BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura, memória e resistência
DOI:
https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v12i22.50792
Resumo:
Objeto deste trabalho o três experiências participativas locais, com atenção para as
estratégias adotadas por grupos do Recôncavo da Bahia para a salvaguarda de suas manifestações
culturais, numa complexa e contraditória relação com o Estado. O reconheci
Roda (2004), do Bem do Mercado (2012) e das Cheganças, Marujadas e Embaixadas (2019),
manifestações de grupos subalternizados, como patrimônio cultural pelo poder público foi um marco e
o processo de patrimonialização merece atenção, um
poder público de induzir a participação popular, com riscos de domesticação e disciplinamento.
Assumindo uma perspectiva situada e considerando a ideia de cidadania cultural, optamos por uma
abordagem que n
os levou a identificar os protagonistas dos processos descritos, focando em suas
motivações e sua capacidade de agência.
em tela significaram, para os grupos envolvidos,
para aprofundar os processos de mobilização e de organização coletiva em busca de protagonismo
na condução de suas manifestações culturais.
Palavras-chave
Bahia.
Colectivos populares en el Recôncavo da Bahia: cultura, memoria y resistência
Resumen:
Tres experiencias participativas locales del Nordeste de Brasil son objeto de este trabajo,
con atención a las estrategias adoptadas por grupos del
manifestaciones culturales, en una relación compleja y contradictoria con el Estado. El
reconocimiento del
Samba de Roda
Marujadas e Embaixadas
(2019), manifestaciones
cultural por parte de los poderes públicos fue un hito y el proceso de patrimonialización merece
atención, ya que hubo intentos de los poderes públicos de inducir la participación popular, con riesgos
de domestica
ción y disciplinamiento. Asumiendo una perspectiva situada y considerando la idea de
ciudadanía cultural, optamos por un enfoque que nos llevó a identificar a los protagonistas de los
procesos descritos, centrándonos en sus motivaciones y su capacidad de a
muestra que los procesos patrimoniales en cuestión significaron, para los grupos involucrados, una
estrategia de empoderamiento, un camino para profundizar los procesos de movilización y
organización colectiva en busca de protago
Palabras clave:
cultura popular; ciudadanía cultural; participación; patrimonio cultural; Recôncavo da
Bahia.
1
Maria Laura Souza Alves Bezerra Lindner. Doutora em Cultura e Sociedade.
Centro
de Culturas, Linguagem e Tecnologias Aplicadas (CECULT)/Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia (UFRB), Brasil. E
0365-6796
Recebido em 10/07/2021,
aceito para publicação em
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura, memória e resistência
https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v12i22.50792
Objeto deste trabalho são três experiências participativas locais, com atenção para as
estratégias adotadas por grupos do Recôncavo da Bahia para a salvaguarda de suas manifestações
culturais, numa complexa e contraditória relação com o Estado. O reconheci
mento do Samba de
Roda (2004), do Bembé do Mercado (2012) e das Cheganças, Marujadas e Embaixadas (2019),
manifestações de grupos subalternizados, como patrimônio cultural pelo poder público foi um marco e
o processo de patrimonialização merece atenção, um
a vez que ele se inicia a partir de tentativas do
poder público de induzir a participação popular, com riscos de domesticação e disciplinamento.
Assumindo uma perspectiva situada e considerando a ideia de cidadania cultural, optamos por uma
os levou a identificar os protagonistas dos processos descritos, focando em suas
motivações e sua capacidade de agência.
A pesquisa mostra que os processos de patrimonialização
em tela significaram, para os grupos envolvidos,
uma estratégia de empoderamen
para aprofundar os processos de mobilização e de organização coletiva em busca de protagonismo
na condução de suas manifestações culturais.
: cultura popular; cidadania cultural; participação; patrimônio cultural; Recôncavo da
Colectivos populares en el Recôncavo da Bahia: cultura, memoria y resistência
Tres experiencias participativas locales del Nordeste de Brasil son objeto de este trabajo,
con atención a las estrategias adoptadas por grupos del
Recôncavo da Bahia
para salvaguardar sus
manifestaciones culturales, en una relación compleja y contradictoria con el Estado. El
Samba de Roda
(2004), del Bem do Mercado
(2012) y de las
(2019), manifestaciones
de grupos subalternizados, como patrimonio
cultural por parte de los poderes públicos fue un hito y el proceso de patrimonialización merece
atención, ya que hubo intentos de los poderes públicos de inducir la participación popular, con riesgos
ción y disciplinamiento. Asumiendo una perspectiva situada y considerando la idea de
ciudadanía cultural, optamos por un enfoque que nos llevó a identificar a los protagonistas de los
procesos descritos, centrándonos en sus motivaciones y su capacidad de a
ctuación. La investigación
muestra que los procesos patrimoniales en cuestión significaron, para los grupos involucrados, una
estrategia de empoderamiento, un camino para profundizar los procesos de movilización y
organización colectiva en busca de protago
nismo en la conducción de sus manifestaciones culturales.
cultura popular; ciudadanía cultural; participación; patrimonio cultural; Recôncavo da
Maria Laura Souza Alves Bezerra Lindner. Doutora em Cultura e Sociedade.
Professora adjunta do
de Culturas, Linguagem e Tecnologias Aplicadas (CECULT)/Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia (UFRB), Brasil. E
-mail: laura.bezerra@ufrb.edu.br -
https://orcid.org/0000
aceito para publicação em
25/01/2022 e
disponibilizado online em
01/03/2022.
29
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura, memória e resistência
Laura Bezerra1
Objeto deste trabalho o três experiências participativas locais, com atenção para as
estratégias adotadas por grupos do Recôncavo da Bahia para a salvaguarda de suas manifestações
mento do Samba de
Roda (2004), do Bembé do Mercado (2012) e das Cheganças, Marujadas e Embaixadas (2019),
manifestações de grupos subalternizados, como patrimônio cultural pelo poder público foi um marco e
a vez que ele se inicia a partir de tentativas do
poder público de induzir a participação popular, com riscos de domesticação e disciplinamento.
Assumindo uma perspectiva situada e considerando a ideia de cidadania cultural, optamos por uma
os levou a identificar os protagonistas dos processos descritos, focando em suas
A pesquisa mostra que os processos de patrimonialização
uma estratégia de empoderamen
to, um caminho
para aprofundar os processos de mobilização e de organização coletiva em busca de protagonismo
: cultura popular; cidadania cultural; participação; patrimônio cultural; Recôncavo da
Colectivos populares en el Recôncavo da Bahia: cultura, memoria y resistência
Tres experiencias participativas locales del Nordeste de Brasil son objeto de este trabajo,
para salvaguardar sus
manifestaciones culturales, en una relación compleja y contradictoria con el Estado. El
(2012) y de las
Cheganças,
de grupos subalternizados, como patrimonio
cultural por parte de los poderes públicos fue un hito y el proceso de patrimonialización merece
atención, ya que hubo intentos de los poderes públicos de inducir la participación popular, con riesgos
ción y disciplinamiento. Asumiendo una perspectiva situada y considerando la idea de
ciudadanía cultural, optamos por un enfoque que nos llevó a identificar a los protagonistas de los
ctuación. La investigación
muestra que los procesos patrimoniales en cuestión significaron, para los grupos involucrados, una
estrategia de empoderamiento, un camino para profundizar los procesos de movilización y
nismo en la conducción de sus manifestaciones culturales.
cultura popular; ciudadanía cultural; participación; patrimonio cultural; Recôncavo da
Professora adjunta do
de Culturas, Linguagem e Tecnologias Aplicadas (CECULT)/Universidade Federal do
https://orcid.org/0000
-0003-
disponibilizado online em
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
Popular collectives in the Recôncavo da Bahia: culture, memory and resistance
Abstract: The o
bject of this paper are three local participatory experiences, with attention to the
strategies adopted by groups of the
a complex and contradictory relationship with the Stat
(2004), Bembé do Mercado
(2012) and
of subalternised groups, as cultural heritage by the public authorities was a milestone and the process
of patrimonialisati
on deserves attention, as it begins with attempts by the public authorities to induce
popular participation, with risks of domestication and disciplining. Assuming a situated perspective and
considering the idea of cultural citizenship, we opted for an app
protagonists of the processes described, focusing on their motivations and their capacity for agency.
The research shows that the heritage processes in question meant, for the groups involved, a strategy
of empowerment, a
path to deepening the processes of mobilization and collective organization in
search of protagonism in the conduction of their cultural manifestations.
Keywords:
popular culture; cultural citizenship; participation; cultural heritage; Recôncavo da Bahia.
Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura, memória e resistência
Introdução
Neste artigo voltamos a atenção
para as ações de patrimonialização
desenvolvidas por grupos culturais
populares de três cidades
do Rencavo
da Bahia
Cachoeira, Santo Amaro da
Purificação e Saubara
salvaguarda
do Samba de Roda (2004),
do Bembé do Mercado (2012) e das
Cheganças, Marujadas e Embaixadas
(2019),
numa complexa relação com o
Estado2.
Nosso interesse foi pensar as
experiências participativas locais
com atenção para o surgimento
novos atores que com suas
reivindicações político
forçam a ampliação da noção de
2
O artigo apresenta um recorte de nossa
pesquisa de pós-
doutorado, que abordou a
relação entre as cidades, o poder público e as
culturas locais no Brasil e na Argentina. Uma
versão anterior do trabalho foi apresentada
20º
Congresso Brasileiro de Sociologia.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
Popular collectives in the Recôncavo da Bahia: culture, memory and resistance
bject of this paper are three local participatory experiences, with attention to the
strategies adopted by groups of the
Recôncavo da Bahia
to safeguard their cultural manifestations, in
a complex and contradictory relationship with the Stat
e. The acknowledgement of
(2012) and
Cheganças, Marujadas e Embaixadas
(2019), manifestations
of subalternised groups, as cultural heritage by the public authorities was a milestone and the process
on deserves attention, as it begins with attempts by the public authorities to induce
popular participation, with risks of domestication and disciplining. Assuming a situated perspective and
considering the idea of cultural citizenship, we opted for an app
roach that led us to identify the
protagonists of the processes described, focusing on their motivations and their capacity for agency.
The research shows that the heritage processes in question meant, for the groups involved, a strategy
path to deepening the processes of mobilization and collective organization in
search of protagonism in the conduction of their cultural manifestations.
popular culture; cultural citizenship; participation; cultural heritage; Recôncavo da Bahia.
Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura, memória e resistência
Neste artigo voltamos a atenção
para as ações de patrimonialização
desenvolvidas por grupos culturais
do Recôncavo
Cachoeira, Santo Amaro da
para a
do Samba de Roda (2004),
do Bembé do Mercado (2012) e das
Cheganças, Marujadas e Embaixadas
numa complexa relação com o
Nosso interesse foi pensar as
experiências participativas locais
com atenção para o surgimento
de
novos atores que “com suas
reivindicações político
-culturais,
forçam a ampliação da noção de
O artigo apresenta um recorte de nossa
doutorado, que abordou a
relação entre as cidades, o poder público e as
culturas locais no Brasil e na Argentina. Uma
versão anterior do trabalho foi apresentada
no
Congresso Brasileiro de Sociologia.
cidadania, agregando novos
valores e direitos àqueles já
conquistados” (BARBALHO, 2010,
p. 242).
Cabe salientar que, no contexto
político cultural em que as açõe
desenvolveram, o Governo Federal
empreendeu esforços para estimular (e
mesmo induzir) a participação.
de um processo controverso.
lado,
as fortes assimetrias de poder
presentes na sociedade brasileira,
usualmente excluem os agentes
populares
do exercício da cidadania e,
nesse sentido, a indução à participação
pode ser vista como um avanço
democrático, por outro,
questionar o potencial emancipatório da
participação quando esta é realizada
através de mecanismos impu
30
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Popular collectives in the Recôncavo da Bahia: culture, memory and resistance
bject of this paper are three local participatory experiences, with attention to the
to safeguard their cultural manifestations, in
e. The acknowledgement of
Samba de Roda
(2019), manifestations
of subalternised groups, as cultural heritage by the public authorities was a milestone and the process
on deserves attention, as it begins with attempts by the public authorities to induce
popular participation, with risks of domestication and disciplining. Assuming a situated perspective and
roach that led us to identify the
protagonists of the processes described, focusing on their motivations and their capacity for agency.
The research shows that the heritage processes in question meant, for the groups involved, a strategy
path to deepening the processes of mobilization and collective organization in
popular culture; cultural citizenship; participation; cultural heritage; Recôncavo da Bahia.
Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura, memória e resistência
cidadania, agregando novos
valores e direitos àqueles
conquistados” (BARBALHO, 2010,
Cabe salientar que, no contexto
-
político cultural em que as açõe
s se
desenvolveram, o Governo Federal
empreendeu esforços para estimular (e
mesmo induzir) a participação.
Trata-se
de um processo controverso.
Se, por um
as fortes assimetrias de poder
presentes na sociedade brasileira,
usualmente excluem os agentes
culturais
do exercio da cidadania e,
nesse sentido, a indução à participação
pode ser vista como um avanço
democrático, por outro,
que se
questionar o potencial emancipatório da
participação quando esta é realizada
através de mecanismos impu
lsionados
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
pelo próprio poder público. (ZIMBRÃO
SILVA, 2018).
Analisando experiências na
América Latina, Felipe Addor (2018, p.
1116) salienta que a
consolidação
novas estruturas democráticas
participativas não será garantida por
regras ou leis que cr
institucionalidades,
mas pelas existências
de cidadãos que tenham capacidade de
dar-lhes vida...” Assim,
optamos por uma
abordagem que
buscou identificar os
protagonistas dos processos descritos,
focando em suas motivações, sua
capacidade de agên
cia e de apropriação
do espaço público.
Segundo Maria da Glória Gohn
(1997, p. 88), “a
genciamento refere
processo de conscientização de que é
possível alterar as condições ou as
políticas por meio da ação coletiva.
Agência
é entendida neste artigo c
algo que está “encarnada nas relações
sociais, e pode ser efetiva através
delas” (LONG apud
PEREIRA; SOLGIO, 2014, p. 108). Assim,
para Norman
Long “a agência, então,
implica a geração e uso ou manipulação
de redes de relações sociais e a
canalização de elementos espeficos...
através de pontos nodais de interpretação
e interação.” (idem, ibidem
). Relevante,
aqui, são
os dois aspectos centrais da
noção de agência identificados por
Giddens (1984), conhecimento e
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
pelo próprio poder público. (ZIMBRÃO
;
Analisando experiências na
América Latina, Felipe Addor (2018, p.
consolidação
de
novas estruturas democráticas
participativas não será garantida por
regras ou leis que cr
iem novas
mas pelas existências
de cidadãos que tenham capacidade de
optamos por uma
buscou identificar os
protagonistas dos processos descritos,
focando em suas motivações, sua
cia e de apropriação
Segundo Maria da Glória Gohn
genciamento refere
-se ao
processo de conscientização de que é
possível alterar as condições ou as
políticas por meio da ação coletiva.
é entendida neste artigo c
omo
algo que está encarnada nas relações
sociais, e pode ser efetiva através
GONZALES;
PEREIRA; SOLGIO, 2014, p. 108). Assim,
Long a agência, então,
implica a geração e uso ou manipulação
de redes de relações sociais e a
canalização de elementos específicos...
através de pontos nodais de interpretação
). Relevante,
os dois aspectos centrais da
noção de agência identificados por
Giddens (1984), conhecimento e
capacidade.
Partindo da hipó
coletivos abordados operam com lógicas e
saberes não reconhecidos, nos voltamos
para as práticas dos atores envolvidos,
atentando para as estratégias de atuação
e também para os resultados do processo.
Trata-
se de uma pesquisa
exploratória que
teve como ponto de
partida
as formas organizativas e a
atuação de grupos
populares no Brasil e
na Argentina. Diferentes relações com a
participação e com a salvaguarda de suas
manifestações nos lev
aram
de patrimonialização dos grupos do
Recôn
cavo. Nosso percurso metodológico
englobou revisão de literatura; análise
documental e entrevistas semi
estruturadas com três
pessoas
processos de patrimonialização em tela.
1.
Patrimônio e memória em um
novo contexto político
Art. 215. O
Estado garantirá a
todos o pleno exercício dos
direitos culturais e acesso às
fontes da cultura nacional, e
apoiará e incentivará a
valorização e a difuo das
manifestações culturais.
(BRASIL, 1988).
Desde 1988, a Constituição da
República Federativa do
a cultura como um direito e afirma o papel
ativo do Estado para sua garantia. Esta
perspectiva, entretanto,
contradição com o modelo neoliberal
31
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Partindo da hipó
tese que os
coletivos abordados operam com lógicas e
saberes não reconhecidos, nos voltamos
para as práticas dos atores envolvidos,
atentando para as estratégias de atuação
e também para os resultados do processo.
se de uma pesquisa
teve como ponto de
as formas organizativas e a
populares no Brasil e
na Argentina. Diferentes relações com a
participação e com a salvaguarda de suas
aram
aos processos
de patrimonialização dos grupos do
cavo. Nosso percurso metodológico
englobou revisão de literatura; análise
documental e entrevistas semi
-
pessoas
-chave dos
processos de patrimonialização em tela.
Patrimônio e memória em um
novo contexto político
-cultural
Estado garantirá a
todos o pleno exercício dos
direitos culturais e acesso às
fontes da cultura nacional, e
apoiará e incentivará a
valorização e a difusão das
manifestações culturais.
(BRASIL, 1988).
Desde 1988, a Constituição da
República Federativa do
Brasil reconhece
a cultura como um direito e afirma o papel
ativo do Estado para sua garantia. Esta
perspectiva, entretanto,
estava em franca
contradição com o modelo neoliberal
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
vigente (BEZERRA; PITOMBO, 2016) e
começa a se efetivar a partir de 2003,
quando no primeiro Governo Lula o
Ministério da Cultura (MinC) inaugura um
deslocamento de peso nas políticas
culturais brasileiras(VARELLA; BRANDT,
2020; RUBIM, 2007). Operando com um
conceito de cultura ampliado e na
perspectiva da cidadania cultural,
inicia uma série de ações e programas
que visam a sociedade como um todo, ao
invés de ter como foco os artistas, como
era
usual até então. Relevante como
contexto para este trabalho o as
iniciativas de fortalecimento da
institucionalidade cultural
, em especial a
construção do Sistema Nacional de
Cultura (SNC),
proposto como novo
modelo de gestão de políticas públicas de
cultura construídas democraticamente,
integrando de forma
descentralizada e
participativa
os três níveis da federação e
a socieda
de civil, [tendo como base] uma
concepção comum
de política cultural e
uma efetiva
interação e
complementaridade..
.” (MINC, 2010, p.
17).
3 Marilena Chauí (2006) refere-
se à políticas
culturais fundamentadas na
ideia da cultura
como um direito, o que implica
não
em proporcionar à população
acesso à
produção cultural (ou
seja, à fruição),
também acesso aos meios
para a produção
cultural, bem
como a garantia da possibilidade
dos cidadãos e cidadãs
intervirem
nas decisões sobre as políticas
públicas de
cultura (a participação).
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
vigente (BEZERRA; PITOMBO, 2016) e
começa a se efetivar a partir de 2003,
quando no primeiro Governo Lula o
Ministério da Cultura (MinC) inaugura um
deslocamento de peso nas políticas
culturais brasileiras(VARELLA; BRANDT,
2020; RUBIM, 2007). Operando com um
conceito de cultura ampliado e na
perspectiva da cidadania cultural,
3 o MinC
inicia uma rie de ações e programas
que visam a sociedade como um todo, ao
invés de ter como foco os artistas, como
usual até então. Relevante como
contexto para este trabalho são as
iniciativas de fortalecimento da
, em especial a
construção do Sistema Nacional de
proposto como novo
modelo de gestão de políticas públicas de
cultura construídas democraticamente,
descentralizada e
os três níveis da federação e
de civil, [tendo como base] uma
de política cultural e
interação e
. (MINC, 2010, p.
se à políticas
ideia da cultura
não
somente
acesso à
seja, à fruição),
mas
para a produção
como a garantia da possibilidade
intervirem
diretamente
públicas de
O SNC tem a participação como
eixo central, o que se revela
princípios e diretrizes do Sistema e do
Plano N
acional de Cultura (PNC).
o Brasil um país profundamente desigual,
marcado por tradições autoritárias e uma
cultura política centralizadora e
clientelista, o Ministério passou a realizar
uma série de ações para induzir a
participação e o controle so
criação de conselhos, realização de
conferências de cultura, consultas
públicas etc.
Também a proteção ao patrimônio
sofreu um forte deslocamento no culo
XXI.
O Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN), criado em
1937
como do Serviço Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), é
uma das instituições mais estáveis do país
e construiu um sistema operacional muito
bem sucedido, transformando a instituição
“em algo exemplar para as políticas
culturais no Brasil e em
(RUBIM, 2007, p. 17). Cabe, entretanto,
salientar que até o ano 2000, quando foi
instituído o Registro de Bens Culturais de
4 Por exemplo no
Principio X do SNC,
democratização dos processos decisórios
com participação e controle social ou no
Princípio IX do PNC
, “democratização das
instâncias de formulação das políticas
culturais”. Uma das diretrizes do PNC é
“Estimular a organização de instâncias
consultivas, co
nstruir mecanismos de
participação da sociedade civil, e ampliar o
diálogo com agentes culturais e criadores.
32
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
O SNC tem a participação como
eixo central, o que se revela
em vários
prinpios e diretrizes do Sistema e do
acional de Cultura (PNC).
4 Sendo
o Brasil um país profundamente desigual,
marcado por tradições autoritárias e uma
cultura política centralizadora e
clientelista, o Ministério passou a realizar
uma rie de ações para induzir a
participação e o controle so
cial, como a
criação de conselhos, realização de
conferências de cultura, consultas
Também a proteção ao patrimônio
sofreu um forte deslocamento no culo
O Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN), criado em
como do Serviço Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), é
uma das instituições mais estáveis do país
e construiu um sistema operacional muito
bem sucedido, transformando a instituição
em algo exemplar para as políticas
culturais no Brasil e em
muitos países”
(RUBIM, 2007, p. 17). Cabe, entretanto,
salientar que até o ano 2000, quando foi
instituído o Registro de Bens Culturais de
Principio X do SNC,
democratização dos processos decisórios
com participação e controle social” ou no
, democratização das
instâncias de formulação das políticas
culturais. Uma das diretrizes do PNC é
Estimular a organização de instâncias
nstruir mecanismos de
participação da sociedade civil, e ampliar o
diálogo com agentes culturais e criadores.”
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
Natureza Imaterial, as ações do Instituto
se pautavam por um entendimento restrito
de cultura, com ênfase na proteção
signos de poder político e religioso, e
concentração no período colonial.
Instituto do Patrimônio
naturalizou uma
determinada leitura do país tornando,
assim, invisível a posição ativa e
eminentemente política de seus
especialistas na construção de
determinada representação nacional. Sob
a égide da “competência técnica
permaneceram ocultas as formações
discursivas que embasaram as políticas
do IPHAN.
Com a Constituição Federal de
1988, uma mudança de paradigma na
proteção ao patrimônio cultur
Não somente o valor patrimonial de um
bem cultural passa a ser mensurado em
função de seu valor de referência à
identidade, à ação, à memória dos
diferentes grupos formadores da
sociedade brasileira”
(BRASIL, 1988, Art.
216), ao invés de exce
pcional valor
histórico e artístico”, critério definido no
5 Importante fazer referência ao
trabalho de
Aloísio
Magalhães e à criação do Centro
Nacional de Referência Cultural
(CNRC), em
1975, que contra
punha à noção de patrimônio
histórico e artistic a
ideia da referência cultural.
Com isso, abriu-
questionamentos sobre quem
tem
para selecionar o que deve (ou
não) ser
preservado, inaugurando
uma nova
compreensão
do patrimônio. Contudo, o
falecimento
precoce de Magalhães
continuidade do processo.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
Natureza Imaterial, as ações do Instituto
se pautavam por um entendimento restrito
de cultura, com ênfase na proteção
aos
signos de poder político e religioso, e
concentração no período colonial.
5O
naturalizou uma
determinada leitura do país tornando,
assim, invisível a posição ativa e
eminentemente política de seus
especialistas na construção de
uma
determinada representação nacional. Sob
a égide da competência técnica”
permaneceram ocultas as formações
discursivas que embasaram as políticas
Com a Constituição Federal de
1988, há uma mudança de paradigma na
proteção ao patrimônio cultur
al do país.
Não somente o valor patrimonial de um
bem cultural passa a ser mensurado em
função de seu valor de referência à
identidade, à ação, à memória dos
diferentes grupos formadores da
(BRASIL, 1988, Art.
pcional valor
histórico e artístico, critério definido no
trabalho de
Magalhães e à criação do Centro
(CNRC), em
punha à noção de patrimônio
ideia da referência cultural.
se espaço para uma
série de
tem
legitimidade
não) ser
uma nova
do patrimônio. Contudo, o
precoce de Magalhães
impediu a
Decreto 25/1937 e determinante até
então, como também ele não é mais
reduzido a seus elementos materiais.
Além disso, a sociedade é instada a
colaborar ativamente com o poder público
para sua prote
ção, que não é mais
apenas responsabilidade de especialistas
e técnicos (BRASIL, 1988, Art. 216, § 1°).
A mudança é de tal amplitude que as
práticas estabelecidas desde a década de
1930 tornaram-
se insuficientes: ao
tombamento, definido pelo Decreto no
25/
1937, veio se juntar no ano 2000 uma
nova modalidade de proteção, o Registro
de Bens Culturais de Natureza Imaterial.
Pensando na Burocracia como
racionalidade administrativa,
compartilhamos a percepção de Marilena
Chauí
(1997, p. 148) quando afirma que
noção de competência tem a função
precisa de marcar a desigualdade [...]
entre os detentores do saber e os
despossuídos” e introduzimos
reflexões a ideia de cidadania cultural
reconhece o direito à participação e prevê
a intervenção dire
ta dos cidadãos e
cidadãs nas decisões sobre as políticas
6
O Registro de Bens Culturais de Natureza
Imaterial é o instrumento
aplicado aos bens
que obedecem às categorias estabelecidas
pelo Decreto 3551/2000. Ao serem
registrados, os bens recebem o título de
Patrimônio Cultural Brasileiro e são inscritos
em um dos quatro
Livros de Registro: dos
Saberes, das Celebrações, das Formas de
Expressão, e dos Lugares
http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/122.
Acesso em nov. 2020.
33
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Decreto 25/1937 e determinante até
então, como também ele não é mais
reduzido a seus elementos materiais.
Além disso, a sociedade é instada a
colaborar ativamente com o poder público
ção, que não é mais
apenas responsabilidade de especialistas
e técnicos (BRASIL, 1988, Art. 216, § 1°).
A mudança é de tal amplitude que as
práticas estabelecidas desde a década de
se insuficientes: ao
tombamento, definido pelo Decreto no
1937, veio se juntar no ano 2000 uma
nova modalidade de proteção, o Registro
de Bens Culturais de Natureza Imaterial.
6
Pensando na Burocracia como
racionalidade administrativa,
compartilhamos a percepção de Marilena
(1997, p. 148) quando afirma que
“a
noção de competência tem a função
precisa de marcar a desigualdade [...]
entre os detentores do saber e os
despossuídos” e introduzimos
nas nossas
reflexões a ideia de cidadania cultural
, que
reconhece o direito à participação e prevê
ta dos cidadãos e
cidadãs nas decies sobre as políticas
O Registro de Bens Culturais de Natureza
aplicado aos bens
que obedecem às categorias estabelecidas
pelo Decreto 3551/2000. Ao serem
registrados, os bens recebem o título de
Patrimônio Cultural Brasileiro e são inscritos
Livros de Registro: dos
Saberes, das Celebrações, das Formas de
Expressão, e dos Lugares
. Cf.
http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/122.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
públicas de cultura (
CHAUÍ, 2006).
Concebendo o cidadão como sujeito de
direitos, a autora aponta para a
necessidade de se garantir os direitos
daqueles que não têm direitos. Essa ideia,
pensada do
ponto de vista da gestão
pública, é complementar às colocações de
Carlos Fortuna
(2012, p. 202), quando,
desenvolvendo a ideia do direito à cidade,
refere-se à
construção de “lugares onde
os usuários manifestam sua recusa em
ser recusados e desenvolvem est
de afirmação identitária alternativa.
Entendemos que, nesse processo de
apropriação do espaço público,
“subjetividades incompatíveis com o
capitalismo” (MIGNOLO, 2017) reafirmam
sua existência e criam fissuras no
discurso hegemônico. Aqui
se
ambiguidades apontadas por Quijano
(apud
LANDER, 2000, p. 201) ao referir
se a uma
Modernidade que, por um lado,
se fundamenta na dominação, no
apagamento e na exploração de grupos
como os que protagonizam esse artigo,
mas que, por outro, ancora ta
processos de democratização e
reconhecimento.
De que forma e em que
medida isso se nos processos
analisados, é o que veremos adiante.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
CHAUÍ, 2006).
Concebendo o cidadão como sujeito de
direitos, a autora aponta para a
necessidade de se garantir os direitos
daqueles que não têm direitos. Essa ideia,
ponto de vista da gestão
pública, é complementar às colocações de
(2012, p. 202), quando,
desenvolvendo a ideia do direito à cidade,
construção de lugares onde
os usuários manifestam sua recusa em
ser recusados e desenvolvem est
ratégias
de afirmação identitária alternativa.”
Entendemos que, nesse processo de
apropriação do espaço público,
subjetividades incompatíveis com o
capitalismo (MIGNOLO, 2017) reafirmam
sua existência e criam fissuras no
se
revelam as
ambiguidades apontadas por Quijano
LANDER, 2000, p. 201) ao referir
-
Modernidade que, por um lado,
se fundamenta na dominação, no
apagamento e na exploração de grupos
como os que protagonizam esse artigo,
mas que, por outro, ancora ta
mbém
processos de democratização e
De que forma e em que
medida isso se dá nos processos
analisados, é o que veremos adiante.
2. Participação e
patrimonialização
no Recôncavo da Bahia
2.1.
O Samba de Roda do
Recôncavo –
Obra Prima da
Humanidade
Chamamos de Rencavo da
Bahia a região localizada em torno da
Baía de Todos os Santos. Entre os
diversos aspectos que irão configurar o
território estão uma história marcada pela
relação colônia-
metrópole, pela
escravidão e pela monocultura de
exportaçã
o. A economia da cana de
açúcar, estruturante para ao território, foi
movida por uma mão de obra composta
por negros/as escravizados/as, vindos de
diferentes culturas e religiões da África.
No final do século XIX aprox. 70% da
população era composta pelos
seus descendentes e essa é, ainda hoje,
uma região profundamente marcada pelas
culturas de matriz africana. Atualmente o
Recôncavo é tamm um dos 27
“Territórios de Identidade da Bahia,
unidad
es administrativas instituídas p
Governo do Estado em 2007.
O
Samba de Roda (SR) é
expressão musical-
coreográfica e festiva
presente em todo o Estado da Bahia, mas
especialmente conectada com a região do
Recôncavo, com
registros desde o culo
7 Mais
sobre o Recôncavo
25). Cf. também Santos (
1998
34
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
patrimonialização
no Recôncavo da Bahia
O Samba de Roda do
Obra Prima da
Chamamos de Recôncavo da
Bahia a região localizada em torno da
Baía de Todos os Santos. Entre os
diversos aspectos que irão configurar o
território estão uma história marcada pela
metrópole, pela
escravidão e pela monocultura de
o. A economia da cana de
açúcar, estruturante para ao território, foi
movida por uma mão de obra composta
por negros/as escravizados/as, vindos de
diferentes culturas e religiões da África.
No final do culo XIX aprox. 70% da
população era composta pelos
africanos e
seus descendentes e essa é, ainda hoje,
uma região profundamente marcada pelas
culturas de matriz africana. Atualmente o
Rencavo é também um dos 27
Territórios de Identidade” da Bahia,
es administrativas instituídas p
elo
Governo do Estado em 2007.
7
Samba de Roda (SR) é
uma
coreográfica e festiva
presente em todo o Estado da Bahia, mas
especialmente conectada com a região do
registros desde o século
sobre o Recôncavo
em IPHAN (2006, p.
1998
).
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
XVII. O SR era uma celebração cotidiana
um “samba de vizinho”,
uma brincadeira,
uma
alegria para a população
trabalhadora
”, segundo Dona Dalva
Damiana de Freitas.8
Conectado com
outras manifestações culturais de matriz
africana como o candomblé e a capoeira,
o SR é indispensável nos carurus
louvor a Cosme e Damião, santos
católicos sincretizados com os Ibeji
outras festas do catolicismo popular e das
tradições religiosas afro-
brasileiras.
Considerado um dos marcos
distintivos do Recôncavo, o Samba de
Roda foi
condecorado com o
Obra Prima do Patrimônio Oral e Imaterial
da Humanidade pela Organização das
Nações Unidas para a Educação
(UNESCO),
em 2005; como Patrimônio
Imaterial do Brasil pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN), em 2004; e como Pa
Cultural Imaterial do Estado da Bahia, em
2020.10
8
Informação oral. Participação de Dona Dalva
na
entrevista com Any Manuela Freitas dos
Santos Nascimento, em 28/10/2020.
9
Divindades gêmeas do panteão iorubá.
10O Samba de Roda foi regist
rado como
Patrimônio Cultural do Brasil
no Livro das
Formas de Expressão do IPHAN, em 05 de
outubro de 2004;
reconhecido como Obra
Prima da Humanidade pela UNESCO desde
25 de novembro de 2005.
Através do
19.494/2020,
reconhecido como Patrimônio
Cultural Imaterial do Estado da Bahia.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
XVII. O SR era uma celebração cotidiana
,
uma “brincadeira”,
alegria para a população
, segundo Dona Dalva
Conectado com
outras manifestações culturais de matriz
africana como o candomblé e a capoeira,
o SR é indispenvel nos carurus
em
louvor a Cosme e Damião, santos
católicos sincretizados com os Ibeji
9, e em
outras festas do catolicismo popular e das
brasileiras.
Considerado um dos marcos
distintivos do Rencavo, o Samba de
condecorado com o
título de
Obra Prima do Patrimônio Oral e Imaterial
da Humanidade pela Organização das
Nações Unidas para a Educação
em 2005; como Patrimônio
Imaterial do Brasil pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN), em 2004; e como Pa
trimônio
Cultural Imaterial do Estado da Bahia, em
Informação oral. Participação de Dona Dalva
entrevista com Any Manuela Freitas dos
Santos Nascimento, em 28/10/2020.
Divindades gêmeas do panteão iorubá.
rado como
no Livro das
Formas de Expressão do IPHAN, em 05 de
reconhecido como Obra
Prima da Humanidade pela UNESCO desde
Através do
Decreto
reconhecido como Patrimônio
Cultural Imaterial do Estado da Bahia.
Proponentes do registro do
Samba de Roda como patrimônio
imaterial foram a Associação Cul
do Samba de Roda Dalva Damiana de
Freitas
; o Grupo Cultural Filhos de
Nagô e a Associação de Pesquisa
Cultura Popular e Música Tradicional
do Recôncavo (APCM) em 2003. As
duas primeiras são grupos de Samba
de Roda das cidades de Cachoeira e
São Félix, a última, uma instituição de
pesquisa.11
Cabe salientar que a iniciativa
de patrimonialização do SR, não
dos grupos, mas do Ministério da
Cultura/Iphan. A coordenadora da
APCM, Francisca Marques participou
da preparação do dossiê de registro e,
11 “A APCM-
Recôncavo foi fundada em 2003
por pesquisadores, professores, artistas,
músicos e sambadeiras na cidade de
Cachoeira, Bahia, tendo como objetivo
preservar e disseminar conheciment
cultura popular e música do Recôncavo
através de ações educativas e culturais.
Integra [atualmente] a associação, o
Laboratório de Etnomusicologia, Antropologia
e Audiovisual –
LEAA Recôncavo, com
produção de acervo audiovisual sobre
pessoas, luga
res e festas religiosas do
Recôncavo. O LEAA-
Recôncavo produz
documentações com registros em áudio,
vídeos e fotografias, além de capacitação
técnica dos grupos de samba de roda e de
outras expressões artísticas e religiosas da
cidade e região.” (NASCIMENT
O Laboratório de Etnomusicologia desenvolve
o projeto Arquivo de Som e Imagem Dalva
Damiana de Freitas Disponível em:
http://culturadigital.br
/arquivodalvadamianadefr
eitas/.
35
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Proponentes do registro do
Samba de Roda como patrimônio
imaterial foram a Associação Cul
tural
do Samba de Roda Dalva Damiana de
; o Grupo Cultural Filhos de
Nagô e a Associação de Pesquisa
em
Cultura Popular e Música Tradicional
do Rencavo (APCM) em 2003. As
duas primeiras são grupos de Samba
de Roda das cidades de Cachoeira e
São Félix, a última, uma instituição de
Cabe salientar que a iniciativa
de patrimonialização do SR, não
veio
dos grupos, mas do Ministério da
Cultura/Iphan. A coordenadora da
APCM, Francisca Marques participou
da preparação do dossiê de registro e,
Recôncavo foi fundada em 2003
por pesquisadores, professores, artistas,
músicos e sambadeiras na cidade de
Cachoeira, Bahia, tendo como objetivo
preservar e disseminar conheciment
os sobre
cultura popular e música do Recôncavo
atras de ações educativas e culturais.
Integra [atualmente] a associação, o
Laboratório de Etnomusicologia, Antropologia
LEAA Recôncavo, com
produção de acervo audiovisual sobre
res e festas religiosas do
Recôncavo produz
documentações com registros em áudio,
vídeos e fotografias, além de capacitação
técnica dos grupos de samba de roda e de
outras expressões artísticas e religiosas da
cidade e região. (NASCIMENT
O, 2019, p. 19).
O Laboratório de Etnomusicologia desenvolve
o projeto Arquivo de Som e Imagem Dalva
Damiana de Freitas Disponível em:
/arquivodalvadamianadefr
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
junto com o coordenador da pesquisa,
Carlos Sandroni, levou a ideia para
discussão com os grupos, que
entender
am que a patrimonialização
era uma possibilidade de obter apoio
ao SR.
Any Manuela de Freitas,
gestora da Casa do Samba de Dona
Dalva, de quem falaremos mais
adiante, conta sobre o processo:
Tudo pra gente era novidade,
como isso se desenha, a política
de salvaguarda, o método para
construção do dossiê. O que é
importante, o que é bacana é que
o dossiê foi construído em
assembleias e cidades do interior
da Bahia. As propostas que
constam no do
ssiê o de
escutas dos sambadores, o
demandas dos sambadores.
(Informação oral).12
No artigo
Samba de roda,
patrimônio
imaterial da humanidade,
Sandroni reflete sobre o processo e
aponta para um cenário de
negociações, vivências e
apropriações. Para e
le é
claro que a atribuição da expressão
patrimônio imaterial ao samba de roda
veio de ‘fora’ para ‘dentro.
Nenhum dos sambadores com quem
conversei em 2004 a conhecia.
(SANDRONI, 2010, p. 385).
12
Entrevista com Any Manuela Freitas dos
Santos Nascimento, em 2
8/10/2020.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
junto com o coordenador da pesquisa,
Carlos Sandroni, levou a ideia para
discuso com os grupos, que
am que a patrimonialização
era uma possibilidade de obter apoio
Any Manuela de Freitas,
gestora da Casa do Samba de Dona
Dalva, de quem falaremos mais
adiante, conta sobre o processo:
Tudo pra gente era novidade,
como isso se desenha, a política
de salvaguarda, o método para
construção do dossiê. O que é
importante, o que é bacana é que
o dossiê foi construído em
assembleias e cidades do interior
da Bahia. As propostas que
ssiê são de
escutas dos sambadores, são
demandas dos sambadores.
Samba de roda,
imaterial da humanidade”,
Sandroni reflete sobre o processo e
aponta para um cenário de
negociações, vivências e
le é
bastante
claro que a atribuição da expressão
patrimônio imaterial ao samba de roda
veio de fora para dentro’.
[...]
Nenhum dos sambadores com quem
conversei em 2004 a conhecia.”
(SANDRONI, 2010, p. 385).
Entrevista com Any Manuela Freitas dos
8/10/2020.
Optando por uma abordagem
que procura o contrapelo da história e
atenta para os apagamentos, voltamos
o olhar para as manifestações do
coletivo, tentando entender como os
grupos se colocaram nesse processo,
quais suas motivações, suas
estratégias, suas esc
colocamos uma questão simples: o
que aconteceu a partir do registro?
Resumindo podemos dizer que alguns
grupos de Samba de Roda
destaque para a Associação Cul
do Samba de Roda Dalva Damiana de
Freitas (ACSRDD)
e a
Sambad
ores e Sambadeiras do
Estado da Bahia (
ASSEBA)
apoderam do tema. Pode
dizer que a
ACSRDD
com o tema e assumiu o protagonismo
de sua salvaguarda. Em que
condições, veremos a seguir.
Samba de Roda
Dalva
Em 1958, dona
de Freitas, operária charuteira em
Cachoeira, cria o Samba de Roda
13
Importante fazer referência às ações
realizadas pela Associação de Sambadores e
Sambadeiras do Estado da Bahia (
que, entretanto, foram
descontinuadas
diversos momentos.
36
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Optando por uma abordagem
que procura o contrapelo da história e
atenta para os apagamentos, voltamos
o olhar para as manifestações do
coletivo, tentando entender como os
grupos se colocaram nesse processo,
quais suas motivações, suas
estratégias, suas esc
olhas. Nos
colocamos uma questão simples: o
que aconteceu a partir do registro?
Resumindo podemos dizer que alguns
grupos de Samba de Roda
com
destaque para a Associação Cul
tural
do Samba de Roda Dalva Damiana de
e a
Associação de
ores e Sambadeiras do
ASSEBA)
13 se
apoderam do tema. Pode
-se mesmo
ACSRDD
se empoderou
com o tema e assumiu o protagonismo
de sua salvaguarda. Em que
condições, veremos a seguir.
Samba de Roda
Samba de
Em 1958, dona
Dalva Damiana
de Freitas, operária charuteira em
Cachoeira, cria o Samba de Roda
Importante fazer referência às ações
realizadas pela Associação de Sambadores e
Sambadeiras do Estado da Bahia (
ASSEBA),
descontinuadas
em
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
Suerdick. O grupo
permanece ativo e
está atualmente com uma campanha
para arrecadar fundos para a
construção de uma sede própria. Dona
Dalva é uma brincante incansável e
uma a
tivista cultural visionária. Além
do Samba Suerdick, ela criou (e
coordena ainda hoje, aos 93 anos)
outras manifestações como o Terno
das Baianas do Acarajé (1973), o
Terno de Reis Esperança da Paz
(1977), o Samba de Roda Mirim Flor
do Dia (1980) e a Quadr
ilha Junina da
Terceira Idade
Quanto mais velho,
melhor.
Alguns marcos na trajetória do
grupo foram a constituição de
personalidade jurídica, em 2003, como
Associação Cul
tural do Samba de
Roda Dalva Damiana de Freitas; a
inauguração da Casa do Samba de
Roda de Dona Dalva, uma sede
alugada em 2009; e o reconhecimento
como Ponto de Cultura, em 2014.
Detentora de inúmeros prêmios, objeto
de pesquisas acadêmicas,
protagonista de documentários, Dona
Dalva recebeu o título de Doutora
Honoris Causa
pela UFRB, e
sendo desde então carinhosamente
chamada de “Doutora do Samba.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
permanece ativo e
está atualmente com uma campanha
para arrecadar fundos para a
construção de uma sede própria. Dona
Dalva é uma brincante incansável e
tivista cultural visioria. Além
do Samba Suerdick, ela criou (e
coordena ainda hoje, aos 93 anos)
outras manifestações como o Terno
das Baianas do Acarajé (1973), o
Terno de Reis Esperança da Paz
(1977), o Samba de Roda Mirim Flor
ilha Junina da
Quanto mais velho,
Alguns marcos na trajetória do
grupo foram a constituição de
personalidade jurídica, em 2003, como
tural do Samba de
Roda Dalva Damiana de Freitas; a
inauguração da Casa do Samba de
Roda de Dona Dalva, uma sede
alugada em 2009; e o reconhecimento
como Ponto de Cultura, em 2014.
Detentora de inúmeros prêmios, objeto
de pesquisas acadêmicas,
protagonista de documentários, Dona
Dalva recebeu o título de Doutora
pela UFRB, e
m 2012,
sendo desde então carinhosamente
chamada de Doutora do Samba”.
O Samba de Dona Dalva é
coordenado por três gerações de
mulheres-
sambadeiras que
compartilham o vínculo familiar: Dona
Dalva, idealizadora, compositora e
coordenadora-
geral; Mestra Ana
sua filha, compositora e uma pioneira
do canto feminino no samba de roda
(
CSERMAK, 2020, p. 5
Manuela, sua neta e gestora da
Associação.
A monografia da especialização
em Políticas e Gestão Cultural de Any
Manuela Freitas Nascimento analis
contribuição da ACSRDD para o Plano
de Salvaguarda do Samba de Roda e
mostra uma vasta rie de ações em
prol da promoção, valorização,
difusão, transmissão e documentação
do SR, de 2004 até os dias atuais.
Entendemos que a alta
produtividade das açõe
Associação está vinculada aos
seguintes aspectos: em primeiro lugar,
a salvaguarda do samba de roda vai
de encontro aos desejos e às
14
Cf. NASCIMENTO, Any Manuela Freitas dos
Santos. Casa do Samb
a de Roda de Dona
Dalva:
Ponto de Cultura e Política de
Salvaguarda, um estudo de caso. 2019.
Monografia (Especialização). Universidade
Federal do Recôncavo da Bahia, Centro de
Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas,
Programa de Pós-
Graduação
Política e Gestão Cultural. Santo Amaro, 2019.
37
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
O Samba de Dona Dalva é
coordenado por três gerações de
sambadeiras que
compartilham o vínculo familiar: Dona
Dalva, idealizadora, compositora e
geral; Mestra Ana
Olga,
sua filha, compositora e uma pioneira
do canto feminino no samba de roda
CSERMAK, 2020, p. 5
3); e Any
Manuela, sua neta e gestora da
A monografia da especialização
em Políticas e Gestão Cultural de Any
Manuela Freitas Nascimento analis
a a
contribuição da ACSRDD para o Plano
de Salvaguarda do Samba de Roda e
mostra uma vasta série de ações em
prol da promoção, valorização,
difusão, transmissão e documentação
do SR, de 2004 até os dias atuais.
14
Entendemos que a alta
produtividade das açõe
s da
Associação está vinculada aos
seguintes aspectos: em primeiro lugar,
a salvaguarda do samba de roda vai
de encontro aos desejos e às
Cf. NASCIMENTO, Any Manuela Freitas dos
a de Roda de Dona
Ponto de Cultura e Política de
Salvaguarda, um estudo de caso. 2019.
Monografia (Especialização). Universidade
Federal do Recôncavo da Bahia, Centro de
Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas,
Graduação
Lato Sensu em
Política e Gestão Cultural. Santo Amaro, 2019.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
preocupações do grupo, que vinha
refletindo sobre a
continuidade do SR
desde os anos 1980, quando criou o
Samba de
Roda Mirim Flor do Dia, um
grupo de samba “mirim”, ou seja,
formado por crianças. Dona Dalva se
preocupava com o distanciamento das
crianças e jovens
que já não se
integravam ao grupo “naturalmente,
seja por que consideravam o samba
“coisa de velhos”, sej
preconceitos gerados pelo racismo e
pela intolerância religiosa (candomblé
e samba de roda vistos como coisas
do “demônio”).
Assim, teve início um
de educação patrimonial
processo comunitário, construído
através das relações cotidiana
de ações em torno do Samba de
Roda e de outras manifestações
tradicionais no bairro do
Rosarinho. Uma dessas ações foi
a criação, em 1980, do Samba de
Roda Mirim Flor do Dia com a
finalidade em preservar e
proporcionar a continuidade do
Samba de Roda,
neste momento.
(NASCIMENTO, 2019, p. 8, grifos
nossos).
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
preocupações do grupo, que vinha
continuidade do SR
desde os anos 1980, quando criou o
Roda Mirim Flor do Dia, um
grupo de samba mirim”, ou seja,
formado por crianças. Dona Dalva se
preocupava com o distanciamento das
que não se
integravam ao grupo naturalmente”,
seja por que consideravam o samba
coisa de velhos, sej
a pelos
preconceitos gerados pelo racismo e
pela intolerância religiosa (candomblé
e samba de roda vistos como coisas
Assim, teve início um
processo
de educação patrimonial
, um
processo comunitário, construído
atras das relações cotidiana
s e
de ações em torno do Samba de
Roda e de outras manifestações
tradicionais no bairro do
Rosarinho. Uma dessas ações foi
a criação, em 1980, do Samba de
Roda Mirim Flor do Dia com a
finalidade em preservar e
proporcionar a continuidade do
neste momento.
(NASCIMENTO, 2019, p. 8, grifos
Figura 1 –
Samba de Roda
(à frente, Any Manuela)
Foto: Francisca Helena Marques
LEAA/Recôncavo
Dona Dalva considera o
Samba Mirim [...]
o alicerce
de Roda” (NASCIMENTO, 2019, p. 9,
grifos nossos), ou seja, ela já pensava
na salvaguarda
do samba de roda,
mesmo sem usar essa palavra,
mesmo operando a partir de uma
lógica distinta daquela da burocracia
estatal. Existia, portanto, uma base de
atuação presente nos desejos e na
trajetória do próprio grupo. Não é por
acaso que aqui os frutos do Registro
15
De acordo com a Convenção para a
Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial:
“Entende-
se por “salvaguarda as medidas que
visam garantir a viabilidade do patrimônio
cultural imaterial, tais como
documentação, a investigação, a preservação,
a proteção, a promoção, a valorização, a
transmissão –
essencialmente por meio da
educação formal e não formal
deste patrimônio em seus diversos
(IPHAN, 2003, p. 5).
38
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
Samba de Roda
Mirim Flor do Dia
(à frente, Any Manuela)
Foto: Francisca Helena Marques
LEAA/Recôncavo
Dona Dalva considera “o
o alicerce
do Samba
de Roda (NASCIMENTO, 2019, p. 9,
grifos nossos), ou seja, ela pensava
do samba de roda,
mesmo sem usar essa palavra,
15
mesmo operando a partir de uma
lógica distinta daquela da burocracia
estatal. Existia, portanto, uma base de
atuação presente nos desejos e na
trajetória do próprio grupo. Não é por
acaso que aqui os frutos do Registro
De acordo com a Convenção para a
Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial:
se por salvaguarda” as medidas que
visam garantir a viabilidade do patrimônio
cultural imaterial, tais como
a identificação, a
documentação, a investigação, a preservação,
a proteção, a promoção, a valorização, a
essencialmente por meio da
educação formal e não formal
– e revitalização
deste patrimônio em seus diversos
aspectos”
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
do SR como patrimônio imaterial o
tão suculentos.
Em segundo lugar, a tripla
posição de Any Manuela Freitas nesse
processo, enquanto sambadora
integrante do Samba Mirim), gestora
da Casa do Samba e pesquisadora.
Trata-
se de uma posição privilegiada,
que lhe permite combinar as
perspectivas internas e externas,
fazendo as negociações e mediações
necessárias para as ações em prol do
SR e do pro
tagonismo das
sambadeiras. Freitas é graduada em
Administração e especialista em
Política e Gestão da Cultura e
sublinhou que
tanto [...a] família
sanguínea quanto [...a] família do
samba
a incentivaram a buscar
formação e
aperfeiçoamento para
conduzir a associação
(entrevista
citada). Ela conta ainda que
A gente sempre teve esse
objetivo de... de preparar
sambadores para a autonomia do
Samba de Roda. [...] No
momento da salvaguarda do SR,
isso cresce, cresce com as
oportunidades, com os diálogos
reuniões, conferências,
assembleias. Cresce inclusive
enquanto proposta: que os
sambadores sejam autônomos,
sejam preparados para gerir suas
apresentações. A gente inicia
tratando das questões locais, que
a gente consiga se organizar em
nosso local, em n
ossa região...
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
do SR como patrimônio imaterial são
Em segundo lugar, a tripla
posição de Any Manuela Freitas nesse
processo, enquanto sambadora
(ex-
integrante do Samba Mirim), gestora
da Casa do Samba e pesquisadora.
se de uma posição privilegiada,
que lhe permite combinar as
perspectivas internas e externas,
fazendo as negociações e mediações
necessárias para as ações em prol do
tagonismo das
sambadeiras. Freitas é graduada em
Administração e especialista em
Política e Gestão da Cultura e
tanto [...a] família
sanguínea quanto [...a] família do
a incentivaram a buscar
aperfeiçoamento para
(entrevista
citada). Ela conta ainda que
A gente sempre teve esse
objetivo de... de preparar
sambadores para a autonomia do
Samba de Roda. [...] No
momento da salvaguarda do SR,
isso cresce, cresce com as
oportunidades, com os diálogos
,
reuniões, conferências,
assembleias. Cresce inclusive
enquanto proposta: que os
sambadores sejam autônomos,
sejam preparados para gerir suas
apresentações. A gente inicia
tratando das questões locais, que
a gente consiga se organizar em
ossa região...
(Informação oral, entrevista
citada).
Um terceiro aspecto relevante
foi o “reconhecimento como Ponto de
Cultura (
em 2014, que
concretização e atendimento a anseios
e ações culturais nascidas e
desenvolvidas em comunidades em
período anterior à seleção.
(NASCIMENTO, 2019, p. 37). Isso
garantiu à associação recursos
financeiros estáveis por um período de
três anos, alg
o essencial para o
desenvolvimento das ações: com um
plano de trabalho focado nas linhas de
ação propostas pelo IPHAN no Plano
de Salvaguarda do Samba de Roda,
foi possível ampliar e expandir as
ações promovidas pelo grupo
liderado por Dona Dalva, com
para a difusão do samba de roda e
transmissão de conhecimentos, com
uma série de oficinas de canto, dança,
16
O Plano de Salvaguarda do Samba de Roda
é estruturado em quatro linhas, sendo a.
Pesquisa e documentação; b. Reprodução e
transmissão às novas gerações; c. Promoção;
e d. Apoio (“
Esta linha de ação tem um caráter
mais geral na medida em que se propõe a
fornecer alguns apoios diretos que criarão uma
estrutura de sustentação para as demais
atividades”, IPHAN, 2006, p. 89).
39
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
(Informação oral, entrevista
Um terceiro aspecto relevante
foi o reconhecimento como Ponto de
em 2014, que
) figurou em
concretização e atendimento a anseios
e ações culturais nascidas e
desenvolvidas em comunidades em
período anterior à seleção.”
(NASCIMENTO, 2019, p. 37). Isso
garantiu à associação recursos
financeiros estáveis por um período de
o essencial para o
desenvolvimento das ações: com um
plano de trabalho focado nas linhas de
ação propostas pelo IPHAN no Plano
de Salvaguarda do Samba de Roda,
16
foi possível ampliar e expandir as
ações já promovidas pelo grupo
liderado por Dona Dalva, com
ênfase
para a difusão do samba de roda e
transmissão de conhecimentos, com
uma rie de oficinas de canto, dança,
O Plano de Salvaguarda do Samba de Roda
é estruturado em quatro linhas, sendo a.
Pesquisa e documentação; b. Reprodução e
transmissão às novas gerões; c. Promoção;
Esta linha de ação tem um caráter
mais geral na medida em que se propõe a
fornecer alguns apoios diretos que criarão uma
estrutura de sustentação para as demais
atividades, IPHAN, 2006, p. 89).
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
música, educação patrimonial, entre
outras.17
2.2.
Breves notas sobre duas
outras experiências de
patrimonialização no Recôncavo da
Bahia
Que forma
s concretas to
processo de apropriação de um território
em um contexto marcado não somente
por diferenças, mas também por fortes
desigualdades?
Quais as estratégias
escolhidas por grupos populares para
reafirmação de identidades
subalternizadas? A co
mplexidade e a
potência do processo ocorrido em
Cachoeira nos impulsion
aram
brevemente, a atenção para as
experiências de patrimonialização de duas
outras manifestações culturais tradicionais
das cidades vizinhas, o Bembé do
Mercado, de Santo Ama
ro da Purificação
e as Cheganças, Marujadas e
Embaixadas, de Saubara.
Em função da conexão do Samba
de Roda com o Candomblé e a Capoeira,
e da vinculação não exclusiva de ativistas
culturais populares com diversas
manifestações, os grupos que propuseram
a
s novas ações de patrimonialização
participaram direta ou indiretamente do
17Cf. o detalhamento das ações
em
Nascimento (2019).
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
música, educação patrimonial, entre
Breves notas sobre duas
patrimonialização no Recôncavo da
s concretas to
rnam o
processo de apropriação de um território
em um contexto marcado não somente
por diferenças, mas também por fortes
Quais as estratégias
escolhidas por grupos populares para
reafirmação de identidades
mplexidade e a
potência do processo ocorrido em
aram
a voltar,
brevemente, a atenção para as
experiências de patrimonialização de duas
outras manifestações culturais tradicionais
das cidades vizinhas, o Bembé do
ro da Purificação
e as Cheganças, Marujadas e
Em função da conexão do Samba
de Roda com o Candomblé e a Capoeira,
e da vinculação não exclusiva de ativistas
culturais populares com diversas
manifestações, os grupos que propuseram
s novas ações de patrimonialização
participaram direta ou indiretamente do
em
processo de registro de SR.
O Bembé do Mercado, em Santo
Amaro da Purificação
Um ano após a abolição da
escravatura, celebrando publicamente a
liberdade, “os pescadores e o povo de
santo [...] transportaram para a rua o culto
que era dos terreiros” (IPHAN, 2019, p. 7)
realizando um Candomblé de rua que
durou três dias. Nasce o Bembé
Mercado. Celebrar a liberdade em um
contexto de repressão, realizar no espaço
público um culto religioso criminalizado e
reprimido foi um ato de profunda
insurgência.
Para Castro (2003)
O Bembé do Mercado, em Santo
amaro [sic], tem grandes
significados
para a afirmação da
cidadania negra no Brasil.
Eliminados quaisquer traços de
subserviência agradecida à
princesa pela Abolição, emerge a
evidência histórica da luta popular
contra o cativeiro e da força da
cultura afro
-
propulsora da resis
negro no Brasil.
A festa tem três partes: os ritos
privados, reservados aos iniciados do
Candomblé, que acontecem nos terreiros;
o Xirê, cantos e danças para os Orixás,
Voduns e Nkisis, que acontece atualmente
no Largo do Mercado, e a entr
40
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
processo de registro de SR.
O Bembé do Mercado, em Santo
Um ano após a abolição da
escravatura, celebrando publicamente a
liberdade, os pescadores e o povo de
santo [...] transportaram para a rua o culto
que era dos terreiros” (IPHAN, 2019, p. 7)
realizando um Candomblé de rua que
durou três dias. Nasce o Bembé
do
Mercado. Celebrar a liberdade em um
contexto de repressão, realizar no espaço
público um culto religioso criminalizado e
reprimido foi um ato de profunda
Para Castro (2003)
O Bembé do Mercado, em Santo
amaro [sic], tem grandes
para a afirmação da
cidadania negra no Brasil.
Eliminados quaisquer traços de
subserviência agradecida à
princesa pela Abolição, emerge a
evidência histórica da luta popular
contra o cativeiro e da força da
-
brasileira como
propulsora da resis
tência do povo
negro no Brasil.
A festa tem três partes: os ritos
privados, reservados aos iniciados do
Candomblé, que acontecem nos terreiros;
o Xirê, cantos e danças para os Orixás,
Voduns e Nkisis, que acontece atualmente
no Largo do Mercado, e a entr
ega do
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
presente deYemanjá, na praia de Itapema,
que encerra a festa.18
Figura 3 –
Bembé do Mercado (Xirê
do Mercado)
Foto: © Laís Lima (Santo Amaro)
Desde então a festa vem sendo
realizada anualmente. Durante muito
tempo, apesar de realizada
público, a celebração aconteceu sem
grande integração com o calendário
festivo da cidade, ficando restrita ao povo
de santo. Nos últimos anos, transformou
se num animado
evento que levou a
cidade para os noticiários e passou a
atrair não somente
a população em geral,
mas também turistas.
Mais de 40 Terreiros de
Candomblé da cidade estão envolvidos no
evento. Em entrevista, o Babalorixá Jo
Raimundo Lima Chaves (Pai Pote),
18 Essa a configuração
atual da celebração.
Mais detalhes nos
dossiês de registro
IPHAN, 2019 e Instituto do Patrimônio
e Cultural da Bahia (IPAC), 2014.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
presente deYemanjá, na praia de Itapema,
Bembé do Mercado (Xirê
na Praça
Foto: © Laís Lima (Santo Amaro)
Desde então a festa vem sendo
realizada anualmente. Durante muito
tempo, apesar de realizada
no espaço
público, a celebração aconteceu sem
grande integração com o calendário
festivo da cidade, ficando restrita ao povo
de santo. Nos últimos anos, transformou
-
evento que levou a
cidade para os noticiários e passou a
a população em geral,
Mais de 40 Terreiros de
Candomblé da cidade estão envolvidos no
evento. Em entrevista, o Babalorixá José
Raimundo Lima Chaves (Pai Pote),
atual da celebração.
dossiês de registro
em
IPHAN, 2019 e Instituto do Patrimônio
Artístico
e Cultural da Bahia (IPAC), 2014.
liderança religiosa e cultural de Santo
Amaro, conta que o grupo que organ
o Bembé passou a se sentir ofendido ao
ver externos assumirem um protagonismo
que não lhes cabia:
protagonista do Bem do Mercado, [...]
não saber de nada e ficar por fora
Assim, resolveram criar uma Comissão do
Bembé e retomar o l
ugar que era deles. O
grupo procurou apoio de entidades como
o Coletivo de Entidades Negras (CEN) e
realizou uma série de reuniões com os
terreiros envolvidos para discutir a criação
de uma associação. Segundo Pai Pote,
em entrevista citada,
Me
rcado precisava se organizar
juridicamente” para acessar os recursos
necessários à organização da festa e
deixar de ser “representado por outras
associações
”. Foi um longo processo, com
muitas reuniões com as lideranças
religiosas, muitas delas idosas, sem
muito conhecimento
(da burocracia),
pessoas antigas
”. O grupo reconheceu a
pertinência da formalização e, enquanto
se estruturava a associação, criava
estatuto, debatia metas e ações, uma
amiga de Pai Pote sugeriu o registro da
manifestação como patrimônio imaterial
da Bahia.
19
Entrevista com José Raimundo Lima
Chaves, mais conhecido
como Pai Pote, em
3/11/2020. As próximas
citações
fonte.
41
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
liderança religiosa e cultural de Santo
Amaro, conta que o grupo que organ
izava
o Bembé passou a se sentir “ofendido” ao
ver externos assumirem um protagonismo
que não lhes cabia:
a gente ser
protagonista do Bembé do Mercado, [...]
não saber de nada e ficar por fora
”.19
Assim, resolveram criar uma Comissão do
ugar que era deles. O
grupo procurou apoio de entidades como
o Coletivo de Entidades Negras (CEN) e
realizou uma rie de reuniões com os
terreiros envolvidos para discutir a criação
de uma associação. Segundo Pai Pote,
em entrevista citada,
o Bembé do
rcado precisava se organizar
juridicamente para acessar os recursos
necessários à organização da festa e
deixar de ser representado por outras
. Foi um longo processo, com
muitas reuniões com as lideranças
religiosas, muitas delas idosas, sem
(da burocracia),
são
. O grupo reconheceu a
pertinência da formalização e, enquanto
se estruturava a associação, criava
estatuto, debatia metas e ações, uma
amiga de Pai Pote sugeriu o registro da
manifestação como patrimônio imaterial
Entrevista com José Raimundo Lima
como Pai Pote, em
citações
advêm desta
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
Desde 2001, o terreiro de
can
domblé liderado por Pai Pote havia
constituído personalidade jurídica como
Associação Beneficente Ilê Axé Oju
e realizava uma série de atividades
culturais na cidade de Santo Amaro.
Tendo em vista que a Associação do
Bembé ainda não estava formaliza
ela a proponente do processo de registro.
Através do
decreto 14.129/2012
do Mercado foi
inscrito no Livro de
Registro de Eventos e Celebrações do
Estado
e reconhecido como Patrimônio
Imaterial da Bahia. Em 13 de junho de
2019, foi registra
do no Livro de Registro
das Celebrações
e reconhecido como
Patrimônio Imaterial do Brasil.
Associação do Bembé foi
formalizada e, desde então, todas as
decisões são tomadas coletivamente:
todos votam e tem direito de
palavra […] porque uma cabeça
ajuda a
outra […] E eu não posso
assinar nada como presidente do
Bembé sem me reunir com os
outros, sem as palavras das 50
20 Cf.
CHAVES, José Raimundo Lima.
Aprendendo com o Axé:
A Experiência da
Gestão Cultural na Associação
Beneficente
Axé Oju Onirê2019. Monografia
(Especialização). Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia, Centro de Cultura,
Linguagens e Tecnologias Aplicadas,
Programa de Pós-Graduação
Lato Sensu
Política e Gestão Cultural. Santo Amaro, 2019.
21 O Dossiê para o registro
nacional
elaborado por uma equipe do
Cecult
com a participação de estudantes
celebração.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
Desde 2001, o terreiro de
domblé liderado por Pai Pote havia
constituído personalidade jurídica como
Associação Beneficente Ilê Axé Oju
Onirê
e realizava uma rie de atividades
culturais na cidade de Santo Amaro.
20
Tendo em vista que a Associação do
Bembé ainda não estava formaliza
da, foi
ela a proponente do processo de registro.
decreto 14.129/2012
, o Bembé
inscrito no Livro de
Registro de Eventos e Celebrações do
e reconhecido como Patrimônio
Imaterial da Bahia. Em 13 de junho de
do no Livro de Registro
e reconhecido como
Patrimônio Imaterial do Brasil.
21
Associação do Bembé foi
formalizada e, desde então, todas as
decies são tomadas coletivamente:
todos votam e tem direito de
palavra […] porque uma cabeça
outra […] E eu não posso
assinar nada como presidente do
Bembé sem me reunir com os
outros, sem as palavras das 50
CHAVES, José Raimundo Lima.
A Experiência da
Beneficente
Ilê
(Especialização). Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia, Centro de Cultura,
Linguagens e Tecnologias Aplicadas,
Lato Sensu
em
Política e Gestão Cultural. Santo Amaro, 2019.
nacional
foi
Cecult
/UFRB,
com a participação de estudantes
vinculados à
pessoas que participam do
Bembé.22
Após o reconhecimento nacional,
atualmente, a questão da salvaguarda da
celebração está em pauta no
As Marujadas e Cheganças de
Saubara
Cheganças são encenações
performáticas, cantadas e faladas, que
contam sobre embates marítimos. Elas
acontecem no espaço público e estão
frequentemente associadas com datas
festivas da religiosidade popular.
Existem controvérsias na definição
das Cheganças. Para alguns um auto de
natal” ou “uma versão das Mouriscadas da
Península Ibérica”, ou ainda um auto
patriótico-
marítimo do ciclo das conquistas
portuguesas” (apud
ROSÁRIO, 2020, p.
30). Rosildo do Rosár
io, coordenador de
uma marujada e pesquisador, sublinha
sua relação indissociável com a diáspora
africana:
apesar da sua ligação estreita
com a cultura ibérica, foram os
negros descendentes que
assumiram o seu fazer, como
maneira de estar inseridos nas
at
ividades em suas comunidades.
O ato de ligar imediatamente a
chegança à Portugal e Espanha,
de maneira naturalizada, é uma
forma de invisibilização da
participação negra nessa
manifestação. (ROSÁRIO, 2020,
p. 33).
22 Entrevista
citada com Pai Pote.
42
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
pessoas que participam do
Após o reconhecimento nacional,
atualmente, a questão da salvaguarda da
celebração está em pauta no
coletivo.
As Marujadas e Cheganças de
Cheganças são encenações
performáticas, cantadas e faladas, que
contam sobre embates marítimos. Elas
acontecem no espaço público e estão
frequentemente associadas com datas
festivas da religiosidade popular.
Existem controvérsias na definição
das Cheganças. Para alguns um auto de
natal ou uma vero das Mouriscadas da
Península Ibérica, ou ainda “um auto
marítimo do ciclo das conquistas
ROSÁRIO, 2020, p.
io, coordenador de
uma marujada e pesquisador, sublinha
sua relação indissociável com a diáspora
apesar da sua ligação estreita
com a cultura ibérica, foram os
negros descendentes que
assumiram o seu fazer, como
maneira de estar inseridos nas
ividades em suas comunidades.
O ato de ligar imediatamente a
chegança à Portugal e Espanha,
de maneira naturalizada, é uma
forma de invisibilização da
participação negra nessa
manifestação. (ROSÁRIO, 2020,
citada com Pai Pote.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
Saubara é uma comunidade de
pescadores e m
arisqueiras, existindo,
portanto, um contexto próprio de relação
com o mar. Rosário distingue entre as
Cheganças de Mouros e Embaixadas, que
apresentam lutas de cristãos e mouros
que acontecem na Europa, das
Cheganças de Marujos (ou Marujadas)
que se const
roem a partir de epidios da
história do Brasil. A
Chegança dos
Marujos Fragata Brasileira
,
por exemplo, performa a participação do
povo do Recôncavo nas lutas pela
Independência do Brasil na Bahia, ou
seja, vivencia a manifestação a partir do
contexto local.
O autor ressalta ainda que
“as Marujadas, apesar de estarem nesse
contexto religioso católico, têm mais
evidente em suas práticas e narrativas
uma proximidade com a religião de matriz
africana.” (ROSÁRIO, 2020, p. 39).
O processo de patrim
das Cheganças e Marujadas, mais
recente que os dois outros abordados,
revela algumas especificidades, que
sugerem um processo de aprendizado
coletivo.
Rosário, coordenador da
Chegança de Marujos Fragata Brasileira,
participou da marujada na inf
ância, levado
por seu pai e foi um dos responveis por
sua revitalização.23
Além de professor,
23“A retomada do grupo
aconteceu a partir do
momento
em que as crianças e jovens do
passado reuniram-
se para rememorar a
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
Saubara é uma comunidade de
arisqueiras, existindo,
portanto, um contexto próprio de relação
com o mar. Rorio distingue entre as
Cheganças de Mouros e Embaixadas, que
apresentam lutas de cristãos e mouros
que acontecem na Europa, das
Cheganças de Marujos (ou Marujadas)
roem a partir de episódios da
Chegança dos
,
de Saubara,
por exemplo, performa a participação do
povo do Rencavo nas lutas pela
Independência do Brasil na Bahia, ou
seja, vivencia a manifestação a partir do
O autor ressalta ainda que
as Marujadas, apesar de estarem nesse
contexto religioso católico, têm mais
evidente em suas práticas e narrativas
uma proximidade com a religião de matriz
africana. (ROSÁRIO, 2020, p. 39).
O processo de patrim
onialização
das Cheganças e Marujadas, mais
recente que os dois outros abordados,
revela algumas especificidades, que
sugerem um processo de aprendizado
Rorio, coordenador da
Chegança de Marujos Fragata Brasileira,
ância, levado
por seu pai e foi um dos responsáveis por
Além de professor,
aconteceu a partir do
em que as crianças e jovens do
se para rememorar a
atuou na gestão pública da cultura e da
educação nas cidades de Santo Amaro e
Saubara. Também sambador, ele
coordenou a Associação dos Sambadores
e Sambadeiras d
o Estado da Bahia
(ASSEBA) entre 2005 e 2010 (ou seja: no
período seguinte à patrimonialização do
Samba de Roda), tendo sido também
diretor do Centro de Referência do Samba
de Roda da Bahia/Casa do Samba
(2008/2010) e coordenador dos projetos
Pontão de Cul
tura do Samba de Roda da
Bahia e a Rede do Samba. Entendemos
que esse “acúmulo de experiências”
influenciou a condução do processo de
patrimonialização das Cheganças, como
ele próprio conta, ressaltando
[...] essa possibilidade de reunir
pessoas que a ASSE
durante o início desse processo
[de patrimonialização] do samba
de roda […] e foi pensando nisso
que eu trouxe essa experiência
da ASSEBA para os grupos da
Chegança. [...] eu tinha ali a
consciência de que eu precisava
aprender, e em um determinad
momento eu voltaria pra Saubara
pra tomar conta das coisas daqui.
(Informação oral).
Em 2013, Rorio inicia uma
Chegança. Eles
decidiram
colher informações
acerca do grupo e
proporcionar o seu
ressurgimento. Nesse
momento entra em
ação a mulher, as
filhas e mães, que tiveram um importante
papel de ajudar a lembrar das canções, dos
ritmos.” (ROSÁRIO, 2020, p. 99).
24
Entrevista com Rosildo do Rosário, via
zoom, em 20/12/2020.
43
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
atuou na gestão pública da cultura e da
educação nas cidades de Santo Amaro e
Saubara. Também sambador, ele
coordenou a Associação dos Sambadores
o Estado da Bahia
(ASSEBA) entre 2005 e 2010 (ou seja: no
período seguinte à patrimonialização do
Samba de Roda), tendo sido também
diretor do Centro de Referência do Samba
de Roda da Bahia/Casa do Samba
(2008/2010) e coordenador dos projetos
tura do Samba de Roda da
Bahia e a Rede do Samba. Entendemos
que esse amulo de experiências”
influenciou a condução do processo de
patrimonialização das Cheganças, como
ele próprio conta, ressaltando
[...] essa possibilidade de reunir
pessoas que a ASSE
BA teve
durante o início desse processo
[de patrimonialização] do samba
de roda [] e foi pensando nisso
que eu trouxe essa experiência
da ASSEBA para os grupos da
Chegança. [...] eu tinha ali a
consciência de que eu precisava
aprender, e em um determinad
o
momento eu voltaria pra Saubara
pra tomar conta das coisas daqui.
(Informação oral).
24
Em 2013, Rosário inicia uma
decidiram
juntar-se para
acerca do grupo e
ressurgimento. Nesse
ação a mulher, as
esposas,
filhas e mães, que tiveram um importante
papel de ajudar a lembrar das canções, dos
ritmos. (ROSÁRIO, 2020, p. 99).
Entrevista com Rosildo do Rosário, via
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
pesquisa de registro
das Cheganças de
Saubara, através de depoimentos dos
integrantes das três cheganças da cidade.
O projeto teve o
patrocínio da Petrobrás e
resultou na coletânea “Êta, Marujada!,
composta por um catálogo, documentário,
CD e site. Neste mesmo ano ele organiza
o I Encontro de Cheganças, Marujadas e
Embaixadas da Bahia, que, desde então,
acontece anualmente, criando uma
estadual que passa a discutir a
patrimonialização da manifestação.
Foram cinco anos de trabalhos
intensos, diversas atividades
foram desenvolvidas com o intuito
de manter as pessoas envolvidas.
Realizamos diversas atividades:
os encontros estaduais
importantes […] para mantermos
foco no processo, realizamos
encontros territoriais (baixo sul,
extremo sul, piemontês de
diamantina, região
metropolitana), registramos áudio
em CD de cinco grupos,
realizamos pelo menos dez
reuniões com lideranças. No
do ano de 2017, começamos a
fazer o inventário dos grupos
existentes na Bahia. (ROSÁRIO,
2020, p. 84).
Em 2013 a
Associação Chegança
dos Marujos Fragata Brasileira
da rede constituída nos encontros anuais,
propôs ao Instituto do Patrimônio
da Bahia (IPAC) o registro das Cheganças
e Marujadas e Embaixadas
Patrimônio Cultural Imaterial da Bahia,
tendo assumido ela própria a elaboração
do dossiê necessário para o registro. Em
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
das Cheganças de
Saubara, através de depoimentos dos
integrantes das três cheganças da cidade.
patronio da Petrobrás e
resultou na coletânea Êta, Marujada!”,
composta por um catálogo, documentário,
CD e site. Neste mesmo ano ele organiza
o I Encontro de Cheganças, Marujadas e
Embaixadas da Bahia, que, desde então,
acontece anualmente, criando uma
rede
estadual que passa a discutir a
patrimonialização da manifestação.
Foram cinco anos de trabalhos
intensos, diversas atividades
foram desenvolvidas com o intuito
de manter as pessoas envolvidas.
Realizamos diversas atividades:
os encontros estaduais
foram
importantes […] para mantermos
foco no processo, realizamos
encontros territoriais (baixo sul,
extremo sul, piemontês de
diamantina, região
metropolitana), registramos áudio
em CD de cinco grupos,
realizamos pelo menos dez
reuniões com lideranças. No
final
do ano de 2017, começamos a
fazer o inventário dos grupos
existentes na Bahia. (ROSÁRIO,
Associação Chegança
dos Marujos Fragata Brasileira
, em nome
da rede constituída nos encontros anuais,
propôs ao Instituto do Patrimônio
Artístico
da Bahia (IPAC) o registro das Cheganças
e Marujadas e Embaixadas
como
Patrimônio Cultural Imaterial da Bahia,
tendo assumido ela própria a elaboração
do dossiê necessário para o registro. Em
2019, através do decreto 18.905/2019, as
manifestaçõe
s foram inscritas no Livro do
Registro Especial das Expressões Lúdicas
e Artísticas da Bahia.
Memória e resistência: um
aprendizado coletivo de agenciamento
Lembremos que essas
experiências de patrimonialização
começaram com a indução da
participação dos
grupos de Samba de
Roda no seu reconhecimento. Sem negar
as ambiguidades
que permearam o
processo, é importante olhar para o
percurso e seus
resultados.Ela abriu
espaço para a soc
iedade civil interferir nas
polí
ticas culturais. No caso espefico,
abriu e
spaço para grupos excluídos da
participação ativa na vida política. Os
grupos responderam, ocuparam o espaço,
criaram estratégias para avançar na
organização coletiva e assumiram o
protagonismo na salvaguarda de suas
manifestações culturais.
Mais ainda, a
s experiências de
patrimonialização do Samba de Roda, do
Bembé e das Cheganças apontam para
um processo de aprendizado coletivo,
como dito antes, e possivelmente para a
constituição de um repertório de ação
coletiva.25
Vejamos: Se no primeiro caso,
25 Segundo Charles Tilly “
A palavra
identifica um conjunto
limitado de
são
aprendidas, compartilhadas e postas
ação por meio de um processo
44
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
2019, através do decreto 18.905/2019, as
s foram inscritas no Livro do
Registro Especial das Expressões Lúdicas
Memória e resistência: um
aprendizado coletivo de agenciamento
Lembremos que essas
experiências de patrimonialização
começaram com a indução da
grupos de Samba de
Roda no seu reconhecimento. Sem negar
que permearam o
processo, é importante olhar para o
resultados.Ela abriu
iedade civil interferir nas
ticas culturais. No caso específico,
spaço para grupos excluídos da
participação ativa na vida política. Os
grupos responderam, ocuparam o espaço,
criaram estratégias para avançar na
organização coletiva e assumiram o
protagonismo na salvaguarda de suas
manifestações culturais.
s experiências de
patrimonialização do Samba de Roda, do
Bembé e das Cheganças apontam para
um processo de aprendizado coletivo,
como dito antes, e possivelmente para a
constituição de um repertório de ação
Vejamos: Se no primeiro caso,
A palavra
repertório
limitado de
retinas que
aprendidas, compartilhadas e postas
em
ação por meio de um processo
relativamente
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
a solic
itação do registro veio do Estado;
no segundo, do Bembé do Mercado, a
sugestão veio do entorno do grupo
envolvido; no terceiro, das Cheganças,
veio do próprio grupo. Enquanto no
processo do Samba de Roda a
elaboração do dossiê foi feita pelo próprio
Iphan
(mesmo que envolvendo os
sambadores e sambadeiras), no caso do
registro nacional do Bembé, uma equipe
do Centro de Culturas, Linguagens e
Tecnologias Aplicadas (CECULT),
Campus de Santo Amaro da Universidade
Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)
foi sugerid
a pelo IPHAN à associação
proponente e aceita. A equipe contou com
a participação de estudantes diretamente
vinculados à manifestação. Já no registro
das Cheganças, os próprios brincantes
assumiram a elaboração do dossiê. O
mesmo vale para a mobilização do
grupos, que no primeiro caso, foi feita,
inicialmente, pelo IPHAN; no segundo,
constituiu-
se uma Comissão do Bembé,
deliberado de escolha. Repertórios
criaçõesculturais
aprendidas, mas eles
descendem de filosofia abstrata
ou
forma como resultado
da propaganda política;
eles emergem da luta.” (apud
ALONSO, 2012,
p. 26). Tilly refere-
se ainda a “transferência de
repertórios”, acentuando, entretanto, que a
transferência de formas de ação é pautada por
criatividade e improviso. Ou seja: ao ins de
ap
enas repetir as ações anteriores, elas vão,
na prática, se modificando de acordo com os
contextos de atuação. Entretanto, cabe
salientar que o conceito de Tilly tem foco na
questão dos confront
os, o que não se aplica,
ao menos literalmente, aos
casos abord
por nós.
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
itação do registro veio do Estado;
no segundo, do Bembé do Mercado, a
sugestão veio do entorno do grupo
envolvido; no terceiro, das Cheganças,
veio do próprio grupo. Enquanto no
processo do Samba de Roda a
elaboração do dossiê foi feita pelo próprio
(mesmo que envolvendo os
sambadores e sambadeiras), no caso do
registro nacional do Bembé, uma equipe
do Centro de Culturas, Linguagens e
Tecnologias Aplicadas (CECULT),
Campus de Santo Amaro da Universidade
Federal do Rencavo da Bahia (UFRB)
a pelo IPHAN à associação
proponente e aceita. A equipe contou com
a participação de estudantes diretamente
vinculados à manifestação. no registro
das Cheganças, os próprios brincantes
assumiram a elaboração do dossiê. O
mesmo vale para a mobilização do
s
grupos, que no primeiro caso, foi feita,
inicialmente, pelo IPHAN; no segundo,
se uma Comiso do Bembé,
deliberado de escolha. Repertórios
são
aprendidas, mas eles
não
ou
tomam
da propaganda política;
ALONSO, 2012,
se ainda a transferência de
repertórios”, acentuando, entretanto, que a
transferência de formas de ação é pautada por
criatividade e improviso. Ou seja: ao invés de
enas repetir as ações anteriores, elas vão,
na prática, se modificando de acordo com os
contextos de atuação. Entretanto, cabe
salientar que o conceito de Tilly tem foco na
os, o que não se aplica,
casos abord
ados
com uma estrutura de decisão
horizontalizada; no terceiro, os Encontros
Estaduais criaram uma base de debates
para o processo de patrimoni
Sublinhemos também a apropriação das
ações de salvaguarda do SR pelos
sambadores e sambadeiras.
No caso do Bembé está em pauta,
atualmente, a questão da salvaguarda:
“agora é não vacilar, aproveitar esse
reconhecimento para nosso povo, nosso
leg
ado”, disse Pai Pote em entrevista
citada. A fala permite a associação com o
paradigma da travessia, cunhado pelo
filósofo camaronês Jean
quando afirma que, para os povos negros
na diáspora, os lugares de memória o
“um chamado e um
trânsito para os não
lugares da memória’” e aponta para uma
“construção coletiva de um pensar que
nos reinvente, nos abra outras imagens de
nós mesmos, considerando nossas
heranças em memória africanas.
(NASCIMENTO, 2020, p. 35).
Para Rosildo do Rorio
21),
[…] ainda nos dias atuais,
existem comunidades que
alimentam e praticam a
transmissão de conhecimentos
ancestrais, como forma de
preservar suas identidades,
garantindo que saberes do
passado sejam experenciados
por várias gerações. Um dos
pilares dessa resistência o os
grupos de “Culturas Populares”,
que utilizam cnicas ancestrais,
como a oralidade, para não se
45
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
com uma estrutura de decisão
horizontalizada; no terceiro, os Encontros
Estaduais criaram uma base de debates
para o processo de patrimoni
alização.
Sublinhemos também a apropriação das
ações de salvaguarda do SR pelos
sambadores e sambadeiras.
No caso do Bembé está em pauta,
atualmente, a questão da salvaguarda:
agora é não vacilar, aproveitar esse
reconhecimento para nosso povo, nosso
ado, disse Pai Pote em entrevista
citada. A fala permite a associação com o
paradigma da travessia”, cunhado pelo
filósofo camaronês Jean
-Godefroy Bidima,
quando afirma que, para os povos negros
na diáspora, os lugares de memória são
trânsito para os ‘não
-
lugares da memória e aponta para uma
construção coletiva de um pensar que
nos reinvente, nos abra outras imagens de
nós mesmos, considerando nossas
heranças em memória africanas.”
(NASCIMENTO, 2020, p. 35).
Para Rosildo do Rosário
(2020, p.
[…] ainda nos dias atuais,
existem comunidades que
alimentam e praticam a
transmissão de conhecimentos
ancestrais, como forma de
preservar suas identidades,
garantindo que saberes do
passado sejam experenciados
por várias gerações. Um dos
pilares dessa resistência são os
grupos de Culturas Populares”,
que utilizam técnicas ancestrais,
como a oralidade, para não se
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
submeterem às investidas
massacrantes da modernidade.
Considerando que as memórias
dos grupos sub
normalmente são apagadas da
História (contada pelos grupos
dominantes), seu cultivo representa
uma forma de resistência popular.
Cabe
referência às mediações feitas
por lideranças como Dona Dalva e Any
Freitas, Pai Pote e Rosildo do Rosário,
q
ue foram essenciais no processo de
construção coletiva. Este último
sublinha que “uma política de
patrimonialização gerenciada de forma
eficaz pelo Estado permite que os
zeladores das manifestações se
encontrem, se reconheçam no fazer do
outro e mutuament
e construam uma
agenda positiva.” (ROSÁRIO, 2020,
p.156). Em entrevista citada, Rosário
afirmou que os grupos de chegança
estão
avançando na construção de um
plano de salvaguarda, que deverá ser
publicado mesmo antes da validação
pelo IPAC, sublinhando a
do grupo em relação ao poder público.
3.
Considerações finais: Cultura,
memória e resistência no
Recôncavo da Bahia
Analisamos três processos de
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
submeterem às investidas
massacrantes da modernidade.
Considerando que as memórias
dos grupos sub
alternizados
normalmente são apagadas da
História (contada pelos grupos
dominantes), seu cultivo representa
uma forma de resistência popular.
referência às mediações feitas
por lideranças como Dona Dalva e Any
Freitas, Pai Pote e Rosildo do Rosário,
ue foram essenciais no processo de
construção coletiva. Este último
sublinha que uma política de
patrimonialização gerenciada de forma
eficaz pelo Estado permite que os
zeladores das manifestações se
encontrem, se reconheçam no fazer do
e construam uma
agenda positiva. (ROSÁRIO, 2020,
p.156). Em entrevista citada, Rosário
afirmou que os grupos de chegança
avançando na construção de um
plano de salvaguarda, que deverá ser
publicado mesmo antes da validação
pelo IPAC, sublinhando a
autonomia
do grupo em relação ao poder público.
Considerações finais: Cultura,
memória e resistência no
Analisamos três processos de
patrimonialização, conduzido por coletivos
populares,
que se dão
político-
cultural bastante específico. Num
plano macro, eles são parte do movimento
democrático iniciado no final do culo
XX, do qual emerge uma nova qualidade
de cidadania, com a ampliação da
participação e o surgimento de novos
atores q
ue, por sua vez, impulsionam o
alargamento da própria ideia de cidadania.
Um momento em que se fortalece a ideia
de governança, a busca de novos padrões
de articulação entre Estado e Sociedade,
com o fortalecimento da percepção
participação e controle
elementos essenciais à gestão pública.
Ademais, no Brasil do século XXI, o MinC,
como apontamos, opera a partir de um
profundo deslocamento, onde localizamos
as controversas tentativas de indução à
participação.
Nos casos analisados,
entendemos
que a indução da
participação pelo Estado foi um primeiro
passo, essencial, para assegurar o
exercício da cidadania cultural a grupos
subalternizados. O envolvimento dos três
coletivos n
os processos de
patrimonialização
transformou
estratégia de
empoderamento, um
caminho para aprofundar os processos de
mobilização e de organização coletiva em
busca de protagonismo na condução de
suas manifestações culturais. Na
contraface da indução está a capacidade
46
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
patrimonialização, conduzido por coletivos
que se dão
em um contexto
cultural bastante específico. Num
plano macro, eles o parte do movimento
democrático iniciado no final do século
XX, do qual emerge uma nova qualidade
de cidadania, com a ampliação da
participação e o surgimento de novos
ue, por sua vez, impulsionam o
alargamento da própria ideia de cidadania.
Um momento em que se fortalece a ideia
de governança, a busca de novos padrões
de articulação entre Estado e Sociedade,
com o fortalecimento da percepção
que
participação e controle
social são
elementos essenciais à gestão pública.
Ademais, no Brasil do século XXI, o MinC,
como apontamos, opera a partir de um
profundo deslocamento, onde localizamos
as controversas tentativas de indução à
Nos casos analisados,
que a indução da
participação pelo Estado foi um primeiro
passo, essencial, para assegurar o
exercício da cidadania cultural a grupos
subalternizados. O envolvimento dos três
os processos de
transformou
-se em uma
empoderamento, um
caminho para aprofundar os processos de
mobilização e de organização coletiva em
busca de protagonismo na condução de
suas manifestações culturais. Na
contraface da indução está a capacidade
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
memória e resistência. PragMATIZES -
Revista Latino
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 12, n. 22
, p.
de agência dos grupos, que, em um
processo de
aprendizado coletivo, se
apoderaram dos espaços e das
ferramentas que emergiram nesse novo
contexto político-cultural.
Com isso, um novo perfil de
sujeitos (aqueles invisibilizados pela
racionalidade hegemônica) se inseriu no
espaço público, buscando parti
processos decisórios que lhes dizem
respeito, protagonizando um processo de
construção coletiva realizada a partir dos
saberes localizados nos próprios grupos.
Ao “discurso competente”
pretensamente
universal, desvinculado dos seus laços
com o lu
gar e o tempo de origem, como
apontou Chauí, eles contrapõem
enfrentamentos que se desenvolvem em
territórios concretos, em seu
“estar-
sendo” no mundo, com seus
sistemas simbólicos espeficos
(oralidade, ancestralidade, contiguidade
indivíduo-com
unidade, conhecimento
compartilhado, decisões coletivas,
perspectiva aberta a
diferentes
etc.).
Além disso, ao
construer
de memória dos povos negros na
diáspora, esses grupos
ativamente na
memória
produzindo
rupturas no discurso
hegemônico e reafirmando
subjetividades
negadas/invisibilizadas/indesejadas.
Operando na perspectiva da
cidadania cultural, as ações do Governo
BEZERRA, Laura. Coletivos populares no Recôncavo da Bahia: cultura,
Revista Latino
-Americana de
, p.
29-49, mar. 2022. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "Coletivos culturais –
resistências, disputas e potências
de agência dos grupos, que, em um
aprendizado coletivo, se
apoderaram dos espaços e das
ferramentas que emergiram nesse novo
Com isso, um novo perfil de
sujeitos (aqueles invisibilizados pela
racionalidade hegemônica) se inseriu no
espaço público, buscando parti
cipar dos
processos decisórios que lhes dizem
respeito, protagonizando um processo de
construção coletiva realizada a partir dos
saberes localizados nos próprios grupos.
pretensamente
universal, desvinculado dos seus laços
gar e o tempo de origem, como
apontou Chauí, eles contrapõem
enfrentamentos que se desenvolvem em
territórios concretos, em seu
locus de
sendo no mundo, com seus
sistemas simbólicos específicos
(oralidade, ancestralidade, contiguidade
unidade, conhecimento
compartilhado, decies coletivas,
uma
diferentes
práticas
construer
lugares
de memória dos povos negros na
interferem
memória
nacional,
rupturas no discurso
subjetividades
negadas/invisibilizadas/indesejadas.
Operando na perspectiva da
cidadania cultural, as ações do Governo
Federal refletem
a modernidade ambígua
e contraditória descrita por
qual, em um
contexto de excluo e
desigualdade, são iniciados processos de
democratização e reconhecimento
instituem novos espaços de articulação
(governança) e mesmo melhores
condições de negociação entre Estado e
Sociedade. Numa expressão de
conhecimento e cap
transmissão e ampliação de conhecimento
e de conquista e aprimoramento de
competências–
os grupos de cultura
popular do Recôncavo reconheceram as
novas condições e
os espaços abertos,
promoveram o agenciamento,
os repertórios locai
s de ação coletiva
constituindo-
se em instrumentos de
enriquecimento so
ciopolítico
Fica em aberto o lugar das
mediações
seja das lideranças
populares, seja do Estado (com a indução
à participação, o reconhecimento
espaços como pontos de cultura, a
criação de universidades públicas em
cidades do interior etc.)
algo que pretendemos analisar num
momento seguinte.
Referências bibliográficas
ADDOR, Felipe.
Reflexões sobre
Democracia Participativa
Latina.
Revista de Administração
Pública,
Rio de Janeiro, vol. 52, n. 6, p.
1108-
1124, nov./dez. 2018.
47
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
resistências, disputas e potências
")
a modernidade ambígua
e contraditória descrita por
Quijano, na
contexto de exclusão e
desigualdade, o iniciados processos de
democratização e reconhecimento
que
instituem novos espaços de articulação
(governança) e mesmo melhores
condições de negociação entre Estado e
Sociedade. Numa expressão de
conhecimento e cap
acidade, de
transmissão e ampliação de conhecimento
e de conquista e aprimoramento de
os grupos de cultura
popular do Rencavo reconheceram as
os espaços abertos,
promoveram o agenciamento,
expandindo
s de ação coletiva
,
se em instrumentos de
ciopolítico
e cultural.
Fica em aberto o lugar das
seja das lideranças
populares, seja do Estado (com a indução
à participação, o reconhecimento
de
espaços como pontos de cultura, a
criação de universidades públicas em
cidades do interior etc.)
nesse processo,
algo que pretendemos analisar num
Referências bibliográficas
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Democracia Participativa
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IV
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