SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada
DOI: https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v13i24.
Resumo
: O presente artigo tem por objetivo a análise da representação da violência contra as
mulheres e o feminicídio na primeira temporada da série brasileira da
lançada em 2019. A narrativa seriada, ambientada no fim da década de 1950, retrata a história de
Maria Luiza Carone
Malu, Lígia Soares, Adélia Araújo e Theresa Soares, que vivem na ficção uma
sequência de situações que evidenciam a condição da mulher em
patriarcal. As análises foram elaboradas a partir de estudos bibliográficos, considerando o contexto
histórico, as relações entre cinema, crítica feminista, os estudos de gênero e as múltiplas formas das
violências a parti
r de autores e autoras como Eco (1989), Buonnano (2019), Curi (2021), Lerner
(2019), Butler (2003), Bourdieu (2017), eSaffioti (1987). Constatamos que as violências sofridas pelas
personagens femininas da ficção podem ser encontradas nos diversos casos de
na sociedade contemporânea, representando discursos racistas, sexistas e miginos contra as
mulheres.
Palavras-chave: n
Representaciones de la violencia contra las mujeres en la narrativa seriada
Resumen:
Este artículo tiene como objetivo analizar la representación de la violencia contra la mujer
y el feminicidio en la primera temporada de la serie brasileña de Netflix
en 2019. El título de la producción audiovisual es un homen
Tom Jobim y Vinicius de Moraes, de 1962, que tiene en la primera estrofa de la letra la expresión
“coisamais linda”. La narrativa serial, ambientada a fines de la década de 1950, retrata la historia de
1
Crislaine Alessandra de Lima Scher.
Estadual do
Oeste do Paraná (UNIOESTE). Bolsista CAPES. Brasil
crislainealessandra@hotmail.com
2
Paula Maria Lucietto Dylbas. Doutoranda em Letras pelo PPG em Letras
do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Bolsista CAPES. Brasil. E
https://orcid.org/0000-0002-
3605
3
Adriana Aparecida de Figueiredo Fiuza. Doutora em Letras
(UNESP –
Assis/SP). Professora do PPG em Letras
Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Brasil. E
https://orcid.org/0000-0002-
8667
Recebido em 29/07/2022,
aceito para publicação em
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada
linda (2019)
Crislaine Alessandra de Lima Scher
Paula Maria Lucietto Dylbas
Adriana Aparecida de Figueiredo
DOI: https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v13i24.
55421
: O presente artigo tem por objetivo a análise da representação da violência contra as
mulheres e o feminidio na primeira temporada da série brasileira da
Netflix
lançada em 2019. A narrativa seriada, ambientada no fim da década de 1950, retrata a história de
Malu, Lígia Soares, Adélia Araújo e Theresa Soares, que vivem na ficção uma
sequência de situações que evidenciam a condição da mulher em
uma sociedade regida pelo sistema
patriarcal. As análises foram elaboradas a partir de estudos bibliográficos, considerando o contexto
histórico, as relações entre cinema, crítica feminista, os estudos de gênero e as múltiplas formas das
r de autores e autoras como Eco (1989), Buonnano (2019), Curi (2021), Lerner
(2019), Butler (2003), Bourdieu (2017), eSaffioti (1987). Constatamos que as violências sofridas pelas
personagens femininas da fião podem ser encontradas nos diversos casos de
na sociedade contemporânea, representando discursos racistas, sexistas e miginos contra as
arrativa seriada
; violência de gênero; personagens femininas;
Representaciones de la violencia contra las mujeres en la narrativa seriada
Coisa mais linda
Este artículo tiene como objetivo analizar la representación de la violencia contra la mujer
y el feminicidio en la primera temporada de la serie brasileña de Netflix
CoisaMais Linda
en 2019. El título de la producción audiovisual es un homen
aje a la canción “Garota de Ipanema, de
Tom Jobim y Vinicius de Moraes, de 1962, que tiene en la primera estrofa de la letra la expresión
coisamais linda. La narrativa serial, ambientada a fines de la década de 1950, retrata la historia de
Crislaine Alessandra de Lima Scher.
Doutoranda em Letras pelo PPG em Letras da Universidade
Oeste do Paraná (UNIOESTE). Bolsista CAPES. Brasil
. E-mail:
crislainealessandra@hotmail.com
- https://orcid.org/0000-0002-9740-3660
Paula Maria Lucietto Dylbas. Doutoranda em Letras pelo PPG em Letras
da Universidade Estadual
do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Bolsista CAPES. Brasil. E
-mail:
pauladylbas@hotmail.com
3605
-6028
Adriana Aparecida de Figueiredo Fiuza. Doutora em Letras
pela Universidade Estadual Paulista
Assis/SP). Professora do PPG em Letras
Linguagem e Sociedade da Universidade
Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Brasil. E
-mail:
adrifiuza@yahoo.com.br
8667
-4756
aceito para publicação em
02/02/20
23 e disponibilizado online em
01/03/2023.
123
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada
Coisa mais
Crislaine Alessandra de Lima Scher
1
Paula Maria Lucietto Dylbas
2
Adriana Aparecida de Figueiredo
Fiuza 3
: O presente artigo tem por objetivo a análise da representação da violência contra as
Netflix
:Coisa Mais Linda,
lançada em 2019. A narrativa seriada, ambientada no fim da década de 1950, retrata a história de
Malu, Lígia Soares, Adélia Araújo e Theresa Soares, que vivem na ficção uma
uma sociedade regida pelo sistema
patriarcal. As análises foram elaboradas a partir de estudos bibliográficos, considerando o contexto
histórico, as relações entre cinema, crítica feminista, os estudos de gênero e as múltiplas formas das
r de autores e autoras como Eco (1989), Buonnano (2019), Curi (2021), Lerner
(2019), Butler (2003), Bourdieu (2017), eSaffioti (1987). Constatamos que as violências sofridas pelas
personagens femininas da fião podem ser encontradas nos diversos casos de
violência de gênero
na sociedade contemporânea, representando discursos racistas, sexistas e misóginos contra as
Coisa Mais Linda.
Coisa mais linda
(2019)
Este artículo tiene como objetivo analizar la representación de la violencia contra la mujer
CoisaMais Linda
, estrenada
aje a la canción Garota de Ipanema”, de
Tom Jobim y Vinicius de Moraes, de 1962, que tiene en la primera estrofa de la letra la expresión
coisamais linda. La narrativa serial, ambientada a fines de la década de 1950, retrata la historia de
Doutoranda em Letras pelo PPG em Letras da Universidade
da Universidade Estadual
pauladylbas@hotmail.com
-
pela Universidade Estadual Paulista
Linguagem e Sociedade da Universidade
adrifiuza@yahoo.com.br
-
23 e disponibilizado online em
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
Maria Luiza Carone –
Malu, Lígia Soares, Adélia Araújo y Theresa Soares, que viven en la ficción una
secuencia de situaciones que muestran la condición de la mujer en una sociedad regida por el
sistema patriarcal. El trabajo fue elaborado a partir de estudios bibliográ
contexto histórico, las relaciones contemporáneas entre el cine, la crítica, los estudios de género y las
múltiples formas de violencia, desde autores como Eco (1989), Buonnano (2019), Curi (2021), Lerner
(2019), Butler (2003), Bourd
ieu (2017), Saffioti (1987). Concluimos que la violencia que sufren los
personajes femeninos en la ficción se puede encontrar en los diversos casos de violencia de género
en la sociedad contemporánea, representando discursos racistas, sexistas y miginos
mujeres.
Palabras clave: narrativa serial;
Representations of violence against women in the serial narrative
Abstract:
This article aims to analyze the representation of violence against women and the femicide
in the first season of the Brazilian Netflix series
audiovisual production is a tribute to the song Garota d
Moraes, from 1962, which has, in the first verse of the lyrics, the expression coisa
serial narrative, set in the late 1950s, portrays the story of Maria Luiza Carone
Adélia
Araújo and Theresa Soares, who live in fiction a sequence of situations that show the condition
of women in a society ruled by patriarchal system. The analyzes were drawn up from bibliographic
studies, considering the historical context, the relationships
studies and the multiple forms of violence from authors such as Eco (1989), Buonnano (2019), Curi
(2021), Lerner (2019), Butler (2003), Bourdieu (2017), Saffioti (1987). We found that the violence
suffered by fema
le characters in fiction can be found in the various cases of gender violence in
contemporary society, representing racist, sexist and misogynistic discourses against women.
Keywords: serial narrative;
gender
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada
Introdução
A plataforma de
Netflix
tem focado na produção de
séries originais em diversos países,
inclusive no Brasil, devido ao seu
grande engajamento ao disponibilizar
o serviço de vídeo on
demand
4Em português,
significa vídeo sob demanda.
Trata-
se de um sistema que armazena vídeos,
que podem ser escolhidos conforme o
interesse do espectador, sem a necessidade
de ter um horário fixo em uma programação
em um canal. Os maiores exemplos de VO
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
Malu, Lígia Soares, Adélia Araújo y Theresa Soares, que viven en la ficción una
secuencia de situaciones que muestran la condición de la mujer en una sociedad regida por el
sistema patriarcal. El trabajo fue elaborado a partir de estudios bibliográ
ficos, considerando el
contexto histórico, las relaciones contemporáneas entre el cine, la crítica, los estudios de género y las
múltiples formas de violencia, desde autores como Eco (1989), Buonnano (2019), Curi (2021), Lerner
ieu (2017), Saffioti (1987). Concluimos que la violencia que sufren los
personajes femeninos en la ficción se puede encontrar en los diversos casos de violencia de género
en la sociedad contemporánea, representando discursos racistas, sexistas y miginos
violencia de género; personajes femininos;
Coisa
Representations of violence against women in the serial narrative
Coisa mais linda
This article aims to analyze the representation of violence against women and the femicide
in the first season of the Brazilian Netflix series
Coisa Mais Linda
, released in 2019. The title of the
audiovisual production is a tribute to the song “Garota d
e Ipanema'', by Tom Jobim and Vinicius de
Moraes, from 1962, which has, in the first verse of the lyrics, the expression “coisa
serial narrative, set in the late 1950s, portrays the story of Maria Luiza Carone
Araújo and Theresa Soares, who live in fiction a sequence of situations that show the condition
of women in a society ruled by patriarchal system. The analyzes were drawn up from bibliographic
studies, considering the historical context, the relationships
between cinema, feminist criticism, gender
studies and the multiple forms of violence from authors such as Eco (1989), Buonnano (2019), Curi
(2021), Lerner (2019), Butler (2003), Bourdieu (2017), Saffioti (1987). We found that the violence
le characters in fiction can be found in the various cases of gender violence in
contemporary society, representing racist, sexist and misogynistic discourses against women.
gender
violence; female characters;
Coisa Mais Linda
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada
linda (2019)
A plataforma de
streaming
tem focado na produção de
ries originais em diversos países,
inclusive no Brasil, devido ao seu
grande engajamento ao disponibilizar
demand
(VOD)4.
significa deo sob demanda.
se de um sistema que armazena vídeos,
que podem ser escolhidos conforme o
interesse do espectador, sem a necessidade
de ter um horário fixo em uma programação
em um canal. Os maiores exemplos de VO
D
Segundo um estudo realizado pelo site
Comparitech
(2020), o Brasil é o
terceiro mai
or mercado mundial da
Netflix
e dispõe da segunda maior
base de assinantes pagos
16 milhões, ficando atrás apenas dos
Estados Unidos. Portanto, torna
cada vez mais comum que recursos
sejam direcionados para as produções
são a Netflix, o Youtube
e a
Video.
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periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
Malu, Lígia Soares, Adélia Araújo y Theresa Soares, que viven en la ficción una
secuencia de situaciones que muestran la condición de la mujer en una sociedad regida por el
ficos, considerando el
contexto histórico, las relaciones contemporáneas entre el cine, la crítica, los estudios de género y las
múltiples formas de violencia, desde autores como Eco (1989), Buonnano (2019), Curi (2021), Lerner
ieu (2017), Saffioti (1987). Concluimos que la violencia que sufren los
personajes femeninos en la ficción se puede encontrar en los diversos casos de violencia de género
en la sociedad contemporánea, representando discursos racistas, sexistas y misóginos
contra las
Coisa
Mais Linda.
Coisa mais linda
(2019)
This article aims to analyze the representation of violence against women and the femicide
, released in 2019. The title of the
e Ipanema'', by Tom Jobim and Vinicius de
Moraes, from 1962, which has, in the first verse of the lyrics, the expression coisa
mais linda”. The
Malu, Lígia Soares,
Araújo and Theresa Soares, who live in fiction a sequence of situations that show the condition
of women in a society ruled by patriarchal system. The analyzes were drawn up from bibliographic
between cinema, feminist criticism, gender
studies and the multiple forms of violence from authors such as Eco (1989), Buonnano (2019), Curi
(2021), Lerner (2019), Butler (2003), Bourdieu (2017), Saffioti (1987). We found that the violence
le characters in fiction can be found in the various cases of gender violence in
contemporary society, representing racist, sexist and misogynistic discourses against women.
Coisa Mais Linda
.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada
Coisa mais
Segundo um estudo realizado pelo site
(2020), o Brasil é o
or mercado mundial da
e dispõe da segunda maior
base de assinantes pagos
cerca de
16 milhões, ficando atrás apenas dos
Estados Unidos. Portanto, torna
-se
cada vez mais comum que recursos
sejam direcionados para as produções
e a
Amazon Prime
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
nacionais na plataform
a, como é o
caso das séries produzidas:
(2018); Irmandade
(2019);
(2019);
Bom dia, Verônica
Coisa Mais Linda
(2019); dentre
outras.
A cultura de “maratonar ries
na era digital perpassa as dimensões
do individual e do coletivo, cau
um engajamento dos seus
espectadores que, ao assistirem os
episódios, utilizam do meio tecnológico
para discutir entre si os temas e as
problemáticas abordadas pela
narrativa; tais ações ocorrem em redes
sociais, sites, blogs
plataformas dig
itais. Nessa
perspectiva, os assinantes assumem
um papel ativo no cenário de debate,
pois compartilham ideias, elaboram
teorias diversas sobre os assuntos
tratados e buscam conhecimento a
respeito do que é visto nas telas.
As temáticas que emergem das
séri
es brasileiras são bastante
variadas, abordando política, folclore,
música, cultura, violência, racismo etc.
Desses temas, alguns ganham
destaque no cenário atual, como por
exemplo, a violência e as suas facetas,
que a cada dia atingem mais pessoas,
princi
palmente, as mulheres.
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
a, como é o
caso das ries já produzidas:
3%
(2019);
Sintonia
Bom dia, Verônica
(2020);
(2019); dentre
A cultura de maratonar” séries
na era digital perpassa as dimensões
do individual e do coletivo, cau
sando
um engajamento dos seus
espectadores que, ao assistirem os
epidios, utilizam do meio tecnológico
para discutir entre si os temas e as
problemáticas abordadas pela
narrativa; tais ações ocorrem em redes
e outras
itais. Nessa
perspectiva, os assinantes assumem
um papel ativo no cenário de debate,
pois compartilham ideias, elaboram
teorias diversas sobre os assuntos
tratados e buscam conhecimento a
respeito do que é visto nas telas.
As temáticas que emergem das
es brasileiras o bastante
variadas, abordando política, folclore,
música, cultura, violência, racismo etc.
Desses temas, alguns ganham
destaque no cenário atual, como por
exemplo, a violência e as suas facetas,
que a cada dia atingem mais pessoas,
palmente, as mulheres.
Conforme Cerqueira
Atlas da Violência, 3.737 mulheres
foram assassinadas no Brasil em
2019. Nessa perspectiva, duas ries
em específico versam sobre a
violência de gênero -
(2019), dirigida por Caíto Ortiz, Hugo
Prata e Julia Rezende e
Verônica
(2020), sob a direção de
José Henrique Fonseca, Izabel
Jaguaribe e Rog de Souza.
Para o artigo, propomos o
estudo e análise de Coisa Mais Linda
(2019), haja vista que abord
que nos interessam particularmente,
como as múltiplas formas de violências
contra as mulheres, e que se articulam
com nossas pesquisas acadêmicas. A
série brasileira
Coisa Mais Linda
(2019), produção original da
criada por Giuliano Ced
Roth, apresentando duas temporadas
uma com sete e a outra com seis
episódios. O título da produção é uma
homenagem à música Garota de
Ipanema'', canção de Tom Jobim e
Vinicius de Moraes, de 1962, que tem,
no primeiro verso da letra, a exp
“coisa mais linda”. Lançada em 2019,
a narrativa seriada, ambientada no fim
da década de 1950, retrata a história
de Maria Luiza Carone
125
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
Conforme Cerqueira
et. al. (2021), no
Atlas da Violência, 3.737 mulheres
foram assassinadas no Brasil em
2019. Nessa perspectiva, duas séries
em específico versam sobre a
Coisa Mais Linda
(2019), dirigida por Caíto Ortiz, Hugo
Prata e Julia Rezende e
Bom dia,
(2020), sob a direção de
Jo Henrique Fonseca, Izabel
Jaguaribe e Rog de Souza.
Para o artigo, propomos o
estudo e análise de Coisa Mais Linda
(2019), haja vista que abord
a temas
que nos interessam particularmente,
como as múltiplas formas de violências
contra as mulheres, e que se articulam
com nossas pesquisas acadêmicas. A
Coisa Mais Linda
(2019), produção original da
Netflix, foi
criada por Giuliano Ced
roni e Heather
Roth, apresentando duas temporadas
-
uma com sete e a outra com seis
epidios. O título da produção é uma
homenagem à música “Garota de
Ipanema'', canção de Tom Jobim e
Vinicius de Moraes, de 1962, que tem,
no primeiro verso da letra, a exp
ressão
coisa mais linda. Lançada em 2019,
a narrativa seriada, ambientada no fim
da década de 1950, retrata a história
de Maria Luiza Carone
Malu (Maria
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
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Casadevall), paulista que se muda
para o Rio de Janeiro e tem muitas
ambições para uma mulher que v
em meados do século XX. Ela e suas
amigas
Lígia Soares (Fernanda
Vasconcellos), Adélia Araújo (Pathy
Dejesus) e Theresa Soares (Mel
Lisboa)
vivem, na ficção, uma
sequência de situações que
evidenciam a condição da mulher em
uma sociedade regida pel
patriarcal.
Imagem 1 – Cartaz da série
Coisa Mais Linda
Fonte:
https://cdn.falauniversidades.com.br/wp
content/uploads/2020/07/20110
Mais-Linda-
poster.jpg
Lerner (2019) explica que o
alicerce do sistema patriarcal é uma
espécie de
contrato com uma base na
troca: ao mesmo tempo em que o
homem oferece sustento e amparo, a
mulher oferta sujeição, presteza sexual
e serviço doméstico sem
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
Casadevall), paulista que se muda
para o Rio de Janeiro e tem muitas
ambições para uma mulher que v
ive
em meados do culo XX. Ela e suas
Lígia Soares (Fernanda
Vasconcellos), Adélia Araújo (Pathy
Dejesus) e Theresa Soares (Mel
vivem, na ficção, uma
sequência de situações que
evidenciam a condição da mulher em
uma sociedade regida pel
o sistema
Coisa Mais Linda
https://cdn.falauniversidades.com.br/wp
-
content/uploads/2020/07/20110
243/Coisa-
poster.jpg
.
Lerner (2019) explica que o
alicerce do sistema patriarcal é uma
contrato com uma base na
troca: ao mesmo tempo em que o
homem oferece sustento e amparo, a
mulher oferta sujeição, presteza sexual
e serviço doméstico sem
remuneração. Em consonância com
essa ideia, Saffioti (1987) reitera que
por trás do discurso enraizad
“lugar de mulher é em casa, existe
uma potente falta de oportunidades
para as mulheres. A estudiosa
prossegue mencionando que Ao se
atribuir a elas [as mulheres] a
responsabilidade praticamente
exclusiva pela prole e pela casa, já se
lhes está,
automaticamente, reduzindo
as probabilidades de desenvolvimento
de outras potencialidades de que são
portadoras” (SAFFIOTI, 1987, p. 14).
Dessa forma, Malu, Lígia, Adélia e
Theresa são mulheres que
experimentam inúmeras situações de
violência pelo fato de
um gênero histórico e socialmente
inferiorizado.
Em sua primeira temporada, o
desenrolar da narrativa se dá a partir
da chegada de Malu ao Rio de
Janeiro, no ano de 1959, para se
encontrar com o marido
Bertholini), com quem abri
restaurante na capital carioca. No
entanto, ele não está no apartamento
nem no suposto restaurante e acaba
não aparecendo na trama durante a
primeira temporada. Malu, que já é
amiga de Lígia, conhece Adélia e
126
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
remuneração. Em consonância com
essa ideia, Saffioti (1987) reitera que
por trás do discurso enraizad
o de que
lugar de mulher é em casa”, existe
uma potente falta de oportunidades
para as mulheres. A estudiosa
prossegue mencionando que “Ao se
atribuir a elas [as mulheres] a
responsabilidade praticamente
exclusiva pela prole e pela casa, se
automaticamente, reduzindo
as probabilidades de desenvolvimento
de outras potencialidades de que são
portadoras” (SAFFIOTI, 1987, p. 14).
Dessa forma, Malu, Lígia, Adélia e
Theresa são mulheres que
experimentam inúmeras situações de
violência pelo fato de
pertencerem a
um gênero histórico e socialmente
Em sua primeira temporada, o
desenrolar da narrativa se a partir
da chegada de Malu ao Rio de
Janeiro, no ano de 1959, para se
encontrar com o marido
Pedro (Kiko
Bertholini), com quem abri
um
restaurante na capital carioca. No
entanto, ele não está no apartamento
nem no suposto restaurante e acaba
não aparecendo na trama durante a
primeira temporada. Malu, que é
amiga de Lígia, conhece Adélia e
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
Theresa e suas vidas se conectam
ainda no primeiro episódio.
Neste texto, pretendemos analisar a
representação da violência contra as
mulheres na primeira temporada da
série original Netflix
Coisa Mais
Linda
(2019), com o intuito de verificar
quais são os tipos de violência
existentes contra a
s mulheres e de
que maneira os discursos racistas,
machistas e misóginos atingem as
personagens femininas. Para tanto,
utilizaremos como base teórica as
discussões promovidas por Eco
(1989), Buonnano (2019), Curi (2021),
Lerner (2019), Butler (2003), Bourd
(2017), Saffioti (1987), entre outros.
Antes de entrar especificamente na
análise da representação da violência
de gênero presente na rie,
abordamos, ainda que de maneira
breve, sobre o gênero narrativas
seriadas para que possamos
contextualizar sua
própria produção
artística e o alcance dos serviços de
streaming online
no mercado de
conteúdo audiovisual. É o que
passamos a desenvolver na próxima
seção.
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
Theresa e suas vidas se conectam
Neste texto, pretendemos analisar a
representação da violência contra as
mulheres na primeira temporada da
Coisa Mais
(2019), com o intuito de verificar
quais o os tipos de violência
s mulheres e de
que maneira os discursos racistas,
machistas e misóginos atingem as
personagens femininas. Para tanto,
utilizaremos como base teórica as
discuses promovidas por Eco
(1989), Buonnano (2019), Curi (2021),
Lerner (2019), Butler (2003), Bourd
ieu
(2017), Saffioti (1987), entre outros.
Antes de entrar especificamente na
análise da representação da violência
de gênero presente na série,
abordamos, ainda que de maneira
breve, sobre o gênero narrativas
seriadas para que possamos
própria produção
artística e o alcance dos serviços de
no mercado de
conteúdo audiovisual. É o que
passamos a desenvolver na próxima
Narrativas seriadas
As narrativas seriadas têm se
tornado um tipo de produção fílmica
que está
ganhando destaque no
mundo do entretenimento, pois
conseguem chegar ao público de
maneira rápida, por meio de aparatos
tecnológicos. A cibercultura propicia
que
uma parcela significativa de
sujeitos possa ter acesso à internet e
aos seus recursos, por isso
empresas no ramo estão cada vez
mais interessadas em produzir
materiais que possam ser alcançados
por meio digital. Curi (2021
assevera que:
Se os comportamentos e práticas
de consumo dos espectadores
mudaram ao longo dos anos, o
merca
do fez de tudo para
acompanhar essas
transformações e oferecer, em
todos os espaços possíveis,
novos produtos e narrativas,
como forma de atender, e
também de explorar, todas essas
expectativas do público.
Uma das plataformas que se
destaca nesse meio é a
principal líder mundial na área de
streaming
, que produz diversas ries
originais, como mencionado, e exibe
séries produzidas por outros canais
televisivos.Vivendo em um mundo
digital, globaliz
ado e competitivo, a
127
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
As narrativas seriadas têm se
tornado um tipo de produção fílmica
ganhando destaque no
mundo do entretenimento, pois
conseguem chegar ao público de
maneira rápida, por meio de aparatos
tecnológicos. A cibercultura propicia
uma parcela significativa de
sujeitos possa ter acesso à internet e
aos seus recursos, por isso
as grandes
empresas no ramo estão cada vez
mais interessadas em produzir
materiais que possam ser alcançados
por meio digital. Curi (2021
, p. 81)
Se os comportamentos e práticas
de consumo dos espectadores
mudaram ao longo dos anos, o
do fez de tudo para
acompanhar essas
transformações e oferecer, em
todos os espaços possíveis,
novos produtos e narrativas,
como forma de atender, e
também de explorar, todas essas
expectativas do público.
Uma das plataformas que se
destaca nesse meio é a
Netflix,
principal líder mundial na área de
, que produz diversas séries
originais, como já mencionado, e exibe
ries produzidas por outros canais
televisivos.Vivendo em um mundo
ado e competitivo, a
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
rapidez e a agilidade se fazem critérios
básicos na área cinematográfica.
Os sujeitos passaram a ter
consigo sempre um dispositivo com
acesso à internet, podendo assistir a
filmes e a séries em qualquer local: no
ônibus, em casa, na fa
culdade, no
parque, no trabalho etc. Essa nova
experiência propiciou o surgimento da
cultura de “maratonar”, isto é, o
espectador pode assistir a uma ou
mais temporadas inteiras de ries de
televisão em um curto período de
tempo, por meio de sessões imer
(BUONANNO, p. 46, 2019). Ainda
sobre o termo “maratonar”, Saccomori
(2016) assevera que o consumidor,
além de assistir ao conteúdo em
sequência, engaja-
se na narrativa pelo
tempo que quiser, e isso, portanto,
transforma e amplia a sua experiência
narrativa/televisiva.
Ademais, as séries advindas de
plataformas de streaming
sucesso entre os usuários porque eles
podem criar um perfil dentro da
plataforma, determinando o seu gosto
entre os diferentes gêneros e tendo a
seu dispor um catálogo
com diversos
títulos. Dessa forma, os espectadores
acompanham quando quiserem e não
dependem de uma programação
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
rapidez e a agilidade se fazem critérios
básicos na área cinematográfica.
Os sujeitos passaram a ter
consigo sempre um dispositivo com
acesso à internet, podendo assistir a
filmes e a ries em qualquer local: no
culdade, no
parque, no trabalho etc. Essa nova
experiência propiciou o surgimento da
cultura de maratonar, isto é, o
espectador pode assistir “a uma ou
mais temporadas inteiras de séries de
televio em um curto período de
tempo, por meio de sessões imer
sivas”
(BUONANNO, p. 46, 2019). Ainda
sobre o termo maratonar, Saccomori
(2016) assevera que o consumidor,
além de assistir ao conteúdo em
se na narrativa pelo
tempo que quiser, e isso, portanto,
transforma e amplia a sua experiência
Ademais, as ries advindas de
fazem mais
sucesso entre os usuários porque eles
podem criar um perfil dentro da
plataforma, determinando o seu gosto
entre os diferentes gêneros e tendo a
com diversos
títulos. Dessa forma, os espectadores
acompanham quando quiserem e não
dependem de uma programação
estipulada, podendo pausar os
episódios e continuá
momento.
Sob essa ótica, Buonanno
(2019) denomina como paradigma
Netflix as al
terações acontecidas nas
formas de consumir as ries, uma vez
que elas são produzidas em função da
demanda e em etapas de modo
premeditado. Nas narrativas seriadas
advindas de plataformas de
as séries são produzidas e criadas a
partir dos resul
tados do engajamento
do público com a própria companhia
produtora. No caso da
empresa possui diversas redes sociais
no ciberespaço, como páginas no
Facebook, no
Instagram
nas quais interage e divulga os seus
materiais e, desse modo
verificar quais são as reações do
coletivo e quais temas estão em alta.
De acordo com Ede (2015) uma
característica marcante desse novo
modelo de produção audiovisual é que
as séries são disponibilizadas, na
grande maioria das vezes, na íntegra,
ou seja, o usuário tem acesso a todos
os episódios de uma vez, além
disso não interrupção por meio de
propagandas ou comerciais, essa
definição é chamada pela autora de
128
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
estipulada, podendo pausar os
epidios e contin
-los em outro
Sob essa ótica, Buonanno
(2019) denomina como “paradigma
terações acontecidas nas
formas de consumir as séries, uma vez
que elas o produzidas em função da
demanda e em etapas de modo
premeditado. Nas narrativas seriadas
advindas de plataformas de
streaming,
as ries são produzidas e criadas a
tados do engajamento
do público com a ppria companhia
produtora. No caso da
Netflix, a
empresa possui diversas redes sociais
no ciberespaço, como páginas no
Instagram
e no Twitter,
nas quais interage e divulga os seus
materiais e, desse modo
, consegue
verificar quais o as reações do
coletivo e quais temas estão em alta.
De acordo com Ede (2015) uma
característica marcante desse novo
modelo de produção audiovisual é que
as ries o disponibilizadas, na
grande maioria das vezes, na íntegra,
ou seja, o usuário tem acesso a todos
os epidios de uma vez, além
disso não há interrupção por meio de
propagandas ou comerciais, essa
definição é chamada pela autora de
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
Bing-Publishing
. Essa nova
configuração no modelo de
entretenimento gera uma exp
de imersão para o usuário, pois ele
pode passar mais de 6 horas seguidas
assistindo a série, não há uma
interrupção programada por um agente
externo no fluxo da narrativa. Quem
decide quando e onde pausar o
episódio é o próprio usuário.
O que perm
anece na estrutura
narrativa das séries, conforme Eco
(1989, p. 123), na atualidade, é que
“temos uma situação fixa e um certo
número de personagens principais da
mesma forma fixos, em torno dos
quais giram personagens secundários
que mudam, justamente par
impressão de que a história seguinte é
diferente da anterior”. Para Eco
(1989), a serialidade pode ser vista de
duas maneiras, de um lado emerge a
repetição, que carrega consigo aquilo
que foi visto, como uma espécie de
eco; do outro surge a in
ovação, que é
aquilo que une, de maneira criativa,
dois ou mais elementos, estruturando
algo “novo”.
Portanto, apesar de existir uma
repetição no modelo de narrativa
seriada, a existência desse tipo de
produção precisou ser renovada, pois
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
. Essa nova
configuração no modelo de
entretenimento gera uma exp
eriência
de imero para o usuário, pois ele
pode passar mais de 6 horas seguidas
assistindo a rie, não uma
interrupção programada por um agente
externo no fluxo da narrativa. Quem
decide quando e onde pausar o
epidio é o próprio usuário.
anece na estrutura
narrativa das ries, conforme Eco
(1989, p. 123), na atualidade, é que
temos uma situação fixa e um certo
número de personagens principais da
mesma forma fixos, em torno dos
quais giram personagens secundários
que mudam, justamente par
a dar a
impressão de que a história seguinte é
diferente da anterior. Para Eco
(1989), a serialidade pode ser vista de
duas maneiras, de um lado emerge a
repetição, que carrega consigo aquilo
que já foi visto, como uma espécie de
ovação, que é
aquilo que une, de maneira criativa,
dois ou mais elementos, estruturando
Portanto, apesar de existir uma
repetição no modelo de narrativa
seriada, a existência desse tipo de
produção precisou ser renovada, pois
na contemporaneid
ade há uma mescla
de mídias que fluem e convergem para
a experiência narrativa como um todo.
Não é apenas olhar para a história que
está sendo contada, mas pensar em
como essa narrativa ficcional é
projetada para fora das telas e como
ela reverbera entre o
Quando a narrativa seriada toca em
temas sensíveis à sociedade, essa
reverberação pode ser ainda maior.
Não é sem motivo que a maioria
dessas narrativas abordam temáticas
que estão sendo discutidas na
atualidade.
Coisa Mais Linda
uma d
elas. Ao tematizar a violência de
gênero em suas mais variadas formas,
a série atrai o público espectador e, ao
mesmo tempo, proporciona a exibição
de cenas contendo violências que as
mulheres sofrem desde tempos
imemoriais. A seguir, refletiremos
sobre es
ses abusos que subalternizam
e oprimem as mulheres.
Violências
Discutir a respeito da violência
requer refletir sobre o que ela significa.
Teles e Melo (2002) afirmam que é um
modo de limitar a autonomia de
alguém, coibindo e afrontando tanto
moral, qua
nto fisicamente. Atentando
129
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
ade uma mescla
de mídias que fluem e convergem para
a experiência narrativa como um todo.
Não é apenas olhar para a história que
está sendo contada, mas pensar em
como essa narrativa ficcional é
projetada para fora das telas e como
ela reverbera entre o
s usuários.
Quando a narrativa seriada toca em
temas senveis à sociedade, essa
reverberação pode ser ainda maior.
Não é sem motivo que a maioria
dessas narrativas abordam temáticas
que estão sendo discutidas na
Coisa Mais Linda
(2019) é
elas. Ao tematizar a violência de
gênero em suas mais variadas formas,
a rie atrai o público espectador e, ao
mesmo tempo, proporciona a exibição
de cenas contendo violências que as
mulheres sofrem desde tempos
imemoriais. A seguir, refletiremos
ses abusos que subalternizam
e oprimem as mulheres.
Discutir a respeito da violência
requer refletir sobre o que ela significa.
Teles e Melo (2002) afirmam que é um
modo de limitar a autonomia de
alguém, coibindo e afrontando tanto
nto fisicamente. Atentando
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
para essa ideia, a violência contra as
mulheres, muitas vezes denominada
violência de gênero, conforme as
mesmas autoras, precisa ser
compreendida como uma forma de
domínio e de subordinação. Nesse
sentido, ressaltamos que a ampl
da discussão dessa problemática
cresce também no âmbito artístico e
cultural, como se observa na produção
literária, no cinema, na canção, nas
artes visuais, por meio de obras
recentes que tocam no tema das
violências contra as mulheres.
Com o intuit
o de dar mais
visibilidade para a temática, empresas
do ramo do entretenimento passaram
a abordar o tema em suas produções
e a Netflix
é uma delas. A expansão do
gênero seriado abriu espaço para
narrativas com temas atuais e que
retratam aspectos do cotidi
seus espectadores. Esses
as séries, pois se veem representados
na tela, sentem empatia pelas
personagens que fazem parte da
narrativa ficcional. De acordo com
Murray (2003, p. 10):
A arte narrativa baseada em
formatos procedimentais,
parti
cipativos, enciclopédicos e
espaciais pode incrementar
nosso repertório de ações,
alargar os modelos pelos quais
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
para essa ideia, a violência contra as
mulheres, muitas vezes denominada
violência de gênero, conforme as
mesmas autoras, precisa ser
compreendida como uma forma de
domínio e de subordinação. Nesse
sentido, ressaltamos que a ampl
iação
da discussão dessa problemática
cresce também no âmbito artístico e
cultural, como se observa na produção
literária, no cinema, na canção, nas
artes visuais, por meio de obras
recentes que tocam no tema das
violências contra as mulheres.
o de dar mais
visibilidade para a temática, empresas
do ramo do entretenimento passaram
a abordar o tema em suas produções
é uma delas. A expansão do
gênero seriado abriu espaço para
narrativas com temas atuais e que
retratam aspectos do cotidi
ano de
maratonam
as ries, pois se veem representados
na tela, sentem empatia pelas
personagens que fazem parte da
narrativa ficcional. De acordo com
A arte narrativa baseada em
formatos procedimentais,
cipativos, enciclopédicos e
espaciais pode incrementar
nosso repertório de ações,
alargar os modelos pelos quais
aprendemos e interpretamos o
mundo, transformar os modos
pelos que pensamos uns nos
outros e como nos tratamos
mutuamente.
Portanto, a narrativa seriada
pode contribuir para que os sujeitos
reflitam sobre as situações ficcionais e
verifiquem que tais fatos também
ocorrem fora das telas, levando
possivelmente, a repensar atitudes e
ações. Na série
Coisa Mais Linda
(2019), o
s diversos tipos de violência
contra as mulheres transitam pela
narrativa, dentre os quais se destacam
a violência física, psicológica, moral,
sexual e patrimonial. De acordo com
Alemany (2009
, p. 271
As violências praticadas contra as
mulheres devido ao
assumem múltiplas formas. Elas
englobam todos os atos que, por
meio de ameaça, coação ou
força, lhes infligem, na vida
privada ou blica, sofrimentos
físicos ou psicológicos com a
finalidade de intimidá
las, humilhá-
las, atingi
integridade sica e na sua
subjetividade.
No Brasil, esses tipos de
violências estão previstos na Lei Maria
da Penha5
(Lei 11.340); o art. 5º
5
A Lei Maria da Penha foi sancionada em 7 de
agosto de 2006 pelo presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Com 46 artigos distribuídos em
sete títulos, ela cria mecanismos para prevenir
130
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
aprendemos e interpretamos o
mundo, transformar os modos
pelos que pensamos uns nos
outros e como nos tratamos
Portanto, a narrativa seriada
pode contribuir para que os sujeitos
reflitam sobre as situações ficcionais e
verifiquem que tais fatos também
ocorrem fora das telas, levando
-os,
possivelmente, a repensar atitudes e
Coisa Mais Linda
s diversos tipos de violência
contra as mulheres transitam pela
narrativa, dentre os quais se destacam
a violência física, psicológica, moral,
sexual e patrimonial. De acordo com
, p. 271
),
As violências praticadas contra as
mulheres devido ao
seu sexo
assumem múltiplas formas. Elas
englobam todos os atos que, por
meio de ameaça, coação ou
força, lhes infligem, na vida
privada ou pública, sofrimentos
físicos ou psicológicos com a
finalidade de intimidá
-las, puni-
las, atingi
-las na sua
integridade física e na sua
No Brasil, esses tipos de
violências estão previstos na Lei Maria
(Lei nº 11.340); o art.
A Lei Maria da Penha foi sancionada em 7 de
agosto de 2006 pelo presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Com 46 artigos distribuídos em
sete títulos, ela cria mecanismos para prevenir
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
classifica a violência doméstica e
familiar contra as mulheres como
“qualquer ação ou omissão baseada
no gênero que lhe cause morte, leo,
sofrimento físico, sexual ou psicológico
e dano moral ou patrimonial (BRASIL,
2006).
Ademais, outros tipos de
viol
ência também são abordados na
série, como por exemplo, a violência
institucional, estimulada pelas
desigualdades de gênero, étnico
raciais, econômicas etc. À vista desse
tipo de violência, o Conselho Nacional
de Justiça -
órgão que atua no
aperfeiçoamento
do sistema judiciário
brasileiro -
define que essas
desigualdades se formalizam e
institucionalizam nas diferentes
organizações privadas e aparelhos
estatais, como também nos diferentes
grupos que constituem essas
sociedades”.
Outra forma de violência é
que não se caracteriza por lees
e coibir a violência doméstica e familiar con
a mulher em conformidade com a Constituição
Federal (art. 226, § 8°) e os tratados
internacionais ratificados pelo Estado brasileiro
(Convenção de Belém do Pará, Pacto de San
José da Costa Rica, Declaração Americana
dos Direitos e Deveres do Homem e
Co
nvenção sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra a Mulher).
(INSTITUTO MARIA DA PENHA)
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
classifica a violência doméstica e
familiar contra as mulheres como
qualquer ação ou omissão baseada
no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico
e dano moral ou patrimonial” (BRASIL,
Ademais, outros tipos de
ência também são abordados na
rie, como por exemplo, a violência
institucional, estimulada pelas
desigualdades de gênero, étnico
-
raciais, econômicas etc. À vista desse
tipo de violência, o Conselho Nacional
órgão que atua no
do sistema judiciário
define que “essas
desigualdades se formalizam e
institucionalizam nas diferentes
organizações privadas e aparelhos
estatais, como também nos diferentes
grupos que constituem essas
Outra forma de violência é
a
que não se caracteriza por lesões
e coibir a violência doméstica e familiar con
tra
a mulher em conformidade com a Constituição
Federal (art. 226, § 8°) e os tratados
internacionais ratificados pelo Estado brasileiro
(Convenção de Belém do Pará, Pacto de San
José da Costa Rica, Declaração Americana
dos Direitos e Deveres do Homem e
nvenção sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra a Mulher).
(INSTITUTO MARIA DA PENHA)
corporais, que não demonstra um
dano físico externo ao violentado e é
denominada por Bourdieu (2017) como
“violência simbólica”, uma vez que
afeta as vítimas em seu íntimo. Para o
sociólogo, a violência simbólica é
const
ituída a partir das estruturas de
dominação, e estas, por sua vez, se
desenvolvem e evoluem por meio de
um trabalho constante de agentes
específicos, como por exemplo,
família, igreja, estado, escola, dentre
outros.
A violência simbólica se institui
por i
ntermédio da adeo que o
dominado não pode deixar de
conceder ao dominante (e,
portanto, à dominação) quando
ele não dispõe, para pen
para se pensar, ou melhor, para
pensar sua relação com ele, mais
que de instrumentos de
conhecimento que ambos têm
comum e que, não sendo mais
que a forma incorporada da
relação de dominação, fazem
esta relação ser vista como
natural; ou, em outros termos,
quando os esquemas que ele põe
em ação para se ver e se avaliar,
ou para ver e avaliar os
dominantes (elevado/
masculino/feminino, branco/negro
etc.), resultam da incorporação
de classificações, assim
naturalizadas, de que seu ser
social é produto. (BOURDIEU,
2017, p. 46).
Nesse sentido, compreendemos
que esse tipo de violência contra as
131
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
corporais, que não demonstra um
dano físico externo ao violentado e é
denominada por Bourdieu (2017) como
violência simbólica, uma vez que
afeta as vítimas em seu íntimo. Para o
sociólogo, a violência simbólica é
ituída a partir das estruturas de
dominação, e estas, por sua vez, se
desenvolvem e evoluem por meio de
um trabalho constante de agentes
espeficos, como por exemplo,
família, igreja, estado, escola, dentre
A violência simbólica se institui
ntermédio da adesão que o
dominado não pode deixar de
conceder ao dominante (e,
portanto, à dominação) quando
ele não dispõe, para pensá
-la e
para se pensar, ou melhor, para
pensar sua relação com ele, mais
que de instrumentos de
conhecimento que ambos têm
em
comum e que, não sendo mais
que a forma incorporada da
relação de dominação, fazem
esta relação ser vista como
natural; ou, em outros termos,
quando os esquemas que ele põe
em ação para se ver e se avaliar,
ou para ver e avaliar os
dominantes (elevado/
baixo,
masculino/feminino, branco/negro
etc.), resultam da incorporação
de classificações, assim
naturalizadas, de que seu ser
social é produto. (BOURDIEU,
Nesse sentido, compreendemos
que esse tipo de violência contra as
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
mulheres é conceb
ido em ambientes
opressores por diferentes modos. Ela
ocorre pelo fato de mulheres serem
mulheres, acontece também por serem
mulheres pobres, por serem pretas,
por serem gordas etc.; o inúmeras
as características físicas e/ou sociais
que tornam as mulher
es um alvo.
Consonante ao tema, Saffioti (1987, p.
16) reitera que
[...] a supremacia masculina
perpassa todas as classes
sociais, estando também
presente no campo da
discriminação racial. [...] Na
sociedade brasileira, esta última
posição é ocupada por m
negras e pobres.
Ressaltamos que é a partir da
escrita de algumas obras de autoria
feminina e do surgimento das
denominadas ondas feministas que
houve uma maior preocupação em
discutir a respeito das desigualdades
existentes entre os gêneros e
violência contra as mulheres. Nessa
perspectiva da história dos
feminismos, destacam-
se algumas
vozes que foram as precursoras da
luta das mulheres, como Christine de
Pizan em 1405 com a publicação de
cidade das damas
e Marie
Gournay, a quem
se atribui a
publicação de
Escritos sobre a
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
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1
48, mar. 2023. www.
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(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
ido em ambientes
opressores por diferentes modos. Ela
ocorre pelo fato de mulheres serem
mulheres, acontece também por serem
mulheres pobres, por serem pretas,
por serem gordas etc.; são inúmeras
as características físicas e/ou sociais
es um alvo.
Consonante ao tema, Saffioti (1987, p.
[...] a supremacia masculina
perpassa todas as classes
sociais, estando também
presente no campo da
discriminação racial. [...] Na
sociedade brasileira, esta última
posição é ocupada por m
ulheres
Ressaltamos que é a partir da
escrita de algumas obras de autoria
feminina e do surgimento das
denominadas ondas feministas que
houve uma maior preocupação em
discutir a respeito das desigualdades
existentes entre os gêneros e
a
violência contra as mulheres. Nessa
perspectiva da história dos
se algumas
vozes que foram as precursoras da
luta das mulheres, como Christine de
Pizan em 1405 com a publicação de
A
e Marie
le Jars de
se atribui a
Escritos sobre a
igualdade de homens e mulheres
1622. Ainda no século XVIII, Olympe
de Gouges e Mary Wollstonecraft
também deram sua contribuição com
Declaração dos direitos da mulher e da
cidadã e
Reivindicação dos direitos
mulher
(BARRANCOS, 2022, p. 22).
Posteriormente, surge a
primeira onda feminista nos Estados
Unidos e na Europa por volta da
segunda
metade do culo XIX,
durando até o início do culo
subsequente (
MCMCANN
principais pautas
desse momento
inicial são o sufragismo e o direito à
educação. a segunda onda ocorreu
entre os anos de 1960 e 1980, é o
chamado feminismo clássico, que
defendeu a luta contra a opressão
masculina, tendo por influência teórica
a obra de Simone de Beauvoi
segunda onda é representada pelos
movimentos de mulheres do
hemisfério norte, que surgem para
reivindicar seu espaço, disseminando
também para outros contextos
culturais, como o da América Latina,
sob muitas ditaduras militares
(ZIRBEL, 2021).
a t
erceira se iniciou na
década de 1990, como uma
132
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
igualdade de homens e mulheres
de
1622. Ainda no culo XVIII, Olympe
de Gouges e Mary Wollstonecraft
também deram sua contribuição com
Declaração dos direitos da mulher e da
Reivindicação dos direitos
da
respectivamente
(BARRANCOS, 2022, p. 22).
Posteriormente, surge a
primeira onda feminista nos Estados
Unidos e na Europa por volta da
metade do século XIX,
durando até o início do século
MCMCANN
, 2019). As
desse momento
inicial o o sufragismo e o direito à
educação. a segunda onda ocorreu
entre os anos de 1960 e 1980, é o
chamado feminismo clássico, que
defendeu a luta contra a opressão
masculina, tendo por influência teórica
a obra de Simone de Beauvoi
r. A
segunda onda é representada pelos
movimentos de mulheres do
hemisfério norte, que surgem para
reivindicar seu espaço, disseminando
também para outros contextos
culturais, como o da América Latina,
sob muitas ditaduras militares
erceira se iniciou na
década de 1990, como uma
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
necessidade de se rediscutir o próprio
movimento feminista, na busca de
recuperar discussões anteriores que
pareciam ter se resolvido com as
ondas anteriores, embora a realidade
de muitas mulheres não fosse ig
exemplo das mulheres latino
americanas. Neste caso, estas tiveram
que “seguir lutando por direitos
mínimos de cidadania”, enquanto as
do contexto europeu e norte
americana avançavam em outras
pautas de direitos (ZIRBEL, 2021, p.
23).
A quarta onda
contemporaneamente, a partir de
2010, em consequência de protestos
sucedidos tanto presencialmente
quanto por meio da internet e das
redes sociais. É um movimento
marcadamente jovem, coletivo e com
forte atuação em plataformas digitais
como Facebo
ok, Instagram, YouTube,
etc, com capacidade de grande
mobilização. Além disso, propicia
discussões no que se refere à
interseccionalidade, trazendo para o
centro das questões diversos
marcadores sociais, como gênero,
raça e classe social” (PEREZ;
RICOLDI, 2019, p. 2).
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
necessidade de se rediscutir o próprio
movimento feminista, na busca de
recuperar discussões anteriores que
pareciam ter se resolvido com as
ondas anteriores, embora a realidade
de muitas mulheres não fosse ig
ual, a
exemplo das mulheres latino
-
americanas. Neste caso, estas tiveram
que seguir lutando por direitos
mínimos de cidadania, enquanto as
do contexto europeu e norte
-
americana avançavam em outras
pautas de direitos (ZIRBEL, 2021, p.
A quarta onda
é citada
contemporaneamente, a partir de
2010, em consequência de protestos
sucedidos tanto presencialmente
quanto por meio da internet e das
redes sociais. É um movimento
marcadamente jovem, coletivo e com
forte atuação em plataformas digitais
ok, Instagram, YouTube,
etc, com capacidade de grande
mobilização. Além disso, propicia
discuses no que se refere à
interseccionalidade, trazendo para o
centro das questões “diversos
marcadores sociais, como gênero,
raça e classe social (PEREZ;
Enfatizamos que não
discorremos aqui sobre as ondas em
profundidade porque esse não é nosso
objetivo no artigo, entretanto,
consideramos ser importante ao
menos mencionar a existência das
ondas como uma forma de
contextualizar a luta das mulh
envolve também o enfrentamento da
violência. É necesrio deixar o
registro de que outras mulheres nos
antecederam para que chegássemos a
alguns avanços na atualidade, como a
aprovação de leis que protegem as
vítimas de violência, embora isso não
signifique que não haja muito o que
fazer para combater o feminidio e
outros tipos de violência contra as
mulheres.
Observamos, outrossim, o que
expõe Colling (2019) acerca da
disparidade entre os gêneros ocorrida
amiúde:
O discurso da inferioridade
feminina estava tão arraigado na
estrutura da vida das mulheres e
dos homens que poucos o
questionaram. A maioria das
mulheres acomodava
instituição familiar dominada
pelos homens, que lhe garantia
subsistência, oferecia
companheiro para toda a vida e
fornecia um sentimento de
proteção frente ao cotidiano da
vida. Vivendo para seus maridos,
esquecidas, esqueciam de
133
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
Enfatizamos que não
discorremos aqui sobre as ondas em
profundidade porque esse não é nosso
objetivo no artigo, entretanto,
consideramos ser importante ao
menos mencionar a existência das
ondas como uma forma de
contextualizar a luta das mulh
eres, que
envolve também o enfrentamento da
violência. É necessário deixar o
registro de que outras mulheres nos
antecederam para que chegássemos a
alguns avanços na atualidade, como a
aprovação de leis que protegem as
timas de violência, embora isso não
signifique que não haja muito o que
fazer para combater o feminicídio e
outros tipos de violência contra as
Observamos, outrossim, o que
expõe Colling (2019) acerca da
disparidade entre os gêneros ocorrida
O discurso da inferioridade
feminina estava tão arraigado na
estrutura da vida das mulheres e
dos homens que poucos o
questionaram. A maioria das
mulheres acomodava
-se na
instituição familiar dominada
pelos homens, que lhe garantia
subsistência, oferecia
-lhe um
companheiro para toda a vida e
fornecia um sentimento de
proteção frente ao cotidiano da
vida. Vivendo para seus maridos,
esquecidas, esqueciam de
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
pensar sobre si mesmas
(COLLING, 2019, p. 46).
Com o excerto, percebemos
que a subordinação de mulhe
sempre foi comum nas relações
familiares e socialmente aceita. Logo
depois da criação de movimentos
feministas em diversos países, da
instituição de estudos, de fóruns
internacionais sobre a vivência das
mulheres na sociedade tanto na vida
privada quan
to na pública, passou
a discutir com maior ênfase a falta de
igualdade e a questão das mulheres
em situação de violência. Desse modo,
também houve e ainda há uma
preocupação em retratar tais assuntos
em telenovelas, filmes e séries, como
em nosso objeto
de análise
Mais Linda
(2019), cujas violências
contra as mulheres se apresentam por
meio das vozes das personagens
femininas principais. Na sequência,
analisamos estas personagens e suas
trajetórias.
D
iscursos de ódio: as
manifestações de violênc
as mulheres
O início da série
Linda
(2019) ocorre com uma cena
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
pensar sobre si mesmas
(COLLING, 2019, p. 46).
Com o excerto, percebemos
que a subordinação de mulhe
res
sempre foi comum nas relações
familiares e socialmente aceita. Logo
depois da criação de movimentos
feministas em diversos países, da
instituição de estudos, de fóruns
internacionais sobre a vivência das
mulheres na sociedade tanto na vida
to na pública, passou
-se
a discutir com maior ênfase a falta de
igualdade e a questão das mulheres
em situação de violência. Desse modo,
também houve e ainda uma
preocupação em retratar tais assuntos
em telenovelas, filmes e séries, como
de análise
Coisa
(2019), cujas violências
contra as mulheres se apresentam por
meio das vozes das personagens
femininas principais. Na sequência,
analisamos estas personagens e suas
iscursos de ódio: as
manifestações de violênc
ia contra
O início da rie
Coisa Mais
(2019) ocorre com uma cena
noturna de Réveillon, em uma praia no
Rio de Janeiro, com uma mulher
desconhecida colocando no mar uma
oferenda a Iemanjá; além das ondas, a
voz da atriz que interpreta Malu é
ouvida declamando um trecho da
música “Samba da nção, composta
por Baden Powe
ll e Vinicius de
Moraes, e lançada em disco em 1967:
[...] Uma mulher tem que ter
qualquer coisa além de beleza /
Qualquer coisa de triste / Qualquer
coisa que chora / Qualquer coisa
que sente saudade / Um molejo de
amor machucado / Uma beleza
que vem da
tristeza de se saber
mulher [...].
Com o excerto, notamos que a
mulher é evidenciada já no começo da
narrativa seriada, o que se comprova
com o desenrolar dos epidios.
Na sequência, depois da
abertura, Malu desembarca no Rio de
Janeiro e, após pegar
ao endereço do prédio onde seu
marido estaria. Há, então, uso do
recurso de
flashbacks
noite anterior
em que estava ainda
em o Paulo em uma festa de
despedida, que no dia seguinte
iniciaria uma nova vida ao lado do
co
mpanheiro, que havia se mudado
anteriormente para organizar a
inauguração de um restaurante em
134
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
noturna de Réveillon, em uma praia no
Rio de Janeiro, com uma mulher
desconhecida colocando no mar uma
oferenda a Iemanjá; além das ondas, a
voz da atriz que interpreta Malu é
ouvida declamando um trecho da
música Samba da Bênção”, composta
ll e Vinicius de
Moraes, e lançada em disco em 1967:
[...] Uma mulher tem que ter
qualquer coisa além de beleza /
Qualquer coisa de triste / Qualquer
coisa que chora / Qualquer coisa
que sente saudade / Um molejo de
amor machucado / Uma beleza
tristeza de se saber
Com o excerto, notamos que a
mulher é evidenciada no começo da
narrativa seriada, o que se comprova
com o desenrolar dos episódios.
Na sequência, depois da
abertura, Malu desembarca no Rio de
Janeiro e, após pegar
um táxi, chega
ao endereço do prédio onde seu
marido estaria. Há, então, uso do
flashbacks
e ela relembra a
em que estava ainda
em São Paulo em uma festa de
despedida, já que no dia seguinte
iniciaria uma nova vida ao lado do
mpanheiro, que havia se mudado
anteriormente para organizar a
inauguração de um restaurante em
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
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mais linda (2019). PragMATIZES -
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em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
que ambos trabalhariam. É nesses
momentos de retrospecto que Lígia
aparece pela primeira vez em
companhia de seu marido, Augusto
Soares (Gustavo Vaz). A cena, qu
passa ainda nos primeiros minutos do
episódio 01, aponta para indícios de
agressividade, visto que Augusto
adverte Lígia para o consumo de
bebidas e exige que ela mantenha um
sorriso no rosto devido às posveis
relações de negócios a serem
estabelecidas no evento.
Além disso, descobrimos,
enquanto espectadores, que Lígia
gosta muito de música e costumava
cantar, porém parou depois que se
casou. Malu afirma que a amiga possui
uma voz que chama a atenção, em
seguida o marido de Lígia esboça um
sor
riso sem graça. Outra cena que
merece destaque é um pequeno gesto
de subversão de Malu quando se
encontra com Ester Carone (Ondina
Clais Castilho), sua mãe; a matriarca
trocou de vestido porque seu marido
não aprovou o primeiro, Malu, então,
a entender
que a obediência é o
que mantém o casamento de 30 anos
de seus pais.
Mais adiante, Malu descobre
que Pedro, seu marido, o está com
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de F.
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(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
que ambos trabalhariam. É nesses
momentos de retrospecto que Lígia
aparece pela primeira vez em
companhia de seu marido, Augusto
Soares (Gustavo Vaz). A cena, qu
e se
passa ainda nos primeiros minutos do
epidio 01, já aponta para indícios de
agressividade, visto que Augusto
adverte Lígia para o consumo de
bebidas e exige que ela mantenha um
sorriso no rosto devido às possíveis
relações de negócios a serem
Além disso, descobrimos,
enquanto espectadores, que Lígia
gosta muito de música e costumava
cantar, porém parou depois que se
casou. Malu afirma que a amiga possui
uma voz que chama a atenção, em
seguida o marido de Lígia esboça um
riso sem graça. Outra cena que
merece destaque é um pequeno gesto
de subvero de Malu quando se
encontra com Ester Carone (Ondina
Clais Castilho), sua mãe; a matriarca
trocou de vestido porque seu marido
não aprovou o primeiro, Malu, então,
que a obediência é o
que mantém o casamento de 30 anos
Mais adiante, Malu descobre
que Pedro, seu marido, não está com
o restaurante pronto para a
inauguração e que tem mentido para
ela e para a sua família. No
apartamento do casal, no Rio,
encontra um bilhete com uma marca
de batom, indicando que o njuge
esteve com outra mulher. Em um
momento de ódio e raiva, por ter sido
enganada, a personagem começa a
atear fogo nos pertences de Pedro,
gerando uma chama enorme, que
chama a atenção do
momento em que entra em cena
Adélia, que apaga o fogo. Adélia é
uma mulher negra e mãe solo que
mora no morro com a sua filha e com a
sua irmã mais nova, trabalha como
empregada doméstica para uma
madame em uma região bem
localizada da capital
carioca.
Na sequência, aparece um dos
primeiros momentos de sororidade da
série, no qual Adélia oferece um prato
de sopa para Malu, pois percebe que
ela está muito abalada com as
descobertas sobre o marido. Mesmo
sem conhecê-
la, Adélia se compadece
pela s
ituação que Malu está
vivenciando, segurando sua mão e
confortando-
a. Ainda perturbada com o
fato e sobre a sua nova vida no Rio de
Janeiro, Malu procura Lígia para
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- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
o restaurante pronto para a
inauguração e que tem mentido para
ela e para a sua família. No
apartamento do casal, no Rio,
ela
encontra um bilhete com uma marca
de batom, indicando que o cônjuge
esteve com outra mulher. Em um
momento de ódio e raiva, por ter sido
enganada, a personagem começa a
atear fogo nos pertences de Pedro,
gerando uma chama enorme, que
chama a atenção do
s vizinhos -
momento em que entra em cena
Adélia, que apaga o fogo. Adélia é
uma mulher negra e mãe solo que
mora no morro com a sua filha e com a
sua irmã mais nova, trabalha como
empregada doméstica para uma
madame em uma região bem
carioca.
Na sequência, aparece um dos
primeiros momentos de sororidade da
rie, no qual Adélia oferece um prato
de sopa para Malu, pois percebe que
ela está muito abalada com as
descobertas sobre o marido. Mesmo
la, Adélia se compadece
ituação que Malu está
vivenciando, segurando sua mão e
a. Ainda perturbada com o
fato e sobre a sua nova vida no Rio de
Janeiro, Malu procura Lígia para
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
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mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
contar sobre os acontecimentos e,
nessa ocasião, conhece a jornalista
Theresa, cunhada de L
ígia. Com isso,
a vida de Malu conecta
-
personagens femininas e juntas
delineiam a trama da narrativa.
Um dos principais tipos de
violência que emerge constantemente
na série é a violência psicológica, que
se caracteriza por provocar danos
emoci
onais à vítima, sendo causados
por chantagens, ameaças,
manipulação, humilhação,
perseguição, insultos, dentre outras
situações. Adélia é uma das
personagens que constantemente é
humilhada, chantageada e ameaçada
por conta de seu gênero (mulher), cor
(pret
a) e classe social (pobre). Ela
precisa esconder da patroa que tem
uma filha, pois uma empregada boa e
que não falta no trabalho não pode ter
filhos. Isso se devido ao
pensamento tradicional de que caso
precisasse se ausentar, causaria
incômodos e trans
tornos para a
empregadora. Além disso, o elevador
de serviço está sempre quebrado,
obrigando Adélia a usar as escadas
para subir até o apartamento em que
atua, em razão de ela ser uma
empregada mulher e negra
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
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(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
contar sobre os acontecimentos e,
nessa ocasião, conhece a jornalista
ígia. Com isso,
-
se às três
personagens femininas e juntas
delineiam a trama da narrativa.
Um dos principais tipos de
violência que emerge constantemente
na rie é a violência psicológica, que
se caracteriza por provocar danos
onais à vítima, sendo causados
por chantagens, ameaças,
manipulação, humilhação,
perseguição, insultos, dentre outras
situações. Adélia é uma das
personagens que constantemente é
humilhada, chantageada e ameaçada
por conta de seu gênero (mulher), cor
a) e classe social (pobre). Ela
precisa esconder da patroa que tem
uma filha, pois uma empregada boa e
que não falta no trabalho não pode ter
filhos. Isso se dá devido ao
pensamento tradicional de que caso
precisasse se ausentar, causaria
tornos para a
empregadora. Além disso, o elevador
de serviço está sempre quebrado,
obrigando Adélia a usar as escadas
para subir até o apartamento em que
atua, em razão de ela ser uma
empregada mulher e negra
o que
poderia causar constrangimento aos
mora
dores do edifício.
Imagem 2 –
Episódio 02
bem-vindas”
Fonte:
Netflix
Em outros momentos da rie,
Adélia juntamente com Malu, não o
vistas pelas demais personagens
como capazes de serem proprietárias
de um Clube de Música.
desencorajada pelo pai ao contar
sobre a sua ideia de abrir o seu próprio
negócio; para Ademar Carone (João
Bourbonnais), a filha não tem
competência para dirigir um
empreendimento sozinha, sem a
presença de um homem. Além disso,
na visão dele, uma
mulher de respeito
e de família jamais deveria se
submeter a tal situação. Lerner (2019),
por conseguinte, expressa a ideia de
que as mulheres sempre colaboraram
para a construção do processo da
própria submissão, devido ao fato de
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- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
poderia causar constrangimento aos
dores do edifício.
Epidio 02
– “Garotas não são
6min2s
Netflix
Em outros momentos da série,
Adélia juntamente com Malu, não são
vistas pelas demais personagens
como capazes de serem proprietárias
de um Clube de Música.
Malu é
desencorajada pelo pai ao contar
sobre a sua ideia de abrir o seu próprio
negócio; para Ademar Carone (João
Bourbonnais), a filha não tem
competência para dirigir um
empreendimento sozinha, sem a
presença de um homem. Além disso,
mulher de respeito
e de família jamais deveria se
submeter a tal situação. Lerner (2019),
por conseguinte, expressa a ideia de
que as mulheres sempre colaboraram
para a construção do processo da
própria submissão, devido ao fato de
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
serem constantemente ta
interiorizar o pensamento de que são
inferiores.
Ao transitar pelas histórias das
personagens femininas da rie,
deparamo-
nos com Theresa, que
trabalha em uma revista voltada ao
público feminino
Ângela
comandada por homens. No episódio
02
, em que ela aparece em seu
ambiente de trabalho, questiona o
chefe acerca da contratação de um
novo funcionário, também homem, que
escreverá sobre assuntos relativos às
mulheres. De acordo com seu
superior, Paulo Sérgio (Rodrigo
Candelot), “Homem é mais f
mais profissional, menos emotivo.
Apesar de a revista ser feminina, a
personagem masculina afirma que não
existe um “mundo feminino e que o
mundo é um só. Na cena, observamos
o comportamento machista perpetrado
pela sociedade da época e propagado
até a contemporaneidade. Theresa,
nitidamente, se mostra feminista e
revolucionária devido aos seus
comentários, declarando que as
normas existentes foram concebidas
pelos homens.
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
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Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
serem constantemente ta
lhadas a
interiorizar o pensamento de que são
Ao transitar pelas histórias das
personagens femininas da série,
nos com Theresa, que
trabalha em uma revista voltada ao
Ângela
e é
comandada por homens. No episódio
, em que ela aparece em seu
ambiente de trabalho, questiona o
chefe acerca da contratação de um
novo funcionário, também homem, que
escreverá sobre assuntos relativos às
mulheres. De acordo com seu
superior, Paulo Sérgio (Rodrigo
Candelot), Homem é mais f
ocado,
mais profissional, menos emotivo”.
Apesar de a revista ser feminina, a
personagem masculina afirma que não
existe um mundo feminino” e que o
mundo é um . Na cena, observamos
o comportamento machista perpetrado
pela sociedade da época e propagado
até a contemporaneidade. Theresa,
nitidamente, se mostra feminista e
revolucionária devido aos seus
comentários, declarando que as
normas existentes foram concebidas
Imagem 3 –
Episódio 02
bem-vindas –
10min11s
Fonte:
Netflix
Martínez (2011) indica que a
violência simbólica contra as mulheres
é engendrada a partir da disseminação
de mensagens de dominação
alastradas socialmente. Três aspectos
sãomaiscomuns, conforme a autora:
1) el desprecio y la burla por lo que
son
y/o hacen las mujeres; 2) el temor
o desconfianza por lo que son y/o
hacen las mujeres, y 3) la justificación
de la subordinación femenina y/o de la
violencia contra las mujeres
(MARTÍNEZ, 2011,
sentido, Malu, ao tentar uma
sociedade com Ro
Machado), é incentivada, por ser uma
mulher bonita, a aproveitar a estadia
no Rio de Janeiro, a esquecer a ideia
do clube de música noturno e a deixar
o trabalho administrativo/burocrático
“a parte chata”, nas palavras da
personagem mascul
homens.
137
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- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
Epidio 02
– “Garotas não são
10min11s
Netflix
Martínez (2011) indica que a
violência simbólica contra as mulheres
é engendrada a partir da disseminação
de mensagens de dominação
alastradas socialmente. Três aspectos
omaiscomuns, conforme a autora:
1) el desprecio y la burla por lo que
y/o hacen las mujeres; 2) el temor
o desconfianza por lo que son y/o
hacen las mujeres, y 3) la justificación
de la subordinación femenina y/o de la
violencia contra las mujeres
”.
(MARTÍNEZ, 2011,
s. p.). Nesse
sentido, Malu, ao tentar uma
sociedade com Ro
berto (Gustavo
Machado), é incentivada, por ser uma
mulher bonita, a aproveitar a estadia
no Rio de Janeiro, a esquecer a ideia
do clube de música noturno e a deixar
o trabalho administrativo/burocrático
a parte chata, nas palavras da
personagem mascul
ina para os
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
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Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
Ainda no episódio 02, Theresa
protagoniza outra cena importante
para o debate da violência simbólica e
da desigualdade de gênero, no espaço
profissional da revista em que atua.
Em novo diálogo com Paulo Sérgio,
ela manipula a contrata
anteriormente discutida, apresentando
duas opções -
um homem e uma
mulher -
para o cargo de repórter.
Theresa faz o chefe decidir por Helô
(Thaila Ayala), argumentando que uma
mulher custaria muito menos, em
virtude de que o pagamento feminino é
inferi
or ao do homem. Outro fator que
contribui para a decisão do chefe é o
de que Helô é muito bonita e, de
acordo com a fala dele: “Acho que não
vai fazer mal ter mais um rabo de saia
para decorar o ambiente”. Uma dessas
visões inconcebíveis, centrada na
desva
lorização do trabalho da mulher,
é ressaltada por Saffioti (1987
17):
A situação mais frequente no
campo do trabalho é aquela que
reúne homens e mulheres sob o
comando de homens. A sujeição
feminina é mais profunda que a
masculina, o que pode ser
averiguado através de vários
aspectos. Primeiro, os patrões
pagam menos às empregadas
mulheres, mesmo quando elas
desempenham as mesmas
tarefas que os homens [...].
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
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Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
Ainda no episódio 02, Theresa
protagoniza outra cena importante
para o debate da violência simbólica e
da desigualdade de gênero, no espaço
profissional da revista em que atua.
Em novo diálogo com Paulo Sérgio,
ela manipula a contrata
ção
anteriormente discutida, apresentando
um homem e uma
para o cargo de repórter.
Theresa faz o chefe decidir por Helô
(Thaila Ayala), argumentando que uma
mulher custaria muito menos, em
virtude de que o pagamento feminino é
or ao do homem. Outro fator que
contribui para a decisão do chefe é o
de que Helô é muito bonita e, de
acordo com a fala dele: Acho que não
vai fazer mal ter mais um rabo de saia
para decorar o ambiente. Uma dessas
vies inconcebíveis, centrada na
lorização do trabalho da mulher,
é ressaltada por Saffioti (1987
, p. 16-
A situação mais frequente no
campo do trabalho é aquela que
reúne homens e mulheres sob o
comando de homens. A sujeição
feminina é mais profunda que a
masculina, o que pode ser
averiguado através de vários
aspectos. Primeiro, os patrões
pagam menos às empregadas
mulheres, mesmo quando elas
desempenham as mesmas
tarefas que os homens [...].
Assim, percebemos que a
situação de desproporção salarial
entre os gêneros sempre existiu e
perpetua mesmo na sociedade
contemporânea. Saffioti (1987)
também colabora com a reflexão
acerca da dominação masculina em
relação às escolhas da mulher na
sociedade patriarcal, mencionando
que, na grande maioria das vezes, a
mulher é compelida a viven
incorporar à comunidade do marido.
Nesse sentido, na sequência da
narrativa seriada, Lígia, chega em
casa após uma noite com Malu e
Theresa, conta ao marido sobre o seu
desejo de continuar cantando, pede
permissão para cantar em seus futuros
comí
cios e acaba sofrendo a primeira
cena de violência física da trama.
Augusto um tapa no rosto de Lígia,
que cai no chão e permanece deitada,
ferida física e psicologicamente.
Imagem 4 –
Episódio 02
bem-vindas” –
Fonte:
Netflix
138
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
Assim, percebemos que a
situação de desproporção salarial
entre os gêneros sempre existiu e
se
perpetua mesmo na sociedade
contemporânea. Saffioti (1987)
também colabora com a reflexão
acerca da dominação masculina em
relação às escolhas da mulher na
sociedade patriarcal, mencionando
que, na grande maioria das vezes, a
mulher é compelida a viven
ciar e se
incorporar à comunidade do marido.
Nesse sentido, na sequência da
narrativa seriada, Lígia, chega em
casa após uma noite com Malu e
Theresa, conta ao marido sobre o seu
desejo de continuar cantando, pede
permissão para cantar em seus futuros
cios e acaba sofrendo a primeira
cena de violência física da trama.
Augusto dá um tapa no rosto de Lígia,
que cai no chão e permanece deitada,
ferida física e psicologicamente.
Epidio 02
– “Garotas não são
41min56s
Netflix
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
Para discutir a condição de
Lígia enquanto cantora, destacamos o
estudo de Perrot (2019) que trata da
mulher artista. Para a autora, trabalhar
com a arte sempre foi muito difícil para
as mulheres, especialmente a música.
Uma das únicas oportunidade
manter no ramo é na circunstância de
cantora lírica; entretanto, não é o caso
da personagem Lígia. A mulher, dessa
maneira, poderia somente fazer o uso
no espaço privado da arte, sendo
considerado uma forma de
entretenimento ou, na eventualidade
de
necessitar seguir na área, poderia
também dar aulas de música. Augusto,
dessa forma, reage com violência ao
desejo da esposa, exigindo que ela
somente posasse ao seu lado para
manter as relações
profissionais/sociais e servisse ao seu
prazer sexual.
Imagem 5 – Episódio 02 –
“Garotas não são
bem-vindas” –
42min23s
Fonte: Netflix
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
Para discutir a condição de
Lígia enquanto cantora, destacamos o
estudo de Perrot (2019) que trata da
mulher artista. Para a autora, trabalhar
com a arte sempre foi muito difícil para
as mulheres, especialmente a música.
Uma das únicas oportunidade
s de se
manter no ramo é na circunstância de
cantora lírica; entretanto, não é o caso
da personagem Lígia. A mulher, dessa
maneira, poderia somente fazer o uso
no espaço privado da arte, sendo
considerado uma forma de
entretenimento ou, na eventualidade
necessitar seguir na área, poderia
também dar aulas de música. Augusto,
dessa forma, reage com violência ao
desejo da esposa, exigindo que ela
somente posasse ao seu lado para
manter as relações
profissionais/sociais e servisse ao seu
Garotas não são
42min23s
No episódio 03, uma vez mais,
Theresa se defronta com uma prática
abusiva na revista -
Tal conceito é definido por Stocker e
Dalmaso (2016) como uma tentativa
de
o homem explicar algo à mulher,
como se sozinha ela não conseguisse
obter a compreensão ou não lograsse
realizar determinada tarefa. Nas
palavras das autoras, A verdadeira
intenção do mansplaining é
desmerecer o conhecimento de uma
mulher, desqualificando
argumentos.” (STOCKER; DALMASO,
2016, p. 684), o que pode ser
evidenciado com a discordância da
fala de Theresa, que tentava
convencer a equipe da importância de
uma reportagem, por um dos colegas.
Gustavo (Wagner Molina) afirma que o
assunto propost
o por Theresa não
interessa às mulheres, fazendo
inclusive chacota da situação. Na
cena, apenas as duas funcionárias
mulheres permanecem sérias
enquanto os homens gargalham.
No mesmo epidio, Adélia
sofre novamente com o preconceito
racial, dessa vez pelo
Ambas ainda não foram apresentadas
e Lígia pede a Adélia um copo de
água, demonstrando também a
139
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
No episódio 03, uma vez mais,
Theresa se defronta com uma prática
o Mansplaining.
Tal conceito é definido por Stocker e
Dalmaso (2016) como uma tentativa
o homem explicar algo à mulher,
como se sozinha ela o conseguisse
obter a compreeno ou não lograsse
realizar determinada tarefa. Nas
palavras das autoras, “A verdadeira
intenção do mansplaining é
desmerecer o conhecimento de uma
mulher, desqualificando
seus
argumentos. (STOCKER; DALMASO,
2016, p. 684), o que pode ser
evidenciado com a discordância da
fala de Theresa, que tentava
convencer a equipe da importância de
uma reportagem, por um dos colegas.
Gustavo (Wagner Molina) afirma que o
o por Theresa não
interessa às mulheres, fazendo
inclusive chacota da situação. Na
cena, apenas as duas funcionárias
mulheres permanecem sérias
enquanto os homens gargalham.
No mesmo episódio, Adélia
sofre novamente com o preconceito
racial, dessa vez pelo
gesto de Lígia.
Ambas ainda não foram apresentadas
e Lígia pede a Adélia um copo de
água, demonstrando também a
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
situação da desigualdade social. Em
outras palavras, a mulher branca e
burguesa, representada pela
personagem gia, enxergou na
mulher negra e
pobre, representada
por Adélia, apenas uma serviçal apta a
lhe servir quando solicitado. Apesar da
sutileza com que o tema é abordado,
notamos a ocorrência do que
Gonzalez (2020, p. 76) designa como
“duplo fenômeno do racismo e
sexismo”; ambos os preconce
quando encadeados, promovem
consequências impactantes na mulher
negra. Ao refletir sobre a cena
retratada na série, notamos que Malu
tenta remediar a situação, explicando
à Lígia que Adélia é sua amiga;
entretanto, não condena o racismo
estrutural de
monstrado pela amiga de
infância e, posteriormente, se desculpa
com Adélia.
Um outro tipo de violência que
emerge na trama é a violência sexual.
Ainda no episódio 03, Lígia é
violentada pelo marido Augusto, que
chega em casa bado e a obriga a
manter rela
ção sexual com ele contra
a sua vontade. De acordo com a Lei
Maria da Penha, caracteriza
violência sexual:
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
situação da desigualdade social. Em
outras palavras, a mulher branca e
burguesa, representada pela
personagem Lígia, enxergou na
pobre, representada
por Adélia, apenas uma serviçal apta a
lhe servir quando solicitado. Apesar da
sutileza com que o tema é abordado,
notamos a ocorrência do que
Gonzalez (2020, p. 76) designa como
duplo fenômeno do racismo e
sexismo; ambos os preconce
itos,
quando encadeados, promovem
consequências impactantes na mulher
negra. Ao refletir sobre a cena
retratada na rie, notamos que Malu
tenta remediar a situação, explicando
à Lígia que Adélia é sua amiga;
entretanto, não condena o racismo
monstrado pela amiga de
infância e, posteriormente, se desculpa
Um outro tipo de violência que
emerge na trama é a violência sexual.
Ainda no episódio 03, Lígia é
violentada pelo marido Augusto, que
chega em casa bêbado e a obriga a
ção sexual com ele contra
a sua vontade. De acordo com a Lei
Maria da Penha, caracteriza
-se como
Qualquer conduta que a
constranja a presenciar, a manter
ou a participar de relação sexual
não desejada, mediante
intimidação, ameaça, coação
uso da força; Que a induza a
comercializar ou a utilizar, de
qualquer modo, a sua
sexualidade, Que a impeça de
usar qualquer método
contraceptivo ou que a force ao
matrimônio, à gravidez, ao aborto
ou à prostituição, mediante
coação, chantagem, suborno
manipulação; Ou que limite ou
anule o exercício de seus direitos
sexuais e reprodutivos. (BRASIL,
2006).
A violência sofrida por Lígia
dentro do casamento é conhecida
também como estupro marital, o crime
é classificado dessa maneira quando
cometido p
elo companheiro de
relacionamento. Ademais, pode ser
considerado estupro marital forçar
relação sexual enquanto a vítima está
inconsciente, seja dormindo,
embriagada ou sob efeito de remédios.
A violência sexual cometida pelo
cônjuge passa, muitas vezes,
d
espercebida até mesmo pela vítima,
pois ainda existe uma cultura que
insiste em inferiorizar a posição da
mulher dentro do casamento, onde ela
deve satisfazer os desejos sexuais do
companheiro, deixando de lado a sua
vontade e o seu livre desejo de
desfrut
ar ou não de um ato sexual.
140
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
Qualquer conduta que a
constranja a presenciar, a manter
ou a participar de relação sexual
não desejada, mediante
intimidação, ameaça, coação
ou
uso da força; Que a induza a
comercializar ou a utilizar, de
qualquer modo, a sua
sexualidade, Que a impeça de
usar qualquer método
contraceptivo ou que a force ao
matrimônio, à gravidez, ao aborto
ou à prostituição, mediante
coação, chantagem, suborno
ou
manipulação; Ou que limite ou
anule o exercio de seus direitos
sexuais e reprodutivos. (BRASIL,
A violência sofrida por Lígia
dentro do casamento é conhecida
também como estupro marital, o crime
é classificado dessa maneira quando
elo companheiro de
relacionamento. Ademais, pode ser
considerado estupro marital forçar
relação sexual enquanto a vítima está
inconsciente, seja dormindo,
embriagada ou sob efeito de remédios.
A violência sexual cometida pelo
njuge passa, muitas vezes,
espercebida até mesmo pela vítima,
pois ainda existe uma cultura que
insiste em inferiorizar a posição da
mulher dentro do casamento, onde ela
deve satisfazer os desejos sexuais do
companheiro, deixando de lado a sua
vontade e o seu livre desejo de
ar ou não de um ato sexual.
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
A personagem Lígia é a que
mais sofre violências na narrativa
seriada. O seu relacionamento com
Augusto é extremamente abusivo e
tóxico, sua existência é baseada em
satisfazer as vontades e anseios dele.
No episódio 05, Lígia
volta a ser tima
de agressão física. O marido,
insatisfeito com a apresentação
musical dela no clube de música Coisa
Mais Linda, agride-
a novamente. Ela
tenta se defender, mas não consegue,
pois a força física de Augusto é maior
do que a dela. Quem imped
agressões continuem é Malu, que
separa a briga e impõe que Augusto
saia do clube.
Depois do ocorrido, Adélia,
Malu e Theresa conversam com Lígia,
descobrem que as agressões
aconteceram em outros momentos e
discutem sobre o que poderiam fazer a
res
peito. Adélia e Malu acreditam que
manter a situação em sigilo é a melhor
possibilidade, visto a posição social
ocupada por Augusto e com medo de
prejudicar ainda mais Lígia.
Theresa fica consternada com a
situação e sugere chamar a polícia,
porém é imp
edida por Lígia, que
insiste em afirmar que o marido a ama
e que foi apenas um momento de
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
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(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
A personagem Lígia é a que
mais sofre violências na narrativa
seriada. O seu relacionamento com
Augusto é extremamente abusivo e
tóxico, sua existência é baseada em
satisfazer as vontades e anseios dele.
volta a ser vítima
de agressão física. O marido,
insatisfeito com a apresentação
musical dela no clube de música Coisa
a novamente. Ela
tenta se defender, mas não consegue,
pois a força física de Augusto é maior
do que a dela. Quem imped
e que as
agressões continuem é Malu, que
separa a briga e impõe que Augusto
Depois do ocorrido, Adélia,
Malu e Theresa conversam com Lígia,
descobrem que as agressões
aconteceram em outros momentos e
discutem sobre o que poderiam fazer a
peito. Adélia e Malu acreditam que
manter a situação em sigilo é a melhor
possibilidade, visto a posição social
ocupada por Augusto e com medo de
prejudicar ainda mais Lígia.
Theresa fica consternada com a
situação e sugere chamar a polícia,
edida por Lígia, que
insiste em afirmar que o marido a ama
e que foi apenas um momento de
nervosismo da parte dele. Com medo
da reação de Augusto, Lígia passa
alguns dias no apartamento de Malu.
Durante esse período em que
Lígia está afastada de Augusto, e
consegue experimentar uma vida na
qual os seus anseios o a prioridade.
Ela canta, sai com os amigos, vivencia
acontecimentos que a deixam feliz,
sem se preocupar em seguir os
padrões morais estipulados pelo
marido e pela sociedade. No epidio
06, enq
uanto Lígia se deleita com a
possibilidade de ter uma vida sem as
projeções impostas pelo marido,
Augusto viaja para a Itália a negócios.
Eleonora Soares (Esther Góes)
aproveita o momento de ausência do
filho e providencia o desquite do casal,
levando os d
ocumentos para que Lígia
assine, cortando assim relação com a
família.
Ainda nesse epidio, Lígia
confidencia às amigas Malu e Adélia
que está grávida de Augusto e que
deseja interromper a gestação, pois
não tem vontade de ser mãe. Butler
(2003) reitera a
importância de não
entendermos a mulher a partir de um
padrão universal, haja vista que as
mulheres são distintas e nem todas
desejam as mesmas coisas, inclusive
141
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
nervosismo da parte dele. Com medo
da reação de Augusto, Lígia passa
alguns dias no apartamento de Malu.
Durante esse período em que
Lígia está afastada de Augusto, e
la
consegue experimentar uma vida na
qual os seus anseios são a prioridade.
Ela canta, sai com os amigos, vivencia
acontecimentos que a deixam feliz,
sem se preocupar em seguir os
padrões morais estipulados pelo
marido e pela sociedade. No episódio
uanto Lígia se deleita com a
possibilidade de ter uma vida sem as
projeções impostas pelo marido,
Augusto viaja para a Itália a negócios.
Eleonora Soares (Esther Góes)
aproveita o momento de ausência do
filho e providencia o desquite do casal,
ocumentos para que Lígia
assine, cortando assim relação com a
Ainda nesse episódio, Lígia
confidencia às amigas Malu e Adélia
que está grávida de Augusto e que
deseja interromper a gestação, pois
não tem vontade de ser mãe. Butler
importância de não
entendermos a mulher a partir de um
padrão universal, haja vista que as
mulheres o distintas e nem todas
desejam as mesmas coisas, inclusive
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
a maternidade. Compreendendo as
individualidades de Lígia, as amigas,
que são mães, declaram
que se esse
é o desejo dela, deve ser acatado. Não
existindo um espaço
adequado/legalizado para realizar a
interrupção voluntária da gestação,
elas vão até uma clínica clandestina,
onde o procedimento é realizado. A
temática do aborto segue sendo um
tabu n
a sociedade brasileira,
considerado um delito; a prática do
aborto pode, inclusive, levar a mulher
a ser condenada à prisão.
No episódio 07 da rie, o
último da primeira temporada, Augusto
retorna da Itália e tem uma conversa
com a mãe; ele descobre qu
assinou os papéis do divórcio e
aproveita para confidenciar que não
será mais candidato a prefeito do Rio
de Janeiro. O diálogo continua com
Eleonora enfatizando que Augusto não
conseguiu “manter a esposa na linha,
causando vergonha para a família
com isso perdendo a oportunidade de
ser candidato a prefeito do Rio de
Janeiro. Na mesma cena, Eleonora
aponta que o filho não é homem o
bastante, que não tem uma postura
rígida e que isso gerou todos os
problemas da família. Para finalizar o
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
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(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
a maternidade. Compreendendo as
individualidades de Lígia, as amigas,
que se esse
é o desejo dela, deve ser acatado. Não
existindo um espaço
adequado/legalizado para realizar a
interrupção voluntária da gestação,
elas vão até uma clínica clandestina,
onde o procedimento é realizado. A
temática do aborto segue sendo um
a sociedade brasileira,
considerado um delito; a prática do
aborto pode, inclusive, levar a mulher
No episódio 07 da série, o
último da primeira temporada, Augusto
retorna da Itália e tem uma conversa
com a mãe; ele descobre qu
e Lígia
assinou os papéis do divórcio e
aproveita para confidenciar que o
será mais candidato a prefeito do Rio
de Janeiro. O diálogo continua com
Eleonora enfatizando que Augusto não
conseguiu manter a esposa na linha”,
causando vergonha para a família
e
com isso perdendo a oportunidade de
ser candidato a prefeito do Rio de
Janeiro. Na mesma cena, Eleonora
aponta que o filho não é “homem” o
bastante, que não tem uma postura
rígida e que isso gerou todos os
problemas da família. Para finalizar o
ato, a m
ãe de Augusto mostra fotos de
Lígia saindo de uma clínica junto com
Malu, local onde a personagem
submeteu-
se a um aborto. Tais
comentários, advindos de Eleonora,
evidenciam que o machismo muitas
vezes é perpetrado pela própria
mulher. Figueiredo (2020, p.
aponta que algumas mulheres são
“porta-
vozes do patriarcado, porque a
dificuldade para operar uma mudança
reside no fato de os pensamentos dos
dominados se basearem nas
estruturas de dominação.
As representações de violência
contra as mulheres são ev
durante toda a primeira temporada da
série, porém um dos eventos que
comovem é a morte de Lígia. O último
episódio da primeira temporada da
série culmina em um feminidio.
Depois de sofrer diversos tipos de
agressões durante o casamento, Lígia
é morta pelo ex-
marido com um tiro no
peito. Malu também é tima das
agressões de Augusto e é baleada na
barriga, sendo acusada por ele de ser
a causadora da destruição do
relacionamento do casal.
142
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
ãe de Augusto mostra fotos de
Lígia saindo de uma clínica junto com
Malu, local onde a personagem
se a um aborto. Tais
comentários, advindos de Eleonora,
evidenciam que o machismo muitas
vezes é perpetrado pela própria
mulher. Figueiredo (2020, p.
18)
aponta que algumas mulheres são
vozes do patriarcado, porque a
dificuldade para operar uma mudança
reside no fato de os pensamentos dos
dominados se basearem nas
estruturas de dominação”.
As representações de violência
contra as mulheres são ev
idenciadas
durante toda a primeira temporada da
rie, porém um dos eventos que
comovem é a morte de Lígia. O último
epidio da primeira temporada da
rie culmina em um feminicídio.
Depois de sofrer diversos tipos de
agressões durante o casamento, Lígia
marido com um tiro no
peito. Malu também é vítima das
agressões de Augusto e é baleada na
barriga, sendo acusada por ele de ser
a causadora da destruição do
relacionamento do casal.
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
Imagem 6 – Episódio 07 –
“Fantasmas do
Natal passado”
30min50s
Fonte: Netflix
Apesar de impactante e trágica,
a narrativa seriada imita a realidade de
muitas mulheres que também foram
mortas por homens apenas por serem
mulheres. A morte de Lígia é a maior
expressão da violência e do poder
masculino, demonstrados por Augusto,
isto é,
que ele não consegue
dominá-
la, tira a sua vida, mostrando
superioridade. Sobre essas relações
de poder e violência, Alemany (2009,
p. 271) assevera que “[...] violências
corporais que, como expressão de
relações entre poder masculino e
sexualidade, fa
zem parte da
aprendizagem da virilidade, e o em
geral legitimados socialmente,
portanto, todas as outras violências
que a personagem feminina sofreu
antes de ser morta passaram
despercebidas por grande parte da
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
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Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
Fantasmas do
30min50s
Apesar de impactante e trágica,
a narrativa seriada imita a realidade de
muitas mulheres que também foram
mortas por homens apenas por serem
mulheres. A morte de Lígia é a maior
expressão da violência e do poder
masculino, demonstrados por Augusto,
já que ele não consegue
la, tira a sua vida, mostrando
superioridade. Sobre essas relações
de poder e violência, Alemany (2009,
p. 271) assevera que [...] violências
corporais que, como expressão de
relações entre poder masculino e
zem parte da
aprendizagem da virilidade, e são em
geral legitimados socialmente”,
portanto, todas as outras violências
que a personagem feminina sofreu
antes de ser morta passaram
despercebidas por grande parte da
sociedade que a rodeava. A sogra de
Lígia,
Eleonora, acreditava que as
agressões sofridas pela nora eram
merecidas, uma vez que eram uma
forma de punição pela falta de
obediência da nora. Apenas as amigas
mais próximas rechaçaram as
violências contra gia, porém não
conseguiram fazer muito, justa
pela posição inferior em que eram
alocadas na sociedade.
Os casos de mulheres
assassinadas são crescentes na
atualidade; em 2021, segundo dados
do Fórum Brasileiro de Segurança
Pública (FBSP), a cada sete horas
uma mulher foi vítima de feminidio n
país. No Brasil, o crime de feminidio
foi instituído apenas em 9 de março de
2015, com a Lei 13.104, conhecida
como Lei do Feminidio, que foi
promulgada pela presidente Dilma
Rousseff. Com a nova lei, o feminidio
tornou-
se um crime hediondo, na
a pena dos assassinos varia entre 12 e
30 anos.
Há um espaço temporal de mais
de 50 anos entre a rie e o momento
em que de fato o feminidio é
reconhecido como tal perante a
sociedade. Nesse período, milhares de
mulheres tiveram suas vidas ceifadas
143
periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
sociedade que a rodeava. A sogra de
Eleonora, acreditava que as
agressões sofridas pela nora eram
merecidas, uma vez que eram uma
forma de punição pela falta de
obediência da nora. Apenas as amigas
mais próximas rechaçaram as
violências contra Lígia, porém não
conseguiram fazer muito, justa
mente
pela posição inferior em que eram
alocadas na sociedade.
Os casos de mulheres
assassinadas são crescentes na
atualidade; em 2021, segundo dados
do Fórum Brasileiro de Segurança
Pública (FBSP), a cada sete horas
uma mulher foi vítima de feminicídio n
o
país. No Brasil, o crime de feminicídio
foi instituído apenas em 9 de março de
2015, com a Lei nº 13.104, conhecida
como Lei do Feminicídio, que foi
promulgada pela presidente Dilma
Rousseff. Com a nova lei, o feminicídio
se um crime hediondo, na
qual
a pena dos assassinos varia entre 12 e
Há um espaço temporal de mais
de 50 anos entre a série e o momento
em que de fato o feminicídio é
reconhecido como tal perante a
sociedade. Nesse período, milhares de
mulheres tiveram suas vidas ceifadas
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
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1
por não se adequarem ao ideal de
feminino estipulado pela sociedade.
De acordo com a Rede de
Observatório da Segurança
instituição que tem como objetivo
monitorar e difundir informações sobre
segurança pública, violência e direitos
humanos “no passado
mortes e agressões contra mulheres
eram tratados como legítima defesa da
honra, ou como consequência de forte
emoção, pela justiça e pela imprensa,
culpabilizando a vítima.” (2021, p.10).
Nos anos de 1950 e 1960, momento
em que se desenvolve a t
série, não havia nenhuma lei que as
protegesse das violências sofridas
apenas pela condição de gênero, é
importante destacar estes dados, pois,
na época as leis brasileiras ainda
reproduziam a ideia de que o homem
era superior à mulher, permitindo
as violências acontecessem sem
nenhum tipo de punição.
Considerações finais
Ao analisarmos a narrativa
seriada brasileira
Coisa Mais Linda
(2019), suas personagens femininas e
as questões elencadas sobre as
formas de violência contra as
mulheres, torna-
se inegável a
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
por não se adequarem ao ideal de
feminino estipulado pela sociedade.
De acordo com a Rede de
Observatório da Segurança
-
instituição que tem como objetivo
monitorar e difundir informações sobre
segurança pública, violência e direitos
no passado
, casos de
mortes e agressões contra mulheres
eram tratados como legítima defesa da
honra, ou como consequência de forte
emoção, pela justiça e pela imprensa,
culpabilizando a vítima. (2021, p.10).
Nos anos de 1950 e 1960, momento
em que se desenvolve a t
rama da
rie, não havia nenhuma lei que as
protegesse das violências sofridas
apenas pela condição de gênero, é
importante destacar estes dados, pois,
na época as leis brasileiras ainda
reproduziam a ideia de que o homem
era superior à mulher, permitindo
que
as violências acontecessem sem
Ao analisarmos a narrativa
Coisa Mais Linda
(2019), suas personagens femininas e
as questões elencadas sobre as
formas de violência contra as
se inegável a
necessidade de um maior debate
acerca de tais assuntos, bem como um
aprofundamento da análise da série,.
Caberia ainda um estudo de
Mais Linda
(2019) no que se refere a
sua recepção para sabermos o quanto
a narrativa seriada poderia
ao intercalar nuances e cenas
explícitas de violência contra as
mulheres, a partir da aceitação da
sociedade e, em certos momentos,
das próprias mulheres, devido ao fato
de tais ações e comportamentos
estarem fixados no pensamento do
corpo social.
Alguns aspectos da condição
das mulheres no século XIX persistem
ainda na contemporaneidade. Um dos
desafios vivenciados pelas
personagens femininas de
Linda
(2019) é a questão da
desigualdade enfrentada na vida
profissional. Nessa perspectiva,
destacamos o que discutiu Virginia
Woolf em
Um teto todo seu
pela primeira vez em 1929, e no
ensaio “Profissões para mulheres”, de
1931, quando assevera que m
século XX a mulher escritora, por
exemplo, depende financeiramente de
um homem, seja ele o pai, seja ele o
marido; além do mais, Woolf nos
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periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
necessidade de um maior debate
acerca de tais assuntos, bem como um
aprofundamento da análise da série,.
Caberia ainda um estudo de
Coisa
(2019) no que se refere a
sua recepção para sabermos o quanto
a narrativa seriada poderia
nos afetar,
ao intercalar nuances e cenas
explícitas de violência contra as
mulheres, a partir da aceitação da
sociedade e, em certos momentos,
das próprias mulheres, devido ao fato
de tais ações e comportamentos
estarem fixados no pensamento do
Alguns aspectos da condição
das mulheres no século XIX persistem
ainda na contemporaneidade. Um dos
desafios vivenciados pelas
personagens femininas de
Coisa Mais
(2019) é a questão da
desigualdade enfrentada na vida
profissional. Nessa perspectiva,
destacamos o que discutiu Virginia
Um teto todo seu
, publicado
pela primeira vez em 1929, e no
ensaio Profissões para mulheres”, de
1931, quando assevera que m
esmo no
culo XX a mulher escritora, por
exemplo, depende financeiramente de
um homem, seja ele o pai, seja ele o
marido; além do mais, Woolf nos
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
apresenta a figura do “Anjo do Lar
símbolo de mulher perfeita, recatada,
prudente, prestativa, que deve se
morta para que a verdadeira mulher
resista. Dessa maneira, Malu, Lígia,
Adélia e Theresa, mesmo sendo
personagens ambientadas no ano de
1959, simbolizam a morte do anjo
doméstico e representam a superação
das dificuldades impostas às mulheres
quanto ao â
mbito profissional.
Outra perspectiva a ser
considerada é a da violência simbólica
que permeia toda a narrativa seriada e
todas as personagens femininas
analisadas se deparam com ela. Como
vimos, é o poder do homem
estruturado em uma sociedade
patriarcal,
como exposto por Saffioti
(1987), enleado à sutileza e à
“normalidade” dessa forma de
violência, discutida por Bourdieu
(2017) e por Martínez (2011), que
contribuem para a sua perpetuação,
inclusive até a hodiernidade.
Relembramos o que aborda Colling
(2019, p. 107):
A explosão dos conceitos como
igualdade e liberdade trazida pela
história das mulheres e das
relações de gênero e poder
permitiu uma releitura do
passado, uma prestação de
contas entre memória e história.
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
de F.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
Revista Latino
-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
apresenta a figura do Anjo do Lar”
-
mbolo de mulher perfeita, recatada,
prudente, prestativa, que deve se
r
morta para que a verdadeira mulher
resista. Dessa maneira, Malu, Lígia,
Adélia e Theresa, mesmo sendo
personagens ambientadas no ano de
1959, simbolizam a morte do anjo
doméstico e representam a superação
das dificuldades impostas às mulheres
mbito profissional.
Outra perspectiva a ser
considerada é a da violência simbólica
que permeia toda a narrativa seriada e
todas as personagens femininas
analisadas se deparam com ela. Como
vimos, é o poder do homem
estruturado em uma sociedade
como exposto por Saffioti
(1987), enleado à sutileza e à
normalidade dessa forma de
violência, discutida por Bourdieu
(2017) e por Martínez (2011), que
contribuem para a sua perpetuação,
inclusive até a hodiernidade.
Relembramos o que aborda Colling
A exploo dos conceitos como
igualdade e liberdade trazida pela
história das mulheres e das
relações de gênero e poder
permitiu uma releitura do
passado, uma prestação de
contas entre memória e história.
A noção de gênero obrigou a
repensar
a visão androntrica da
historiografia e apontou
possibilidades de novas
explicações da sociedade e da
história que exigiu a consideração
de todos os sujeitos implicados
nela.
Tendo em vista o excerto e a
disponibilização da série
Linda
(2019) na plataforma da
compreendemos a importância da
elaboração de personagens femininas
como Malu, Lígia, Adélia e Theresa,
para representarem por meio da fião
as mulheres em situações de
violência.
Nessa lógica, ainda ressaltamos
a importân
cia de se dialogar sobre a
violência sexual, física e o feminidio.
Na narrativa seriada, Augusto
representa a figura central de uma
família carioca de prestígio vivendo em
um ambiente patriarcal, que se vê no
direito de agir violentamente contra a
mulher
. As suas ações se
desenvolvem de maneira gradativa até
atingirem o ápice -
o assassinato de
sua ex-
companheira. A construção de
uma personagem masculina
respeitada no espaço social e
agressiva no ambiente familiar, capaz
até de matar, está ligada à
preser
vação da honra masculina.
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periodicos.uff.br/pragmatizes
- ISSN 2237-1508
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
")
A noção de gênero obrigou a
a visão androcêntrica da
historiografia e apontou
possibilidades de novas
explicações da sociedade e da
história que exigiu a consideração
de todos os sujeitos implicados
Tendo em vista o excerto e a
disponibilização da série
Coisa Mais
(2019) na plataforma da
Netflix,
compreendemos a importância da
elaboração de personagens femininas
como Malu, Lígia, Adélia e Theresa,
para representarem por meio da ficção
as mulheres em situações de
Nessa lógica, ainda ressaltamos
cia de se dialogar sobre a
violência sexual, física e o feminicídio.
Na narrativa seriada, Augusto
representa a figura central de uma
família carioca de prestígio vivendo em
um ambiente patriarcal, que se no
direito de agir violentamente contra a
. As suas ações se
desenvolvem de maneira gradativa até
o assassinato de
companheira. A construção de
uma personagem masculina
respeitada no espaço social e
agressiva no ambiente familiar, capaz
até de matar, está ligada à
vação da honra masculina.
SCHER, Crislaine A. de L.; DYLBAS, Paula Maria L.; FIUZA, Adriana A.
Representações da violência contra mulheres na narrativa seriada Coisa
mais linda (2019). PragMATIZES -
Revista Latino
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 24, p. 123-
1
Por fim, embora o objetivo do
artigo não tenha sido o estudo de
recepção da série, não podemos
deixar de inferir que a experiência com
as séries pode gerar debates,
questionamentos e até mesmo
identificação com o que se narra, fat
que possibilita
uma ampliação das
discussões que permeiam os grupos
feministas, atingindo outros estratos da
sociedade. Neste sentido, é possível
indagarmos se o seriado poderia
auxiliar a transformação de
mentalidade e de comportamento, já
que ao ver a série,
os espectadores
podem
controverter preconceitos
enraizados socialmente e despertar
seu interesse para questões relativas
às mulheres e aos feminismos, o que
nos leva a considerar a importância
das narrativas seriadas para a atual
sociedade brasileira.
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HIRATA, Helena
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-Americana de Estudos
1
48, mar. 2023. www.
periodicos.uff.br/pragmatizes
(Dossiê "
Violência contra as Mulheres nas narrativas midiáticas
Por fim, embora o objetivo do
artigo não tenha sido o estudo de
recepção da rie, não podemos
deixar de inferir que a experiência com
as ries pode gerar debates,
questionamentos e a mesmo
identificação com o que se narra, fat
o
uma ampliação das
discuses que permeiam os grupos
feministas, atingindo outros estratos da
sociedade. Neste sentido, é possível
indagarmos se o seriado poderia
auxiliar a transformação de
mentalidade e de comportamento,
os espectadores
controverter preconceitos
enraizados socialmente e despertar
seu interesse para questões relativas
às mulheres e aos feminismos, o que
nos leva a considerar a importância
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- ISSN 2237-1508
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