455
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
“A vida acontece no encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica
dos Encontros de Saberes
Elaine Monteiro
1
Daniel Bitter
2
Edilberto José de Macedo Fonseca
3
Andressa Fouraux Figueira
4
Gabriela da Silva Pimenta
5
Milena Leão Pereira
6
DOI: https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v13i25.57915
Resumo: O Encontro de Saberes é um amplo movimento presente em várias universidades, cujo
objetivo consiste em incluir saberes tradicionais de comunidades afro-brasileiras, indígenas,
quilombolas, urbanas, agro-extrativistas, etc., nestas instituições, através da participação de mestres
e mestras de tradições como docentes convidados. Seu propósito é tornar a universidade mais
diversa e inclusiva, multirracial, multilinguística e pluriespistêmica, por meio da reformulação de
currículos, pedagogias e protocolos administrativos. Neste artigo abordamos a experiência do
Encontro de Saberes realizada na UFF, a partir da oferta da disciplina Saberes Negros e Indígenas
oferecida em 2022, e exploramos aspectos da pedagogia dos encontros identificados por estudantes,
especialmente, a partir dos relatos que produziram em diários pessoais ao longo do curso, nos quais
1
Elaine Monteiro. Doutora em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Professora Associada do Departamento Sociedade, Educação e Conhecimento da Faculdade de
Educação da Universidade Federal Fluminense, Niterói, Brasil. E-mail: elainemonteiro@id.uff.br -
https://orcid.org/0000-0001-6122-3281
2
Daniel Bitter. Doutor em Antropologia pelo IFCS-UFRJ. Professor Associado do Departamento de
Antropologia da Universidade Federal Fluminense - UFF e do Programa de Pós-Graduação em
Cultura em Territorialidade PPCULT-UFF, Niterói, Brasil. E-mail: danielbitter@gmail.com -
https://orcid.org/0000-0003-2080-9926
3
Edilberto José de Macedo Fonseca. Professor Adjunto do curso de Produção Cultural da
Universidade Federal Fluminense em Rio das Ostras, Brasil. E-mail: edilbertofonseca@id.uff.br -
https://orcid.org/0000-0003-0947-4440
4
Andressa Fouraux Figueira. Graduanda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense E-
mail: andressafouraux@id.uff.br - https://orcid.org/0000-0001-9509-0018
5
Gabriela da Silva Pimenta. Graduanda em Antropologia pela Universidade Federal Fluminense
(UFF), Niterói, Brasil. E-mail: gabrielap@id.uff.br - https://orcid.org/0009-0001-8560-9020
6
Milena Leão Pereira. Graduanda em Antropologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF),
Niterói, Brasil. E-mail: mileao@id.uff.br - https://orcid.org/0009-0001-6164-1835
Recebido em 31/03/2023, aceito para publicação em 27/06/2023 e disponibilizado online em
01/09/2023.
456
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
registraram suas impressões e experiências. Procuramos mostrar o potencial disruptivo desta
pedagogia contra e anti-colonial e seu efeito transformador sobre as pessoas envolvidas.
Palavras-chaves: Encontro de Saberes; mestres de tradição, universidade, pedagogia dos
encontros.
“La vida pasa en el encuentro con el outro”. Diarios de la experiencia pedagógica de
Encuentros de Saberes
Resumen: El Encontro de Saberes es un amplio movimiento presente en varias universidades, cuyo
objetivo es incluir los saberes tradicionales de comunidades afrobrasileñas, indígenas, quilombolas,
urbanas, agroextractivistas, etc., en estas instituciones, a través de la participación de maestros y
maestras. de las tradiciones como docentes invitados. Su propósito es hacer la universidad más
diversa e incluyente, multirracial, multilingüe y multiepistémica, a través de la reformulación de
currículos, pedagogías y protocolos administrativos. En este artículo abordamos la experiencia del
Encontro de Saberes realizado en la UFF, a partir de la oferta del curso Saber Negro e Indígena
ofrecido en 2022, y exploramos aspectos de la pedagogía de los encuentros identificados por los
estudiantes, especialmente a partir de los relatos que estos produjeron en diarios personales a lo
largo del curso, en los que registraron sus impresiones y experiencias. Buscamos mostrar el potencial
disruptivo de esta pedagogía contra y anticolonial y su efecto transformador en las personas
involucradas.
Palabras claves: Encuentro de Saber; maestros de tradición, universidad, pedagogía de los
encuentros.
“Life happens in the encounter with the other.” Diaries of the pedagogical experience of
Meetings of Knowledge
Abstract: The Meeting of Knowledges is a broad movement present in several universities, whose
objective is to include traditional knowledge of Afro-Brazilian, indigenous, quilombola, urban, agro-
extractivist communities, etc., in these institutions, through the participation of people with
acknowledged higher knowledge (mestres e mestras da cultura popular) as guest lecturers. Its
purpose is to make the university more diverse and inclusive, multiracial, multilingual and multi-
epistemic, through the reformulation of curricula, pedagogies and administrative protocols. In this
article, we address the experience of the Meeting of Knowledges held at UFF, based on the offer of
the Black and Indigenous Knowledge course offered in 2022, and we explore aspects of the pedagogy
of the meetings identified by students, especially from the reports they produced in personal diaries
along the course, in which they recorded their impressions and experiences. We seek to show the
disruptive potential of this counter and anti-colonial pedagogy and its transforming effect on the people
involved.
Keywords: Meeting of Knowledge; tradition masters, university, pedagogy of encounters.
“A vida acontece no encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica
dos Encontros de Saberes
Apresentação
O Encontro de Saberes é acalanto, mas
pode ser também bastante desconfortável.
Um desconforto que nos bota diante dos
nossos preconceitos, diante do senso
comum, diante das nossas limitações em
relação às outras pessoas, diante da nossa
própria zona de conforto. É um desconforto
bom. Um desconforto que faz a gente se
457
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
mover na direção de sermos pessoas mais
íntegras, esclarecidas, empáticas.
(Gabriela da Silva Pimenta. Diário pessoal)
Na disciplina do Encontro dos Saberes
descobri que a vida acontece no encontro
com o outro. Como uma estudante do
curso de Antropologia, o contexto do
estudo de um dos principais insumos para
a prática do nosso trabalho é a “alteridade”,
mas acredito que foi de fato cursando essa
disciplina que pude entender do que se
trata de fato a “alteridade”. Digo isso pois
foi com os mestres, mestras, colegas e
professores que pude perceber a alteridade
saltar sobre os olhos no contexto da
academia, pois foi nessa conjuntura que,
aprender com os outros e ensinar, foi real
pra mim.
(Miriam Soares Dias. Diário pessoal)
O Encontro de Saberes é um
amplo movimento disseminado por
várias universidades brasileiras, cujo
objetivo consiste em incluir saberes
tradicionais de comunidades afro-
brasileiras, indígenas, quilombolas,
urbanas, agro-extrativistas, etc.,
nestas instituições, através da
participação de mestres e mestras de
tradições como docentes convidados.
Seu propósito é tornar a universidade
mais diversa, multirracial,
multilinguística e pluriespistêmica.
Tal como tem se estabelecido
em diversas universidades, o Encontro
de Saberes é, de certo modo, um
desdobramento da política de cotas
que instituiu, além da reserva de vagas
para estudantes de escolas públicas e
para estudantes em situação de
vulnerabilidade sócio-econômica (as
chamadas “cotas sociais”), a reserva
de vagas para negros, indígenas e
deficientes em universidades e em
institutos federais de educação. O
projeto propõe a inclusão epistêmica
dos saberes daquelas comunidades,
assim como de seus sujeitos, por
efeito de sua própria mobilização e
desejo de inclusão. Tal pedagogia
almeja colocar em diálogo distintas
epistemologias, de forma a assinalar
eventuais convergências,
divergências, contraditoriedades,
complementaridades, etc. (BITTER,
2022). A inclusão de sujeitos negros e
indígenas e seus saberes na
universidade significa a valorização de
conhecimentos baseados na oralidade,
na memória coletiva, na intuição, na
sensibilidade, na corporeidade, na
ancestralidade, na circularidade, na
espiritualidade, no afeto e em
cosmologias singulares. O Encontro de
Saberes é, portanto, um projeto de
intervenção antirracista, anti-colonial e
contra colonial nas universidades com
o propósito de renovar seus currículos,
seus modos de ensinar e de aprender.
458
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
Está respaldado por um
conjunto diversificado de normas
nacionais e internacionais que
regulamentam a Lei 12.343/2010, que
institui o Plano Nacional de Cultura
(PNC). Esse conjunto de normativas
visa a proteção e difusão dos saberes
tradicionais e da diversidade cultural e
está em plena consonância com as
leis 10.639/2003 e 11.645/2008, que
prescrevem o ensino das culturas
negras e indígenas na educação
básica.
Sua forma de atuação mais
importante é a oferta de disciplinas em
que mestres e mestras de
comunidades e coletivos tradicionais
atuam lado a lado com docentes
parceiros da instituição de ensino
superior. Foi iniciado na Universidade
de Brasília (UnB), a partir de 2010, sob
direção do Professor Jo Jorge de
Carvalho, no âmbito do Instituto
Nacional de Ciência e Tecnologia de
Inclusão no Ensino Superior e na
Pesquisa (INCTI/UnB), expandindo-se
gradualmente para outras instituições
brasileiras e estrangeiras.
Vale registrar ainda que o
desejo de mestras e mestres de terem
seus saberes transmitidos em
instituições de ensino, como escolas e
universidades, assim como as
conquistas desses direitos no âmbito
da legislação, refletem relações,
visões e valores da educação em
comunidades tradicionais. Visões
essas diferentes, diversas, carregadas
de valores ancestrais insistentemente
ignorados pela concepção
predominante de educação inculcada
em estudantes nos bancos de escolas
e universidades. A concepção de
educação “bancária” e de uma “história
única”, que ensina que a educação no
Brasil se deu a partir da chegada dos
jesuítas. Como se as populações
negras e indígenas não tivessem
conhecimentos acumulados e
processos educativos, o que contribuiu
sobremaneira para a perpetuação do
racismo e para o racismo epistêmico.
Ao contrário, a educação, os
processos de transmissão de saberes
e a escola foram e são valores
fundamentais para as comunidades
tradicionais e se constituíram em
bandeiras de luta por direitos na
sociedade. É Mestra Fatinha, dos
saberes negros jongueiros e
quilombolas, quem entra na conversa,
participa do Encontro, se apresenta, e
nos fala sobre a importância de estar
aqui:
459
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
Todos me conhecem como
Fatinha e é um prazer estar
retornando aqui
universidade] para falar da
nossa comunidade, falar do
movimento jongueiro, que é
um movimento de resistência.
O Jongo foi para os negros
atrás, na época da escravidão,
uma forma de luta, uma forma
de expressão, e é para nós,
até hoje, uma forma de luta,
uma forma de resistência.
Então, a gente estar em
espaços como esse, buscando
a nossa valorização,
colocando os nossos jovens
na universidade… Porque a
sociedade brasileira sempre
negou tudo para o nosso povo.
E nega até hoje. As coisas
para as comunidades
jongueiras são muito difíceis. A
gente mantém a tradição
mesmo porque é a nossa vida,
é a nossa história, é por amor,
porque é muita luta, muita
desigualdade mesmo. Estar
em um espaço como esse,
para nós, assim, é tudo! É uma
conquista porque é uma forma
da gente mostrar que nós
sempre existimos e que
precisamos ser valorizados
enquanto cidadãos brasileiros
que somos. Até hoje a gente
tem pouco reconhecimento.
Então, muito obrigada por
vocês estarem aqui! (Maria de
Fátima da Silveira Santos
Mestra Fatinha do Jongo de
Pinheiral-RJ)
Na UFF o Encontro de Saberes
começou a ser desenhado em 2016 a
partir da reunião de docentes que
tinham algum tipo de nculo com
comunidades tradicionais, tanto na
pesquisa quanto na extensão, e
estudantes de vários departamentos e
áreas de conhecimento, impulsionada
pela visita do professor José Jorge de
Carvalho. Em 2017 foram oferecidas
as primeiras disciplinas em caráter
experimental e, desde então, o projeto
de ensino, vinculado à Pró-Reitoria de
Graduação, tem atuado regularmente
em cursos de graduação, excetuando-
se o período da pandemia de Covid-
19.
Cerca de 250 estudantes
passaram pela experiência do
Encontro de Saberes em alguma das
disciplinas oferecidas pelo Projeto na
UFF. O que temos notado é que a
vivência dentro e fora da sala de aula
com mestres e mestras das tradições,
oriundos de comunidades negras,
indígenas, quilombolas, urbanas, entre
outras, tem promovido uma
transformação significativa em
subjetividades de estudantes e
docentes, desencadeando processos
de reconhecimentos identitários,
étnico-racias, de gênero, e
promovendo, ainda, mudanças
qualitativas em percepções de mundo
e tomada de consciência do estado
atual das práticas universitárias no
campo do ensino/aprendizagem.
460
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
Nessa direção, o Encontro de Saberes
é uma proposta sempre em
construção, que valoriza múltiplas
dimensões do ser humano, da
educação como prática da liberdade,
como nos ensinaram Paulo Freire
(1987) e bell hooks (2013), que
também participam desta conversa:
A educação como prática da
liberdade é um jeito de ensinar
que qualquer um pode
aprender. Esse processo de
aprendizado é mais fácil para
aqueles professores que
também creem que sua
vocação tem um aspecto
sagrado; que creem que nosso
trabalho não é o de
simplesmente partilhar
informação, mas sim o de
participar do crescimento
intelectual e espiritual de
nossos alunos. Ensinar de um
jeito que respeite e proteja as
almas de nossos alunos é
essencial para criar condições
necessárias para que o
aprendizado possa começar
do modo mais profundo e mais
íntimo. (HOOKS, 2013, p. 25)
Observamos, como quando
escutamos Mestra Fatinha, que os
mestres e mestras envolvidos no
Projeto também são impactados pela
experiência, sentindo-se reconhecidos
e valorizados no ambiente acadêmico
que historicamente os excluiu, assim
como aos seus saberes e aos seus
descendentes.
Nessa direção, o objetivo deste
artigo é apresentar alguns aspectos da
implementação deste Projeto na UFF,
de sua pedagogia, e refletir,
especialmente, a partir dos relatos de
impressões e experiências que
estudantes registraram em diários
pessoais elaborados como um produto
destinado à avaliação da disciplina.
Busca-se perceber em que condições
-se a troca de saberes e como essa
pedagogia dos encontros afeta as
subjetividades de seus participantes
em seus processos formativos
(HOOKS, 2013)
De saída, notamos que esse
artigo é uma produção coletiva,
envolvendo em sua escrita/elaboração,
docentes parceiros do Projeto e
estudantes monitores que participaram
da disciplina. Estão incluídos, ainda,
todes aqueles cujos enunciados
escritos ou falados podemos aqui ler e
escutar. Nosso objetivo foi produzir
uma narrativa a mais polifônica
possível, observando que a ideia de
autoria individual e de univocidade de
sentidos, tributárias da modernidade
ocidental, são estranhas ao nosso
propósito (GUMBRECHT, 1998).
Partimos, então, do pressuposto de
que este texto é uma tentativa de
461
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
estabelecer uma interlocução dialógica
interdiscursiva entre os diversos
agentes envolvidos (BAKHTIN, 2011).
Assim, procuramos o diálogo e a
escuta atenta de estudantes que
participaram da disciplina no segundo
semestre de 2022, para identificar
possíveis impactos do Encontro de
Saberes em sua formação inicial e/ou
continuada. No desafio de produção
de uma narrativa polifônica, então, não
“demos ou daremos ouvidos aos
estudantes”, mas também vamos
incorporar suas falas na construção
coletiva do texto.
O Encontro de saberes UFF
O Encontro de Saberes é um
Projeto de Ensino da Pró-Reitoria de
Graduação da UFF (Prograd/UFF) cujo
objetivo consiste em incluir saberes
tradicionais de comunidades afro-
brasileiras e indígenas, convidando
mestres das artes e ofícios como
docentes colaboradores, em atividades
de ensino e pesquisa, em parceria
com docentes da universidade. Se
inicia com a formação, em 2016, de
um grupo de estudos (GE) de
docentes e estudantes dos mais
diversos campi, institutos e
departamentos; entre os quais,
Antropologia, Educação, Produção
Cultural, Psicologia, Letras, Ciência
Ambiental, Artes e História. O grupo
começou a se reunir regularmente, a
partir de uma primeira visita do Prof.
José Jorge de Carvalho a esta
universidade, após a qual se seguiram
muitas outras. Este grupo elaborou
diversas ações integradas na
universidade produzindo articulações
junto ao Centro de Artes UFF e à Pro-
Reitoria de Graduação.
Esse processo culminou com a
parceria formalizada entre a
Prograd/UFF e o INCTI/UnB em 2018,
o que foi fundamental para concretizar
a oferta de disciplinas nos cursos de
graduação da UFF. O coletivo formado
por professores e estudantes, alguns
dos quais bolsistas, além de mestres e
mestras, mantém reuniões semanais
dedicadas a diversas atividades,
incluindo estudos, pesquisas,
avaliação, edição de material
audiovisual, planejamento dos cursos,
entre outras.
Em 2017 o GE propôs uma
primeira experiência do Encontro de
Saberes UFF, com a oferta de duas
disciplinas optativas vinculadas a
quatro departamentos, envolvendo
docentes de oito departamentos,
462
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
vários Institutos e seis mestres de
distintos territórios de existência. A
experiência foi considerada
amplamente exitosa e, assim, em 2018
e 2019, o GE ofereceu, no segundo
semestre, mais duas disciplinas para a
graduação: Encontro de Saberes:
Corpo e Espiritualidade e Encontro de
Saberes: Toques e Cantos das
Culturas Populares. Somente em
2022, após o período pandêmico, em
uma fase ainda de adaptação do
ensino remoto para o presencial, o
grupo voltou a oferecer a disciplina,
desta vez denominada Encontro de
Saberes: Formas de Expressão e
Saberes Negros, Indígenas. A maior
parte das reflexões elaboradas neste
artigo se referem mais estritamente à
experiência desta disciplina e, em
especial, aos procedimentos relativos
à sua avaliação. Desde o início,
portanto, o Encontro de Saberes se
desenvolve em estreita parceria com
mestres e mestras, com os quais, os
docentes participantes mantinham
uma longa relação estabelecida no
campo da pesquisa e das lutas
políticas
Sobre a oferta da disciplina na
UFF, duas estudantes de Ciências
Sociais nos falam de sua percepção
do projeto e de sua vivência:
A trajetória na disciplina foi um
ponto fora da curva dentre as
experiências acadêmicas que tive,
por principalmente me mostrar na
prática novas formas didáticas de
construir uma relação de
aprendizagem através de mestres
que muitas vezes são objeto de
estudo na universidade mas não
tem o protagonismo de transmitir
seus conhecimentos e estudos
através de si mesmos, ganhando o
devido reconhecimento, valor e
crédito por suas dedicações
também científicas. (Ciana Lopes
Godoy e Silva. Diário pessoal)
Por conta da formação de ciências
sociais ser muito focada em
autores europeus e
estadunidenses, sempre tentei
puxar matérias que fugissem disso.
Tive conhecimento da existência
do Encontro de Saberes através
de um professor de Antropologia.
(...) O professor passou o texto
"Encontro de Saberes e
Descolonização: para uma
refundação étnica, racial e
epistêmica das universidades
brasileiras", do José Jorge de
Carvalho, para discussão sobre as
relações entre colonialidade e
conhecimento acadêmico e as
possibilidades de articulação dos
saberes acadêmicos com outros
modos de conhecimento. Por conta
disso, sabia como a disciplina
funcionava e tinha expectativa
em cursá-la. No primeiro encontro,
algumas coisas me chamaram
atenção, como o entusiasmo dos
estudantes para as aulas, que os
fez até pegar matéria em uma
sexta-feira por livre e espontânea
vontade. E o interesse/expectativa
que os encontros fossem um
espaço amoroso e acolhedor, e as
463
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
conversas da importância de se ter
um ensino com essas
características. Durante as aulas
de Saberes dos Terreiros com o
Mestre Kotoquinho, apesar de ter
me empenhado para acompanhar,
a bagagem que eu tinha o foi
suficiente para me fazer
compreender as aulas da forma
que eu gostaria. Mas, ter uma aula
regada de música, tambor, dança,
espiritualidade e ancestralidade foi
mais significativo do que o pleno
entendimento das palavras do
mestre. O módulo indigena foi uma
dose de esperança de uma outra
forma de educar as crianças, com
atenção, afeto, respeito e materiais
lindos. Ademais, é urgente a
necessidade de debater questões
indígenas, de ter conhecimento
dos povos originários desta terra,
de sua diversidade e de sua
existência por todo esse país, em
aldeias ou em contexto urbano.
Para que se possa somar na luta
por território e outros direitos. E,
enquanto futuros professores
(como muitos da turma são de
licenciatura), poder ensinar de
forma decolonial e antirracista. E
formar uma geração que não
perpetue estigmas e violências. E
que tenha sabedoria, pois, como o
Professor Vanderlei disse “muito
conhecimento sem sabedoria não
adianta, e sabedoria é saber ouvir
o tempo”. (Ana Carolina Cario
Peixoto. Diário pessoal)
Ambas as estudantes fazem
considerações epistemológicas,
problematizando a relação que a
universidade estabelece com mestres
das culturas tradicionais como objetos
de estudo e o como sujeitos do
conhecimento, a colonialidade dos
saberes acadêmicos, as possibilidades
de formas diversas de ensino e
aprendizagem e a importância da
formação profissional decolonial e
antirracista. Os mestres e mestras de
tradições são detentores de saberes
vivos integrados aos seus territórios. A
transmissão desses conhecimentos
-se de forma variada envolvendo a
oralidade, o corpo, os gestos, a escuta
e tem, como suporte, a emoção, a
intuição e a sensibilidade. Nessa
direção a estudante Ciana Lopes
Godoy Silva expressa sua percepção
sobre a pedagogia dos mestres e
mestras,
Para mim, o que tem sido mais
marcante no curso com os mestres
que nos deram aula são os
infinitos formatos de
aprendizagem, que correspondem
de forma mais coerente com
expressões humanas de
linguagem como a festa, alegria,
prazer e música. Percebo que me
sentir afetada por essas
linguagens através de experiências
como dançar em roda, aprender e
cantar cantigas juntamente com os
colegas, sentar no chão, rir alto e
complementar discussões com
experiências de vida e memória
que remetem a temas
mencionados ali faz com que os
conceitos trazidos estejam para
além de uma memorização de
teoria. (Diário pessoal).
Esse ensinar e aprender que é
circular, em roda, horizontal, que
464
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
canta, dança e que é carregado de
experiências e de vida, como nos
lembra bell hooks, é a educação como
prática da liberdade. Pressupõe
aprendizados do corpo, da mente, do
espírito, emoção, afeto e abertura
também de docentes para correr
riscos, para se expor, expor suas
experiências, falar da vida e dos
limites de nosso conhecimento.
Os professores que esperam que
os alunos partilhem narrativas
confessionais mas não estão eles
mesmos dispostos a partilhar as
suas, exercem o poder de maneira
potencialmente coercitiva. [...]
Quando os professores levam
narrativas de sua própria
experiência para a discussão em
sala de aula, elimina-se a
possibilidade de atuarem como
inquisidores oniscientes e
silenciosos. É produtivo, muitas
vezes, que os professores sejam
os primeiros a correr o risco,
ligando narrativas confessionais às
discussões acadêmicas para
mostrar de que modo a experiência
pode iluminar e ampliar nossa
compreensão do material
acadêmico.(HOOKS, 2013, p.35)
A referência da autora é o
ensino superior, que não está, de
forma alguma, apartado da vida que
ressignifica o conhecimento
acadêmico em seus modos de ensinar
e de aprender. Quando se abre a porta
da sala de aula e se deixa sentimentos
e afetos entrarem na forma de
vivências e de experiências diversas
que dialogam com conhecimentos
acadêmicos, aponta hooks, docentes
sentem medo. Porque podem correr
riscos, porque podem perder o
controle da sala de aula, porque
podem ter conflitos. Do diálogo e das
relações estabelecidas em sala de
aula emergem sujeitos que têm
distintos pertencimentos de classe, de
raça e de gênero. Como ela mesma
afirma, se tivermos medo de errar, de
nos enganar, nunca transformaremos
a academia num lugar culturalmente
diverso, (HOOKS, 2013, p.49)
Além disso, a presença de
sujeitos diversos na universidade, as
possibilidades de diálogo, de escuta e
de produção de novos conhecimentos
exigem mudanças nem sempre aceitas
por boa parte dos docentes. Isso é
bastante evidente no caso da
crescente presença de estudantes
negres. A permanência de estudantes
no ensino superior não significa
apenas a fundamental inserção em
programas de assistência estudantil.
Permanência implica reconhecer que
estudantes negres, maioria desde o
ano de 2019 em universidades
públicas, estão a “sacudir” a
universidade em seu racismo
465
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
institucional, afirmando sua negritude e
fazendo emergir a branquitude em
majoritária parcela do corpo docente,
expressa em seus modos de ser, de
saber, de poder. Sua presença
confronta a colonialidade presente nos
modos de ensinar e de aprender no
espaço acadêmico.
A disciplina Encontro de Saberes:
Formas de Expressão e Saberes
Negros e Indígenas
Em 2022 retomamos as
atividades do Encontro de Saberes
após o período pandêmico. Propomos,
no segundo semestre, uma disciplina
não obrigatória/eletiva, oferecida pelo
Departamentos de Antropologia e
chamada “Encontro de Saberes:
Formas de Expressão e Saberes
Negros e Indígenas”. A disciplina de
caráter interdisciplinar, foi criada com
docentes em colaboração com
mestres/mestras, estudantes (bolsistas
e voluntários que colaboram com o
desenvolvimento do projeto) e
comunidades e coletivos
participantes.
Para o desenvolvimento da
proposta, é absolutamente necessário
que as fases de planejamento,
execução e, posteriormente, avaliação
da disciplina ocorram sempre em um
estreito e constante diálogo entre os
mestres, mestras e docentes
proponentes, tendo ainda participação
dos estudantes bolsistas e voluntários.
Nesse sentido, a proposta do Encontro
de Saberes guarda afinidade com
aquelas da chamada Pesquisa-Ação-
Participativa (FALS-BORDA, 2015;
FREIRE, 1987; CAMBRIA; FONSECA;
GUAZINA, 2015), todas as atividades
são concebidas em conjunto com os
integrantes, seja no que diz respeito
aos temas a abordar, aos
procedimentos de ensino e
aprendizagem a serem adotados,
como quanto às formas de avaliação,
recursos materiais necessários ou às
atividades externas que irão ser
implementadas. A disciplina requer
procedimentos e negociações
institucionais para a sua realização,
como a viabilização de transporte e
alimentação para mestras e mestres, e
hospedagem, quando necessário.
Para que cada encontro aconteça,
todo um trabalho que acontece no
período de planejamento e a cada dia
de aula.
Os mestres e mestras
participaram do planejamento da
disciplina com sugestões relativas ao
466
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
cronograma, número de aulas,
conteúdo, indicação dos aprendizes
para acompanhá-los e vários outros
aspectos. Nesta fase são planejadas,
também, as visitas de campo da turma
de modo a oferecer aos estudantes um
contato direto com os territórios de
tradição referenciados na disciplina.
A participação de estudantes
bolsistas de graduação no grupo de
estudo e de trabalho do Encontro de
Saberes é fundamental para o
desenvolvimento da disciplina. Em
geral, são estudantes que cursaram a
disciplina em períodos anteriores. Não
é incomum o fato da disciplina
provocar transformações na vida e na
formação desses estudantes, seja no
âmbito da espiritualidade, da
afirmação de suas identidades e do
compromisso militante com questões
de raça, de gênero, de classe, assim
como com questões ambientais. A
integração entre docentes e
estudantes e entre estudantes entre si
na elaboração e desenvolvimento da
proposta de cada semestre, na
realização de cada encontro e nos
processos avaliativos, se de forma
colaborativa e faz parte da formação
de todes, docentes e estudantes, não
sem tensões e sem conflitos, mas
sempre com muito aprendizado.
O segundo semestre de 2022
foi, após o período de distanciamento
social, o primeiro semestre totalmente
presencial na universidade. No
primeiro semestre daquele ano,
tínhamos retornado presencialmente à
universidade, mas ainda sem a
presença obrigatória dos estudantes e
com muita cautela. A pandemia afetou
toda a sociedade e,
consequentemente, as comunidades e
condições de vida e de saúde de
mestras e mestres que fazem parte de
nosso grupo, com quem trabalhamos
regularmente desde o início do projeto
na UFF. Comunidades indígenas,
caiçaras e quilombolas se mantiveram
“fechadas” por questões sanitárias,
evitando as visitas e a saída de
pessoas muito idosas por um longo
período. Campanhas, organização da
comunidade e participação em lives e
em pequenos editais para a realização
de projetos (Lei Aldir Blanc) garantiram
o enfrentamento de dificuldades
financeiras no período da pandemia.
Nesse contexto, para a oferta
da disciplina no semestre proposto,
procuramos privilegiar mestras e
mestres geograficamente mais
467
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
próximos da universidade e poupar
tanto as/os mais idosos quanto as/os
que vivem em locais mais distantes.
Além disso, temáticas debatidas no
grupo no período pandêmico e a
euforia do retorno aos encontros
presenciais entre docentes e
estudantes bolsistas, facilitaram a
escuta atenta de nós, docentes, para
demandas e proposições das/dos
estudantes.
Organizamos os conteúdos da
disciplina em três módulos distintos: o
primeiro abordou as manifestações da
oralidade e das expressões tmicas
presentes nos terreiros de matriz
afrodescendente, tendo como docente
Osvaldo José de Sena Filho,
conhecido como “Mestre Ogã
Kotoquinho”, acompanhado de Victor
Moraes de Oilveira, como seu
aprendiz. Nessa mesma linha, foram
ministradas aulas sobre os saberes
ligados aos Jongos e Quilombos, com
a Mestra Fatinha do Jongo de
Pinheiral/RJ (Maria de Fátima da
Silveira Santos), acompanhada de
suas duas irmãs, Maria das Graças e
Maria Amélia e de integrantes da
comunidade. Suellen Tavares,
liderança do Jongo do Morro da
Serrinha, em Madureira, município do
Rio de Janeiro/RJ, também participou
do encontro. O segundo módulo,
Saberes Indígenas, trouxe questões
relacionadas ao multiverso dos povos
originários por meio da presença da
liderança indígena e doutoranda em
Educação Marise Vieira, e da artista
visual e graduanda em Pedagogia
Lana Potiguara, além de Maria
Martinha Barbosa (Guajajara) e
Vanderlei da Silva (Guarani), ambos
docentes de uma das Escolas
Indígenas de Maricá-RJ. A professora
Mariana Paladino da Faculdade de
Educação da UFF foi a docente da
universidade parceira deste módulo.
o terceiro e último módulo,
“(Re)existências: culturas urbanas e
suas relações com saberes
tradicionais” foi resultado da escuta
atenta dos estudantes bolsistas e de
um dos possíveis desdobramentos do
Encontro de Saberes muito
debatido e acalentado. Nos limites da
organização da disciplina naquele
período, concretizamos a ideia de
trazer coletivos/grupos jovens urbanos
que representassem interesses,
identidades e lutas de estudantes e, ao
mesmo tempo, guardassem memórias
e formas de organização de
comunidades tradicionais. Foi assim
468
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
que conhecemos, por meio de um dos
estudantes bolsistas, Mestra Idra
Maria, da Casa de Mamba Negra, que
trouxe para o centro da experiência um
tipo de prática cultutral ainda pouco
vivenciada no projeto Encontro de
Saberes no Brasil: a cultura urbana,
jovem e transgênero com marcas de
formas de organização e de
resistência de comunidades
tradicionais. E são estudantes que nos
falam sobre essa nova frente aberta no
Encontro de Saberes, para que sobre
elas possamos refletir:
A aula do módulo
(Re)existência me apresentou
um universo que tinha
conhecimento de sua
existência, mas sabia pouco a
respeito. Foi fantástica a aula
sobre suas formas de
organização, resistência, arte
e cultura. Mostrando a criação
de uma comunidade e de uma
cena que aumenta as
perspectivas de vida dos que a
compõem, e constrói um
legado e uma ancestralidade.
(Ana Carolina Cario Peixoto,
Diário pessoal)
No último módulo
apresentado, Cultura urbana:
Vogue a mestra Idra Maria
demonstrou, junto às suas
filhas…, que a ancestralidade
pode ser composta de
diferentes formas. A mãe (e o
mais raro o pai), dentro da
cultura Ballroom são
concebidos pelo acolhimento e
admiração de seus filhos.
Diferente de outras definições
para ancestral, as implicações
cronológicas como idade não
são um fator determinante.
Nos exercícios propostos à
turma, ficou evidente
conhecimento perpassado
pelo corpo. um forte
letramento baseado na
oralidade em Vogue. Os tipos
ideais representados, assim
como a realização obrigatória
de determinadas coreografias,
nas disputas realizadas em
seus bailes, são claros
elementos rituais. (Juliana
Gomes Silva do Nascimento.
Diário pessoal)
Não posso, e nem quero,
deixar de falar do nosso último
módulo: (Re)existências, com
Idra Maria. Fiquei muito feliz
de ver a universidade abrindo
as portas não apenas para
saberes tradicionais, mas para
saberes contemporâneos,
urbanos, marginalizados, que
resistem com a cultura
Ballroom. O que o Encontro de
Saberes está fazendo na
esfera educacional é lindo de
ver. Convidar quem está à
margem da sociedade e nunca
foi visto como prioridade para
ocupar esses espaços e dar
aula, é gigante. Eu nunca
escutei alguém falar sobre
uma aula com pessoas
LGBTQIA+ da cena Ballroom,
acredito, inclusive, que nunca
antes foi considerado fazer
esse convite. A aula é
simplesmente de uma força
imensurável. Saí esse dia
pensando em tantas coisas,
como existir e resistir em um
sistema que quer te matar. E
como não falar disso tudo na
universidade? Precisamos
falar! (Manuela Grandi
Carregal. Diário pessoal)
469
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
No encontro em que
realizamos em função do
terceiro e último módulo: “(Re)
existências: Culturas Urbanas
e suas relações com Saberes
Tradicionais” talvez tenha sido
o encontro no qual eu mais me
encontrei, sendo guiada pela
Mestra Idra Maria e suas
filhas, tivemos uma pequena
amostra do universo Ballroom
e da dança Vogue em que
pudemos compreender que
estar na cena do Ballroom
significa um jeito de existir no
mundo que se manifesta
através da arte, que essa
cultura está presente e surgiu
no meio LGBTQIA+ como uma
forma de
resistência/sobrevivência das
pessoas e também como uma
forma de explorar identidades
oprimidas. (Miriam Soares
Dias. Diário pessoal)
Todos os encontros foram
muito marcantes para mim,
mas esse último foi de fato o
mais marcante de todos.
Primeiro que eu nunca
imaginei estudar dentro de
uma sala de aula da faculdade
a cultura LGBTQIAP+,
principalmente o Ballroom,
poder dizer para outras
pessoas que tive uma aula
ministrada por 3 mulheres
trans, foi algo que me deixou
tão feliz, saí contando para
todes à minha volta. A cultura
urbana marginalizada se
mostrou com um grande
cenário antropológico, ouvindo
sobre os termos dados pela
comunidade, o sistema que ali
existe, inclusive de
parentesco, pensava
“porque não vimos isso antes
em algum texto etnográfico”?
Novamente, uma cultura
urbana marginalizada, tanto na
sociedade como dentro da
Academia, mas depois dessa
aula me deu uma esperança
de ver esse cenário se
revertendo, de poder ver um
calouro lendo um texto
etnográfico sobre a cultura
Ballroom, a ressignificação dos
sistemas de parentesco
quando esses corpos são
excluídos dos seus próprios
núcleos familiares. Poder
ampliar o olhar antropológico
sobre grupos que ali existem,
que possuem uma imensidão
cultural, histórica e social
construídas sobre um contexto
particular, mas que ao mesmo
tempo são ressignificadas a
todo momento. (Nayra de
Oliveira Martins. Diário
pessoal)
As aulas ocorreram uma vez por
semana em sessões de quatro horas
ao longo de dezesseis semanas e não
as chamamos de aulas, mas de
“encontros”. Após a realização de cada
um desses módulos, foram feitas
rodas de conversa com os/as
estudantes com intuito de avaliar o
percurso de cada módulo. A disciplina
recebeu cerca de 60 inscrições de
estudantes, das mais diversas áreas
das Humanidades, tais como Artes,
Educação, Antropologia, Cinema,
Psicologia, Produção Cultural,
Ciências Sociais, Letras, entre outras.
São majoritariamente jovens entre 20
470
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
e 25 anos, muitos dos quais
ingressantes na universidade através
de cotas sócio-econômicas e étnico-
raciais.
Por fim, é importante assinalar
que mestres e aprendizes envolvidos
na disciplina são remunerados em
reconhecimento ao seu trabalho e em
concordância com princípios básicos
do Encontro de Saberes. Viabilizar a
remuneração dos mestres e mestras é
um dos entraves maiores do
desenvolvimento do projeto que
demanda reformular, também,
protocolos administrativos para o
reconhecimento de mestres e mestras
de comunidades tradicionais como
docentes.
Processos avaliativos e
transformações subjetivas
Em termos metodológicos, a
avaliação da disciplina se constituiu
em um dos maiores desafios do
Encontro de Saberes para o nosso
grupo de trabalho. Negociamos e
adotamos diversas ações com os
estudantes durante os semestres em
que a disciplina foi oferecida. Em
2022, obtivemos um retorno de grande
significância para o aprimoramento do
processo de avaliação. Inspirados nas
ideias de bell hooks (2013),
propusemos aos estudantes que
escrevessem diários pessoais com
observações sobre os encontros com
os mestres e mestras. Ao final do
semestre, estudantes apresentaram,
por escrito, uma síntese das
anotações realizadas ao longo da
disciplina e, no mesmo texto, uma
autoavaliação a partir das reflexões
anotadas. Cerca de 38 relatos
indicaram a escrita sistemática dos
diários. Eles foram reunidos na forma
de um caderno de avaliações da
disciplina e é a partir dele que a maior
parte dos discursos mobilizados neste
artigo, provém.
A dificuldade com relação à
avaliação talvez seja um dos principais
exemplos da encruzilhada do Encontro
de Saberes. Encruzilhada (MARTINS,
2021) compreendida como “cruzo”
(SIMAS, 2018). Encruzilhada que não
exclui, não mata saberes, mas que
permite que saberes coexistam,
dialoguem e se completem. Como
aprendemos com um dos mestres do
Encontro de Saberes ao abordar a
história única contada na região
conhecida como o Vale do Café no
estado do Rio de Janeiro, “nós não
queremos tirar a foto do barão da
471
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
parede, queremos apenas colocar a
nossa foto ao lado da dele”.
Em uma instituição marcada por
princípios pedagógicos e por currículos
eurocêntricos, promover encontros de
saberes diversos, deixar afetos e
emoções entrarem na sala de aula e,
ao mesmo tempo, dialogar com textos,
autores e saberes acadêmicos,
cumprir orientações e regras
institucionais que garantam a
legitimidade e a possibilidade da
disciplina na universidade muitas
vezes são ações que colocam as
pessoas que estão à frente do projeto
em situações limítrofes, de fronteira.
Desenvolver um projeto como o
Encontro de Saberes, criar uma
disciplina com mestras e mestres dos
saberes tradicionais e cumprir, por
exemplo, o que está previsto para a
avaliação no regulamento dos cursos
de graduação, que é a realização de
pelo menos duas avaliações no
semestre nos coloca na fronteira entre
dimensões muito diversas de ensino e
de aprendizagem e do que seria a
avaliação nesse processo. Nos
perguntamos muitas vezes que tipo de
avaliação caberia em uma disciplina
como o Encontro de Saberes.
Apostamos na livre escolha e
expressão de estudantes, com o
incentivo de que produzissem
individualmente, em duplas ou em
grupos (a proposta variou nos
semestres) um trabalho que
expressasse os aprendizados e/ou o
significado do Encontro de Saberes.
Junto com este trabalho, no último
encontro, solicitamos um texto livre
para acatarmos a regulamentação das
duas avaliações. Recebemos poemas,
músicas, performances, filmes, objetos
confeccionados por estudantes,
relatos, trabalhos em formato
acadêmico, entre outros.
Agora, em 2022, encontramos
em proposições de bell hooks a escrita
dos diários. A autora propõe o diário
como uma das possibilidades de
transformar a sala de aula em uma
comunidade, como possibilidade de
expressão, de ouvir a voz de cada
estudante individualmente e de
todas/os. A concepção da sala de aula
como comunidade se relaciona
também com o papel do/a professor/a.
O desapego do controle da segurança
e a abertura para a sala de aula como
comunidade é essencial para a
pedagogia transformadora, para a
produção de conhecimento e para o
pensamento crítico:
472
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
Trabalhando com uma
pedagogia crítica baseada em
minha compreensão dos
ensinamentos de Freire, entro
na sala partindo do princípio
de que temos de construir uma
“comunidade” para criar um
clima de abertura e rigor
intelectual. Em vez de enfocar
a questão da segurança,
penso que o sentimento de
comunidade cria a sensação
de um compromisso partilhado
e de um bem comum que nos
une. Idealmente, o que todos
partilhamos é o desejo de
aprender - de receber
ativamente um conhecimento
que intensifique nosso
desenvolvimento intelectual e
nossa capacidade de viver
mais plenamente no mundo.
Segundo minha experiência,
um dos jeitos de construir a
comunidade na sala de aula é
reconhecer o valor de cada
voz individual. Cada aluno das
minhas turmas tem um diário.
Muitas vezes, eles escrevem
parágrafos durante a aula e os
leem uns aos outros. (...) Ouvir
um ao outro (o som de vozes
diferentes), escutar um ao
outro, é um exercício de
reconhecimento. Também
garante que nenhum aluno
permaneça invisível na sala. (
HOOKS, 2013, p. 58)
Encontramos na concepção da
sala de aula como comunidade, uma
referência que se coaduna com as
disciplinas do Encontro de Saberes na
universidade e, na escrita dos diários,
uma das possibilidades de criação da
comunidade em sala de aula. De
saída, notamos que, embora tenham
sido apresentados de forma escrita,
entendemos que as narrativas m um
caráter constitutivamente oral, uma
vez que foram produzidas a partir de
modelos literários deliberadamente
não acadêmicos e mais livres. Esses
relatos são registros escritos de
vivências, experiências, reflexões,
impressões, sentimentos e emoções,
muitos dos quais foram verbalizados
durante as aulas. Ao longo do curso
mantivemos constantes diálogos com
os estudantes, a partir dos quais
puderam expressar sua percepção.
Nessa direção a fala da estudante Ana
Carolina Cario Peixoto é significativa e
nos deu a sensação de que
caminhamos no sentido de criação de
uma comunidade em sala de aula:
Durante a graduação
alguns modelos de trabalho
que são mais frequentemente
cobrados e que permitem
pouca ou nenhuma
criatividade, mas é sempre
interessante assistir as
apresentações dos outros
alunos e reparar a forma de
apresentar, de organizar as
ideias, quais pontos do texto
achou importante ressaltar etc.
O encontro de apresentação
dos trabalhos posso dizer que
foi uma das minhas aulas
preferidas. Ver Poemas,
artesanatos, colagens, relato
falado, pinturas e tantos outros
tipos de trabalhos dentro de
473
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
uma universidade sendo feito
com tanta criatividade foi
possivelmente uma das
minhas aulas favoritas. Foi
como uma chuva de
possibilidade de absorção e
elaboração de aulas de forma
“não acadêmica. (Diário
pessoal)
Como foi assinalado, a
disciplina realizou-se num período
ainda de transição do ensino remoto,
adotado durante a pandemia de Covid-
19, para o regime presencial, em que
muitas adaptações estavam em curso.
Esse dado é altamente relevante para
as narrativas que apresentamos neste
texto. A experiência do período
transitório com toda sua liminaridade
implicada foi sentida de forma crítica
por muitos estudantes e docentes. A
estudante Daiara da Conceição
Genuino Pereira relata em seu diário
que se inscreveu na disciplina atraída
pelo nome, sem dispor de maiores
informações naquele momento. Ela
nota que,
No entanto, ter vindo quase
que às cegas para a disciplina
foi o que a fez se tornar ainda
mais significativa para mim.
Entrei no mundo acadêmico
com expectativas, afinal, era
um mundo novo. Após três
longos e dolorosos períodos,
fui de encontro ao Encontro e
recebi o abraço que precisava
para me reconectar comigo e
voltar a sentir sede por trilhar
os meus caminhos (Diário
pessoal).
Esse ano foi extremamente
intenso, saímos de um
confinamento torturante,
voltamos com as aulas
presenciais e parecia tudo
muito novo e diferente do
que a havia vivido durante
minha graduação, apesar de
estar próxima a me formar,
me senti iniciando o curso e
tenho convicção de que
essa disciplina tem um
grande peso para essa
sensação. Além de voltarmos
ao presencial, tivemos
eleições, cortes orçamentários
que afetaram imensamente a
vida acadêmica, tudo junto de
milhares de questões
pessoais que passei nesse
segundo semestre do ano.
Estar nessa disciplina foi
muito importante para que
eu desse conta de lidar
com todo esse turbilhão!
(Bianca Monteiro Alves. Diário
pessoal)
Através deste relato, tomamos
conhecimento do sofrimento pelo qual
as estudantes Daiara e Bianca
passaram ao longo do período remoto
de ensino, assim como da importância
do retorno presencial do ensino e do
contato com os mestres e mestras do
Encontro de Saberes. Notamos que as
estudantes referem-se, também, ao
sofrimento mais geral experimentado
com relação aos processos
pedagógicos e acadêmicos
474
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
implementados rotineiramente pelas
universidades canonizadas pelo
processo colonial. Trata-se
tradicionalmente de um ensino muitas
vezes marcado pela hierarquia,
meritocracia, hipertrofia da escrita,
monoepistemologia, racionalidade
cartesiana, etc. Tal pedagogia, - ou
talvez possa-se dizer, anti-pedagogia -
, tem produzido grande sofrimento
psíquico com seu caráter produtivista,
competitivo e com seu foco
exacerbado no acúmulo de
conhecimentos, na exigência de
conformação a modelos canônicos de
escrita, além de frequentemente inibir
a expressão de sentimentos interiores
em favor de uma objetividade e
neutralidade (CARVALHO; FLÓREZ
2014).
Desse ponto de vista, o relato
de Gabriel Teixeira de Oliveira Dantas
é significativo,
Quando a pandemia começou,
eu me senti na obrigação de
chafurdar em livros e teorias
complexas. Eu dizia para mim
mesmo que não ia me formar
parecendo que eu achei meu
diploma no lixo. O valor para
mim tinha a ver (e ainda tem
bastante a ver), com ter,
possuir o conhecimento que é
valorizado dentro da
academia. Eram amarras das
quais eu vinha tentando me
liberar desde o período
passado, mas que estava
sendo pouco possível pois
aquilo ainda ocupava um
espaço central na minha ideia
de formação, a qual, diga-se
de passagem, ocupava a
maior parte dos meus
pensamentos. Adoeci (Diário
pessoal).
O relato de outra estudante
sinaliza o potencial disruptivo do
Encontro de Saberes para uma
educação descolonial. Isadora
Mendonça de Araújo escreve que “O
Encontro de Saberes não é uma
desconstrução necessária de toda
fórmula acadêmica que molda os
espaços universitários. É também a
desconstrução necessária da nossa
noção de mundo e realidade (Diário
pessoal)”. Interessante é, também, a
observação que a estudante elabora
sobre uma experiência pessoal que
entende ser compartilhada por outros
estudantes dentro da sala de aula.
Assim, Isadora nota que “vi muitos
alunos serem atingidos em seu íntimo
nas aulas. A identificação com os
módulos foi importante para que os
alunos pudessem ter contato em uma
sala de aula, por exemplo, com a sua
espiritualidade e ascendência (Diário
pessoal)”. A estudante chama a
atenção para o impacto que o
475
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
Encontro de Saberes provoca nas
pessoas, promovendo transformações
significativas em suas subjetividades,
reconhecimentos e descobertas. Ao se
referir às aulas do mestre Kotoquinho,
Nayra de Oliveira Martins relata em
seu diário que,
Ao falar sobre os saberes
tradicionais do terreiro senti
uma enorme potência na sua
fala, uma força tamanha que
fez com que eu repensasse
muitas questões e conceitos
na minha vida. Comecei a
observar isso nos meus
amigos também, na influência
simbólica dos orixás, como na
filosofia do terreiro no nosso
dia a dia (Diário pessoal).
A dimensão de autoconhecimento,
liberdade criativa e até mesmo
terapêutica, frequentemente são
externalizadas pelos estudantes.
Assim Samara Gonçalves Duarte fala
que,
Ser uma mulher preta na
sociedade é difícil, o que
talvez não seja novidade para
ninguém, mas quando se
cresce em um ambiente
predominantemente de
convivências de pessoas
brancas é uma luta um pouco
mais densa. Eu entendo hoje
que na minha vida, até aquele
momento do encontro, eu não
tinha nenhuma representação
de mulheres pretas (exceto
meus familiares) na minha
vida, e ainda mais mulheres
pretas que levavam adiante a
cultura do nosso povo. Eu
precisei crescer sufocando
muito de minhas vontades. -
“adore a esse Deus”, - “não
vista essas roupas”, - “não fale
desse modo”, foram coisas
que escutei enquanto crescia.
Até o ponto que eu precisava
fazê-los se sentirem
confortáveis com a minha
presença. Sinceramente eu
não sei nem ao certo o
número de vezes que
precisei concordar que o
ensino de religiões de
matrizes africanas seria de
certa forma doutrinador”.
Então quando eu chego ao
Encontro de Saberes e tenho o
encontro, a apresentação e
valorização de tudo aquilo que
[por] muito tempo em minha
vida foi proibido (por viver em
um ambiente extremamente
católico) é atordoante. É a
única palavra que consigo
descrever (Diário pessoal).
Um pouco mais adiante em seu diário,
a estudante narra de forma
contundente e emocionada,
Foi incrível poder chegar
novamente e ver aquela sala
cheia de sedentas por
conhecimentos de uma cultura
que por muito tempo foi e, em
certos lugares, ainda é
marginalizada e vítima de
preconceito. A minha cultura, a
cultura dos meus
antepassados, acho que foi
a primeira vez que senti
tanto orgulho da minha
origem, pois ali era um
lugar onde eu não receberia
olhares mal encarados nem
cochichos pelos cantos. A
minha cultura ali era exaltada
e nada poderia me fazer mais
feliz. A semana após o quarto
476
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
encontro foi uma semana
diferente, eu estava
completamente fascinada, eu
escutava músicas sobre
vídeos sobre a história e
qualquer mínimo resquício de
dança, minha mente
automaticamente me levava a
pensar novamente no Jongo.
O quarto encontro foi onde eu
fui tomando mais afinidade
com a cultura afro. Eu não a
chamava mais de cultura
deles. Ela havia se tornado ou,
bem dizendo, eu havia a
reconhecido como a minha
cultura, a cultura que corria por
minhas veias, que brilhava
sobre minha pele e acelerava
meu coração. A minha cultura
(Diário pessoal).
Entre os vários relatos que
ouvimos e recebemos dos estudantes,
através de suas falas e dos diários,
destaca-se de forma reiterada o modo
como o corpo participa ativamente do
aprendizado num processo em que os
sentidos são protagonistas da
experiência. Nayra de Oliveira Martins
nota que,
A partir do momento em que
ensinaram os passos de dança
do Jongo, fechei meus olhos e
deixei que o ritmo do tambor
conduzisse meu corpo, e vivi
um breve momento de
plenitude naquele momento,
mas que até hoje ressoa na
minha memória (Diário
pessoal).
A estudante Daiara da Conceição
Genuino Pereira, por sua vez, comenta
que,
Dessa forma, volto a afirmação
do saber estar no sentir.
Acredito que para saber algo,
é necessário viver esse algo.
Não basta o domínio da teoria.
Entendi que quando você sabe
de uma coisa, o seu corpo
automaticamente responde a
esse estímulo, ou seja, quando
se começa a fazer uma
determinada atividade, o corpo
responde quase que de forma
natural, o saber é intrínseco.
Quando o corpo responde por
ele mesmo, é exatamente
nesse momento que mora o
saber. (Diário pessoal)
Interessante também a forma
com que Gabriela da Silva Pimenta
destaca a afetividade e o cuidado dos
encontros e o modo como essa ética
facilita o aprendizado reduzindo
sentimentos de vergonha e timidez
que poderiam bloquear a experiência
corporal. Assim ela relata:
E essas vivências também
levam o aprendizado para o
corpo. Através da dança, seja
nos movimentos de cada orixá,
seja sambando, seja
sensualizando no ballroom,
todas as estruturas do
convencional, do formal, do
lugar que performamos dentro
da academia são remexidos
(Diário pessoal).
Perceber que o conhecimento
do dia a dia, o conhecimento
da vida, é tão poderoso e
477
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
importante quanto os livros
que nos são passados ao
longo da extensa bibliografia
dos cursos feitos por nós,
estudantes, acendeu uma luz
na minha mente e me fez
voltar a enxergar possíveis
formas de conectar e de
aprender. A aprendizagem não
está na leitura e na escrita.
Não quero dizer que ela não
está nessas coisas, pois está
sim, mas quero dizer que além
desses lugares, a
aprendizagem também está
nas trocas de olhares, no
toque, na diálogo, no contar
histórias e causos. (Daiara Da
Conceição Genuino Pereira.
Diário pessoal)
Durante o processo, a disciplina
teve um impacto significativo não
apenas nos estudantes inscritos, mas
também em toda a equipe de
professores e monitores que atuaram
como agentes produtores e se
permitiram ser afetados e
completamente envolvidos com o
projeto. Assim, a monitora Milena Leão
relata sua vivência:
Participar como monitora de
audiovisual na disciplina
Encontro dos Saberes foi uma
experiência transformadora
para mim como mulher,
fotógrafa, estudante, monitora,
antropóloga e pesquisadora.
Foi significativo exercer a
fotografia dentro de uma
proposta que uniu educação,
ancestralidade e a reconhecer
cada vez mais a minha
ascendência indígena. Fazer
parte da nossa história sendo
contada do nosso ponto de
vista e ocupar espaços
políticos que antes nos eram
vedados é crucial para
reconhecer a importância da
diversidade e construir um
ambiente mais respeitoso, em
que as diferenças sejam
valorizadas e celebradas.
Acredito que essa valorização
das diferenças é fundamental
para a construção de uma
sociedade mais justa e
igualitária. A disciplina
Encontro dos Saberes me
emocionou profundamente,
mostrando como a união entre
educação, ancestralidade e
decolonialismo pode ser uma
ferramenta poderosa na
construção educacional do
nosso povo, me dando a
esperança de que é possível
construir um futuro mais
equitativo e imparcial.
Ademais, a disciplina ensejou
um diálogo direto com minha
pesquisa acerca da
antropologia da sobrevivência
indígena em trabalhos
artísticos, a exemplo do impar
trabalho de Claudia Andujar
em A Luta Yanomami,
instigando-me a reflexionar
sobre a imprescindibilidade do
diálogo transdisciplinar e da
construção de um
conhecimento abarcador das
múltiplas perspectivas e
saberes. Acredito que por
meio dessa abordagem,
podemos cooperar na
edificação de uma sociedade
mais justa e impar, que
demonstre respeito e apreço
pelas diversas expressões
culturais presentes em nosso
país. Em resumo, a minha
participação como monitora de
audiovisual na disciplina
Encontro dos Saberes e a
prática da fotografia nesse
478
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
âmbito foram cruciais para o
meu crescimento pessoal e
profissional. Muitas vezes, não
percebo o quão
embranquecido é o nosso
sistema como um todo,
especialmente quando a
minha ancestralidade é de
alguma forma apagada.
Mesmo quando estou em uma
graduação que tem como viés
a compreensão da sociedade,
ainda assim não consigo
perceber a real dimensão da
necessidade de decolonizar.
Foi somente quando vivenciei
a disciplina Encontro dos
Saberes que isso ficou
claramente evidente para mim.
Embora saibamos que a base
teórica vem da Europa, que é
proveniente do colonizador,
somente quando passamos
pela disciplina é que pudemos
experimentar uma dinâmica
oposta, que valoriza a
diversidade cultural e a
pluralidade de perspectivas. É
preciso descolonizar para
construir um conhecimento
mais plural, que leve em
consideração a diversidade de
saberes e experiências
presentes em nosso país e no
mundo. Somente assim
poderemos avançar rumo a
uma sociedade mais justa e
igualitária, em que todos os
povos e culturas sejam
valorizados e respeitados
(comunicação oral).
Considerações finais
Apresentamos neste artigo a
experiência do Encontro de Saberes
na Universidade Federal Fluminense,
com ênfase na escuta atenta de
estudantes que participaram da
disciplina no segundo semestre de
2022. Buscamos ainda a sua
participação ativa na construção deste
texto, por meio do compartilhamento
das sínteses de seus diários,
organizadas por nós em um Caderno
de avaliações.
O Encontro de Saberes, por seu
histórico e por sua inserção nas
universidades, conta, pode-se dizer,
com ampla produção bibliográfica que
valoriza, apresenta e problematiza
diferentes aspectos e sujeitos
envolvidos em sua realização. Neste
artigo, a partir da experiência na UFF,
procuramos trazer reflexões sobre o
impacto do Encontro de Saberes em
estudantes, em especial de
graduação, e contribuir para a
construção do que talvez possamos
chamar de uma “pedagogia dos
encontros”.
Colocamos em diálogo a nossa
experiência na disciplina e a
contribuição que educadores como bell
hooks e Paulo Freire nos trazem sobre
a produção de conhecimentos sobre
nossas práticas, na perspectiva de
uma pedagogia crítica, transformadora
e da educação como prática da
liberdade. Como também apontamos,
a produção acadêmica no campo da
479
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
Educação Popular tem contribuído
para nossas ações e reflexões sobre a
metodologia do Encontro de Saberes.
Especificamente, ao
partilharmos nossas reflexões sobre os
processos de avaliação, esperamos ter
contribuído com a experiência dos
diários e com a concepção da sala de
aula como comunidade. A abertura e a
atitude de docentes em sala de aula,
com portas abertas para a diferença,
sentimentos, emoções e para
afirmação de identidades, nem sempre
tranquila e segura, não sem conflitos,
mas com vida, também, se apresentou
como uma necessidade para o
desenvolvimento da disciplina
Encontro de Saberes.
Nossa opção por trazer para
este artigo as impressões de
estudantes e pensar em propostas que
contribuam para o desenvolvimento da
metodologia de uma pedagogia dos
encontros, expressa o nosso
reconhecimento do papel
desempenhado pelo Encontro de
Saberes na formação profissional na
universidade. Nossa esperança é que
docentes formados por universidades
públicas que tenham passado pela
experiência do Encontro de Saberes
levem seus aprendizados e vivências
para sua prática profissional. Da
mesma forma, esse é um passo
necessário para os demais
profissionais que se formam na
universidade.
A amplificação e a ampliação do
Encontro de Saberes nas
universidades e nas escolas, atingindo
diretamente a educação
institucionalizada em nosso país,
poderá contribuir para o enfrentamento
do racismo, do machismo e da
heteronormatividade que marcam as
políticas que estruturam a sociedade
capitalista, patriarcal imperialista e
supremacista branca, como afirma bell
hooks. Então, poderemos provocar
transformações o necessárias em
todas as esferas da vida social. Como
ensinou Paulo Freire, a educação não
muda o mundo; ela transforma as
pessoas e as pessoas mudam o
mundo. O Encontro de Saberes em
universidades e em escolas é, por fim,
necessário para transformar as
pessoas e para mudar o mundo!
Referências
ABREU, Martha Campos e
MONTEIRO, Elaine. Patrimônio
Imaterial e Afirmação Negra: caminhos
e encontros para uma educação
480
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
antirracista. Cadernos Naui, v. 9, n. 17,
jul-dez. 2020.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação
verbal. São Paulo: WMF Martins
Fontes, 2011.
BENTO, Maria Aparecida Silva. A.;
CARONE, Iray (orgs.). Psicologia
Social do Racismo. São Paulo: Vozes,
2002.
BITTER, Daniel. Encontro de Saberes.
A inclusão de mestres da cultura
popular e seus saberes no ensino
superior. Revista Páginas, año 14, n.
34, enero-abril, 2022.
CAMBRIA, Vincenzo; FONSECA,
Edilberto; GUAZINA, Laize. "With the
People": Reflections on Collaboration
and Participatory Research
Perspectives in Brazilian
Ethnomusicology. The World of Music
(new series), University of Göttigen,
German, v. 4, n. 2, 2015.
CARDOSO, Lourenço. O branco
“invisível”: um estudo sobre a
emergência da branquitude nas
pesquisas sobre as relações raciais no
Brasil (Período: 1957-2007).
Dissertação [Mestrado]. Faculdade de
Economia e Centro de Estudos Sociais
da Universidade de Coimbra, 2008.
CARVALHO, José Jorge de. A política
de cotas no ensino superior. Ensaio
descritivo e analítico do Mapa das
Ações Afirmativas no Brasil. Brasília:
Instituto de Inclusão no Ensino
Superior e na Pesquisa, CNPQ,
Universidade de Brasília, MEC. 2016.
CARVALHO, José Jorge de. Encontro
de Saberes e descolonização: para
uma refundação étnica, racial e
epistêmica das universidades
brasileiras. In: BERNARDINO-COSTA,
Joaze; MALDONADO-TORRES,
Nelson; GROSFOGUEL, Ramón
(orgs.). Decolonialidade e pensamento
afrodiaspórico. Belo Horizonte:
Autêntica, 2019.
CARVALHO, José Jorge de. O
confinamento racial no mundo
acadêmico brasileiro. [Série
Antropologia, 395]. Brasília: UnB,
2006. Disponível em
http://www.dan.unb.br/images/doc/Seri
e395empdf.pdf Acesso em: 07 fev.
2022.
CARVALHO, José Jorge de; FLÓREZ,
Juliana Flórez. Encuentro de saberes:
Proyecto para decolonizar el
conocimiento universitario
eurocéntrico. Nómadas, Universidad
Central de Colombia, n. 41, 2014.
CARVALHO, José Jorge de; VIANNA,
Letícia. O encontro de saberes nas
universidades, uma síntese dos dez
primeiros anos. Revista Mundaú,
Maceió, UFAL, n.9, p.23-49, 2020.
DIANGELO, Robin J. Não basta não
ser racista: sejamos antirracistas. São
Paulo: Faro Editorial, 2018.
FALS BORDA, Orlando. Una
sociología sentipensante para América
Latina. México,: Siglo XXI Editores ;
Buenos Aires: CLACSO, 2015.
FERNANDES, Lygia de Oliveira. “Não
falo do lugar dos derrotados”: o
Encontro de Saberes e suas
possibilidades emancipatórias. Tese
[Doutorado. em Educação].
Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, 2019.
481
MONTEIRO, Elaine; BITTER, Daniel; FONSECA, Edilberto J. de
M.;PIMENTA, Andressa F.; PEREIRA, Milena L. “A vida acontece no
encontro com o outro”. Diários da experiência pedagógica dos
Encontros de Saberes. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de
Estudos em Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 455-481, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior")
FREIRE, Paulo. Pedagogia do
Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1987.
GOMES, Nilma Lino. O Movimento
Negro educador: saberes construídos
nas lutas por emancipação. Petrópolis:
Vozes, 2017.
GUMBRECHT, Hans Ulrich.
Modernização dos Sentidos. São
Paulo: Editora 34, 1998.
HOOKS, Bell. Ensinando a transgredir.
A educação como prática da liberdade.
São Paulo: Martins Fontes, 2013.
MARTINS, Leda Maria. Afrografias da
memória: O Reinado do Rosário da
Jatobá. [S. l.: s. n.], 2021.
SANTOS, Boaventura de Sousa. A
gramática do tempo: para uma nova
cultura política. Para um novo senso
comum: a ciência, o direito e a política
na transição paradigmática [vol. 4].
Porto: Edições Afrontamento. 2006
SCHUCMAN, Lia Vainer. Entre o
“encardido”, o “branco” e o
“branquíssimo”: Raça, hierarquia e
poder na construção da branquitude
paulistana. Tese [Doutorado em
Psicologia Social]. Universidade de
São Paulo, 2012.
SOVIK, Liv. Aqui ninguém é branco.
Rio de Janeiro: Aeroplano, 2009.
VIANNA, Letícia. O Projeto Encontro
de Saberes: Educação Patrimonial e
inclusão epistêmica. Revista Com
Censo, Brasília, vol. 7, n. 3, p. 202-
207, ago. 2020.