da Cinderela, da
Branca de Neve, da Barbie?
(VANNUCCI, 2010, p. 108)
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
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(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
luta maior contra os valores do
Contra esse argumento levanta
-
se o exemplo do patriarcado como
uma relação fundamental de
exploração e opreso, visto que
re como uma constante em quase
todas as formações sociais, inclusive
Está, portanto, acima da
Essa discussão
apela ao combate imediato contra o
patriarcado, sem esperar por uma
revolução socialista que não estiv
esse
Nos debates
se até os mitos
antropológicos e religiosos que
justificam a opressão das mulheres
. A
produção cultural também é atacada,
revelando a humilhação e a submissão
das mulheres com o seu erotismo
Com esse último tópico
surge assim o debate sobre a relação
entre a sexualidade e a pornografia.
Imaginem. Como seria possível
inar a paternidade e
manter o prinpio de herança
familiar, se a mulher resolvesse
sair do controle masculino e se
apoderar de seu corpo, de sua
liberdade sexual e de expressão?
Sair do tal lugar de mulher”? Sair
do lugar da culpa, da dívida, da
o, da burka? Sair da Eva
e também da Cinderela, da
Branca de Neve, da Barbie?
(VANNUCCI, 2010, p. 108)
O mundo contemporâneo, já
herdeiro das questões levantadas por
essa história de luta e resistência,
apresenta outro desafio. Com a
ascensão do
neolibera
processo de conscientização torna
mais difícil pois, segundo alguns
autores, o movimento das mulheres
está caindo como uma marionete no
modelo do novo capitalismo
desregulamentado.
Dentro do sistema
neoliberal, os esforços do movimento
das m
ulheres por mais participação no
mercado de trabalho acabaram
levando a um aumento das horas
trabalhadas por família, juntamente
com a queda simultânea nos salários e
co
ndições de trabalho prerias.
muitos
, as mulheres não foram
integradas ao merc
ado de trabalho por
razões emancipatórias, mas apenas
para aumentar o crescimento
econômico.
Essas estruturas hierárquicas e
dogmáticas, dentro também dos
próprios setores engajados, abafaram
muitas vezes o potencial rebelde das
questões femininas, como
sufocaram.
O movimento de mulheres
e outros grupos que lutam por
cidadania buscam então se reinventar
e buscar caminhos onde poderiam
201
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
O mundo contemporâneo,
herdeiro das questões levantadas por
essa história de luta e resistência,
apresenta outro desafio. Com a
neolibera
lismo, o
processo de conscientização torna
-se
mais difícil pois, segundo alguns
autores, o movimento das mulheres
está caindo como uma marionete no
modelo do novo capitalismo
Dentro do sistema
neoliberal, os esforços do movimento
ulheres por mais participação no
mercado de trabalho acabaram
levando a um aumento das horas
trabalhadas por família, juntamente
com a queda simultânea nos salários e
ndições de trabalho precárias.
Para
, as mulheres o foram
ado de trabalho por
razões emancipatórias, mas apenas
para aumentar o crescimento
Essas estruturas hierárquicas e
dogmáticas, dentro também dos
próprios setores engajados, abafaram
muitas vezes o potencial rebelde das
questões femininas, como
também as
O movimento de mulheres
e outros grupos que lutam por
cidadania buscam então se reinventar
e buscar caminhos onde poderiam
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
contemplar suas próprias questões. A
luta dessas mulheres passa a ser,
além de convencer a população que
segu
ia os padrões da sociedade
dominante, o convencimento dos
próprios grupos sociais engajados.
Esse é o cenário da terceira
onda de organização das mulheres
nos países centrais, nos anos 1990,
que envolve a nova fase do
capitalismo neoliberal relacionada ao
processo de globalização do capital. É
no seio da terceira onda que Butler,
em 1990, desenvol
ve a teoria de
gênero enquanto
performance/performatividade (que
rompe o paradigma da divio entre
natural e social, sexo e gênero).
Butler (2003) define a terceira
onda como de reconhecimento de que
as opressões atingem as mulheres de
modos diferentes.
a desconstrução
da categoria “mulher” como um sujeito
coletivo unificado que partilha as
mesmas opressões, os mesmos
problemas e a mesma história. Trata
se de reivindicar a diferença dentro da
diferença. Desse princípio surgem
conceitos de redes e
inter
seccionalidades do feminino com
questões étnicas, sexuais, etárias e de
renda.
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
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resistências, disputas e potências
contemplar suas próprias questões. A
luta dessas mulheres passa a ser,
além de convencer a população que
ia os padrões da sociedade
dominante, o convencimento dos
próprios grupos sociais engajados.
Esse é o cenário da terceira
onda de organização das mulheres
nos países centrais, nos anos 1990,
que envolve a nova fase do
capitalismo neoliberal relacionada ao
processo de globalização do capital. É
no seio da terceira onda que Butler,
ve a teoria de
gênero enquanto
performance/performatividade (que
rompe o paradigma da divisão entre
natural e social, sexo e gênero).
Butler (2003) define a terceira
onda como de reconhecimento de que
as opressões atingem as mulheres de
Há a desconstrução
da categoria mulher como um sujeito
coletivo unificado que partilha as
mesmas opressões, os mesmos
problemas e a mesma história. Trata
-
se de reivindicar a diferença dentro da
diferença. Desse prinpio surgem
conceitos de redes e
seccionalidades do feminino com
questões étnicas, sexuais, etárias e de
O reconhecimento da
diversidade aponta para
especificidades das mulheres negras e
indígenas e o racismo, da não
imposição da heteroafetividade e a
violência de identidade sexua
exploração no trabalho que vitima
operárias e trabalhadoras rurais, em
oposição ao essencialismo e
universalidade verificados até então. A
reivindicação da diferença dentro da
diferença também abre olhares para o
outro, a outra distante, geográfica e
culturalmente. As mulheres dos países
centrais se veem diante de questões
até então inexistentes para elas: o que
a “diferente” tem a falar e que
ouvir? O que corpos distintos e suas
expressões africanas, indígenas,
latino-
americanas têm a ensinar
A América Latina e a condição da
mulher
No caso da América Latina, a
condição era e é
baseada em extremos. As mulheres
poderiam estar em grandes centros
urbanos e fazer parte de uma rede de
informações ocasionada, no mínimo,
pel
as precárias condições de trabalho
e pela cultura de massa, ou poderiam
estar ainda em situações rurais que
202
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
O reconhecimento da
diversidade aponta para
especificidades das mulheres negras e
indígenas e o racismo, da não
imposição da heteroafetividade e a
violência de identidade sexua
l e a
exploração no trabalho que vitima
operárias e trabalhadoras rurais, em
oposição ao essencialismo e
universalidade verificados até então. A
reivindicação da diferença dentro da
diferença também abre olhares para o
outro, a outra distante, geográfica e
culturalmente. As mulheres dos países
centrais se veem diante de questões
até então inexistentes para elas: o que
a diferente tem a falar e que
se deve
ouvir? O que corpos distintos e suas
expressões africanas, indígenas,
americanas têm a ensinar
?
A América Latina e a condição da
No caso da América Latina, a
muito mais difícil,
baseada em extremos. As mulheres
poderiam estar em grandes centros
urbanos e fazer parte de uma rede de
informações ocasionada, no mínimo,
as precárias condições de trabalho
e pela cultura de massa, ou poderiam
estar ainda em situações rurais que
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
lembravam os antigos padrões do
período colonial ibérico. Situação essa
muito semelhante às periferias das
grandes cidades. Além de pensarem
na situ
ação da mulher no mundo,
ainda tinham que superar condições
não mais existentes em países da
América do Norte ou da Europa
ocidental.
Considera-
se que no continente
latino-
americano, as ações das
mulheres, para além de um sistema
simbólico que reúne um co
ações estruturadas e estruturantes de
caráter de gênero/sexo, tem papel
fundamental na desconstrução dos
processos de exploração e dominação.
Por suas características é uma
categoria a ser inserida no movimento
de decolonialidade do poder e da
cu
ltura, que conforme Aníbal Quijano
(1997) pode se expressar em
subversão radical e massiva, que
conduz a uma revolução.6
6
Quijano diferencia colonialidade de
colonialismo. O segundo refere-
se
estri
tamente a uma estrutura de
dominação/exploração em que o controle da
autoridade política, dos recursos de produção
e do trabalho de uma população determinada
domina outra de diferente identidade e cujas
sedes centrais estão, além disso, localizadas
em outr
o local. Ou seja, o colonialismo revela
uma relação política e econômica, na qual a
soberania de um povo depende do poder de
um outro povo ou nação. Já a colonialidade,
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
lembravam os antigos padrões do
período colonial ibérico. Situação essa
muito semelhante às periferias das
grandes cidades. Além de pensarem
ação da mulher no mundo,
ainda tinham que superar condições
não mais existentes em países da
América do Norte ou da Europa
se que no continente
americano, as ações das
mulheres, para além de um sistema
simbólico que reúne um co
njunto de
ações estruturadas e estruturantes de
caráter de gênero/sexo, tem papel
fundamental na desconstrução dos
processos de exploração e dominação.
Por suas características é uma
categoria a ser inserida no movimento
de decolonialidade do poder e da
ltura, que conforme Aníbal Quijano
(1997) pode se expressar em
subvero radical e massiva, que
Quijano diferencia colonialidade de
se
tamente a uma estrutura de
dominação/exploração em que o controle da
autoridade política, dos recursos de produção
e do trabalho de uma população determinada
domina outra de diferente identidade e cujas
sedes centrais estão, além disso, localizadas
o local. Ou seja, o colonialismo revela
uma relação política e econômica, na qual a
soberania de um povo depende do poder de
um outro povo ou nação. Já a colonialidade,
Quijano detecta que a
colonialidade
do poder surge com a
colonização, quando o homem branco
questiona se os indígenas tinham ou
não alma. O mesmo se aplica aos
negros, mestiços, e de forma ainda
mais acentuada às mulheres, desde
sempre consideradas sujeitos
inferiores e sem capacidade de
pe
nsamento e de expressão. Assim,
elas são seres inviveis em uma
escala vertical de validação de uma
suposta humanidade completa.
O aspecto relacional homem
versus
mulher que fundamenta a
relação de gênero, cujo conceito nasce
nos países ocidentais hegemô
não consegue abarcar a complexidade
da América Latina, continente
multirracial e pluricultural, em que a
colonização impôs uma forma de
distinção muito mais avançada
cruel: a do humano
humano. Não foi à toa que a
colonização da Amér
que tem na América Latina um eixo central,
implica relações racistas e androcêntricas d
poder, sendo mais profunda e duradoura que o
colonialismo. Sustenta-
se na imposição de
uma classificação, primordialmente racial e
étnica da população, como pedra angular do
referido padrão de poder e opera em cada um
dos planos, meios e dimensões, mater
subjetivos, da existência social cotidiana e de
escala social.
203
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Quijano detecta que a
do poder surge com a
colonização, quando o homem branco
questiona se os indígenas tinham ou
não alma. O mesmo se aplica aos
negros, mestiços, e de forma ainda
mais acentuada às mulheres, desde
sempre consideradas sujeitos
inferiores e sem capacidade de
nsamento e de expressão. Assim,
elas o seres invisíveis em uma
escala vertical de validação de uma
suposta humanidade completa.
O aspecto relacional homem
mulher que fundamenta a
relação de gênero, cujo conceito nasce
nos países ocidentais hegemô
nicos,
não consegue abarcar a complexidade
da América Latina, continente
multirracial e pluricultural, em que a
colonização impôs uma forma de
distinção muito mais avançada
e
cruel: a do humano
versus o o
humano. Não foi à toa que a
colonização da Amér
ica Latina e
que tem na América Latina um eixo central,
implica relações racistas e androcêntricas d
e
poder, sendo mais profunda e duradoura que o
se na imposição de
uma classificação, primordialmente racial e
étnica da população, como pedra angular do
referido padrão de poder e opera em cada um
dos planos, meios e dimensões, mater
iais e
subjetivos, da existência social cotidiana e de
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
Caribe tentou negar o caráter humano
do colonizado a serviço do homem
ocidental, mesmo após a publicação
da bula papal
Sublimis Deo
em 1537 pelo Papa Paulo III, que
determinou que os indígenas o
seres capazes de compreender a fé
cristã, portanto humanos. A mesma
lógica foi aplicada em outras distinções
hierárquicas, entre elas as referentes a
homens e mulheres, neste caso as
mulheres brancas. Lugones (2014)
exemplifica:
A missão civilizadora colonial
era a máscara eufemística do
acesso brutal aos corpos das
pessoas através de uma
exploração inimaginável de
violações sexuais, do controle da
reprodução e o terror sistemático
(alimentando cachorros com
pessoas vivas ou fazendo bolsas
e chapéus das vaginas de
mulheres indígenas bruta
assassinadas, por exemplo).
(LUGONES, 2014, p. 937)
A resistência das mulheres da
América Latina, consideradas como
não-
seres humanos, percorreu
caminho distinto daquele das mulheres
dos países centrais. A gênese do
movimento feminino/feminista lat
americano teve a marca da luta pela
igualdade política, expressa no direito
ao voto. Foi organizada por mulheres
das classes médias e altas, com
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
Caribe tentou negar o caráter humano
do colonizado a serviço do homem
ocidental, mesmo após a publicação
Sublimis Deo
, emitida
em 1537 pelo Papa Paulo III, que
determinou que os indígenas são
seres capazes de compreender a fé
cristã, portanto humanos. A mesma
lógica foi aplicada em outras distinções
hierárquicas, entre elas as referentes a
homens e mulheres, neste caso as
mulheres brancas. Lugones (2014)
A miso civilizadora” colonial
era a máscara eufemística do
acesso brutal aos corpos das
pessoas através de uma
exploração inimaginável de
violações sexuais, do controle da
reprodução e o terror sistemático
(alimentando cachorros com
pessoas vivas ou fazendo bolsas
e chapéus das vaginas de
mulheres indígenas bruta
lmente
assassinadas, por exemplo).
(LUGONES, 2014, p. 937)
A resistência das mulheres da
América Latina, consideradas como
seres humanos, percorreu
caminho distinto daquele das mulheres
dos países centrais. A gênese do
movimento feminino/feminista lat
ino-
americano teve a marca da luta pela
igualdade política, expressa no direito
ao voto. Foi organizada por mulheres
das classes médias e altas, com
preponderância de filhas de políticos e
intelectuais que tiveram a chance de
estudar em outros países. O
po
sicionamento social gerou um
caráter internacionalista do
movimento, configurado na
participação de encontros
internacionais e culminando com a
realização do Primeiro Congresso
Feminino, em 1910, em Buenos Aires,
e da Conferência Internacional dos
Estad
os Americanos, em 1928, em
Havana, Cuba, em que foi criada a
Comissão Interamericana da Mulher.
Nesta fase o o consideradas as
lutas das mulheres no cenário do fim
da escravidão negra e das indígenas
no mundo hispano-
americano contra
os latifundiários
que começam a
consolidar as formas de coronelismo.
Na segunda metade do culo
XX, a América Latina viveu a reação
política conservadora das ditaduras
militares que se instalaram em países
“em desenvolvimento e que
entendiam qualquer forma de crítica ou
contestação às normas sociais como
rebeldia. Os regimes militares latino
americanos são particularmente
importantes para entender o
desenvolvimento político do
continente: são caracterizados
204
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
preponderância de filhas de políticos e
intelectuais que tiveram a chance de
estudar em outros países. O
sicionamento social gerou um
caráter internacionalista do
movimento, configurado na
participação de encontros
internacionais e culminando com a
realização do Primeiro Congresso
Feminino, em 1910, em Buenos Aires,
e da 6ª Conferência Internacional dos
os Americanos, em 1928, em
Havana, Cuba, em que foi criada a
Comissão Interamericana da Mulher.
Nesta fase não o consideradas as
lutas das mulheres no cenário do fim
da escravidão negra e das indígenas
americano contra
que começam a
consolidar as formas de coronelismo.
Na segunda metade do século
XX, a América Latina viveu a reação
política conservadora das ditaduras
militares que se instalaram em países
em desenvolvimento” e que
entendiam qualquer forma de crítica ou
contestação às normas sociais como
rebeldia. Os regimes militares latino
-
americanos o particularmente
importantes para entender o
desenvolvimento político do
continente: o caracterizados
pela
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
repressão da oposição
política
meio de medidas violen
tortura,
assassinatos
"desaparecimento
" de pessoas
politicamente ativas. A legitimação do
poder é propagada contra uma
suposta ameaça ao
Estado
sociedade promovida
pelos chamado
grupos antissistema ou
subversivos
que via de r
egra, mas não só,
pertenceriam à luta política de
esquerda.
As ditaduras militares
apareciam como supostas salvadoras
do Estado, da economia e da cultura e
promoviam um discurso de ordem e
manutenção dos costumes sociais
tradicionais. Não lidavam bem co
liberação dos costumes dos anos 1960
e dos debates teóricos promovidos
pela contracultura. A nação deveria ser
"reorganizada" de acordo com os
ideais cristãos ultraconservadores e
depois "devolvida" à democracia.
elementos essenciais dessa vio de
mundo estariam no tradicionalismo
católico, na educação escolar baseada
na autoridade, em valores norte
americanos e europeus de civilização
(o que deixava exposto o racismo) e o
anticomunismo.
Por conta disso,
as mulheres
latino-
americanas não surfaram na
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
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(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
política
por
meio de medidas violen
tas como
assassinatos
e o
" de pessoas
politicamente ativas. A legitimação do
poder é propagada contra uma
Estado
e à
pelos chamado
s
subversivos
,
egra, mas não só,
pertenceriam à luta política de
As ditaduras militares
apareciam como supostas salvadoras
do Estado, da economia e da cultura e
promoviam um discurso de ordem e
manutenção dos costumes sociais
tradicionais. Não lidavam bem co
m a
liberação dos costumes dos anos 1960
e dos debates teóricos promovidos
pela contracultura. A nação deveria ser
"reorganizada" de acordo com os
ideais cristãos ultraconservadores e
depois "devolvida" à democracia.
Os
elementos essenciais dessa visão de
mundo estariam no tradicionalismo
católico, na educação escolar baseada
na autoridade, em valores norte
-
americanos e europeus de civilização
(o que deixava exposto o racismo) e o
as mulheres
americanas não surfaram na
segunda onda do feminismo central.
Sua articulação esteve ligada à
resistência às ditaduras, conforme
Doris Lamus
Canavae (2009):
O perfil organizacional nos anos
1970 a 1980 estava relacionado
ao ambiente
político que envolvia
os movimentos sociais
progressistas em um período de
repressivos regimes militares
(Argentina, Brasil, Chile, Peru e
Uruguai) e as democracias
formais restritas ou de
autoritarismo civil que se
estendiam pelo continente. Em tal
conte
xto, não apenas desafiavam
o patriarcado e seu modelo de
dominação estatal militarista mas
também denunciavam, junto com
outras correntes da oposição, a
opressão e a exploração
econômica e política. (LAMUS
CANAVAE, 2009, p. 99).
Nos anos 1970, destaca
papel de resistência política das
mulheres aos regimes políticos da
região, à clandestinidade da sociedade
civil e aos condicionamentos da
esquerda revolucionária a que elas
estavam vinculadas. Mas há pouco
registro, por exemplo
das indígenas e negras que
assumiram todas as tarefas de suas
comunidades depois que os homens
se juntaram (ou foram obrigados a se
juntar) à luta armada, sofrendo
inclusive violência sexual de ambas as
partes do conflito.
205
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
segunda onda do feminismo central.
Sua articulação esteve ligada à
resistência às ditaduras, conforme
Canavae (2009):
O perfil organizacional nos anos
1970 a 1980 estava relacionado
político que envolvia
os movimentos sociais
progressistas em um período de
repressivos regimes militares
(Argentina, Brasil, Chile, Peru e
Uruguai) e as democracias
formais restritas ou de
autoritarismo civil que se
estendiam pelo continente. Em tal
xto, não apenas desafiavam
o patriarcado e seu modelo de
dominação estatal militarista mas
também denunciavam, junto com
outras correntes da oposição, a
opressão e a exploração
econômica e política. (LAMUS
CANAVAE, 2009, p. 99).
Nos anos 1970, destaca
-se o
papel de resistência política das
mulheres aos regimes políticos da
região, à clandestinidade da sociedade
civil e aos condicionamentos da
esquerda revolucionária a que elas
estavam vinculadas. Mas pouco
registro, por exemplo
, sobre o papel
das indígenas e negras que
assumiram todas as tarefas de suas
comunidades depois que os homens
se juntaram (ou foram obrigados a se
juntar) à luta armada, sofrendo
inclusive violência sexual de ambas as
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
Na América Latin
movimentação da resistência das
mulheres, no que poderia ser
classificado como “terceira onda,
ganha fôlego no cenário de
redemocratização das nações, da
revisão do papel do Estado e das
subsequentes crises fiscais, e sob
impacto das consequências da
implantação de projetos neoliberais.
Essa linha do tempo estende
ascensão de governos progressistas
liberais da América Latina nos
primeiros anos do século XXI. Verifica
se uma ênfase sobre processos de
institucionalização e discussão das
diferenças intragênero.
Defrontando-
se com novas
maneiras de se organizar
coletivamente, as mulheres passam
por “novas” articulações de resistência.
Alvarez (2003, p. 548) observa que,
como resposta às dificuldades do
contexto marcado pelo
empobrecimento e violênc
contraste à face branca/mestiça e de
classe média do movimento de
mulheres nos seus primeiros tempos,
nos anos 1980 floresce uma
composição predominante de
mulheres pobres, trabalhadoras, e/ou
negras e indígenas. Ao mesmo tempo,
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
Na América Latin
a, a
movimentação da resistência das
mulheres, no que poderia ser
classificado como terceira onda”,
ganha fôlego no cenário de
redemocratização das nações, da
revio do papel do Estado e das
subsequentes crises fiscais, e sob
impacto das consequências da
implantação de projetos neoliberais.
Essa linha do tempo estende
-se até
ascensão de governos progressistas
liberais da América Latina nos
primeiros anos do culo XXI. Verifica
-
se uma ênfase sobre processos de
institucionalização e discussão das
se com novas
maneiras de se organizar
coletivamente, as mulheres passam
por novas articulações de resistência.
Alvarez (2003, p. 548) observa que,
como resposta às dificuldades do
contexto marcado pelo
empobrecimento e violênc
ia, em
contraste à face branca/mestiça e de
classe média do movimento de
mulheres nos seus primeiros tempos,
nos anos 1980 floresce uma
composição predominante de
mulheres pobres, trabalhadoras, e/ou
negras e indígenas. Ao mesmo tempo,
despontam ações que
a complexidade da existência
feminina, com a sensibilidade para as
relações com o Cosmo, a terra, com
os seres vivos e o inorgânico, entes
cuja expressividade erótica, estética e
linguística, cujos saberes, noções de
espaço, expectativas, pr
instituições e formas existir não eram
para ser simplesmente substituídas,
mas sim encontradas. Essas ações
são sistematizadas em uma frase da
artista aimará boliviana Julieta
Paredes Carvajal: Nós mulheres
somos metade do todo:
Essas condições e
compartilhadas por mulheres na África,
Ásia, ou mesmo no leste da Europa
que saía do socialismo. Essas
mulheres precisavam ir além do
debate dos grandes centros da
democracia dos países ocidentais
centrais e entender a sua realidade
próxima de a
utoritarismo proclamado,
censura, machismo tradicional e luta
pela sobrevivência econômica. Como
ex colonizadas, as ativistas
pelos
direitos das mulheres tiveram
que incluir ainda o debate sobre o
eurocentrismo
que vinha sempre
carregado de racismo e discr
na produção intelectual desses
206
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
despontam ações que
levam em conta
a complexidade da existência
feminina, com a sensibilidade para as
relações com o Cosmo, a terra, com
os seres vivos e o inorgânico, entes
cuja expressividade erótica, estética e
linguística, cujos saberes, noções de
espaço, expectativas, pr
áticas,
instituições e formas existir não eram
para ser simplesmente substituídas,
mas sim encontradas. Essas ações
o sistematizadas em uma frase da
artista aimará boliviana Julieta
Paredes Carvajal: “Nós mulheres
somos metade do todo”:
Essas condições e
ram também
compartilhadas por mulheres na África,
Ásia, ou mesmo no leste da Europa
que saía do socialismo. Essas
mulheres precisavam ir além do
debate dos grandes centros da
democracia dos pses ocidentais
centrais e entender a sua realidade
utoritarismo proclamado,
censura, machismo tradicional e luta
pela sobrevivência econômica. Como
ex colonizadas, as ativistas
direitos das mulheres tiveram
que incluir ainda o debate sobre o
que vinha sempre
carregado de racismo e discr
iminação
na produção intelectual desses
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resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
centros. As necessidades espeficas
das mulheres das diferentes regiões
culturais dos países periféricos não
seriam consideradas se o discurso
eurocêntrico continuasse monopo
lizando essa luta e essa fala.
Nos país
es periféricos ainda se
luta por uma maior participação no
mercado de trabalho e a tradição
patriarcal barra ao máximo um
movimento de autodeterminação
sexual.
Mesmo assim, os modelos e
os projetos de vida das mulheres
desses lugares também mudam e
imagens
tradicionais de feminilidade
não combinam mais com aquilo que é
almejado por elas. O reconhecimento
conseguido com muitas dificuldades e
o escândalo público da violência
contra as mulheres promovem a
consciência de alguns grupos
deixando claras as relaçõe
s estruturais
de opressão dessas sociedades. Em
nível internacional, o debate provindo
das mulheres desses países começou
a chamar a atenção. As mulheres do
“terceiro mundo” começaram a criar
muitas e diversas plataformas e
iniciativas que estavam cada vez
conectadas ao redor do globo e
começavam a atrair a atenção mundial
para o tema dos direitos femininos.
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
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(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
centros. As necessidades específicas
das mulheres das diferentes regiões
culturais dos países periféricos não
seriam consideradas se o discurso
eurontrico continuasse monopo
-
lizando essa luta e essa fala.
es periféricos ainda se
luta por uma maior participação no
mercado de trabalho e a tradição
patriarcal barra ao máximo um
movimento de autodeterminação
Mesmo assim, os modelos e
os projetos de vida das mulheres
desses lugares também mudam e
tradicionais de feminilidade
não combinam mais com aquilo que é
almejado por elas. O reconhecimento
conseguido com muitas dificuldades e
o esndalo público da violência
contra as mulheres promovem a
consciência de alguns grupos
s estruturais
de opressão dessas sociedades. Em
nível internacional, o debate provindo
das mulheres desses países começou
a chamar a atenção. As mulheres do
terceiro mundo começaram a criar
muitas e diversas plataformas e
iniciativas que estavam cada vez
mais
conectadas ao redor do globo e
começavam a atrair a atenção mundial
para o tema dos direitos femininos.
Olhares culturais
Pensar a resistência das
mulheres sob a perspectiva cultural
remete a um novo espelho, com
imagem de complexa definição. Para
além das conceituações, várias
vertentes de pensamento convergem
na dimensão societária da cultura, que
não é apenas um significado produzido
para ser decifrado como um "texto",
mas sim um instrumento de
intervenção no mundo e um dispositivo
de poder.
Chau
í (2014) lembra que, até
antes mesmo do Iluminismo as
sociedades passaram a ser avaliadas
segundo a presença ou não de alguns
elementos, cuja auncia indicava
ausência de cultura, introduzindo
assim um conceito de valor para
distinguir formas culturais, l
e justificando a colonização e o
imperialismo. É preciso lembrar que,
desde o início dos tempos, o ser
humano se faz três perguntas
fundamentais
De onde venho?
Quem sou? Para onde vou?
questões que articulam passado,
presente e futuro, ou
origem, da identidade e do destino,
que demandam pensamento,
207
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resistências, disputas e potências
")
Pensar a resistência das
mulheres sob a perspectiva cultural
remete a um novo espelho, com
imagem de complexa definição. Para
além das conceituações, várias
vertentes de pensamento convergem
na dimensão societária da cultura, que
não é apenas um significado produzido
para ser decifrado como um "texto",
mas sim um instrumento de
intervenção no mundo e um dispositivo
í (2014) lembra que, até
antes mesmo do Iluminismo as
sociedades passaram a ser avaliadas
segundo a presença ou não de alguns
elementos, cuja ausência indicava
ausência de cultura, introduzindo
assim um conceito de valor para
distinguir formas culturais, l
egitimando
e justificando a colonização e o
imperialismo. É preciso lembrar que,
desde o início dos tempos, o ser
humano se faz três perguntas
De onde venho?
Quem sou? Para onde vou?
questões que articulam passado,
presente e futuro, ou
seja, sentidos da
origem, da identidade e do destino,
que demandam pensamento,
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Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
sentimento, ato criativo e recriação da
realidade concreta e simbólica.
A pergunta de fundo não está
vinculada às diferenças em relação às
mulheres de várias partes do mundo,
m
as sim às convergências no modo de
ser, estar e viver. As mulheres latino
americanas mostram isso por meio
dos processos de viver e partilhar,
valorizar o ser em lugar do possuir, a
ideia de igualdade relacionada ao
desenvolvimento do bem comum.
Rompem, na
prática, a ideia de que
são limitadas por falta de
conhecimento formal, teórico e
acadêmico, desconsiderando assim o
saber originado da práxis. Essa prática
é expressa pelo corpo e pela voz em
cena
no trabalho, nas ruas, nas
organizações comunitárias, n
palcos.
É inconteste que, nos setores
populares, bairros da periferia, no meio
rural, na rua e no lar, negras,
indígenas e brancas empobrecidas
sempre estiveram vinculadas ao
mundo do trabalho e à violência,
fomentado pelos rescaldos das
ditaduras, desa
parecidos, militares e
paramilitares, guerrilhas e mortes
seletivas, fome, desemprego,
desesperança. Mas é fundamental
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
sentimento, ato criativo e recriação da
realidade concreta e simbólica.
A pergunta de fundo não está
vinculada às diferenças em relação às
mulheres de várias partes do mundo,
as sim às convergências no modo de
ser, estar e viver. As mulheres latino
-
americanas mostram isso por meio
dos processos de viver e partilhar,
valorizar o ser em lugar do possuir, a
ideia de igualdade relacionada ao
desenvolvimento do bem comum.
prática, a ideia de que
o limitadas por falta de
conhecimento formal, teórico e
acadêmico, desconsiderando assim o
saber originado da práxis. Essa prática
é expressa pelo corpo e pela voz em
no trabalho, nas ruas, nas
organizações comunitárias, n
os
É inconteste que, nos setores
populares, bairros da periferia, no meio
rural, na rua e no lar, negras,
indígenas e brancas empobrecidas
sempre estiveram vinculadas ao
mundo do trabalho e à violência,
fomentado pelos rescaldos das
parecidos, militares e
paramilitares, guerrilhas e mortes
seletivas, fome, desemprego,
desesperança. Mas é fundamental
lembrar que a resistência criou redes
de acolhimento e solidariedade, ações
de partilha, produções culturais
compartilhadas, busca do
rec
onhecimento de saber e construção
de uma cultura de paz.
Não se trata de carta de
intenções. Na arte, vale o prinpio
defendido por Boal ao falar de teatro,
em que interagem em condições de
igualdade o ator e o espectador,
considerado por ele como o gran
ator social, pois tem o livre arbítrio em
escolher o seu destino.
Essa é a fundamentação do
Teatro do Oprimido7
. Boal dá a deixa
para a arte em cena das mulheres ao
afirmar que, ao ver o mundo além das
7
O Teatro do Oprimido começou a ser
gestado após a prisão, tortura e expulo de
Augusto Boal pela ditadura militar brasileira,
em 1971. Durante a primeira fase de exílio
(1971-1976),
em cinco países da América
Latina (sequencialmente Argentina, Peru,
Colômbia, Venezuela e Bolívia), e depois na
França (1979-
1986), Boal desenvolve
experiências que combinam o fazer político
com o fazer teatral, por meio de diversas
técnicas teatrais. O ob
jetivo do método é fazer
o público (considerado ator) repensar a
realidade e reformulá-
la, uma vez que se
conscientize que a sociedade está dividida
entre opressores e oprimidos. Depois disso
estará apto a assumir seu real papel,
passando a ser sujeito da
social. Para que o processo se concretize, é
proposto um novo conceito de autoria, em que
o ator é destituído de seu papel de profissional
de arte para a criação de um espaço de
transformação comunitária e de escrita
coletiva do mundo.
208
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
lembrar que a resistência criou redes
de acolhimento e solidariedade, ações
de partilha, produções culturais
compartilhadas, busca do
onhecimento de saber e construção
de uma cultura de paz.
Não se trata de carta de
intenções. Na arte, vale o princípio
defendido por Boal ao falar de teatro,
em que interagem em condições de
igualdade o ator e o espectador,
considerado por ele como o gran
de
ator social, pois tem o livre arbítrio em
escolher o seu destino.
Essa é a fundamentação do
. Boal a deixa
para a arte em cena das mulheres ao
afirmar que, ao ver o mundo além das
O Teatro do Oprimido começou a ser
gestado após a prio, tortura e expulsão de
Augusto Boal pela ditadura militar brasileira,
em 1971. Durante a primeira fase de exílio
em cinco países da América
Latina (sequencialmente Argentina, Peru,
Colômbia, Venezuela e Bolívia), e depois na
1986), Boal desenvolve
experiências que combinam o fazer político
com o fazer teatral, por meio de diversas
jetivo do método é fazer
o público (considerado ator) repensar a
la, uma vez que se
conscientize que a sociedade está dividida
entre opressores e oprimidos. Depois disso
estará apto a assumir seu real papel,
passando a ser sujeito da
transformação
social. Para que o processo se concretize, é
proposto um novo conceito de autoria, em que
o ator é destituído de seu papel de profissional
de arte para a criação de um espaço de
transformação comunitária e de escrita
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
aparências, vê-
se opressores e
oprimidos em todas
as sociedades,
etnias, gêneros, classes e castas, o
mundo injusto e cruel. Assim surge a
obrigação de inventar outro mundo
pois outro mundo é posvel, mas
cabe a s construí-
lo com nossas
mãos entrando em cena, no palco e na
vida” (BOAL, 2009).
Palco da Vida
Em seu último livro,
do oprimido
, editado e lançado
postumamente, Augusto Boal
sistematiza não apenas os prinpios
do Teatro do Oprimido, mas uma
concepção de estética democrática e
subjuntiva que, por meio da arte,
permite a cidadão ques
tionar dogmas
e certezas, hábitos e costumes
suportados na vida. Para isso, recorre
ao exemplo da violência contra as
mulheres:
Todo poder autoritário é violência.
Aquela mulher indiana que disse
“Meu marido não me bate mais
do que o necessário, portanto
n
ão sou oprimida! revela a
existência de um poder marital
que não é maior nem menor do
que aquele que sofre aquela
mulher nórdica que justificou seu
esposo: “É verdade que, no meu
país, pelo mesmo trabalho e
mesmas condições, os homens
ganham mais do que n
mulheres. Mas isso não é
opressão porque nossos homens
são bons para nós!. Elas não
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
se opressores e
as sociedades,
etnias, gêneros, classes e castas, o
mundo injusto e cruel. Assim surge a
obrigação de inventar outro mundo
pois outro mundo é possível, “mas
lo com nossas
mãos entrando em cena, no palco e na
Em seu último livro,
A estética
, editado e lançado
postumamente, Augusto Boal
sistematiza não apenas os princípios
do Teatro do Oprimido, mas uma
concepção de estética democrática e
subjuntiva que, por meio da arte,
tionar dogmas
e certezas, hábitos e costumes
suportados na vida. Para isso, recorre
ao exemplo da violência contra as
Todo poder autoritário é violência.
Aquela mulher indiana que disse
Meu marido não me bate mais
do que o necessário, portanto
ão sou oprimida!” revela a
existência de um poder marital
que não é maior nem menor do
que aquele que sofre aquela
mulher nórdica que justificou seu
esposo: É verdade que, no meu
país, pelo mesmo trabalho e
mesmas condições, os homens
ganham mais do que n
ós,
mulheres. Mas isso não é
opressão porque nossos homens
o bons para nós!”. Elas não
percebiam que a violência do
poder não está apenas no seu
exercício
existência”.
Como a violência pode se
manifestar sem que seja
exercitada? Pelo espetá
estética. Como se revela e pode
ser combatida? Pela estética e
pelo espetáculo, que se
extrapolará
para a realidade onde
se torna real e nela se completa.
Uma nova estética é urgente. A
estética do oprimido é um ensaio
de revolução”
158).
O palco
da arte e da vida
onde acontecem os movimentos que
transformam a realidade. É espaço de
relações, de redes, compostas por nós
e laços. É importante perceber que a
ideia de rede é parte constitutiva da
existência das la
Redes de lutas, redes de resistência,
redes de acolhimento, redes de
convivência, redes de expressão,
redes de sentimentos.
As potencialidades das
articulações em rede estão presentes
na Rede Ma(g)dalena Internacional
(RedMa(g)dalena Inte
composta por arte
organizações feministas organizada
em cinco regionais (América Central,
México e Equador; América do Sul de
fala hispânica; Brasil; África; e
Europa). A partir da metodologia do
209
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
percebiam que a violência do
poder não es apenas no seu
está na sua
Como a violência pode se
manifestar sem que seja
exercitada? Pelo espetá
culo, pela
estética. Como se revela e pode
ser combatida? Pela estética e
pelo espetáculo, que se
para a realidade onde
se torna real e nela se completa.
Uma nova estética é urgente. A
estética do oprimido é um ensaio
(BOAL, 2009, p.
da arte e da vida
é
onde acontecem os movimentos que
transformam a realidade. É espaço de
relações, de redes, compostas por nós
e laços. É importante perceber que a
ideia de rede é parte constitutiva da
existência das la
tino-americanas.
Redes de lutas, redes de resistência,
redes de acolhimento, redes de
convivência, redes de expressão,
redes de sentimentos.
As potencialidades das
articulações em rede estão presentes
na Rede Ma(g)dalena Internacional
(RedMa(g)dalena Inte
rnacional),
composta por arte
-ativistas e
organizações feministas organizada
em cinco regionais (América Central,
México e Equador; América do Sul de
fala hispânica; Brasil; África; e
Europa). A partir da metodologia do
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
Teatro das Oprimidas8
, a rede
desenv
olve projetos teatrais de
denúncia e de busca de estéticas
feministas.
A rede é integrada por
indígenas, afro-
latinas, migrantes,
imigrantes, lésbicas, não binárias, com
diversidades funcionais e diferentes
experiências em saúde mental, entre
outros fator
es que as classificam como
“oprimidas” político-
sociais. Como
afirmam o manifesto da Rede
Ma(g)dalena Internacional/Teatro das
Oprimidas: “Somos oprimidas porque
reconhecemos as opreses que
vivemos e temos o desejo de mudá
las. Nosso desejo e nossa
neces
sidade são urgentes e é por
meio de nossa criatividade teatral que
encontramos caminhos para ser as
protagonistas de nossas histórias”.
Apesar da dimeno
internacional das Madalenas e dos
grupos que utilizam a metodologia do
Teatro das Oprimidas, é fundamental
ressaltar que foi no Brasil, e em
seguida nos países latino
-
e africanos, que surge a proposta de
feminilizar as técnica
s do Teatro do
Oprimido. A primeira experiência
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
, a rede
olve projetos teatrais de
denúncia e de busca de estéticas
A rede é integrada por
latinas, migrantes,
imigrantes, lésbicas, não binárias, com
diversidades funcionais e diferentes
experiências em saúde mental, entre
es que as classificam como
sociais. Como
afirmam o manifesto da Rede
Ma(g)dalena Internacional/Teatro das
Oprimidas: Somos oprimidas porque
reconhecemos as opressões que
vivemos e temos o desejo de mudá
-
las. Nosso desejo e nossa
sidade o urgentes e é por
meio de nossa criatividade teatral que
encontramos caminhos para ser as
protagonistas de nossas histórias”.
Apesar da dimensão
internacional das Madalenas e dos
grupos que utilizam a metodologia do
Teatro das Oprimidas, é fundamental
ressaltar que foi no Brasil, e em
-
americanos
e africanos, que surge a proposta de
s do Teatro do
Oprimido. A primeira experiência
ocorre em 2010 no Rio de Janeiro,
liderado por Barbara Santos, dando
origem à ação conjunta e em rede.
Em 2009, resolvemos fazer uma
experiência de um laboratório só
para mulheres, porque algumas
discussões e
grupos mistos. Tudo que tem a
ver com sexualidade, medos,
culpas, em grupo misto, fica
nebuloso, porque a mulher logo
sente que tem que se justificar. A
experiência foi fascinante.
Fizemos o primeiro em janeiro de
2010. As mulheres que
part
iciparam começaram a
trabalhar com outros grupos, e foi
se multiplicando. Fiz laboratórios
na Europa, na Índia. Na América
Latina foi impressionante.
[...]
Acho que a única explicação
é a necessidade. O que faz uma
coisa avançar não é que seja
original. O
importante é que
chegue na pessoa certa e as
pessoas se apropriam disso.
(SANTOS, 2016)
Embora a concepção e
pesquisa estética se baseie no
teatral de diálogo desenvolvido por
Boal, o Teatro das Oprimidas recusa o
rótulo de “feminino plural do pro
boaliano. E, se por um lado a Rede
Ma(g)dalena Internacional/Teatro das
Oprimidas baseia sua ação na
sororidade, reconhecendo a
universalidade da opreso e a
especificação das realidades locais,
por outro ressalta questões que devem
particulares da r
ealidade latino
210
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
ocorre em 2010 no Rio de Janeiro,
liderado por Barbara Santos, dando
origem à ação conjunta e em rede.
Em 2009, resolvemos fazer uma
experiência de um laboratório
para mulheres, porque algumas
discussões e
ram difíceis em
grupos mistos. Tudo que tem a
ver com sexualidade, medos,
culpas, em grupo misto, fica
nebuloso, porque a mulher logo
sente que tem que se justificar. A
experiência foi fascinante.
Fizemos o primeiro em janeiro de
2010. As mulheres que
iciparam começaram a
trabalhar com outros grupos, e foi
se multiplicando. Fiz laboratórios
na Europa, na Índia. Na América
Latina foi impressionante.
Acho que a única explicação
é a necessidade. O que faz uma
coisa avançar não é que seja
importante é que
chegue na pessoa certa e as
pessoas se apropriam disso.
(SANTOS, 2016)
Embora a concepção e
pesquisa estética se baseie no
método
teatral de diálogo desenvolvido por
Boal, o Teatro das Oprimidas recusa o
rótulo de feminino plural” do pro
jeto
boaliano. E, se por um lado a Rede
Ma(g)dalena Internacional/Teatro das
Oprimidas baseia sua ação na
sororidade, reconhecendo a
universalidade da opressão e a
especificação das realidades locais,
por outro ressalta questões que devem
ealidade latino
-
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
americana que devem estar no radar
em qualquer parte do mundo: a
violência
originada na desigualdade
social, a inexistência de políticas
públicas que garantam a vida, o
racismo e a xenofobia que vitimam de
forma contundente as mulheres
negr
as, indígenas e imigrantes.
Madalenas em teatro
As Madalenas do Teatro das
Oprimidas o
ferecem outra forma de
engajamento: a estética. A mesma
estética que também pode ser
entendida como algo secundário por
vários membros de grupos
considerados
progressistas. Todas
essas descobertas foram possíveis
porque os coletivos femininos que
originaram a Rede Ma(g)dalena
Internacional foram estruturados de
forma diferente dos tradicionais grupos
políticos de então e da atualidade. A
sua formação trazia
consigo o exemplo
da estética/Teatro do Oprimido e o
poder de recorrer a tópicos de sua
verdadeira escolha:
Juntas queremos fazer real o
sonho de uma sociedade
baseada na justiça, livre da
ideologia capitalista, de
competição, de exploração da
pessoa human
a e de destruição
da natureza. Uma sociedade sem
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
americana que devem estar no radar
em qualquer parte do mundo: a
originada na desigualdade
social, a inexistência de políticas
públicas que garantam a vida, o
racismo e a xenofobia que vitimam de
forma contundente as mulheres
as, indígenas e imigrantes.
As Madalenas do Teatro das
ferecem outra forma de
engajamento: a estética. A mesma
estética que também pode ser
entendida como algo secundário por
vários membros de grupos
progressistas. Todas
essas descobertas foram possíveis
porque os coletivos femininos que
originaram a Rede Ma(g)dalena
Internacional foram estruturados de
forma diferente dos tradicionais grupos
políticos de então e da atualidade. A
consigo o exemplo
da estética/Teatro do Oprimido e o
poder de recorrer a tópicos de sua
Juntas queremos fazer real o
sonho de uma sociedade
baseada na justiça, livre da
ideologia capitalista, de
competição, de exploração da
a e de destruição
da natureza. Uma sociedade sem
racismo, sem machismo, sem
homofobia, sem lesbofobia, sem
estereótipos ou mandatos sociais.
Uma sociedade sem patriarcas,
na qual seja possível reinventar e
multiplicar os espaços de poder e
diversificar que
(Primeiro Manifesto da Rede
Ma(g)dalena Internacional, 2016,
p. 13)
Cada coletivo individualmente e
em rede pensa a conscientização por
meio de
produções artísticas que o
resultantes desses encontros
sistemáticos como peças de teatro,
perfor
mances, instalações, a utilização
de pinturas e esculturas; a expressão
por meio de poesias e músicas, além
da promoção de discuso e debates
em torno desses eventos. A produção
estética seria o processo pelo qual
ocorre a conscientização e o
empoderament
o das mulheres.
A
estratégia é trazer a
percepção que as mulheres podem
aumentar seu grau de a
autodeterminação
e capacitá
que sejam agente transformador de
sua realidade imediata, de sua família
e de sua comunidade. O objetivo é
promove
r uma sensibilização
adequada que gere uma cultura de
confiança e a capacitação para
assumir responsabilidades ditas não
femininas”. O protesto é dirigido
211
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
racismo, sem machismo, sem
homofobia, sem lesbofobia, sem
estereótipos ou mandatos sociais.
Uma sociedade sem patriarcas,
na qual seja possível reinventar e
multiplicar os espaços de poder e
diversificar que
m os ocupa.
(Primeiro Manifesto da Rede
Ma(g)dalena Internacional, 2016,
Cada coletivo individualmente e
em rede pensa a conscientização por
produções artísticas que são
resultantes desses encontros
sistemáticos como peças de teatro,
mances, instalações, a utilização
de pinturas e esculturas; a expressão
por meio de poesias e músicas, além
da promoção de discussão e debates
em torno desses eventos. A produção
estética seria o processo pelo qual
ocorre a conscientização e o
o das mulheres.
estratégia é trazer a
percepção que as mulheres podem
aumentar seu grau de a
utonomia e
e capacitá
-las para
que sejam agente transformador de
sua realidade imediata, de sua família
e de sua comunidade. O objetivo é
r uma sensibilização
adequada que gere uma cultura de
confiança e a capacitação para
assumir responsabilidades ditas “não
femininas”. O protesto é dirigido
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
principalmente contra a imagem
comercializada e estereotipada do
corpo feminino idealizado,
principa
lmente no mundo da moda,
contra a
homofobia contínua na
sociedade (no caso das lésbicas),
contra o racismo e contra as
oportunidades educacionais desiguais.
Em relação ao racismo, estrutural no
Brasil e em outros países latino
americano, podemos pensar:
[...] a. resgatar os valores da
cultura africana, marginalizados
por preconceito à mera condição
folclórica, pitoresca ou
insignificante; b. Através de uma
pedagogia estruturada no
trabalho de arte e cultura, tentar
educar a classe dominante
“branca”, rec
uperando
perversão etnocentrista de se
autoconsiderar superiormente
europeia, cristã, branca, latina e
ocidental; c. Erradicar dos palcos
brasileiros o ator branco
maquilado de preto, norma
tradicional quando a personagem
negra exigia qualidade dramát
do intérprete; [...] (NASCIMENTO,
2016, p. 161)
Busca-
se assim uma rie de
conhecimentos culturais de raízes não
europeias que resgatam estruturas
espirituais, esotéricas ou não cristãs
que foram e são moldadas pelo
feminino e por tradições matriarca
Lembram constantemente dos
arquétipos da “grande deusa em suas
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(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
principalmente contra a imagem
comercializada e estereotipada do
corpo feminino idealizado,
lmente no mundo da moda,
homofobia contínua na
sociedade (no caso das lésbicas),
contra o racismo e contra as
oportunidades educacionais desiguais.
Em relação ao racismo, estrutural no
Brasil e em outros países latino
-
americano, podemos pensar:
[...] a. resgatar os valores da
cultura africana, marginalizados
por preconceito à mera condição
folclórica, pitoresca ou
insignificante; b. Através de uma
pedagogia estruturada no
trabalho de arte e cultura, tentar
educar a classe dominante
uperando
-a da
pervero etnocentrista de se
autoconsiderar superiormente
europeia, cristã, branca, latina e
ocidental; c. Erradicar dos palcos
brasileiros o ator branco
maquilado de preto, norma
tradicional quando a personagem
negra exigia qualidade dramát
ica
do intérprete; [...] (NASCIMENTO,
se assim uma série de
conhecimentos culturais de raízes não
europeias que resgatam estruturas
espirituais, esotéricas ou não cristãs
que foram e o moldadas pelo
feminino e por tradições matriarca
is.
Lembram constantemente dos
arquétipos da grande deusa” em suas
três formas: menina, mãe e a bia
anciã. A
histórica caça às bruxas é
metaforicamente interpretada como a
lembrança de uma tentativa de
destruição do conhecimento feminino
sobre o mundo.
O encontro de mulheres é
usado como um momento gerador de
autorresponsabilidade e autode
terminação. A luta é não deixar que o
conheciment
o morra ou resgatar
aquele que foi perdido. Por isso,
acoplada a essa percepção, está a
necessidade e a percepção da
alteridade do feminino, que é pelo
menos igual, senão superior ao
masculino (pensamento da diferença).
A abordagem parte de uma
interven
ção orientada em
autobiografias, narrativas e histórias
de vida.
O empoderamento é um
conceito central n
a
saúde
mental e corporal das
participantes e se refere ao processo
de
emancipação frente aos valores
patriarcais, à busca
percepção
da falta de influência nas
decisões da sociedade e, por
consequência, sua sub
sociopolítica. O trabalho pensa
contexto de uma f
ormação política
democráti
ca e essas atividades o
212
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
três formas: menina, mãe e a sábia
histórica caça às bruxas é
metaforicamente interpretada como a
lembrança de uma tentativa de
destruição do conhecimento feminino
O encontro de mulheres é
usado como um momento gerador de
autorresponsabilidade e autode
-
terminação. A luta é não deixar que o
o morra ou resgatar
aquele que já foi perdido. Por isso,
acoplada a essa percepção, está a
necessidade e a percepção da
alteridade do feminino, que é pelo
menos igual, senão superior ao
masculino (pensamento da diferença).
A abordagem parte de uma
ção orientada em
biografias,
autobiografias, narrativas e histórias
O empoderamento é um
a
promoção da
mental e corporal das
participantes e se refere ao processo
emancipação frente aos valores
patriarcais, à busca
profissional, a
da falta de influência nas
decies da sociedade e, por
consequência, sua sub
-representação
sociopolítica. O trabalho pensa
no
ormação política
e
ca e essas atividades são
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
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22, p. 191-218 mar. 2022.
entendidas como instrumentos
aumentar a cidadania.
A proposta estética
d
as Oprimidas desenvolvida pelos
coletivos da Rede Ma(g)dalena
defende uma e
strutura social no qual a
opressão às mulheres seja eli
como norma social. As Madalenas
consideram as ordens sociais
prevalecentes como androcêntricas
interpretam esta circunstância como
estrutural e como resultado de uma
dominação patriarcal gerada há
séculos. Suas intervenções abrem
espaço para qu
e os homens não
tenham sua autoimagem vinculada à
dominação sobre as mulheres. Esta
afirmação vai ao encontro e faz coro
às
propostas de vários grupos atuais
que defendem que a própria visão do
mundo que temos e o conhecimento
construído pela humanidade
baseados em um olhar masculino e
que as mulheres precisam ocupar
esse espaço, mostrando uma
observação feminina do vivido. A
sociedade teria como tarefa tornar
visíveis as conquistas das mulheres e
revelar as omissões anteriores sobre a
história feminina.
A pesquisa desse
grupo fala, além de tudo, sobre tornar
visível o trabalho privado feminino que
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resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
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resistências, disputas e potências
entendidas como instrumentos
para
A proposta estética
do Teatro
as Oprimidas desenvolvida pelos
coletivos da Rede Ma(g)dalena
strutura social no qual a
opressão às mulheres seja eli
minada
como norma social. As Madalenas
consideram as ordens sociais
prevalecentes como androcêntricas
e
interpretam esta circunstância como
estrutural e como resultado de uma
dominação patriarcal gerada
culos. Suas intervenções abrem
e os homens não
tenham sua autoimagem vinculada à
dominação sobre as mulheres. Esta
afirmação vai ao encontro e faz coro
propostas de vários grupos atuais
que defendem que a própria visão do
mundo que temos e o conhecimento
construído pela humanidade
estão
baseados em um olhar masculino e
que as mulheres precisam ocupar
esse espaço, mostrando uma
observação feminina do vivido. A
sociedade teria como tarefa tornar
visíveis as conquistas das mulheres e
revelar as omissões anteriores sobre a
A pesquisa desse
grupo fala, além de tudo, sobre tornar
visível o trabalho privado feminino que
fora sempre invivel. Essa
feminilidade do conhecimento pode,
nesse sentido, compreender também o
mundo intuitivo, o esotérico e o
pensamento não racio
considerados alijados do ponto
vista masculino.
Reflexões finais
A Rede Ma(g)dalena
Internacional/Teatro das Oprimidas
b
usca a implementação dos prinpios
sociais básicos modernos que têm
se
espalhado enquanto ideal desde a
Revolução Francesa, da modernização
econômica e da proclamação dos
Direitos Humanos. Uma luta que vai
além do solo europeu ou
estadunidense. Trata
básico do reconhecimento de sua igual
d
ignidade humana por meio do qual os
princípios fundamentais de
igualdade para todas as
objetivamente, o reconhecimento para
as mulheres. Essa busca permite um
debate aber
to sobre a igualdade
política e jurídica, a educação, a
autodeterminação sexual, os direitos
humanos para mulheres e a
emancipação de currículos prescritos e
modelos de comportamento
tradicional.
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periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
fora sempre invisível. Essa
feminilidade do conhecimento pode,
nesse sentido, compreender também o
mundo intuitivo, o esotérico e o
pensamento não racio
nal que são
considerados alijados do ponto
-de-
A Rede Ma(g)dalena
Internacional/Teatro das Oprimidas
usca a implementação dos princípios
sociais básicos modernos que têm
espalhado enquanto ideal desde a
Revolução Francesa, da modernização
econômica e da proclamação dos
Direitos Humanos. Uma luta que vai
além do solo europeu ou
estadunidense. Trata
-se do princípio
básico do reconhecimento de sua igual
ignidade humana por meio do qual os
prinpios fundamentais de
liberdade e
igualdade para todas as
pessoas traz,
objetivamente, o reconhecimento para
as mulheres. Essa busca permite um
to sobre a igualdade
política e jurídica, a educação, a
autodeterminação sexual, os direitos
humanos para mulheres e a
emancipação de currículos prescritos e
modelos de comportamento
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
A invocação da dignidade
humana provoca uma remoção de
costu
mes arraigados e construídos
pelas ordens sociais de gênero
a
ssimétricas, nas quais a dignidade é
um conceito definido por gênero. Com
base nos costumes tradicionais, a
dignidade dos homens é considerada
“honrosa” e a dignidade das mulheres
como “modéstia”.
Na vida cotidiana, o
comportamento é então classificado
como digno ou indigno
com a ajuda de
estereótipos de papéis gênero
a
valiativos”. Se, por outro lado, a
dignidade humana é considerada
inviolável, independentemente do
sexo, não justificativa para violar a
dignidade das mulheres.
básico da dignidade humana promove
uma melhor observância dos direitos
fundam
entais à liberdade e à
igualdade.
Esse debate abraça temas
como os direitos civis de afro
americanos e afro
populações indígenas, diferentes cores
de pele ou de origem ocidental e não
ocidental, situações de pobreza ou a
luta pela independência
dos corpos e
das mentes nas áreas que foram
colonizadas pelos europeus. Além de
sua condição de mulher, sua situação
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
A invocação da dignidade
humana provoca uma remoção de
mes arraigados e construídos
pelas ordens sociais de gênero
ssimétricas, nas quais a dignidade é
um conceito definido por gênero. Com
base nos costumes tradicionais, a
dignidade dos homens é considerada
honrosa e a dignidade das mulheres
Na vida cotidiana, o
comportamento é então classificado
com a ajuda de
estereótipos de papéis “gênero
valiativos”. Se, por outro lado, a
dignidade humana é considerada
inviolável, independentemente do
sexo, não há justificativa para violar a
O princípio
básico da dignidade humana promove
uma melhor observância dos direitos
entais à liberdade e à
Esse debate abraça temas
como os direitos civis de afro
-
americanos e afro
-europeus,
populações indígenas, diferentes cores
de pele ou de origem ocidental e não
ocidental, situações de pobreza ou a
dos corpos e
das mentes nas áreas que foram
colonizadas pelos europeus. Além de
sua condição de mulher, sua situação
econômica, étnica e cultural pode estar
ligada a alguma dessas realidades, o
que dificulta sua percepção, sua luta e
sua realização como p
Como uma rede de discussão
feminina espalhada por diversos
países e continentes, o Teatro das
Madalenas s
e percebe trabalhando
bastante com a internet e atuando de
forma on-
line, de uma maneira
orientada a objetivos em projetos
interseccionais,
constantemente o machismo e a
heteronormatividade. Esse debate
interseccional se desenvolve
principalmente a partir das críticas de
mulheres negras e indígenas no Brasil,
África e Europa que observam o
racismo na sociedade onde vivem e
também no
próprio movimento atuante
de mulheres. Suas bases incluem
plataformas a partir da vio de um
mundo d
ecolonial que se une a uma
rede de mulheres de países não
centrais. O que se pretende é uma
rede intencional de parcerias e a
identificação de uma luta
mesmo em situações geográficas
dispersas e afastadas. Todas as
envolvidas, além de sua condição
feminina, trazem como registro as
cicatrizes da colonização de seus
214
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
econômica, étnica e cultural pode estar
ligada a alguma dessas realidades, o
que dificulta sua percepção, sua luta e
sua realização como p
essoa.
Como uma rede de discussão
feminina espalhada por diversos
países e continentes, o Teatro das
e percebe trabalhando
bastante com a internet e atuando de
line, de uma maneira
orientada a objetivos em projetos
debatendo
constantemente o machismo e a
heteronormatividade. Esse debate
interseccional se desenvolve
principalmente a partir das críticas de
mulheres negras e indígenas no Brasil,
África e Europa que observam o
racismo na sociedade onde vivem e
próprio movimento atuante
de mulheres. Suas bases incluem
plataformas a partir da visão de um
ecolonial que se une a uma
rede de mulheres de países não
centrais. O que se pretende é uma
rede intencional de parcerias e a
identificação de uma luta
em comum,
mesmo em situações geográficas
dispersas e afastadas. Todas as
envolvidas, além de sua condição
feminina, trazem como registro as
cicatrizes da colonização de seus
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
Revista Latino-
Americana de Estudos em Cultura,
22, p. 191-218 mar. 2022.
povos. Nesse sentido, lutam de uma
forma diferenciada em comparação às
mulheres e
uropeias ou
estadunidenses.
Mesmo assim, sua rede
também está instalada em países
desenvolvidos. Essa situação faz com
que percebamos que o estamos
falando apenas das periferias do
mundo, mas também das periferias
dos grandes centros, das cidades
enriqu
ecidas e dos países com alta
qualidade de vida. Nesses espaços
encontramos refugiados, imigrantes,
migrantes, trabalhadores de baixa
renda, violência doméstica e,
sobretudo, mulheres que formam uma
parte significativa de todo esse
caleidoscópio. Elas, em c
rede, podem e estão presentes em
todos esses lugares.
A questão central indiscutível de
toda essa produção é a desigualdade
nos campos da participação política,
econômica e intelectual, bem como a
crítica à violência.
As mulheres
envolvidas ne
sse projeto consideram
ser capazes de levar uma vida
autodeterminada sem violência
condição e a possibilidade de uma real
existência de liberdade e igualdade
Criticam a falta de valorização da
DIAS, Marcos Horácio Gomes; TONETO, Maria Bernadete. Estética e
resistência em rede na cena do Teatro das Oprimidas
. PragMATIZES -
Americana de Estudos em Cultura,
Niterói/RJ, Ano 12, n. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
povos. Nesse sentido, lutam de uma
forma diferenciada em comparação às
uropeias ou
Mesmo assim, sua rede
também está instalada em países
desenvolvidos. Essa situação faz com
que percebamos que não estamos
falando apenas das periferias do
mundo, mas também das periferias
dos grandes centros, das cidades
ecidas e dos países com alta
qualidade de vida. Nesses espaços
encontramos refugiados, imigrantes,
migrantes, trabalhadores de baixa
renda, violência doméstica e,
sobretudo, mulheres que formam uma
parte significativa de todo esse
caleidoscópio. Elas, em c
ena e em
rede, podem e estão presentes em
A questão central indiscutível de
toda essa produção é a desigualdade
nos campos da participação política,
econômica e intelectual, bem como a
As mulheres
sse projeto consideram
ser capazes de levar uma vida
autodeterminada sem violência
, com a
condição e a possibilidade de uma real
existência de liberdade e igualdade
.
Criticam a falta de valorização da
subjetividade feminina, que se
expressa na desval
corpos e mentes. Desnudam
sobretudo o modelo de individualidade
u
niversal, supostamente neutra em
termos de gênero. Algumas lembram
que a mulher incorpora uma
moralidade diferente do homem por
causa da experiência da maternidade
e da experi
ência feminina do cuidado.
A partir dessa vivência estética,
examina-
se a construção do termo
"gênero" n
os diversos contextos, seu
significado e seus efeitos na
distribuição do
poder
estruturas sociais e na produção de
conhecimento, da cultura e da arte
aumento da consciência dessas
mulheres seria explorar os aspectos
políticos de sua própria vida pessoal.
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periodicos.uff.br/pragmatizes
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resistências, disputas e potências
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subjetividade feminina, que se
expressa na desval
orização dos
corpos e mentes. Desnudam
sobretudo o modelo de individualidade
niversal, supostamente neutra em
termos de gênero. Algumas lembram
que a mulher incorpora uma
moralidade diferente do homem por
causa da experiência da maternidade
ência feminina do cuidado.
A partir dessa vivência estética,
se a construção do termo
os diversos contextos, seu
significado e seus efeitos na
poder
político, nas
estruturas sociais e na produção de
conhecimento, da cultura e da arte
. O
aumento da consciência dessas
mulheres seria explorar os aspectos
políticos de sua própria vida pessoal.
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- ISSN 2237-1508
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