CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Epistemômetro. Uma Metodologia para a Descolonização e Transformação do
Currículo das Universidades Brasileiras
DOI:
https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v13i25.57921
Resumo:
O artigo apresenta um instrumento metodológico novo, denominado Epistemômetro, que
visa avaliaro grau de (des)colonização epistêmica vigente nos currículos e nos projetos de curso das
universidade
Saberes,movimento que visa a inclusão dos saberes indígenas, afro
tradicionais como caminho para a construção de uma universidade brasileira pluriepistêmica
modelo da pluralidade epistêmicaé plasmado na imagem dos três círculos borromeanos, com seus
nós de interseção, representando os três troncos principais formadores da diversidade epistêmica
brasileira: o ocidental, o indígena e o afro
variáveis e dimensões interdependentes quecompõem a abordagem do Epistemômetro.
Palavras-chaves:
Epistemômetro; eurocentrismo; Encontro de Saberes; descolonização;
universidade pluriepistêmica.
Epistemómetro. Una Metodología para la Descolonización
las Universidades Brasileñas.
Resumen:
El artículo presenta unnuevo instrumento metodológico denominado Epistemómetro,
concebido para evaluar el grado de (des)coloniz
proyectos de cursos de las universidades brasileñas.El Epistemómetroes derivado de la
teoríadelEncuentro de Saberes, movimiento dedicado a la inclusión de los saberes indígenas,
afrobrasileños y los demáspu
universidadbrasileñapluriepistémica. El modelo de la pluralidade epistémica es presentado con el
imagen de los três círculos borromeanos, los cualespasan a representar los tres troncos
principalesf
ormadores de la diversidad epistémica brasileña: el tronco occidental, el tronco indígena y
1 José Jorge de Carvalho
. Doutor
pós-doutorados
pela Rice University
de Antropologia da Universidade de Brasília, Pesquisador 1
Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia e Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa, do Ministério
de Ciência e Tecnologia e do CNPq.
3534
Recebido em 31/03/2023,
aceito para publicação em
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Epistemômetro. Uma Metodologia para a Descolonização e Transformação do
Currículo das Universidades Brasileiras
José Jorge de Carvalho
https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v13i25.57921
O artigo apresenta um instrumento metodológico novo, denominado Epistemômetro, que
visa avaliaro grau de (des)colonização epistêmica vigente nos currículos e nos projetos de curso das
s brasileiras. O Epistemômetrose conecta com a teoria do Encontro de
Saberes,movimento que visa a inclusão dos saberes indígenas, afro
-
brasileiros e dos demais povos
tradicionais como caminho para a construção de uma universidade brasileira pluriepistêmica
modelo da pluralidade epistêmicaé plasmado na imagem dos três círculos borromeanos, com seus
nós de interseção, representando os três troncos principais formadores da diversidade epistêmica
brasileira: o ocidental, o indígena e o afro
-diaspórico. É apr
esentado também o modelo das sete
variáveis e dimensões interdependentes quecompõem a abordagem do Epistemômetro.
Epistemômetro; eurocentrismo; Encontro de Saberes; descolonização;
Epistemómetro. Una Metodología para la Descolonización
y Transformación
El artículo presenta unnuevo instrumento metodológico denominado Epistemómetro,
concebido para evaluar el grado de (des)coloniz
ación epistémica presente en los currículos y los
proyectos de cursos de las universidades brasileñas.El Epistemómetroes derivado de la
teoríadelEncuentro de Saberes, movimiento dedicado a la inclusión de los saberes indígenas,
afrobrasileños y los demáspu
eblostradicionalescomo caminho para la construcción de una
universidadbrasileñapluriepistémica. El modelo de la pluralidade epistémica es presentado con el
imagen de los três círculos borromeanos, los cualespasan a representar los tres troncos
ormadores de la diversidad epistémica brasileña: el tronco occidental, el tronco indígena y
. Doutor
em Antropologia Social por The Queen's University
pela Rice University
e
pela University of Florida. Professor Titular no Departamento
de Antropologia da Universidade de Brasília, Pesquisador 1
-
A do CNPq e Coordenador do INCT
Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia e Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa, do Ministério
de Ciência e Tecnologia e do CNPq.
E-mail: jorgedc@terra.com.br-
https://orcid.org/0000
aceito para publicação em
27/06/20
23 e disponibilizado online em
01/09/2023.
302
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Epistemômetro. Uma Metodologia para a Descolonização e Transformação do
José Jorge de Carvalho
1
O artigo apresenta um instrumento metodológico novo, denominado Epistemômetro, que
visa avaliaro grau de (des)colonização epistêmica vigente nos currículos e nos projetos de curso das
s brasileiras. O Epistemômetrose conecta com a teoria do Encontro de
brasileiros e dos demais povos
tradicionais como caminho para a construção de uma universidade brasileira pluriepistêmica
. O
modelo da pluralidade epistêmicaé plasmado na imagem dos três círculos borromeanos, com seus
nós de interseção, representando os três troncos principais formadores da diversidade epistêmica
esentado também o modelo das sete
variáveis e dimensões interdependentes quecompõem a abordagem do Epistemômetro.
Epistemômetro; eurocentrismo; Encontro de Saberes; descolonização;
y Transformación
del Currículo de
El artículo presenta unnuevo instrumento metodológico denominado Epistemómetro,
ación epistémica presente en los currículos y los
proyectos de cursos de las universidades brasileñas.El Epistemómetroes derivado de la
teoríadelEncuentro de Saberes, movimiento dedicado a la inclusión de los saberes indígenas,
eblostradicionalescomo caminho para la construcción de una
universidadbrasileñapluriepistémica. El modelo de la pluralidade epistémica es presentado con el
imagen de los três círculos borromeanos, los cualespasan a representar los tres troncos
ormadores de la diversidad epistémica brasileña: el tronco occidental, el tronco indígena y
em Antropologia Social por The Queen's University
of Belfast com
pela University of Florida. Professor Titular no Departamento
A do CNPq e Coordenador do INCT
-
Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia e Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa, do Ministério
https://orcid.org/0000
-0003-3415-
23 e disponibilizado online em
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
el tronco afro-
diaspórico.Es presentado también el modelo de las sietevariables y dimensiones
interdependientes que componen el método del Epistemómetro.
Palabras clave:
Epistemómetro; eurocentrismo; Encuentro de Saberes; descolonización; universidad
pluriepistémica.
Epistemometer. A Methodology for the Decolinization
Brazilian Universities
Abstract: The article presents
a new methodological tool, called Epistemometer, designed to evaluate
the degree of epistemic (de)colonization present in the curriculum and in the courses offered by
Brazilian universities. The Epistemometer is derived from the theory of the Meeting of K
project dedicated to the inclusion of the knowledges of Indigenous, Afro
peoples as a way of building a newpluriepistemic Brazilian university. The model of epistemic plurality
is presented by the image of the t
shaped Brazilian epistemic diversity: the Western, the Indigenous, and the Afro
presented the model of the seven variables and dimensions which forms part of the me
Epistemometer.
Keywords: Epistemometer;
Eurocentrism
university
.
Epistemômetro. Uma Metodologia para a Descolonização e Transformação do
Currículo das Universidades Brasileiras
Descolonizando a Academia
Eurocêntrica
A ideia de construir um
Epistemômetro foi retirada da
observação das disciplinas ofertadas
pelo Encontro de Saberes,
dedicado à
inclusão de mestres e
mestras dos saberes tradicionais
(indígenas, afro
quilombolas, das culturas populares e
dos demais povos tradicionais) como
docentes nas universidades
2
Apresentei uma primeira versão do
Epistemômetro em uma conferência na
Universidade Federal Fluminense em 2016. A
presente versão se conecta com uma proposta
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
diaspórico.Es presentado también el modelo de las sietevariables y dimensiones
interdependientes que componen el método del Epistemómetro.
Epistemómetro; eurocentrismo; Encuentro de Saberes; descolonización; universidad
Epistemometer. A Methodology for the Decolinization
and Transformatrion
of the Curriculum of
a new methodological tool, called Epistemometer, designed to evaluate
the degree of epistemic (de)colonization present in the curriculum and in the courses offered by
Brazilian universities. The Epistemometer is derived from the theory of the Meeting of K
project dedicated to the inclusion of the knowledges of Indigenous, Afro
-
Brazilian and other traditional
peoples as a way of building a newpluriepistemic Brazilian university. The model of epistemic plurality
is presented by the image of the t
hree Borromean circles, used to represent the three main trunks that
shaped Brazilian epistemic diversity: the Western, the Indigenous, and the Afro
presented the model of the seven variables and dimensions which forms part of the me
Eurocentrism
; Meeting of Knowledges;
decolonization
Epistemômetro. Uma Metodologia para a Descolonização e Transformação do
Currículo das Universidades Brasileiras
Descolonizando a Academia
A ideia de construir um
Epistemômetro foi retirada da
observação das disciplinas ofertadas
pelo Encontro de Saberes,
movimento
inclusão de mestres e
mestras dos saberes tradicionais
(indígenas, afro
-brasileiros,
quilombolas, das culturas populares e
dos demais povos tradicionais) como
docentes nas universidades
2. Desde a
Apresentei uma primeira versão do
Epistemômetro em uma conferência na
Universidade Federal Fluminense em 2016. A
presente versão se conecta com uma proposta
sua primeira edição, que teve lugar na
Universidade de Bras
possível constatar que os mestres e
mestras traziam para suas aulas
temas de conhecimento inteiramente
novos, os quais eram apresentados e
discutidos a partir de ângulos
epistêmicos distintos da episteme
ocidental moderna. Com o Encontro
de Saberes, o momento presente é
certamente de transformação
que formulei recentemente para WanguiWa
Goro, do King’s College
, Londres, de um
esforço conjunto pa
ra a descolonização das
universidades de Nairobi, Londres e Brasília
(CARVALHO, 2023a).
303
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
diaspórico.Es presentado también el modelo de las sietevariables y dimensiones
Epistemómetro; eurocentrismo; Encuentro de Saberes; descolonización; universidad
of the Curriculum of
a new methodological tool, called Epistemometer, designed to evaluate
the degree of epistemic (de)colonization present in the curriculum and in the courses offered by
Brazilian universities. The Epistemometer is derived from the theory of the Meeting of K
nowledges, a
Brazilian and other traditional
peoples as a way of building a newpluriepistemic Brazilian university. The model of epistemic plurality
hree Borromean circles, used to represent the three main trunks that
shaped Brazilian epistemic diversity: the Western, the Indigenous, and the Afro
-diasporic. It is also
presented the model of the seven variables and dimensions which forms part of the me
thod of the
decolonization
; pluriepistemic
Epistemômetro. Uma Metodologia para a Descolonização e Transformação do
sua primeira edição, que teve lugar na
Universidade de Bras
ília em 2010, foi
possível constatar que os mestres e
mestras traziam para suas aulas
temas de conhecimento inteiramente
novos, os quais eram apresentados e
discutidos a partir de ângulos
epistêmicos distintos da episteme
ocidental moderna. Com o Encontro
de Saberes, o momento presente é
certamente de transformação
que formulei recentemente para WanguiWa
, Londres, de um
ra a descolonização das
universidades de Nairobi, Londres e Brasília
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
descolonizadora: estamos partindo de
um modelo acadêmico monocultural,
monolíngue e monoepistêmico e nos
propomos construir agora um novo
modelo multicultural, poliglota e
pluriepistêmico capaz
de refletir a
diversidade de tradições de
conhecimento, em todas as áreas, que
estão vivas e florescentes em nosso
país.
Na medida em que a inclusão
dos mestres na academia como
docentes se enraíza, o passo seguinte
será defender o seu lugar no mundo
da pe
squisa, propondo sua entrada no
CNPq como bolsistas de produtividade
em pesquisa, através de uma política
que chamamos de cotas epistêmicas.
Um dos desafios presentes, quando
efetuamos a tríade inclusivadocência
pesquisa-
extensão (que também
constitui agor
a o Encontro de
Saberes), é discutir como os saberes
trazidos pelos mestres, até
recentemente ausentes da academia,
encaixarão no quadro de posturas
epistemológicas estabelecidas. Por
exemplo, nos termos de Paul
Boghossian, ou as epistemes
indígenas e afro-
brasileiras serão
absorvidas pelo universalismo
epistêmico, ou elas contribuirão para
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
descolonizadora: estamos partindo de
um modelo acadêmico monocultural,
monolíngue e monoepistêmico e nos
propomos construir agora um novo
modelo multicultural, poliglota e
de refletir a
diversidade de tradições de
conhecimento, em todas as áreas, que
estão vivas e florescentes em nosso
Na medida em que a inclusão
dos mestres na academia como
docentes se enraíza, o passo seguinte
será defender o seu lugar no mundo
squisa, propondo sua entrada no
CNPq como bolsistas de produtividade
em pesquisa, através de uma política
que chamamos de cotas epistêmicas.
Um dos desafios presentes, quando
efetuamos a tríade inclusivadocência
-
extensão (que também
a o Encontro de
Saberes), é discutir como os saberes
trazidos pelos mestres, até
recentemente ausentes da academia,
encaixarão no quadro de posturas
epistemológicas estabelecidas. Por
exemplo, nos termos de Paul
Boghossian, ou as epistemes
brasileiras serão
absorvidas pelo universalismo
epistêmico, ou elas contribuirão para
acentuar um quadro de relativismo
epistêmico. Por outro lado, Paul
Feyerabend abre-
nos outras portas de
acolhimento ao defender o anarquismo
epistemológico: se o quadro
anárquico nos confins do saber
eurocêntrico, os saberes indígenas e
afro-
brasileiros farão ampliar ainda
mais a anarquia geral de validação do
conhecimento acadêmico instituído.
Para além do relativismo e do
anarquismo, minha resposta provisória
é
defender inicialmente um ambiente
de pluralismo epistêmico, que nos
permitirá iniciar uma agenda de
diálogos dos saberes indígenas e afro
diaspóricos com todas as posições
epistemológicas eurocêntricas
estabelecidas, incluindo, por
exemplo,discutir os limi
de falseabilidade e demarcação de
Karl Popper, ou a rigidez na aplicação
do programa de pesquisa de Imre
Lakatos, entre outras posições
vigentes no campo.
descolonização da episteme
3
Para os dilemas entre universalismo e
relativismo epistemológico de Paul
Boghossian, ver (2012); sobre a lógica do
método científico segundo Karl Popper, ver
(2013);
sobre a metodologia do programa de
pesquisa de Lakatos, ver (1989); sobre o
anarquismo epistemológico de Feyerabend,
ver (2011).
304
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
acentuar um quadro de relativismo
epistêmico. Por outro lado, Paul
nos outras portas de
acolhimento ao defender o anarquismo
epistemológico: se o quadro
já era
anárquico nos confins do saber
eurocêntrico, os saberes indígenas e
brasileiros farão ampliar ainda
mais a anarquia geral de validação do
conhecimento acadêmico instituído.
Para além do relativismo e do
anarquismo, minha resposta provisória
defender inicialmente um ambiente
de pluralismo epistêmico, que nos
permitirá iniciar uma agenda de
diálogos dos saberes indígenas e afro
-
diaspóricos com todas as posições
epistemológicas eurocêntricas
estabelecidas, incluindo, por
exemplo,discutir os limi
tes dos critérios
de falseabilidade e demarcação de
Karl Popper, ou a rigidez na aplicação
do programa de pesquisa de Imre
Lakatos, entre outras posições
vigentes no campo.
3De fato, a
descolonização da episteme
Para os dilemas entre universalismo e
relativismo epistemológico de Paul
Boghossian, ver (2012); sobre a lógica do
método científico segundo Karl Popper, ver
sobre a metodologia do programa de
pesquisa de Lakatos, ver (1989); sobre o
anarquismo epistemológico de Feyerabend,
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
hegemônica acadêmica é a outra face
da constr
ução de uma nova instituição
acadêmica pluriepistêmica. Por outro
lado, a crescente campanha pela
outorga do Notório Saber para os
mestres e
mestras é um
importante na direção da certificação
ou reconhecimento dos seus saberes.
Contudo, a discussão c
om o campo da
epistemologia tornou-
se inadiável
devido ao amplíssimo universo de
saberes trazidos pelos mestres, o que
exige protocolos
para atender às áreas
das ciências, das artes e das
humanidades.E todas essas áreas
enfrentam as questões de validação
d
o conhecimento ensinado nos
currículos.Assim, essa realidade
epistêmica que se torna extremamente
plural com o Encontro de Saberes
exigiu a construção de dimensões de
inovação epistêmica com suas
respectivas variáveis que constituem o
núcleo da metodologia
Epistemômetro, sobre as quais
oferecerei uma primeira versão no final
deste artigo.
Uma linha alternativa às
discussões epistemológicas
estabelecidas (a maioria delas
centradas nos casos exemplares da
moderna revolução científica), e que
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
hegemônica acadêmica é a outra face
ução de uma nova instituição
acadêmica pluriepistêmica. Por outro
lado, a crescente campanha pela
outorga do Notório Saber para os
mestras é um
passo
importante na direção da certificação
ou reconhecimento dos seus saberes.
om o campo da
se inadiável
devido ao amplíssimo universo de
saberes trazidos pelos mestres, o que
para atender às áreas
das ciências, das artes e das
humanidades.E todas essas áreas
enfrentam as questões de validação
o conhecimento ensinado nos
currículos.Assim, essa realidade
epistêmica que se torna extremamente
plural com o Encontro de Saberes
exigiu a construção de dimensões de
inovação epistêmica com suas
respectivas variáveis que constituem o
núcleo da metodologia
do
Epistemômetro, sobre as quais
oferecerei uma primeira versão no final
Uma linha alternativa às
discussões epistemológicas
estabelecidas (a maioria delas
centradas nos casos exemplares da
moderna revolução científica), e que
mostra afinida
des com nosso projeto,
é a proposta do desenvolvimento de
um campo novo de “epistemologia
comparada de formas divergentes de
conhecimento”, proposta, entre outros,
por Hub
Zwart (2004 e 2008). Seu
escopo é apenas eurocêntrico, porém
é inspirador na medida
embaralha a ainda estabelecida
divisão entre as “duas culturas” de C.
P. Snow e com isso mostra como é
plural o campo do que se chama de
cientificidade, questionando também o
que seu oposto aparente, isto é, o
campo das Humanidades. No caso do
Encon
tro de Saberes, como veremos
da leitura atenta da lista de disciplinas,
nem sequer a divisão entre as duas
culturas, que já é problemática por si
mesma, faz sentido, dada a polimatia
constitutiva do saber dos mestres.
Em vários países africanos está
em curso um grande debate sobre
como descolonizar os currículos e as
epistemologias eurocentradas a eles
impostos, do mesmo modo com que
foram impostos, por processos
históricos distintos, em toda a América
Latina. Em um tra
balho recente, Tosin
Adeata e Anusharani
ambos da África do Sul, oferecem um
“quadro de referências
305
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
des com nosso projeto,
é a proposta do desenvolvimento de
um campo novo de “epistemologia
comparada de formas divergentes de
conhecimento”, proposta, entre outros,
Zwart (2004 e 2008). Seu
escopo é apenas eurocêntrico, porém
é inspirador na medida
em que
embaralha a ainda estabelecida
divisão entre as “duas culturas” de C.
P. Snow e com isso mostra como é
plural o campo do que se chama de
cientificidade, questionando também o
que seu oposto aparente, isto é, o
campo das Humanidades. No caso do
tro de Saberes, como veremos
da leitura atenta da lista de disciplinas,
nem sequer a divisão entre as duas
culturas, que já é problemática por si
mesma, faz sentido, dada a polimatia
constitutiva do saber dos mestres.
Em vários países africanos está
em curso um grande debate sobre
como descolonizar os currículos e as
epistemologias eurocentradas a eles
impostos, do mesmo modo com que
foram impostos, por processos
históricos distintos, em toda a América
balho recente, Tosin
Adeata e Anusharani
Sewchurran,
ambos da África do Sul, oferecem um
“quadro de referências
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
epistemológicas, para a
descolonização do currículo na África
(2023.1), sendo sua meta a construção
de um “currículo afrocentrado” (id:2).
Em Mo
çambique, José Castiano e
Severino Ngoenha têm formulado uma
tentativa de descolonizar a filosofia
como uma disciplina acadêmica; e
Castiano
coloca a questão de uma
epistemologia própria, ainda debatida
apenas em termos conceituais, sem
intervenção concret
a, tal como na sua
obra
Os Saberes Locais na Academia.
Condições e Possibilidades de sua
Legitimação (2013).
Com base na África do Sul,
Sabelo Ndlovu-
Gatsheni tem
produzido obras sobre a
descolonização acadêmica africana, e
em um de seus trabalhos mais
rec
entes enumera um programa de
descolonização epistêmica geral em
seis dimensões, a ser aplicado para o
conjunto das universidades africanas
(2018). A inspiração maior das
formulações de Ndlovu-
Gatsheni é a
obra de Ngugiwa
Thiong’o, a quem
considero o precur
sor geral e mais
antigo da luta pela descolonização do
currículo eurocentrado das
universidades de todo o Sul global.
Destaco seu manifesto intitulado
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
epistemológicas, para a
descolonização do currículo na África
(2023.1), sendo sua meta a construção
de um “currículo afrocentrado” (id:2).
çambique, José Castiano e
Severino Ngoenha têm formulado uma
tentativa de descolonizar a filosofia
como uma disciplina acadêmica; e
coloca a questão de uma
epistemologia própria, ainda debatida
apenas em termos conceituais, sem
a, tal como na sua
Os Saberes Locais na Academia.
Condições e Possibilidades de sua
Com base na África do Sul,
Gatsheni tem
produzido obras sobre a
descolonização acadêmica africana, e
em um de seus trabalhos mais
entes enumera um programa de
descolonização epistêmica geral em
seis dimensões, a ser aplicado para o
conjunto das universidades africanas
(2018). A inspiração maior das
Gatsheni é a
Thiong’o, a quem
sor geral e mais
antigo da luta pela descolonização do
currículo eurocentrado das
universidades de todo o Sul global.
Destaco seu manifesto intitulado
Sobre
a Abolição do Departamento de Inglês
apresentado em 1968 à Universidade
de Nairobi, em que ele pro
lugar do Departamento de Inglês,
existente em praticamente todas as
universidades africanas, um
Departamento de Línguas e Literaturas
Africanas (Wa
Thiong’o 1972).
ainda, seu livro A
Descolonização da
Mente
(1981) sintetiza magistralmente
os d
ilemas da colonização acadêmica
no continente africano.
Também a formulação de
epistemologias especificamente
africanas tem crescido nos últimos
anos, e um bom exemplo é o
panorama geral produzido por Didier
N. Kaphagawani e Jeanette G.
Malherbe (1998) e
as obras do filósofo
nigeriano Jonathan Chimakonam e
seus colegas da chamada Escola do
Calabar. Chimakonam tem
desenvolvido uma lógica nova,
derivada do pensamento tradicional
Igbo, chamada
ezumezu
marcada por um terceiro incluído
complemen
tar (distinto do modelo de
terceiro incluído presente na lógica da
transdisciplinaridade de Basarab
Nicolescu), pensada a partir do
contexto africano, porém que pode
contribuir para a fundamentação de
306
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
a Abolição do Departamento de Inglês
,
apresentado em 1968 à Universidade
de Nairobi, em que ele pro
pôs, em
lugar do Departamento de Inglês,
existente em praticamente todas as
universidades africanas, um
Departamento de Línguas e Literaturas
Thiong’o 1972).
Mais
Descolonização da
(1981) sintetiza magistralmente
ilemas da colonização acadêmica
no continente africano.
Também a formulação de
epistemologias especificamente
africanas tem crescido nos últimos
anos, e um bom exemplo é o
panorama geral produzido por Didier
N. Kaphagawani e Jeanette G.
as obras do filósofo
nigeriano Jonathan Chimakonam e
seus colegas da chamada Escola do
Calabar. Chimakonam tem
desenvolvido uma lógica nova,
derivada do pensamento tradicional
ezumezu
, ou trivalente,
marcada por um terceiro incluído
tar (distinto do modelo de
terceiro incluído presente na lógica da
transdisciplinaridade de Basarab
Nicolescu), pensada a partir do
contexto africano, porém que pode
contribuir para a fundamentação de
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
um campo de pluralismo epistêmico ao
qual nos dirigimos
com o Encontro de
Saberes.4
Além dos africanos, outra fonte
de inspiração para a superação da
monoepisteme eurocêntrica é o campo
de estudos do pensamento oriental
(chinês, japonês, indiano, tailandês e
outros) que também exercitam esse
espaço novo de com
paração entre as
suas epistemologias próprias e a
episteme ocidental.
Destaco, dentro do
grande universo de diálogos
interepistêmicos China-
Ocidente, as
obras recentes de Jana Rosker (2021)
e Mingjun
Lu (2020), ambas discutindo
métodos comparativos e leitu
epistemológicas cruzadas; e também a
leitura crítica da epistemologia
kantiana, a partir de uma perspectiva
que ele chamou de confucionista
marxista, de
Zehou Li (2018), um dos
mais criativos filósofos e
epistemólogos chineses do século XX.
Colocando
nosso esforço de
descolonização epistêmica nos termos
intercontinentais, observo uma
diferença significativa das posições
assumidas pelas universidades
asiáticas para as posições das
4
Ver Chimakonam (2019 e 2020) e
Chimakonam e Ogbonnaya
(2021).
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
um campo de pluralismo epistêmico ao
com o Encontro de
Além dos africanos, outra fonte
de inspiração para a superação da
monoepisteme eurocêntrica é o campo
de estudos do pensamento oriental
(chinês, japonês, indiano, tailandês e
outros) que também exercitam esse
paração entre as
suas epistemologias próprias e a
Destaco, dentro do
grande universo de diálogos
Ocidente, as
obras recentes de Jana Rosker (2021)
Lu (2020), ambas discutindo
métodos comparativos e leitu
ras
epistemológicas cruzadas; e também a
leitura crítica da epistemologia
kantiana, a partir de uma perspectiva
que ele chamou de confucionista
-
Zehou Li (2018), um dos
mais criativos filósofos e
epistemólogos chineses do século XX.
nosso esforço de
descolonização epistêmica nos termos
intercontinentais, observo uma
diferença significativa das posições
assumidas pelas universidades
asiáticas para as posições das
Ver Chimakonam (2019 e 2020) e
(2021).
universidades da África e da América
Latina. Ambas podem ser entendidas
c
omo dualistas (enquanto defendo que
a posição brasileira deve ser
pluralista), porém as africanas e latino
americanas expressam o dualismo em
termos de uma polarização, ou de
rejeição da episteme eurocêntrica de
um lado e de afirmação das epistemes
african
as, originárias e afro
diaspóricas de outro; enquanto
asiáticas optam por um princípio de
complementaridade.5
Uma explicação possível para
essa diferença é que as universidades
da China e do Japão se constituíram
em meio à sua ocidentalização no final
d
o século XIX e operaram com um
modelo de convivência, e não de
repúdio, em relação à sua base
epistêmica que foi forçada a
transformar-
se. Um exemplo
particularmente inspirador é o da
modernização da Universidade de
Beijing em 1898, cujo currículo foi
refo
rmado segundo o lema
desenvolvido por Zhang
5
Nesta proposta de superar os dualismos do
tipo nós versus
europeus, já ofereci o que
chamei de um triálogo entre a episteme da
Escola de Kyoto (especialmente Nishida
Kitaro), a episteme ocidental e a episteme
plasmada nas artes indígenas brasileiras
(CARVALHO, 2019b).
307
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
universidades da África e da América
Latina. Ambas podem ser entendidas
omo dualistas (enquanto defendo que
a posição brasileira deve ser
pluralista), porém as africanas e latino
-
americanas expressam o dualismo em
termos de uma polarização, ou de
rejeição da episteme eurocêntrica de
um lado e de afirmação das epistemes
as, originárias e afro
-
diaspóricas de outro; enquanto
as
asiáticas optam por um princípio de
Uma explicação possível para
essa diferença é que as universidades
da China e do Japão se constituíram
em meio à sua ocidentalização no final
o século XIX e operaram com um
modelo de convivência, e não de
repúdio, em relação à sua base
epistêmica que foi forçada a
se. Um exemplo
particularmente inspirador é o da
modernização da Universidade de
Beijing em 1898, cujo currículo foi
rmado segundo o lema
desenvolvido por Zhang
Zhidong:
Nesta proposta de superar os dualismos do
europeus, já ofereci o que
chamei de um triálogo entre a episteme da
Escola de Kyoto (especialmente Nishida
Kitaro), a episteme ocidental e a episteme
plasmada nas artes indígenas brasileiras
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
zhongxuewei ti, xixueweiyong
podemos traduzir aproximadamente
como: “conhecimento chinês
(zhongxue) por sua essência,
conhecimento ocidental (xixue) por sua
utilidade” (WESTON,
2004). Vale notar
que
Zhong lançou mão de um par de
conceitos da ontologia chinesa
clássica, em uso há mais de dois mil
anos: ti-yong, em que ti
é normalmente
traduzido por essência e
função. Assim, operou-
se com uma
acomodação e uma absorção do
elemento forâneo: a episteme
ocidental traz uma utilidade dentro de
um plano de sinificação (tornar
chinesa) da episteme moderna, porém
mantendo um lugar secundário ou
instrumental diant
e da episteme
fundante chinesa que continuou no
seu lugar central.6
O lema de Zhang
Zhidong pode
ser uma referência para nós, porque
os pensadores tidos como
progressistas da época advogavam
por uma modernização total das
instituições chinesas (e foi este
modelo inicial brasileiro, qual seja,
6
Para uma análise histórica da proposta de
Zhang
Zhidong no contexto da reforma de
1898 e do seu ensaio famoso (e ainda
polêmico)“Exortação ao Conhecimento”, ver
Hon (2002).
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
zhongxuewei ti, xixueweiyong
, que
podemos traduzir aproximadamente
como: “conhecimento chinês
(zhongxue) por sua essência,
conhecimento ocidental (xixue) por sua
2004). Vale notar
Zhong lançou mão de um par de
conceitos da ontologia chinesa
clássica, em uso há mais de dois mil
é normalmente
traduzido por essência e
yong por
se com uma
acomodação e uma absorção do
elemento forâneo: a episteme
ocidental traz uma utilidade dentro de
um plano de sinificação (tornar
-se
chinesa) da episteme moderna, porém
mantendo um lugar secundário ou
e da episteme
fundante chinesa que continuou no
Zhidong pode
ser uma referência para nós, porque
os pensadores tidos como
progressistas da época advogavam
por uma modernização total das
instituições chinesas (e foi este
o
modelo inicial brasileiro, qual seja,
Para uma análise histórica da proposta de
Zhidong no contexto da reforma de
1898 e do seu ensaio famoso (e ainda
polêmico)“Exortação ao Conhecimento”, ver
ocidentalização absoluta do currículo);
e
Zhang foi visto como um
conservador ao defender a
convivência biepistêmica, porém com
a precedência do saber chinês (o
que continuou no seu lugar central
face o saber no
vo vindo da Europa (o
yong
). Em uma breve comparação, o
Manifesto de Ngugi pela eliminação do
Departamento de Inglês é frontalmente
descolonizador. Já a solução de Zhang
não foi exatamente descolonizadora,
na linha do confronto defendido pelos
africanos e hispano-
americanos, mas
uma sorte de passo atrás repactuador
diante do perigo de uma modernização
totalizante, impedindo assim a
colonização epistêmica eurocêntrica
da China.
Dos estudos japoneses, uma
obra que representa uma afirmação da
absorção intercu
ltural da episteme
ocidental sem perder sua raiz
tradicional é
A Estrutura do Iki
Shuzo (1997), filósofo que pertenceu
de um modo marginal à Escola de
Kyoto. Termo altamente polissêmico,
Iki
é uma dessas “palavras
civilizacionais”, tão difíceis de
e assimilar em sua integralidade como
o termo axé
do iorubá falado no
candomblé brasileiro, o
308
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
ocidentalização absoluta do currículo);
Zhang foi visto como um
conservador ao defender a
convivência biepistêmica, porém com
a precedência do saber chinês (o
ti),
que continuou no seu lugar central
vo vindo da Europa (o
). Em uma breve comparação, o
Manifesto de Ngugi pela eliminação do
Departamento de Inglês é frontalmente
descolonizador. Já a solução de Zhang
não foi exatamente descolonizadora,
na linha do confronto defendido pelos
americanos, mas
uma sorte de passo atrás repactuador
diante do perigo de uma modernização
totalizante, impedindo assim a
colonização epistêmica eurocêntrica
Dos estudos japoneses, uma
obra que representa uma afirmação da
ltural da episteme
ocidental sem perder sua raiz
A Estrutura do Iki
, de Kuki
Shuzo (1997), filósofo que pertenceu
de um modo marginal à Escola de
Kyoto. Termo altamente polissêmico,
é uma dessas “palavras
civilizacionais”, tão difíceis de
traduzir
e assimilar em sua integralidade como
do iorubá falado no
candomblé brasileiro, o
aguyjé do
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Guarani Mbyá e Kaiová, ou
pensamento chinês clássico. O ensaio
de Shuzo, calcado inteiramente na
episteme japonesa, foi por ele
acionad
o já numa era de
ocidentalização do Japão, construindo
uma resposta silenciosa às categorias
ocidentais que conformam o pano de
fundo, sem citações diretas, de sua
afirmação integradora (porém
indiretamente descolonizadora) das
epistemes ocidental e orient
seja, por um movimento
distinto do da Universidade de
e na mesma época, a Escola de Kyoto
também realizou uma síntese
intercultural a partir da qual a episteme
ocidental não conseguiu colonizar a
episteme japonesa.
Uma proposta d
escolonizadora
contemporânea muito bem articulada
do continente asiático é a da
Universidade da Tailândia, que
transformou integralmente seu
currículo para que ele possa refletir o
quadro de saberes de uma
universidade epistemicamente
moderna, no sentido o
cidental do
termo, e ao mesmo tempo
epistemicamente budista, posto que
enraizada nas tradições do budismo
tailandês (RHEA,
2017). Podemos nos
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Guarani Mbyá e Kaiová, ou
Dao do
pensamento chinês clássico. O ensaio
de Shuzo, calcado inteiramente na
episteme japonesa, foi por ele
o já numa era de
ocidentalização do Japão, construindo
uma resposta silenciosa às categorias
ocidentais que conformam o pano de
fundo, sem citações diretas, de sua
afirmação integradora (porém
indiretamente descolonizadora) das
epistemes ocidental e orient
al. Ou
seja, por um movimento
implícito,
distinto do da Universidade de
Beijing,
e na mesma época, a Escola de Kyoto
também realizou uma síntese
intercultural a partir da qual a episteme
ocidental não conseguiu colonizar a
escolonizadora
contemporânea muito bem articulada
do continente asiático é a da
Universidade da Tailândia, que
transformou integralmente seu
currículo para que ele possa refletir o
quadro de saberes de uma
universidade epistemicamente
cidental do
termo, e ao mesmo tempo
epistemicamente budista, posto que
enraizada nas tradições do budismo
2017). Podemos nos
inspirar também na longa e rica
tradição de posições epistemológicas
da Índia, desde as sofisticadas
elaborações d
as escolas Nyaya e
Vaisheshika até às epistemologias
budistas (TUSKE,
2019), todas elas
ativadas em diálogos horizontais com
a episteme ocidental. Próxima também
da nossa abordagem é a proposta da
intelectual Maori Linda Tuhiwai Smith
(2019), de descoloniz
procedimentos eurocêntricos de
pesquisa e as metodologias,
substituindo-
os por abordagens
epistêmicas Maori.
Assumindo que o
Epistemômetro não é apenas uma
teoria da descolonização, mas uma
práxis descolonizadora, esta
se efetiva de fato em um conjunto
articulado de ações, com destaque
entre elas para uma reforma curricular
completa e integrada. E essa reforma
curricular exige a construção de um
ambiente plurepistêmico. Por outro
lado, trazer as epistemes não
oci
dentais para a universidade requer
um deslocamento, um rearranjo e uma
redução do espaço quase absoluto
que foi conferido à episteme ocidental.
O primeiro passo para formular um
currículo pluriepistêmico é realizar um
309
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
inspirar também na longa e rica
tradição de posições epistemológicas
da Índia, desde as sofisticadas
as escolas Nyaya e
Vaisheshika até às epistemologias
2019), todas elas
ativadas em diálogos horizontais com
a episteme ocidental. Próxima também
da nossa abordagem é a proposta da
intelectual Maori Linda Tuhiwai Smith
(2019), de descoloniz
ar os
procedimentos eurocêntricos de
pesquisa e as metodologias,
os por abordagens
Assumindo que o
Epistemômetro não é apenas uma
teoria da descolonização, mas uma
práxis descolonizadora, esta
somente
se efetiva de fato em um conjunto
articulado de ações, com destaque
entre elas para uma reforma curricular
completa e integrada. E essa reforma
curricular exige a construção de um
ambiente plurepistêmico. Por outro
lado, trazer as epistemes não
-
dentais para a universidade requer
um deslocamento, um rearranjo e uma
redução do espaço quase absoluto
que foi conferido à episteme ocidental.
O primeiro passo para formular um
currículo pluriepistêmico é realizar um
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
diagnóstico epistemológico do
currícul
o vigente. Se os autores, as
teorias e os temas eurocêntricos
reinam quase sozinhos, é preciso
observar como negam, silenciam ou
representam os saberes não
ocidentais excluídos. Esse olhar
analítico que põe atenção tanto no que
está presente como no que es
ausente é característico do
Epistemômetro. Esta ferramenta olha
para o que está recomendado e
tornado obrigatório como referência de
saber acadêmico; e olha também para
o que deveria formar parte, e ainda
não o faz, para a construção de um
novo campo pl
ural de saber
universitário em todas as áreas e
capaz de fazer justiça à diversidade
epistêmica da sociedade brasileira.
Dito de outro modo, é somente quando
vislumbramos pela primeira vez a
imagem de um ambiente acadêmico
pluriepistêmico que se torna poss
avaliar, criticar ou medir (mesmo que
se trate de uma mensuração muito
mais qualitativa que quantitativa) o
grau de colonização epistêmica a que
ainda estamos submetidos. No caso
das universidades brasileiras, o
Encontro de Saberes permitiu
esse v
islumbre nítido e a mobilização
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
diagnóstico epistemológico do
o vigente. Se os autores, as
teorias e os temas eurocêntricos
reinam quase sozinhos, é preciso
observar como negam, silenciam ou
representam os saberes não
-
ocidentais excluídos. Esse olhar
analítico que põe atenção tanto no que
está presente como no que es
tá
ausente é característico do
Epistemômetro. Esta ferramenta olha
para o que está recomendado e
tornado obrigatório como referência de
saber acadêmico; e olha também para
o que deveria formar parte, e ainda
não o faz, para a construção de um
ural de saber
universitário em todas as áreas e
capaz de fazer justiça à diversidade
epistêmica da sociedade brasileira.
Dito de outro modo, é somente quando
vislumbramos pela primeira vez a
imagem de um ambiente acadêmico
pluriepistêmico que se torna poss
ível
avaliar, criticar ou medir (mesmo que
se trate de uma mensuração muito
mais qualitativa que quantitativa) o
grau de colonização epistêmica a que
ainda estamos submetidos. No caso
das universidades brasileiras, o
Encontro de Saberes permitiu
-nos
islumbre nítido e a mobilização
conseguinte para formular uma
transformação descolonizadora do
currículo.
A primeira aplicação do
Epistemômetro realizada pelo INCTI
de Inclusão foi uma análise da
aplicação da Lei 11.645 (e da sua
antecessora, a Lei 10.639)
desenvolvida para o Ministério da
Educação. Tratou-
se de observar a
introdução das culturas indígena e
afro-
brasileira em um ambiente escolar
antes inteiramente eurocêntrico do
ponto de vista cultural; e a introdução
de discursos e narrativas próprias do
indígenas e dos afro
produzem as suas próprias
representações de si mesmos.
Produzimos as leituras de Letícia
Vianna (2016), Raoni Jardim (2018) e
Alexandra Dumas (2023). Realizei
ainda um exercício coletivo de
aplicação do Epistemômetro
propondo-
o como tarefa para os
estudantes do curso “Diálogos de
Civilizações e Encontro de Saberes”
da Pós-
Graduação de Antropologia da
UnB em 2018, quando levantamos
análises dos cursos de Ciências
Sociais e Antropologia de várias
universidades, entre ela
UNILAB, UFRB, UFOPA, a P
310
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
conseguinte para formular uma
transformação descolonizadora do
A primeira aplicação do
Epistemômetro realizada pelo INCTI
de Inclusão foi uma análise da
aplicação da Lei 11.645 (e da sua
antecessora, a Lei 10.639)
,
desenvolvida para o Ministério da
se de observar a
introdução das culturas indígena e
brasileira em um ambiente escolar
antes inteiramente eurocêntrico do
ponto de vista cultural; e a introdução
de discursos e narrativas próprias do
s
indígenas e dos afro
-brasileiros que
produzem as suas próprias
representações de si mesmos.
Produzimos as leituras de Letícia
Vianna (2016), Raoni Jardim (2018) e
Alexandra Dumas (2023). Realizei
ainda um exercício coletivo de
aplicação do Epistemômetro
o como tarefa para os
estudantes do curso “Diálogos de
Civilizações e Encontro de Saberes”
Graduação de Antropologia da
UnB em 2018, quando levantamos
análises dos cursos de Ciências
Sociais e Antropologia de várias
universidades, entre ela
s a UFT,
UNILAB, UFRB, UFOPA, a P
ós-
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Graduação de Estudos Latino
A
mericanos da UnB e o Núcleo
Intercultural Insikiran da UFRR.
O que procuro detectar, desde
então, é a intensidade com que a
cultura ocidental é difundida nas
universidades, como modelo de
id
entificação, não somente intelectual
e política, mas também estética,
simbólica e afetiva. Essa identificação
forçada, ou pelo menos programada e
em grande parte irrefletida,
da unilateralidade e
da exclusividade
com que as disciplinas acadêmic
representam e objetificam as nações
indígenas, quilombolas, as
comunidades negras, as culturas
populares e os demais povos
tradicionais. Neste contexto, a primeira
pergunta que devemos fazer para
avaliar a diversidade epistêmica e
cultural das instituiç
ões de ensino é:
quantos e quais saberes não
ocidentais e tradicionais são
ensinados? E se são ensinados, com
que grau de detalhe, profundidade e
compromisso com as comunidades
detentoras desses saberes? A
presença, maior ou menor, ou a
ausência dos sabere
s tradicionais não
eurocêntricos condiciona todas as
perguntas seguintes. Se eles não são
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Graduação de Estudos Latino
-
mericanos da UnB e o Núcleo
Intercultural Insikiran da UFRR.
O que procuro detectar, desde
então, é a intensidade com que a
cultura ocidental é difundida nas
universidades, como modelo de
entificação, não somente intelectual
e política, mas também estética,
simbólica e afetiva. Essa identificação
forçada, ou pelo menos programada e
em grande parte irrefletida,
é resultado
da exclusividade
com que as disciplinas acadêmic
as
representam e objetificam as nações
indígenas, quilombolas, as
comunidades negras, as culturas
populares e os demais povos
tradicionais. Neste contexto, a primeira
pergunta que devemos fazer para
avaliar a diversidade epistêmica e
ões de ensino é:
quantos e quais saberes não
-
ocidentais e tradicionais são
ensinados? E se são ensinados, com
que grau de detalhe, profundidade e
compromisso com as comunidades
detentoras desses saberes? A
presença, maior ou menor, ou a
s tradicionais não
-
eurocêntricos condiciona todas as
perguntas seguintes. Se eles não são
ensinados significa que não existe
ainda um movimento alternativo em
direção a outros tipos de pensamento
e outras epistemes. Se eles são
ensinados, há que investigar
epistêmica e política gerada com sua
presença.
Uma vez identificada a riqueza
e a diversidade das nossas tradições
de conhecimento, faz
observar se sua presença é justificada
pela episteme dominante. O
eurocentrismo pode sobreviver
operação de traduzir o saber não
ocidental condicionalmente incluído;
no movimento contrário, a diversidade
epistêmica consiste na convivência de
saberes diferentes sem a necessidade
de serem traduzidos, ou às vezes
reduzidos aos termos da episteme
ocidental. À
presença dominante, no
currículo, da episteme ocidental,
devemos contrapor a crítica
descolonizadora, que funcionará como
um filtro acerca dos aspectos que
poderão continuar e aqueles cujo
potencial de racismo e desqualificação
contra os povos ind
brasileiros tornam-
nos inaceitáveis
para a nova convivência epistêmica
equânime e plural que estamos no
caminho de construir. E se chamamos
311
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
ensinados significa que não existe
ainda um movimento alternativo em
direção a outros tipos de pensamento
e outras epistemes. Se eles são
ensinados, há que investigar
a tensão
epistêmica e política gerada com sua
Uma vez identificada a riqueza
e a diversidade das nossas tradições
de conhecimento, faz
-se necessário
observar se sua presença é justificada
pela episteme dominante. O
eurocentrismo pode sobreviver
na
operação de traduzir o saber não
-
ocidental condicionalmente incluído;
no movimento contrário, a diversidade
epistêmica consiste na convivência de
saberes diferentes sem a necessidade
de serem traduzidos, ou às vezes
reduzidos aos termos da episteme
presença dominante, no
currículo, da episteme ocidental,
devemos contrapor a crítica
descolonizadora, que funcionará como
um filtro acerca dos aspectos que
poderão continuar e aqueles cujo
potencial de racismo e desqualificação
contra os povos ind
ígenas e afro-
nos inaceitáveis
para a nova convivência epistêmica
equânime e plural que estamos no
caminho de construir. E se chamamos
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
de eurocentrismo a episteme básica
organizadora da nossa academia,
podemos chamar de euroexclusivismo
à
precedência incondicional da
episteme ocidental por sobre qualquer
outro tipo ou origem de saber,
inclusive sem nenhum filtro antirracista
e anti-
discriminador. Para além do
eurocentrismo, nosso combate
descolonizante, portanto, deve dirigir
se prioritar
iamente a superar o
euroexclusivismo. Enquanto o
eurocentrismo foi a
episteme
implantada na fundação das nossas
universidades, o
euroexclusivismo é a
sua prática
contínua e absolutizada.
Reiterando o argumento
anterior,
oEpistemômetro visa capta
momento inicial de um processo de
mudança no padrão estabelecido de
produção e reprodução do
conhecimento acadêmico e de ensino
no Brasil. Ao longo de todo o século
XX, não houve praticamente nenhuma
proposta concreta de revisão nessa
área. O esforço f
oi basicamente de
ampliação da oferta de vagas, cursos
e de ampliação do número de
universidades. Paralelamente, ocorreu
um aprofundamento das relações da
comunidade acadêmica brasileira,
tanto nas Ciências Exatas quanto nas
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
de eurocentrismo a episteme básica
organizadora da nossa academia,
podemos chamar de euroexclusivismo
precedência incondicional da
episteme ocidental por sobre qualquer
outro tipo ou origem de saber,
inclusive sem nenhum filtro antirracista
discriminador. Para além do
eurocentrismo, nosso combate
descolonizante, portanto, deve dirigir
-
iamente a superar o
euroexclusivismo. Enquanto o
episteme
ocidental
implantada na fundação das nossas
euroexclusivismo é a
contínua e absolutizada.
Reiterando o argumento
oEpistemômetro visa capta
r o
momento inicial de um processo de
mudança no padrão estabelecido de
produção e reprodução do
conhecimento acadêmico e de ensino
no Brasil. Ao longo de todo o século
XX, não houve praticamente nenhuma
proposta concreta de revisão nessa
oi basicamente de
ampliação da oferta de vagas, cursos
e de ampliação do número de
universidades. Paralelamente, ocorreu
um aprofundamento das relações da
comunidade acadêmica brasileira,
tanto nas Ciências Exatas quanto nas
Humanas, com as comunidades
aca
dêmicas europeia e norte
americana. De fato, com a ampliação
dos programas de Pós Graduação,
intensificou-
se ainda mais a
importação de teorias e métodos
desenvolvidos nos Estados Unidos e
na Europa para serem aplicados no
ensino e na pesquisa no Brasil.Ao
observar mais de perto a aplicação
das duas leis subsequentes à LDB, a
saber, a Lei 10.639 e a Lei 11.645,
podemos ser levados a concluir que
talvez sua mais importante
contribuição para a superação do
eurocentrismo
seja a abertura temática
que elas provo
caram. O campo
interdisciplinar aparece quase
automaticamente no seu horizonte,
pois as expressões culturais e
científicas não-
ocidentais a serem
ensinadas não se organizam segundo
a lógica disciplinar humboldtiana,
exigindo, portanto, a articulação de
abo
rdagens próprias de várias
disciplinas para dar conta de uma área
de saber específica.
A seguir apresento algumas
ferramentas metodológicas
descolonizadoras básicas já adotadas
no Brasil em uma linha temporal:
● 1996- LDB-
Educação escolar
312
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Humanas, com as comunidades
dêmicas europeia e norte
-
americana. De fato, com a ampliação
dos programas de Pós Graduação,
se ainda mais a
importação de teorias e métodos
desenvolvidos nos Estados Unidos e
na Europa para serem aplicados no
ensino e na pesquisa no Brasil.Ao
observar mais de perto a aplicação
das duas leis subsequentes à LDB, a
saber, a Lei 10.639 e a Lei 11.645,
podemos ser levados a concluir que
talvez sua mais importante
contribuição para a superação do
seja a abertura temática
caram. O campo
interdisciplinar aparece quase
automaticamente no seu horizonte,
pois as expressões culturais e
ocidentais a serem
ensinadas não se organizam segundo
a lógica disciplinar humboldtiana,
exigindo, portanto, a articulação de
rdagens próprias de várias
disciplinas para dar conta de uma área
A seguir apresento algumas
ferramentas metodológicas
descolonizadoras básicas já adotadas
no Brasil em uma linha temporal:
Educação escolar
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
indígena bilíngue
● 2003-
Lei 10.639
Obrigatoriedade do ensino da
História da África e da Cultura
Afro-Brasileira
● 2008 –
Lei 11.645
Obrigatoriedade do ensino da
Cultura Indígena
● 2008 -
Início do Prolind
(Licenciatura Intercultural
Indígena)
● UFABC-
Lei 11.145.20/7/2005
● UFOPA-
Lei 12.085/2009
● UNILAB Lei 12.289-
2010
●
UNILA Lei 12.189/12/1/2010
●
UFSB Lei 12.818/2013
Estas cinco universidades foram
construídas já com modelos
acadêmicos interdisciplinares; e em
termos dos parâmetros do
Epistemômetro, elas já formularam
suas gra
des curriculares mais
pluriepistêmicas, com a presença
significativa de temas e
abordagens africanas, latino
americanas e dos povos
tradicionais. A UFSB, em particular,
já formulou essa convivência
interepistêmica em um livro coletivo
de grande peso intele
acredito poderá servir de referência
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Lei 10.639
–
Obrigatoriedade do ensino da
História da África e da Cultura
Lei 11.645
–
Obrigatoriedade do ensino da
Início do Prolind
(Licenciatura Intercultural
Lei 11.145.20/7/2005
Lei 12.085/2009
2010
UNILA Lei 12.189/12/1/2010
UFSB Lei 12.818/2013
Estas cinco universidades foram
construídas já com modelos
acadêmicos interdisciplinares; e em
termos dos parâmetros do
Epistemômetro, elas já formularam
des curriculares mais
pluriepistêmicas, com a presença
significativa de temas e
abordagens africanas, latino
-
americanas e dos povos
tradicionais. A UFSB, em particular,
já formulou essa convivência
interepistêmica em um livro coletivo
de grande peso intele
ctual, que
acredito poderá servir de referência
para as outras quatro em particular,
e para as demais em geral.
Na seção abaixo, extraímos os
marcos de referência epistêmica das
ementas das disciplinas do Encontro
de Saberes ministradas até agora
pelos m
estres e mestras em dezoito
universidades8
. A riqueza dos temas e
das abordagens não
parâmetro concreto e eficaz da
incompletude, do silenciamento, das
representações parciais e distorcidas
que caracterizam o currículo
eurocentrado vigente
universidades. A lista descreve a
imensa diversidade de saberes (e a
diversidade epistêmica) trazida para as
universidades nos últimos treze anos.
Lembremos aqui um ponto ao qual
voltaremos ao discorrer sobre as
dimensões analíticas do
Epistemôm
etro: todas as disciplinas
abaixo foram ministradas por mestres
e mestras que pertencem às
comunidades onde circulam os
saberes ensinados. Ou seja, essa
diversidade de saberes chega, pela
primeira vez na história do nosso
7
Ver Tugny e Gonçalves (2020)
8Para um
quadro geral da exp
Encontro de Saberes, ver Carvalho
(2020).
313
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
para as outras quatro em particular,
e para as demais em geral.
7
Na seção abaixo, extraímos os
marcos de referência epistêmica das
ementas das disciplinas do Encontro
de Saberes ministradas até agora
estres e mestras em dezoito
. A riqueza dos temas e
das abordagens não
-ocidentais é um
parâmetro concreto e eficaz da
incompletude, do silenciamento, das
representações parciais e distorcidas
que caracterizam o currículo
eurocentrado vigente
nas nossas
universidades. A lista descreve a
imensa diversidade de saberes (e a
diversidade epistêmica) trazida para as
universidades nos últimos treze anos.
Lembremos aqui um ponto ao qual
voltaremos ao discorrer sobre as
dimensões analíticas do
etro: todas as disciplinas
abaixo foram ministradas por mestres
e mestras que pertencem às
comunidades onde circulam os
saberes ensinados. Ou seja, essa
diversidade de saberes chega, pela
primeira vez na história do nosso
Ver Tugny e Gonçalves (2020)
quadro geral da exp
ansão do
Encontro de Saberes, ver Carvalho
e Vianna
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
ensino superior,
e integralmente,
através das vozes e dos corpos dos
mestres e mestras que são seus
representantes primeiros,
mediação da classe acadêmica
eurocêntrica branca
. Apesar de
extensa, julgamos imprescindível
apresentar a inovação epistêmica
completa para que possamos
compara
r nossa situação com a das
universidades dos outros continentes,
principalmente da América Latina, da
África, da Ásia e da Oceania. É bem
provável que já tenhamos feito
emergir, na nossa rede de
universidades, um quadro de
diversidade epistêmica, incluindo
tradições de saberes de transmissão
oral, dos mais amplos entre as
universidades do mundo.
Ampliação Epistêmica nas
Disciplinas do Encontro de Saberes
- 2010-2022
1- UnB
-
Arquitetura Tradicional Xinguana.
Amary Yawalapiti / Maniwa
-
Diálogos com o Xamã. Davi
Kopenawa.
-
Educação Ambiental. Benki
Ashaninka.
-
Política e espiritualidade Tukano.
Álvaro Tukano e Casimiro Tukano
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
e integralmente,
através das vozes e dos corpos dos
mestres e mestras que são seus
representantes primeiros,
sem
mediação da classe acadêmica
. Apesar de
extensa, julgamos imprescindível
apresentar a inovação epistêmica
completa para que possamos
r nossa situação com a das
universidades dos outros continentes,
principalmente da América Latina, da
África, da Ásia e da Oceania. É bem
provável que já tenhamos feito
emergir, na nossa rede de
universidades, um quadro de
diversidade epistêmica, incluindo
as
tradições de saberes de transmissão
oral, dos mais amplos entre as
Ampliação Epistêmica nas
Disciplinas do Encontro de Saberes
Arquitetura Tradicional Xinguana.
Kamayurá.
Diálogos com o Xamã. Davi
Educação Ambiental. Benki
Política e espiritualidade Tukano.
Álvaro Tukano e Casimiro Tukano
-
Mito e Cosmologia Indígena
Tukano.
-
Saberes sobre Cosmologias,
Narrativas, Artes e Biografias. Gilberto
Kubeo e Álvaro Tukano.
-
Saberes e práticas: cantos e artes
das Nações do Alto Xingu. Arifirá
Matipu.
-
Plantas Medicinais. Mestra Lucely
Pio.
-
Farmacopeia e Medicina Quilombola
Lucely Pio.
-
Saberes Quilombolas. Mestre
Antônio Bispo dos Santos.
-
Política e Gestão da Terra
Bispo.
-
Cultura Kalunga. Procópia dos
Santos Rosa; Natalina
Rosa
/ Daínda; Fiota
Deuzami F. Conceição.
-
A tradição Nagô e o
Recife. Mãe Lu de Yemanjá
Lúcia Costa.
-
Cosmologia do Candomblé
Vestimentas
Sagradas. Mãe Dora de
Oyá / Dora Barreto.
-
Cosmovisão da Nação Congo
Angola. Tata Mutá Imê
dos Santos.
-
O Reinado e a tradição dos Artu
José Bonifácio da Luz (Bengala) e
Geraldo Bonifácio da Luz (Bingueiro).
-
Congado. Eli Benedito.
-
Congado e Moçambique. Zé Jerome.
- Bumba-meu-
boi: Corpo, performance
e artesanato. Gilvan do Vale e
Tamatatíua Freire.
- Bumba-meu-
boi: Canto e co
de toadas. Tamatatíua Freire.
-
Cacuriá. Oficineiros
Cristiano Olímpio e Eliane.
314
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Mito e Cosmologia Indígena
. Álvaro
Saberes sobre Cosmologias,
Narrativas, Artes e Biografias. Gilberto
Kubeo e Álvaro Tukano.
Saberes e práticas: cantos e artes
das Nações do Alto Xingu. Arifirá
Plantas Medicinais. Mestra Lucely
Farmacopeia e Medicina Quilombola
.
Saberes Quilombolas. Mestre
Antônio Bispo dos Santos.
Política e Gestão da Terra
. Antônio
Cultura Kalunga. Procópia dos
Santos Rosa; Natalina
dos Santos
/ Daínda; Fiota
Kakunga /
Deuzami F. Conceição.
A tradição Nagô e o
Candomblé de
Recife. Mãe Lu de Yemanjá
/ Maria
Cosmologia do Candomblé
-
Sagradas. Mãe Dora de
Cosmovisão da Nação Congo
Angola. Tata Mutá Imê
/ Jorge Barreto
O Reinado e a tradição dos Artu
ros.
José Bonifácio da Luz (Bengala) e
Geraldo Bonifácio da Luz (Bingueiro).
Congado. Eli Benedito.
Congado e Moçambique. Zé Jerome.
boi: Corpo, performance
e artesanato. Gilvan do Vale e
boi: Canto e co
mposição
de toadas. Tamatatíua Freire.
Cacuriá. Oficineiros
-Brincantes:
Cristiano Olímpio e Eliane.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
-
Carimbó. Lucas Bragança.
-
Cavalo Marinho. Biu Alexandre
-
Folia do Divino e Catira. Oficineiro
Brincante John Meirelles.
-
Viola e catira. Badia Medeiros
2-UFMG
-
A Cosmociência Guarani e
Kaiowá.Valdomiro Flores.
- OjuhuÑe’é /
MbopajeÑe’e. Nhanderu
Valdomiro Flores.
- Saberes na Aldeia
Yynn
Wherá
Alcindo Wherá Tupã.
-
Saberes na Aldeia Velha
Maria D’Ajuda Alves da Conceição
- O livro vivo Huni-
Kuin: narrativas,
plantas e imagens. Maria Carlos
Kaxinawa, Joaquim Maná Kaxinawa,
Osmar Kaxinawa, Zezinho Yube.
-
Cosmociências: Arte da Miçanga.
Lira HuniKuin e
Maria HuniKuin;
Creuza Prumkwyj
Krahô e Leila Jôxa
Krahô, Sueli Maxakali e Eliane
Maxakali.
-
Arquitetura e cosmociência Xacriabá.
Lourdes Evaristo, Libertina Ferro
-
Saberes Tradicionais: Cosmociência
culinária e construção Xacriabá.
Lourdes Seixas Evarista; Rosa Seixas
Ferro Bezerra; Isabel Cavalcante
Bezerra;
Domingas dos Santos Aquino
Oliveira, Nicolau Gonçalves Alquimim,
Telvina Moura Bezerra Alkimim,
Senhorinha Dias de Sousa Franco,
Vanginei Leite Silva.
- Territórios do Barro. D
alzira Xacriabá
e Manoel Xacriabá.
-
Saberes Tradicionais: construção da
Casa Maxacali. Sueli e Isael Maxacali
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Carimbó. Lucas Bragança.
Cavalo Marinho. Biu Alexandre
.
Folia do Divino e Catira. Oficineiro
-
Brincante John Meirelles.
Viola e catira. Badia Medeiros
.
A Cosmociência Guarani e
MbopajeÑe’e. Nhanderu
Yynn
Morothi
Alcindo Wherá Tupã.
Saberes na Aldeia Velha
. Jaçanã/
Maria D’Ajuda Alves da Conceição
.
Kuin: narrativas,
plantas e imagens. Maria Carlos
Kaxinawa, Joaquim Maná Kaxinawa,
Osmar Kaxinawa, Zezinho Yube.
Cosmociências: Arte da Miçanga.
Maria HuniKuin;
Krahô e Leila Jôxa
Krahô, Sueli Maxakali e Eliane
Arquitetura e cosmociência Xacriabá.
Lourdes Evaristo, Libertina Ferro
.
Saberes Tradicionais: Cosmociência
-
culinária e construção Xacriabá.
Lourdes Seixas Evarista; Rosa Seixas
Ferro Bezerra; Isabel Cavalcante
Domingas dos Santos Aquino
Oliveira, Nicolau Gonçalves Alquimim,
Telvina Moura Bezerra Alkimim,
Senhorinha Dias de Sousa Franco,
alzira Xacriabá
Saberes Tradicionais: construção da
Casa Maxacali. Sueli e Isael Maxacali
-
Cinema e Pensamento Xavante.
Benjamin Wa’Aiho; Paixão Wa’umhi;
Divino Tserewahú.
-
Cinema e Pensamento Kino
Maxakali. Suely Maxakali (Xoeni
Maxakani) e Isael Maxakali (Yaet
Maxakani).
-
Artes e Ofícios dos Saberes
Tradicionais: Políticas da Terra.
Cacique Babau /
Rosivaldo Ferreira da
Silva, Maria da Glória de Jesus e
Glicéria Jesus da Silva Tu
Dona Teresa Amarília Flores
Kaiowa;
Maria Luzia Sidônio
Ferreira de Oliveira
;
Pinto.
-
Dinâmica das Manivas do Médio.
Solimões. Maria Eugênia e Margarida
Meireles.
Cultura e Cultivo dos Quilombos. Badu
/ Silvio Siqueira e Sebastiana de
Oxossi / Sebastiana G.
-
Confluências quilombolas contra
colonização. Antônio Bispo dos
Santos, Maria Luíza Marcelino.
-
Curas e cuidados. Saberes no
Quilombo do Mato do Tição. Badu
Silvio da Siqueira.
-
Curas e cuidados Saberes no
Quilombo do Cedro. Lucely Morais Pi
-
Artes e ofícios dos saberes
tradicionais: curas e cuidados.
Morais Pio, Badu /
Silvio da Siqueira,
Aparecida Arruda.
-
Catar folhas: saberes e fazeres do
povo de axé. Mãe Efigênia Maria da
Conceição / Mametu
Muiandê; Pedrina
Lourdes dos
Santos, IyanifaIfadara
Nilsia dos Santos, Ricardo de Moura,
Makota Kidoiale
/ Cássia Cristina da
Silva.
315
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Cinema e Pensamento Xavante.
Benjamin Wa’Aiho; Paixão Wa’umhi;
Cinema e Pensamento Kino
Maxakali. Suely Maxakali (Xoeni
Maxakani) e Isael Maxakali (Yaet
Artes e Ofícios dos Saberes
Tradicionais: Políticas da Terra.
Rosivaldo Ferreira da
Silva, Maria da Glória de Jesus e
Glicéria Jesus da Silva Tu
pinambá;
Dona Teresa Amarília Flores
Guarani-
Maria Luzia Sidônio
; Joelson
;
Makota Valdina
Dinâmica das Manivas do Médio.
Solimões. Maria Eugênia e Margarida
Cultura e Cultivo dos Quilombos. Badu
/ Silvio Siqueira e Sebastiana de
Oxossi / Sebastiana G.
R. Silva.
Confluências quilombolas contra
-
colonização. Antônio Bispo dos
Santos, Maria Luíza Marcelino.
Curas e cuidados. Saberes no
Quilombo do Mato do Tição. Badu
/
Curas e cuidados Saberes no
Quilombo do Cedro. Lucely Morais Pi
o.
Artes e ofícios dos saberes
tradicionais: curas e cuidados.
Lucely
Silvio da Siqueira,
Catar folhas: saberes e fazeres do
povo de axé. Mãe Efigênia Maria da
Muiandê; Pedrina
Santos, IyanifaIfadara
/
Nilsia dos Santos, Ricardo de Moura,
/ Cássia Cristina da
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Chamando o Mato de Volta.
Makota
Valdina Pinto; Pedrina Lourdes
Santos;
-
Pensamento e ação comunicacional
em comunidades tradicionais.
Kidoiale
/ Cássia Cristina da Silva.
- Cantos Afro-
brasileiros: brincando e
resistindo na tradição. Jorge Antônio
dos Santos e José Bonifácio.
-
Ingira de Ingoma: Africanias
Fagundes. Júlio Antônio Filho.
-
Ingira de Ingoma: Africanias
Jorge Antônio dos Santos, João
Batista da Luz, José Bonifácio da Luz,
Geraldo Bonifácio da Luz
–
-
Ingira de Ingoma: Africanias
Tabatinga. Maria Aparecida Silva
Martins
-
Ingira de Ingoma: Africanias
Expedicto da Luz Ferreira.
- Dança
s, cantos, toques e
instrumentos tradicionais.
Antônio Luiz
de Matos; Arnaldo de Lima; João do
Pife; José Bonifácio da Luz; Lazinho
Nilton Lázaro.
-
Saberes da capoeira angola
Bosco Alves da Silva.
Professores:
José Alfredo Bertoli .
-
Artes e Poéticas Ancestrais
Capoeiragem e memória nas Gerais.
Dunga -
Amadeu Martins; Jurandir
Jurandir Francisco do Nascimento;
Primo -
Edson Moreira da Silva; Mão
Branca -
William Douglas Guimarães;
Índia Itatiaia -
Tânia Mara dos Santos
Borges.
-
Cosmociências: Saberes e Fazeres da
Terra.
Cacique Babau; Cacique Nailton
Pataxó; Dirceu Pereira; Isael
Maxakali
; Japira Pataxó
Ferreira
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Chamando o Mato de Volta.
Mestres:
Valdina Pinto; Pedrina Lourdes
Pensamento e ação comunicacional
em comunidades tradicionais.
Makota
/ Cássia Cristina da Silva.
brasileiros: brincando e
resistindo na tradição. Jorge Antônio
dos Santos e José Bonifácio.
Ingira de Ingoma: Africanias
Fagundes. Júlio Antônio Filho.
Ingira de Ingoma: Africanias
Arturos.
Jorge Antônio dos Santos, João
Batista da Luz, José Bonifácio da Luz,
–
Bingueiro.
Ingira de Ingoma: Africanias
Tabatinga. Maria Aparecida Silva
Ingira de Ingoma: Africanias
Jatobás.
s, cantos, toques e
Antônio Luiz
de Matos; Arnaldo de Lima; João do
Pife; José Bonifácio da Luz; Lazinho
/
Saberes da capoeira angola
. João
Professores:
Artes e Poéticas Ancestrais
–
Capoeiragem e memória nas Gerais.
Amadeu Martins; Jurandir
-
Jurandir Francisco do Nascimento;
Edson Moreira da Silva; Mão
William Douglas Guimarães;
Tânia Mara dos Santos
Cosmociências: Saberes e Fazeres da
Cacique Babau; Cacique Nailton
Pataxó; Dirceu Pereira; Isael
; Japira Pataxó
; Joelson
José Bonifácio da Luz (Bengala);
Primo (Edson Moreira da Silva)
Mametu
Kitaloyá; Maria Muniz; Sueli
Maxa
kali; Valdemar Xakriabá
3-UFJF
-
Agroecologia ainda que tardia. A
experiência da Casa de Sementes da
comunidade Barra do Touro
Serranópolis, MG -
e a agroecologia
em Araponga -
MG. Geraldo Gomes
Barbosa; Gilmar de Oliveira; Sebastião
Estêvão, Sebastião
Sebastiana dos Santos, Maria
Madalena da Silva.
-
Agroecologia: os caminhos, saberes
e possibilidades da agroecologia.
Gilmar de Oliveira; Joseleno Anacleto
da Silva; Gilberto F. Corrêa .
-
Cultura Quilombola, Resistência em
Festa. Tiana (Sebast
Paulo Rogério dos Santos; Jeferson
Alves de Oliveira (Quilombo do
Tamandaré-
Guaratinguetá/SP).
-
Sabedoria Quilombola:
conhecimentos ligados ao corpo, à
cura, à natureza, cultura e história.
Sebastiana de Oxóssi (Carrapatos da
Tabatinga,
MG); Paulo Rogério dos
Santos (Miracema, RJ); Jeferson Alves
de Oliveira (Quilombo do Tamandaré
Guaratinguetá/SP).
-
Cultura Indígena na Brisa da Cura. A
resistência e as cosmociências
Krenak, Tukano e Ashaninka. Ailton
Krenak (MG), Álvaro Tukano (AM) e
Benki
Ashaninka (AC).
-
Sabedoria Indígena: saberes,
cosmologias, perspectivas filosóficas,
políticas, artísticas e medicinais.
316
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
José Bonifácio da Luz (Bengala);
Primo (Edson Moreira da Silva)
;
Kitaloyá; Maria Muniz; Sueli
kali; Valdemar Xakriabá
Agroecologia ainda que tardia. A
experiência da Casa de Sementes da
comunidade Barra do Touro
-
e a agroecologia
MG. Geraldo Gomes
Barbosa; Gilmar de Oliveira; Sebastião
Estêvão, Sebastião
Barbosa,
Sebastiana dos Santos, Maria
Agroecologia: os caminhos, saberes
e possibilidades da agroecologia.
Gilmar de Oliveira; Joseleno Anacleto
da Silva; Gilberto F. Corrêa .
Cultura Quilombola, Resistência em
Festa. Tiana (Sebast
iana de Oxóssi);
Paulo Rogério dos Santos; Jeferson
Alves de Oliveira (Quilombo do
Guaratinguetá/SP).
Sabedoria Quilombola:
conhecimentos ligados ao corpo, à
cura, à natureza, cultura e história.
Sebastiana de Oxóssi (Carrapatos da
MG); Paulo Rogério dos
Santos (Miracema, RJ); Jeferson Alves
de Oliveira (Quilombo do Tamandaré
-
Cultura Indígena na Brisa da Cura. A
resistência e as cosmociências
Krenak, Tukano e Ashaninka. Ailton
Krenak (MG), Álvaro Tukano (AM) e
Ashaninka (AC).
Sabedoria Indígena: saberes,
cosmologias, perspectivas filosóficas,
políticas, artísticas e medicinais.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Mestres: Ailton Krenak (MG); Álvaro
Tukano (AM); Dauá Puri (RJ).
4-UFVJM
-
Farmacopeia do Cerrado. Dalci José
de Carvalho e Dona Maria do Rosário.
-
Cosmologias Pataxó e Pankarau.
Gesilene Braz da Conceição e Maria
Aparecida da Conceição de Matos.
-
Arte de partejar. Maria da Conceição
Carvalho.
-
Cheiros do Mato: Saberes
tradicionais no cuidado com a terra.
Côca, e Mestre João Domingos.
-
Ancestralidade, Saúde e Resistência:
Saberes Pankararu /
Pataxó. Geo
Pataxó e Cida Pankararu
-
Espiritualidade, Corpos Brincantes e
Sonoros. Antônio Bastião, Ge
Andrezinho.
5-UEMG
-
Saberes das Danças, Cantos e
Músicas Tradicionais. Amadeu Martins
-
Capoeira; Dirceu Ferreira Sérgio:
Quilombola; Régis Moreira Pinto
Kitanji - Pai de Santo.
-
Saberes e Fazeres Tradicionais de
Cura e Cuidado. Altino Fer
Silva; Maria Catarina de Souza;
Pedrina de Lourdes Santos.
-
Saberes das Lutas pela Terra.
Argemiro Graciano de Jesus;
Terezinha Sabino de Souza; Miriam
Aprigio; Tatiane Oliveira Pereira;
Clarindo Pereira dos Santos;
Babalorixá Everton de Iyemon
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Mestres: Ailton Krenak (MG); Álvaro
Tukano (AM); Dauá Puri (RJ).
Farmacopeia do Cerrado. Dalci José
de Carvalho e Dona Maria do Rosário.
Cosmologias Pataxó e Pankarau.
Gesilene Braz da Conceição e Maria
Aparecida da Conceição de Matos.
Arte de partejar. Maria da Conceição
Cheiros do Mato: Saberes
tradicionais no cuidado com a terra.
Côca, e Mestre João Domingos.
Ancestralidade, Saúde e Resistência:
Pataxó. Geo
Espiritualidade, Corpos Brincantes e
Sonoros. Antônio Bastião, Ge
ni,
Saberes das Danças, Cantos e
Músicas Tradicionais. Amadeu Martins
Capoeira; Dirceu Ferreira Sérgio:
Quilombola; Régis Moreira Pinto
- Tata
Saberes e Fazeres Tradicionais de
Cura e Cuidado. Altino Fer
reira da
Silva; Maria Catarina de Souza;
Pedrina de Lourdes Santos.
Saberes das Lutas pela Terra.
Argemiro Graciano de Jesus;
Terezinha Sabino de Souza; Miriam
Aprigio; Tatiane Oliveira Pereira;
Clarindo Pereira dos Santos;
Babalorixá Everton de Iyemon
já.
6-UFF
-
Saberes do Corpo e Aprendizagem
Mbyá. Augustinho, Silva e Marciana.
Para Mirim.
-
Guarani: Nhandereko
Agostinho da Silva e Marciana
Oliveira- Pajé Mbya-
Guarani da aldeia
Araponga em Parati. Professores
Abrahão de Oliveira Santos
-
Saberes indígenas. Félix, Marise,
Lana. Professora Mariana
-
Saberes do Corpo e Aprendizagem
Caiçaras. Altamiro dos Santos e
Benedita dos Santos
/
-
Modos de Viver, de Ensinar e
Aprender na Natureza e no Conflito.
Altamiro dos Santos;
Maurício dos Santos Rodrigues
Dica.
-
Saberes do Corpo e Aprendizagem
no Jongo. Manoel Seabra.
-
Cantos e Toques nos Jongos e
Quilombos. Jeferson Alves de Oliveira
/
Jefinho; Paulo Rogério da Silva
Rogério de Oxossi.
-
Cantos e Toques nos Jongos e
Quilombos. Toninho Canecão e
Fatinha.
-
Oralidade e as Expressões
no Terreiro. Ogã
Osvaldo Sena.
-
Ritmos e Performances do Terreiro.
Ogã
Kotokinho/Osvaldo Sena.
-
Saberes de Terreiro.
Braga Alves, Tata Ia. Nkisi
Marcia Regina Vital da Silva, Nagbo
Vodúnnòn Mɛjitó –
Marcia
-
A Oralidade e as Expressões
Rítmicas no Terreiro
Nascimento Fernandes.
317
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Saberes do Corpo e Aprendizagem
Mbyá. Augustinho, Silva e Marciana.
Guarani: Nhandereko
Mbya.
Agostinho da Silva e Marciana
Guarani da aldeia
Araponga em Parati. Professores
Abrahão de Oliveira Santos
–
Saberes indígenas. Félix, Marise,
Lana. Professora Mariana
Paladino.
Saberes do Corpo e Aprendizagem
Caiçaras. Altamiro dos Santos e
/
Dica
Modos de Viver, de Ensinar e
Aprender na Natureza e no Conflito.
Altamiro dos Santos;
Benedita
Maurício dos Santos Rodrigues
/ Dona
Saberes do Corpo e Aprendizagem
no Jongo. Manoel Seabra.
Cantos e Toques nos Jongos e
Quilombos. Jeferson Alves de Oliveira
Jefinho; Paulo Rogério da Silva
/
Cantos e Toques nos Jongos e
Quilombos. Toninho Canecão e
Oralidade e as Expressões
Rítmicas
Kotoquinho –
Ritmos e Performances do Terreiro.
Kotokinho/Osvaldo Sena.
Saberes de Terreiro.
José Roberto
Braga Alves, Tata Ia. Nkisi
Luazemi;
Marcia Regina Vital da Silva, Nagbo
Marcia
de Sàkpáta.
A Oralidade e as Expressões
Rítmicas no Terreiro
. Antônio do
Nascimento Fernandes.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
-
Educação, Corpo e Espiritualidade
Saberes De Terreiro.
Roberto Braga
Alves, Tata Ia Nkisi
Luazemi.
-
Educação, Corpo e Espiritualidade
Saberes De Terreiro.
Marcia Regina
Vital da Silva, Nagbo
Vodúnnòn
Marcia de Sàkpáta.
-
Formas de Expressão e Saberes
Negros. Fatinha e
Fatinha (Jongo de
Pinheiral) e Suellen
Tavares (Jongo da
Serrinha); Ogã
Kotoquinho (Filhos de
Gandhi e Ilé Àṣẹ Alá
Korowo) e Caio
(Ilé Àṣẹ AláKorowo).
-
Encontro de Saberes: Ritmos e
Performances no Reizado e na
Palhaçaria. Expedito Do Pifo e do
Reizado (Palhaço Mateu).
-
Encontro de Saberes: Ritmos e
Performances do Cordel. Edmilson
Santini.
-
Cantos e Toques no Repente. Miguel
Bezerra e Ednaldo Santos.
-
(Re)existências: Culturas urbanas e
suas relações com saberes
tradicionais. Vogue -
Mestra Idra Maria
(KikiHouseofMamba
Negra); Poetas do
Vagão e Dudu do Morro Agudo.
7-UFRJ
-
Saberes e Ocupações Tradicionais.
Felix, Catarina e Miguel.
-
Cultura Brasileira e Dança
Maracatu, Coco, Reisado, Frevo,
Samba. Maurício Soares; Marcos
Gomes do Maracatu; Júlia Muniz da
Aldeia Maracanã; Patrão Neilton
Santana de Sergipe ; D. Aurinha;
Negadeza; Leonor de Moraes; Katia
Juliana; Matheus Marcos; Otac
Cabral de Arruda; Manoela Dionísio.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Educação, Corpo e Espiritualidade
-
Roberto Braga
Luazemi.
Educação, Corpo e Espiritualidade
Marcia Regina
Vodúnnòn
Mɛjitó
Formas de Expressão e Saberes
Fatinha (Jongo de
Tavares (Jongo da
Kotoquinho (Filhos de
Korowo) e Caio
Encontro de Saberes: Ritmos e
Performances no Reizado e na
Palhaçaria. Expedito Do Pifo e do
Encontro de Saberes: Ritmos e
Performances do Cordel. Edmilson
Cantos e Toques no Repente. Miguel
Bezerra e Ednaldo Santos.
(Re)existências: Culturas urbanas e
suas relações com saberes
Mestra Idra Maria
Negra); Poetas do
Vagão e Dudu do Morro Agudo.
Saberes e Ocupações Tradicionais.
Cultura Brasileira e Dança
-
Maracatu, Coco, Reisado, Frevo,
Samba. Maurício Soares; Marcos
Gomes do Maracatu; Júlia Muniz da
Aldeia Maracanã; Patrão Neilton
Santana de Sergipe ; D. Aurinha;
Negadeza; Leonor de Moraes; Katia
Juliana; Matheus Marcos; Otac
ílio
Cabral de Arruda; Manoela Dionísio.
8-UNIRIO
-
Laboratório de Dança Popular:
Sotaques do Bumba
Maranhão. Nadir Olga Cruz; Florinaldo
Silva, Maria José Lima.
9-UNIFESP
-
Encontro de Saberes em Saúde.
Lucely Moraes Pio; Carlos Papá;
Catarina Santos; Makota
-
Cosmociências: Saberes do Batuque.
Mestres: Cica de Oyó ; Michele de
Oxum; Rodrigo do Bará; Iyá
Nina Fola .
10-UFRGS
-
Artes Aplicadas: poéticas,
performances e imagens nos territórios
negros de Porto Alegre. Jorge
Domingos.
-
Sociedades e Cosmovisões:
memórias e histórias afro
em Porto Alegre. Eliane Rodrigues
Espíndola.
-
Artes Aplicadas: samba e carnava
em Porto Alegre. Paraquedas
Rodrigues Espíndola.
-
Plantas e Espírito: o uso de plantas e
os fundamentos da vida. Iracema Rã
Nga Nascimento –
Xamã Kaingang.
-
Alimento e rito: os alimentos
sagrados e as sementes doadas por
Nhanderu. Cacique Ma
Oliveira.
-
Sociedades e Cosmovisões. Janja
Rosângela da Silva; Ellias;
António Matos;
Morinico;
Iara Deodoro.
-
Plantas e espírito: o uso de plantas e
os fundamentos da vida. Iracema Rã
Nga Nascimento.
318
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Laboratório de Dança Popular:
Sotaques do Bumba
-meu-boi do
Maranhão. Nadir Olga Cruz; Florinaldo
Silva, Maria José Lima.
Encontro de Saberes em Saúde.
Lucely Moraes Pio; Carlos Papá;
Catarina Santos; Makota
Kidoialê.
Cosmociências: Saberes do Batuque.
Mestres: Cica de Oyó ; Michele de
Oxum; Rodrigo do Bará; Iyá
Sandrali ;
Artes Aplicadas: poéticas,
performances e imagens nos territórios
negros de Porto Alegre. Jorge
Sociedades e Cosmovisões:
memórias e histórias afro
-brasileiras
em Porto Alegre. Eliane Rodrigues
Artes Aplicadas: samba e carnava
l
em Porto Alegre. Paraquedas
e Eliane
Rodrigues Espíndola.
Plantas e Espírito: o uso de plantas e
os fundamentos da vida. Iracema Rã
-
Xamã Kaingang.
Alimento e rito: os alimentos
sagrados e as sementes doadas por
Nhanderu. Cacique Ma
urício Messa de
Sociedades e Cosmovisões. Janja
/
Rosângela da Silva; Ellias;
Leci Matos;
Cacique Cirilo
Iara Deodoro.
Plantas e espírito: o uso de plantas e
os fundamentos da vida. Iracema Rã
-
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
11-UFPA
-
Música, Cultura Sociedade: Boi
Bumbá em Belém. Gi
lberto Mello
Beto.
-
Música, Cultura e Experiência
Pássaro Junino Tucano. Iracema
Oliveira, Rosa Silva.
-
Saberes e Fazeres Musicais: Oficina
de percussões do Carimbó. Lucas
Bragança.
- Diversidade e Diferença
Moça Nova e Festa do Mingau. Tixnair
Tembé.
-
Artes e ofícios do ato de nomear em
KA APOR. Mariuza
Ka’apor e Piriha
Ka apo.
12-UECE
-
Terra Toré: Tradição e
Espiritualidade dos Índios Pitaguary.
Raimundo Carlos da Silva (Pajé
Barbosa).
-
Torém e Espiritualidade Tremembé.
Luís Manuel do Nascimento (Pajé Luís
Caboclo; Francisco Marques do
Nascimento (Cacique João Venâncio).
- Tradições
Musicais da Cura:
Cantigas e Rezas no Cariri Cearense.
Maria de Fátima Monteiro Cosmo.
-
Plantas que Curam: o Conhecimento
das Mezinhas no Sertão do Ceará.
Lúcio Eufrásio de Oliveira.
13- UFCA
- Episte
mologia do Encontro de
Saberes:
Contextualização da
disciplina e da Tradição do Coco no
Cariri. Marinez Pereira do
Nascimento.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Música, Cultura Sociedade: Boi
-
lberto Mello
–
Música, Cultura e Experiência
Pássaro Junino Tucano. Iracema
Saberes e Fazeres Musicais: Oficina
de percussões do Carimbó. Lucas
- Festa da
Moça Nova e Festa do Mingau. Tixnair
Artes e ofícios do ato de nomear em
Ka’apor e Piriha
Terra Toré: Tradição e
Espiritualidade dos Índios Pitaguary.
Raimundo Carlos da Silva (Pajé
Torém e Espiritualidade Tremembé.
Luís Manuel do Nascimento (Pajé Luís
Caboclo; Francisco Marques do
Nascimento (Cacique João Venâncio).
Musicais da Cura:
Cantigas e Rezas no Cariri Cearense.
Maria de Fátima Monteiro Cosmo.
Plantas que Curam: o Conhecimento
das Mezinhas no Sertão do Ceará.
mologia do Encontro de
Contextualização da
disciplina e da Tradição do Coco no
Cariri. Marinez Pereira do
-
Saberes da cura, cantigas e rezas
no Cariri cearense: plantas medicinais
e tradição oral de rezas. Maria de
Fátima Cosmo. Assistente: Francisco
de Freitas.
-
Terreiros de Cando
Umbanda: A música sagrada. Isaac
de Oliveira Kassy.
-
Repentes e violeiros: música e
poesia oral. Ivan Granjeiro.
-
Reisados no Crajubar: os saberes e
fazeres musicais da região do
Crajubar. Maria de Fátima Cosmo.
-
Benditos e Incelências em Juaze
do Norte: A tradição dos cortejos
fúnebres. Neusa de Oliveira.
-
Banda Cabaçal: os instrumentos, a
música e a performance. Raimundo
Aniceto.
-
Instrumentos da música tradicional
do Cariri: rabeca, pife, zabumba.
Francisco de Freitas, Antônio
Barroso,
José Barroso, Gil Chagas.
14- UNILAB
-
Saberes Tradicionais e as
Universidades. Jorge dos Santos.
-
Saberes Indígenas e o Encontro de
Saberes. Cacique Sotero.
-
Mestres da Cultura e Políticas
Culturais. Dylla Costa Marques
Almeida. Gestores Público
Emmanuel Lopes, Henrique Rocha.
-
Saberes Indígenas e Quilombolas.
Cacica Pequena; Lucely Moraes Pio.
-
Saberes Sagrados e Saberes da
Vida. Mãe Zimá Ferreira da Silva,
Mestra Maria de Tiê,
319
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Saberes da cura, cantigas e rezas
no Cariri cearense: plantas medicinais
e tradição oral de rezas. Maria de
Fátima Cosmo. Assistente: Francisco
Terreiros de Cando
mblé e
Umbanda: A música sagrada. Isaac
Repentes e violeiros: música e
poesia oral. Ivan Granjeiro.
Reisados no Crajubar: os saberes e
fazeres musicais da região do
Crajubar. Maria de Fátima Cosmo.
Benditos e Incelências em Juaze
iro
do Norte: A tradição dos cortejos
fúnebres. Neusa de Oliveira.
Banda Cabaçal: os instrumentos, a
música e a performance. Raimundo
Instrumentos da música tradicional
do Cariri: rabeca, pife, zabumba.
Francisco de Freitas, Antônio
José Barroso, Gil Chagas.
Saberes Tradicionais e as
Universidades. Jorge dos Santos.
Saberes Indígenas e o Encontro de
Saberes. Cacique Sotero.
Mestres da Cultura e Políticas
Culturais. Dylla Costa Marques
Almeida. Gestores Público
s
Emmanuel Lopes, Henrique Rocha.
Saberes Indígenas e Quilombolas.
Cacica Pequena; Lucely Moraes Pio.
Saberes Sagrados e Saberes da
Vida. Mãe Zimá Ferreira da Silva,
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
15-UFSB
-
Tecnologia da cerâmica na tradição
do Rio Jequitin
honha. Dagmar Muniz
de Oliveira.
-
Cartografias da cerâmica: trajetórias
familiares e migração das técnicas.
Fernando.
-
Saberes dos manguezais. Pedrinho.
-
Construção naval no Extremo Sul da
Bahia. Louro: Lourival Bernardino dos
Santos.
- O conhecime
nto popular da Mata
Atlântica. Seu Beca.
- A vida na floresta. Oziel.
-
O homem e a floresta: conhecimento
tradicional e modos de vida Pataxó e
quilombola; ancestralidade quilombola
de Itacaré e Marambaia; estratégias de
organização política.Otília Mari
Nogueira.
-
Técnicas, tradições e escolas da
terra: Tradições quilombolas. Seu Edi.
-
O universo da cura indígena e a
transmissão do saber. Japira Pataxó.
-
Tradições e saberes dos Pataxó Hã
Hã
Hãe e Tupinambá. Maria Muniz.
-
O Candomblé: práticas da saúde e
cura. Eliomar de Jesus Almeida.
-
Candomblé Angola: história, mitos e
rituais. Mãe Ilsa / Mameto
Mukalê.
-
Introdução à cultura da Capoeira
Angola. Virgílio.
-
Fundamentos da Capoeira. Alan.
16-UFRR
- Artes e
ofícios dos saberes
tradicionais de matrizes africanas.
Mestres: Vera Aparecida de Souza
Mutalē / Ifaseyį.
Maria da Graças
Pereira Bahia/ Mãe Yatylyssa. Carlos
Alberto de Souza Fournier Filho
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Tecnologia da cerâmica na tradição
honha. Dagmar Muniz
Cartografias da cerâmica: trajetórias
familiares e migração das técnicas.
Saberes dos manguezais. Pedrinho.
Construção naval no Extremo Sul da
Bahia. Louro: Lourival Bernardino dos
nto popular da Mata
O homem e a floresta: conhecimento
tradicional e modos de vida Pataxó e
quilombola; ancestralidade quilombola
de Itacaré e Marambaia; estratégias de
organização política.Otília Mari
a
Técnicas, tradições e escolas da
terra: Tradições quilombolas. Seu Edi.
O universo da cura indígena e a
transmissão do saber. Japira Pataxó.
Tradições e saberes dos Pataxó Hã
Hãe e Tupinambá. Maria Muniz.
O Candomblé: práticas da saúde e
cura. Eliomar de Jesus Almeida.
Candomblé Angola: história, mitos e
Mukalê.
Introdução à cultura da Capoeira
Fundamentos da Capoeira. Alan.
ofícios dos saberes
tradicionais de matrizes africanas.
Mestres: Vera Aparecida de Souza
/
Maria da Graças
Pereira Bahia/ Mãe Yatylyssa. Carlos
Alberto de Souza Fournier Filho
/ Tata
Bokùlê; Jaqueline Michele Larre
Guterres /
Mãe Michele
Vicente Castro Ihuruana.
-
Plantas e Espíritos. Vera Aparecida
de Souza Mutalē
/ Ifaseyį; Maria da
Graças Pereira Bahia
-
Plantas e Espíritos. Maria da Graças
Pereira Bahia/ Mãe Yatylyssa; Carlos
Alberto de Souza Fournier Filho
Bokùlê.
-
Sociedade e Cosmovisão. Guterres
Mãe Michele de Oxum.
-
Linguagens e Narrativas.
Castro Ihuruana.
17-UFT
-
Encontro de Saberes: Artes e Ofícios
dos Saberes Tradicionais Quilombolas
e Indígenas: Saúde e Meio Ambiente.
Isaías; Roxão; Dainda; Antônio
Nrõmekma Xerente
Xerente (Tocantins-
TO)
18- UFG
-
Encontro de Saberes na UFG
Populares. Durval Martins Mestre
Goyano; Carlos Cesar Nascimento
Mendes; Peixinho; Gilvan do Vale.
Ao
olharmos para as inovações
pedagógicas acima descritas podemos
concluir que praticamente nenhuma
desses temas ou abordagens
contemplados nem nas disciplinas
nem nas ementas dos cursos vigentes
nessas universidades. A razão para
isso é simples, poré
refletida e nem sequer enunciada: com
320
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Bokùlê; Jaqueline Michele Larre
Mãe Michele
de Oxum;
Vicente Castro Ihuruana.
Plantas e Espíritos. Vera Aparecida
/ Ifaseyį; Maria da
/ Mãe Yatylyssa.
Plantas e Espíritos. Maria da Graças
Pereira Bahia/ Mãe Yatylyssa; Carlos
Alberto de Souza Fournier Filho
/ Tata
Sociedade e Cosmovisão. Guterres
/
Mãe Michele de Oxum.
Linguagens e Narrativas.
Vicente
Encontro de Saberes: Artes e Ofícios
dos Saberes Tradicionais Quilombolas
e Indígenas: Saúde e Meio Ambiente.
Isaías; Roxão; Dainda; Antônio
Nrõmekma Xerente
– Pajé do povo
TO)
; Pai Gil; Miró.
Encontro de Saberes na UFG
– Artes
Populares. Durval Martins Mestre
Goyano; Carlos Cesar Nascimento
Mendes; Peixinho; Gilvan do Vale.
olharmos para as inovações
pedagógicas acima descritas podemos
concluir que praticamente nenhuma
desses temas ou abordagens
estavam
contemplados nem nas disciplinas
nem nas ementas dos cursos vigentes
nessas universidades. A razão para
isso é simples, poré
m quase nunca
refletida e nem sequer enunciada: com
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
raríssimas exceções, nenhum projeto
político-
pedagógico de qualquer curso
aberto até hoje em nossas
universidades foi realizado em diálogo
com os povos tradicionais, com
atenção para seus anseios de
forma
ção da sua juventude
veremos nas dimensões do
Epistemômetro descritas abaixo, o
interesse epistêmico dos cursos antes
da chegada dos mestres refletiu
exclusivamente o interesse da classe
acadêmica branca eurocêntrica e
predominantemente burguesa
metropolitana.
Epistem
ômetro: Dimensões e
variáveis da descolonização
epistêmica
Partindo de um quadro original
construído segundo um padrão
exclusivamente eurocêntrico, a
proposta do Epistemômetro
as mudanças institucionais, tais como
aberturas de cursos e program
criações de disciplinas, alterações das
ementas das disciplinas existentes,
9Uma e
xceção digna de nota é a iniciativa da
Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB),
que construiu seu projeto acadêmico em
diálogo com os povos e comunidades da
região, inovação que foi relatada e teorizada
detalhadamente em um livro recente (TUGNY
GONÇALVES, 2020).
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
raríssimas exceções, nenhum projeto
pedagógico de qualquer curso
aberto até hoje em nossas
universidades foi realizado em diálogo
com os povos tradicionais, com
atenção para seus anseios de
ção da sua juventude
9. Como
veremos nas dimensões do
Epistemômetro descritas abaixo, o
interesse epistêmico dos cursos antes
da chegada dos mestres refletiu
exclusivamente o interesse da classe
acadêmica branca eurocêntrica e
predominantemente burguesa
ômetro: Dimensões e
variáveis da descolonização
Partindo de um quadro original
construído segundo um padrão
exclusivamente eurocêntrico, a
proposta do Epistemômetro
é registrar
as mudanças institucionais, tais como
aberturas de cursos e program
as,
criações de disciplinas, alterações das
ementas das disciplinas existentes,
xceção digna de nota é a iniciativa da
Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB),
que construiu seu projeto acadêmico em
diálogo com os povos e comunidades da
região, inovação que foi relatada e teorizada
detalhadamente em um livro recente (TUGNY
;
criações de revistas acadêmicas,
grupos de pesquisa, contratação de
professores, que ampliem e
contribuam para o estabelecimento de
uma universidade pluriepistêmica, com
espaço
intelectual para abrigar os
conhecimentos afrocêntricos,
indigenocêntricos, quilombocêntricos,
das culturas populares e dos demais
povos tradicionais brasileiros.
O exercício do Epistemômetro
pode começar com a análise das
referências bibliográficas conti
ementas das disciplinas. Nelas
buscaremos identificar a variedade dos
temas a ser ensinados, a partir de que
interesses dos grupos comunidades e
povos da sociedade, refletindo ou
repercutindo que vozes e a quem
representam, baseados em que
métodos
e teorias, sustentados por
quais epistemes, defendendo que
modos de viver e formando parte de
que proposta civilizatória. As ementas
são textos escritos, porém elas
deverão registrar não apenas as
referências escritas, mas também as
referências orais que s
para os cursos e as disciplinas pelos
mestres e mestras do Encontro de
Saberes. Partimos do princípio de que
a ementa e o currículo são a arena
321
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
criações de revistas acadêmicas,
grupos de pesquisa, contratação de
professores, que ampliem e
contribuam para o estabelecimento de
uma universidade pluriepistêmica, com
intelectual para abrigar os
conhecimentos afrocêntricos,
indigenocêntricos, quilombocêntricos,
das culturas populares e dos demais
povos tradicionais brasileiros.
O exercício do Epistemômetro
pode começar com a análise das
referências bibliográficas conti
das nas
ementas das disciplinas. Nelas
buscaremos identificar a variedade dos
temas a ser ensinados, a partir de que
interesses dos grupos comunidades e
povos da sociedade, refletindo ou
repercutindo que vozes e a quem
representam, baseados em que
e teorias, sustentados por
quais epistemes, defendendo que
modos de viver e formando parte de
que proposta civilizatória. As ementas
são textos escritos, porém elas
deverão registrar não apenas as
referências escritas, mas também as
referências orais que s
erão trazidas
para os cursos e as disciplinas pelos
mestres e mestras do Encontro de
Saberes. Partimos do princípio de que
a ementa e o currículo são a arena
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
onde sucede o embate descolonizador
que permitirá a construção de um
espaço acadêmico pluriepistêm
A aplicação do Epistemômetro
se concentra na observação de sete
dimensões que permitem avaliar o
processo de passagem de uma
academia monoepistêmica para uma
academia pluriepistêmica; e um
número maior e ainda aberto de
variáveis que ainda poderemos
identificar no currículo que vai se
transformando com a chegada
crescente dos saberes não
Obviamente, o termo “epistemômetro”
é uma metáfora para definir uma
ferramenta analítica crítica, onde
“metro” não é apenas quantificação ou
contagem numé
rica, mas também
qualificação,proporção, relação e
mesmo mera identificação de uma
presença
nova do que sempre esteve
ausente.
a) temas
Identificar os cursos, temas e
bibliografia sobre culturas indígenas,
afro-
brasileiras, quilombolas, das
culturas pop
ulares e das demais
tradições historicamente excluídas do
cânon acadêmico eurocêntrico.
Analisar o elenco das disciplinas
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
onde sucede o embate descolonizador
que permitirá a construção de um
espaço acadêmico pluriepistêm
ico.
A aplicação do Epistemômetro
se concentra na observação de sete
dimensões que permitem avaliar o
processo de passagem de uma
academia monoepistêmica para uma
academia pluriepistêmica; e um
número maior e ainda aberto de
variáveis que ainda poderemos
identificar no currículo que vai se
transformando com a chegada
crescente dos saberes não
-ocidentais.
Obviamente, o termo “epistemômetro”
é uma metáfora para definir uma
ferramenta analítica crítica, onde
“metro” não é apenas quantificação ou
rica, mas também
qualificação,proporção, relação e
mesmo mera identificação de uma
nova do que sempre esteve
Identificar os cursos, temas e
bibliografia sobre culturas indígenas,
brasileiras, quilombolas, das
ulares e das demais
tradições historicamente excluídas do
cânon acadêmico eurocêntrico.
Analisar o elenco das disciplinas
ofertadas, observando os tipos de
disciplinas:obrigatórias; seletivas;
optativas do elenco das obrigatórias;
optativas suplementares;
livre.
A diversidade epistêmica será
maior quanto mais ampla e
multicultural for a temática; e será mais
intensa a depender do tipo de
disciplina que incorpore os saberes
não-
ocidentais modernos. Visto por
outro ângulo, dimensionar a variedade
d
e temas nos permite avaliar o grau
relativo de reprodução do cânon
acadêmico eurocêntrico das
disciplinas. Como em todas as demais
variáveis, o cânon influencia e é
influenciado pelas demais dimensões
de organização do currículo
universitário.
Atenção a es
dimensões nos permite abordar a
tarefa da descolonização como uma
acumulação de ações de distintas
intensidades. Sobre a primeira
variável, resta claro que aumentar a
oferta temática, incluindo temas
indígenas, afro-
brasileiros, quilombolas
impl
ica em um grau de
descolonização, pois a episteme
eurocêntrica não priorizou inúmeros
temas ligados aos saberes não
322
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
ofertadas, observando os tipos de
disciplinas:obrigatórias; seletivas;
optativas do elenco das obrigatórias;
optativas suplementares;
de módulo
A diversidade epistêmica será
maior quanto mais ampla e
multicultural for a temática; e será mais
intensa a depender do tipo de
disciplina que incorpore os saberes
ocidentais modernos. Visto por
outro ângulo, dimensionar a variedade
e temas nos permite avaliar o grau
relativo de reprodução do cânon
acadêmico eurocêntrico das
disciplinas. Como em todas as demais
variáveis, o cânon influencia e é
influenciado pelas demais dimensões
de organização do currículo
Atenção a es
sas várias
dimensões nos permite abordar a
tarefa da descolonização como uma
acumulação de ações de distintas
intensidades. Sobre a primeira
variável, resta claro que aumentar a
oferta temática, incluindo temas
brasileiros, quilombolas
ica em um grau de
descolonização, pois a episteme
eurocêntrica não priorizou inúmeros
temas ligados aos saberes não
-
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
ocidentais. Um exemplo dessa
descolonização temática é a Lei
10.639, de 2003, que obriga o ensino
da História da África e da Cultura Afro
Brasileira10
. De fato, se por um lado
podemos considerar a Lei 10.639
como a primeira lei federal deveras
descolonizadora no Brasil, ela
suscita a aplicação do Epistemômetro
inspirado no Encontro de Saberes:
afinal, quem ensinará a cultura
brasileira (e a cultura indígena
também, após a Lei 11.645) e com que
abordagem? Ou seja, as duas Leis
obrigam a ampliação dos temas para
além do eurocentrismo, porém não
garantem necessariamente a
ampliação
dos interesses, das
perspectivas, das abord
agens e das
teorias. Essa ressalva,de não associar
a ampliação temática com o processo
completo de descolonização,foi
colocada com grande ceticismo por
Sabelo Ndlovu-
Gatsheni, que também
incluiu a inclusão temática como a
terceira das suas seis dimensões d
descolonização epistêmica (2018:81)
10
A Lei 10.639 completa este ano duas
décadas, com o passivo de que a maioria das
universidades federais anda não a
implementou.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
ocidentais. Um exemplo dessa
descolonização temática é a Lei
10.639, de 2003, que obriga o ensino
da História da África e da Cultura Afro
-
. De fato, se por um lado
podemos considerar a Lei 10.639
como a primeira lei federal deveras
descolonizadora no Brasil, ela
também
suscita a aplicação do Epistemômetro
inspirado no Encontro de Saberes:
afinal, quem ensinará a cultura
afro-
brasileira (e a cultura indígena
também, após a Lei 11.645) e com que
abordagem? Ou seja, as duas Leis
obrigam a ampliação dos temas para
além do eurocentrismo, porém não
garantem necessariamente a
dos interesses, das
agens e das
teorias. Essa ressalva,de não associar
a ampliação temática com o processo
completo de descolonização,foi
colocada com grande ceticismo por
Gatsheni, que também
incluiu a inclusão temática como a
terceira das suas seis dimensões d
a
descolonização epistêmica (2018:81)
A Lei 10.639 completa este ano duas
décadas, com o passivo de que a maioria das
universidades federais anda não a
b) interesses
Os interesses apontam para o
conjunto de fatores –
econômicos -
que condicionam a
escolha dos temas
relevantes e o bloqueio ou a
indiferença face os outros. Além disso,
e
les influenciam também a disputa
pelas vozes e representações
paradigmas e teorias.
sociais estão incluídas, além dos
interesses de classe, os interesses
raciais, étnicos, de gênero,
comunitários, regionais, linguísticos e
espirituais, e
ntre outros. Por exemplo,
uma educação indígena deve
responder originalmente aos
interesses dos povos e comunidades
indígenas e a elas deve responder.
Analogamente, a promoção dos
saberes afro-
brasileiros deve atender
(ainda que não exclusivamente) aos
int
eresses da comunidade negra
brasileira.
Os interesses
currículo permitem-
nos fazer uma
radiografia da instituição universitária
colonizada em todo o Sul global.
Qualquer leitura internalista do
desenvolvimento da ciência como
resultado exclus
ivo das dinâmicas de
um espaço de “conhecimento puro”
323
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
Os interesses apontam para o
sociais, políticos,
que condicionam a
escolha dos temas
considerados
relevantes e o bloqueio ou a
indiferença face os outros. Além disso,
les influenciam também a disputa
pelas vozes e representações
e os
paradigmas e teorias.
Nas dimensões
sociais estão incluídas, além dos
interesses de classe, os interesses
raciais, étnicos, de gênero,
comunitários, regionais, linguísticos e
ntre outros. Por exemplo,
uma educação indígena deve
responder originalmente aos
interesses dos povos e comunidades
indígenas e a elas deve responder.
Analogamente, a promoção dos
brasileiros deve atender
(ainda que não exclusivamente) aos
eresses da comunidade negra
Os interesses
plasmados no
nos fazer uma
radiografia da instituição universitária
colonizada em todo o Sul global.
Qualquer leitura internalista do
desenvolvimento da ciência como
ivo das dinâmicas de
um espaço de “conhecimento puro”
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
(como o Mundo 3 de Karl Popper)
mostra-
se insuficiente diante dos
evidentes condicionantes de classe
econômica, raça, gênero e região que
o capitalismo impôs nas universidades
para reproduzirem a prátic
produtividade empresarial, com sua
influência evidente nos
direcionamentos dos projetos de
pesquisa e nos projetos dos cursos
oferecidos e o imperialismo global
exercido pelas universidades
hegemônicas dos países ocidentais
centrais, controladores dos
“rankings” por sobre nossas
universidades.11
Uma referência aqui é o
conceito de “intelecto geral” formulado
por Karl Marx no famoso “Fragmento
sobre as Máquinas” dos
“...o saber social geral, conhecimento,
deveio força produtiva imed
consequência, até que ponto as
próprias condições do processo vital
da sociedade ficaram sobre o controle
do ‘intelecto geral’ e foram
reorganizadas em conformidade com
11
Em síntese, os três mundos de Popper são:
Mundo 1, da matéria física, inerte: Mundo 2,
da vida subjetiva,
as paixões e a dimensão
moral; Mundo 3, do conhecimento puro
objetivado, mundo das ciências e das artes
(POPPER, 1975, 1978 e 1997).
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
(como o Mundo 3 de Karl Popper)
se insuficiente diante dos
evidentes condicionantes de classe
econômica, raça, gênero e região que
o capitalismo impôs nas universidades
para reproduzirem a prátic
a da
produtividade empresarial, com sua
influência evidente nos
direcionamentos dos projetos de
pesquisa e nos projetos dos cursos
oferecidos e o imperialismo global
exercido pelas universidades
hegemônicas dos países ocidentais
centrais, controladores dos
índices e
“rankings” por sobre nossas
Uma referência aqui é o
conceito de “intelecto geral” formulado
por Karl Marx no famoso “Fragmento
sobre as Máquinas” dos
Grundrisse:
“...o saber social geral, conhecimento,
deveio força produtiva imed
iata e, em
consequência, até que ponto as
próprias condições do processo vital
da sociedade ficaram sobre o controle
do ‘intelecto geral’ e foram
reorganizadas em conformidade com
Em síntese, os três mundos de Popper são:
Mundo 1, da matéria física, inerte: Mundo 2,
as paixões e a dimensão
moral; Mundo 3, do conhecimento puro
objetivado, mundo das ciências e das artes
ele” (2011, p.
589). Podemos resumi
em uma pergunta simples: de quem é
o
interesse e de quem é o controle
sobre o poder do conhecimento
acadêmico hoje?
Em suma, a diversidade de
interesses epistêmicos (de classe,
raça, etnia, região, gênero) trazida
pelas cotas e pelo Encontro de
Saberes passa a refletir agora a
disputa pelo c
ontrole epistêmico na
instituição universitária, que antes
atendia exclusivamente aos interesses
do grupo acadêmico elitizado. Enfim,
com o “intelecto geral” podemos
articular, de um modo inseparável, as
dimensões sociais (de classe), política,
econômica e
epistêmica em uma
academia sob o regime capitalista. Se
Marx inaugurou a leitura externalista
da episteme acadêmica, talvez sua
aplicação mais rica e que nos serve de
modelo de estudo até hoje
o estudo de Boris Hessen (1971)
apresentado em 1931
condicionantes sociais, econômicos e
políticos da própria concepção e
criação dos famosos
Isaac Newton.12
12
Para uma atualização da epistemologia
marxista de análise dos condicionantes sociais
e econômicos da ciência, ver Freud
324
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
589). Podemos resumi
-lo
em uma pergunta simples: de quem é
interesse e de quem é o controle
sobre o poder do conhecimento
Em suma, a diversidade de
interesses epistêmicos (de classe,
raça, etnia, região, gênero) trazida
pelas cotas e pelo Encontro de
Saberes passa a refletir agora a
ontrole epistêmico na
instituição universitária, que antes
atendia exclusivamente aos interesses
do grupo acadêmico elitizado. Enfim,
com o “intelecto geral” podemos
articular, de um modo inseparável, as
dimensões sociais (de classe), política,
epistêmica em uma
academia sob o regime capitalista. Se
Marx inaugurou a leitura externalista
da episteme acadêmica, talvez sua
aplicação mais rica e que nos serve de
modelo de estudo até hoje
tenha sido
o estudo de Boris Hessen (1971)
apresentado em 1931
, dos
condicionantes sociais, econômicos e
políticos da própria concepção e
criação dos famosos
Princípios de
Para uma atualização da epistemologia
marxista de análise dos condicionantes sociais
e econômicos da ciência, ver Freud
enthal e
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Significativamente, no lado
oposto do espectro da teoria marxista,
atenção à variável do interesse foi
afirmada também por Karl Pop
epistemólogo sempre associado ao
lado mais internalista,
objetivista e
realista da ciência: “a objetividade da
ciência natural e social não está
baseada num estatuto imparcial da
mente dos cientistas, mas meramente
no fato do caráter público e
competi
tivo da empresa científica e
isso, em certos aspectos sociais dela”
(2004, p. 40).
c)
vozes e formas de representação
A pluralidade temática e a
pluralidade de interesses presentes
nas dezenas de disciplinas dos
mestres e mestras acima listadas
foram ex
pressas em várias vozes e
várias línguas. A experiência do
Encontro de Saberes até agora aponta
(ou simplesmente exemplifica) para
uma correlação básica entre
diversidade linguística e diversidade
epistêmica. Consequentemente, u
passo importante é a ident
línguas indígenas, africanas, asiáticas
e de outras famílias linguísticas não
Grossmann (2009), que inclui uma nova
tradução do ensaio antológico de Hessen.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Significativamente, no lado
oposto do espectro da teoria marxista,
atenção à variável do interesse foi
afirmada também por Karl Pop
per,
epistemólogo sempre associado ao
objetivista e
realista da ciência: “a objetividade da
ciência natural e social não está
baseada num estatuto imparcial da
mente dos cientistas, mas meramente
no fato do caráter público e
tivo da empresa científica e
isso, em certos aspectos sociais dela”
vozes e formas de representação
A pluralidade temática e a
pluralidade de interesses presentes
nas dezenas de disciplinas dos
mestres e mestras acima listadas
pressas em várias vozes e
várias línguas. A experiência do
Encontro de Saberes até agora aponta
(ou simplesmente exemplifica) para
uma correlação básica entre
diversidade linguística e diversidade
epistêmica. Consequentemente, u
m
passo importante é a ident
ificação das
línguas indígenas, africanas, asiáticas
e de outras famílias linguísticas não
-
Grossmann (2009), que inclui uma nova
tradução do ensaio antológico de Hessen.
ocidentais e
não hegemônicas
ensinadas.
Simultaneamente, há que
incluir sem restrição os modos de fala
e os
discursos não limitados pela
norma culta portuguesa acadê
Além da língua, a pluriepistemia
dos mestres amplia também os
regimes de fala. Enquanto a fala
acadêmica é majoritariamente
racional, os mestres exercitam outros
regimes: a fala poética, comum a
muitos mestres da performance; as
narrativas, formais o
ocasião; a associação livre e o fluxo de
consciência; a fala mítica, comum a
muitos pais e mães de santo e xamãs;
a fala revelada, como a dos pajés
guaranis.
Observamos aqui também
impacto epistêmico dos
enunciação e sua complexa influência
na afirmação de identidades. Um
exemplo de enunciação não canônica
é o “pretuguês” expresso na escrita de
Lélia Gonzalez, com a qual
enfatizamos que nossa medida não é
mais o monolinguismo coloquial
eurocêntrico, ma
s a polifonia
ainda, a heteroglossia
todas as vozes, com todos os seus
léxicos particulares, suas inflexões
retóricas próprias. Ou seja, com as
325
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
não hegemônicas
Simultaneamente, há que
incluir sem restrição os modos de fala
discursos não limitados pela
norma culta portuguesa acadê
mica.
Além da língua, a pluriepistemia
dos mestres amplia também os
regimes de fala. Enquanto a fala
acadêmica é majoritariamente
racional, os mestres exercitam outros
regimes: a fala poética, comum a
muitos mestres da performance; as
narrativas, formais o
u criadas na
ocasião; a associação livre e o fluxo de
consciência; a fala mítica, comum a
muitos pais e mães de santo e xamãs;
a fala revelada, como a dos pajés
Observamos aqui também
o
impacto epistêmico dos
loci de
enunciação e sua complexa influência
na afirmação de identidades. Um
exemplo de enunciação não canônica
é o “pretuguês” expresso na escrita de
Lélia Gonzalez, com a qual
enfatizamos que nossa medida não é
mais o monolinguismo coloquial
s a polifonia
– e mais
ainda, a heteroglossia
bakhtiniana:
todas as vozes, com todos os seus
léxicos particulares, suas inflexões
retóricas próprias. Ou seja, com as
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
múltiplas vozes superamos o
pressuposto cartesiano ainda
hegemônico de um sujeito vazio da
ciência.
Outra referência nesta
dimensão das vozes e representações
é a teoria da interseccionalidade,
marcada pela epistemologia da
complexidade, desenvolvida por
Kimberlé
Crenshaw (2002) e Carla
Akotirene (2019), e que complexifica a
noção isolada de id
entidade de classe,
racial, de gênero, entre outras. Stuart
Hall também teorizou a articulação
identitária e a formação do sujeito
moderno (HALL,
2006); e por meu
lado, ofereci um modelo de quatro
dimensões da identidade racial
(CARVALHO, 2020c).
Empregamo
s o termo de vozes
no sentido metafórico, enfatizando que
elas não significam apenas a palavra
falada, mas os conteúdos e
abordagens que são transmitidas
pelos corpos, com todas as suas
dimensões expressivas; ou seja, os
signos produzidos e expressos
inclu
ídos nas corporalidades e todas
as demais formas de expressão
possíveis. Faz parte também dessas
variáveis a leitura dos espaços onde
acontecem os processos de
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
múltiplas vozes superamos o
pressuposto cartesiano ainda
hegemônico de um sujeito vazio da
Outra referência nesta
dimensão das vozes e representações
é a teoria da interseccionalidade,
marcada pela epistemologia da
complexidade, desenvolvida por
Crenshaw (2002) e Carla
Akotirene (2019), e que complexifica a
entidade de classe,
racial, de gênero, entre outras. Stuart
Hall também teorizou a articulação
identitária e a formação do sujeito
2006); e por meu
lado, ofereci um modelo de quatro
dimensões da identidade racial
s o termo de vozes
no sentido metafórico, enfatizando que
elas não significam apenas a palavra
falada, mas os conteúdos e
abordagens que são transmitidas
pelos corpos, com todas as suas
dimensões expressivas; ou seja, os
signos produzidos e expressos
ídos nas corporalidades e todas
as demais formas de expressão
possíveis. Faz parte também dessas
variáveis a leitura dos espaços onde
acontecem os processos de
transmissão com a sua variedade
semiótica, visto que a manufatura dos
espaços é parte dos modos
específicos de representação dos
povos, etnias e grupos sociais.
Mudanças de vozes,
representações, corporalidades e
espaços conduzem a mudanças
pedagógicas, não apenas para o
ensino dos temas, mas para a
definição mesma do que seja o
conjunto de t
emas trazidos pelos
mestres.13
d) paradigmas e teorias
Aqui entramos em uma
dimensão mais complexa e
articulação dos saberes plurais na
academia: observamos
teóricas, os conceitos eas
metodologias, todos ligados aos
saberes
propriamente ditos,
notadamente dos indígenas e afro
brasileiros, sobre os quais nem sequer
temos ainda uma taxonomia
adequada. Partimos do conceito já
canônico de paradigma cunhado por
Thomas Kuhn n’A
Revoluções Científicas
13
Sobre os desafios pedagógicos do Encontro
de Saberes, ver Carvalho e Águas (2015) e
Carvalho e Costa (2020).
326
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
transmissão com a sua variedade
semiótica, visto que a manufatura dos
espaços é parte dos modos
e meios
específicos de representação dos
povos, etnias e grupos sociais.
Mudanças de vozes,
representações, corporalidades e
espaços conduzem a mudanças
pedagógicas, não apenas para o
ensino dos temas, mas para a
definição mesma do que seja o
emas trazidos pelos
d) paradigmas e teorias
Aqui entramos em uma
dimensão mais complexa e
abstrata da
articulação dos saberes plurais na
academia: observamos
as abordagens
teóricas, os conceitos eas
metodologias, todos ligados aos
propriamente ditos,
notadamente dos indígenas e afro
-
brasileiros, sobre os quais nem sequer
temos ainda uma taxonomia
adequada. Partimos do conceito já
canônico de paradigma cunhado por
Estrutura das
Revoluções Científicas
. Apesar da
Sobre os desafios pedagógicos do Encontro
de Saberes, ver Carvalho e Águas (2015) e
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
flexib
ilidade e a abertura presentes
nas formulações de Kuhn, elas
analisam dinâmicas intrínsecas e
exclusivas da revolução científica
moderna, e neste sentido, apesar de
úteis, são
insuficientes para servir
como metalinguagem de um campo de
pluralismo epistêmic
o novo
episteme ocidental passa a ser apenas
uma entre várias. Outra referência
advinda do campo clássico da
Epistemologia seria associar essa
dimensão dos paradigmas e teorias,
variados como são ao somar saberes
indígenas, afro-
brasileiros e
com o Mundo 3 de Karl Popper,
ele definido como o mundo do saber
objetivado: é o campo do saber que se
amplia ocupando o mesmo mundo já
constituído
pelo saber acadêmico
ocidental.
Retiramos de Popper o seu
pluralismo temático e teórico, ao
admitir que o Mundo 3 é dinâmico e
em perpétua expansão e
transformação, tendo ainda a
carcterística
de englobar ao mesmo
tempo as ciências e as artes. Com o
Encontro de Saberes, a partir de agora
esses dois domínios dever ser
acolhidos no plural: ciência
ocidentais, ciências e artes
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
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(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
ilidade e a abertura presentes
nas formulações de Kuhn, elas
analisam dinâmicas intrínsecas e
exclusivas da revolução científica
moderna, e neste sentido, apesar de
insuficientes para servir
como metalinguagem de um campo de
o novo
em que a
episteme ocidental passa a ser apenas
uma entre várias. Outra referência
advinda do campo clássico da
Epistemologia seria associar essa
dimensão dos paradigmas e teorias,
variados como são ao somar saberes
brasileiros e
ocidentais,
com o Mundo 3 de Karl Popper,
por
ele definido como o mundo do saber
objetivado: é o campo do saber que se
amplia ocupando o mesmo mundo já
pelo saber acadêmico
Retiramos de Popper o seu
pluralismo temático e teórico, ao
admitir que o Mundo 3 é dinâmico e
em perpétua expansão e
transformação, tendo ainda a
de englobar ao mesmo
tempo as ciências e as artes. Com o
Encontro de Saberes, a partir de agora
esses dois domínios dever ser
acolhidos no plural: ciência
s e artes
ocidentais, ciências e artes
indígenas
e ciências e artes afro
Podemos identificar dezenas de
exemplos desses saberes abstratos
objetivados do Mundo 3 na lista das
disciplinas acima apresentada. No
caso do Encontro de Saberes, a
dime
nsão transdisciplinar toma uma
feição nova, não mais eurocêntrica,
porque está tingida pelo princípio mais
dinâmico e menos essencializado da
polimatia dos mestres, que aprendem,
pesquisam e transmitem o que sabem
segundo princípios que agrupam os
tipos va
riados de conhecimento e
unificam os seus modos de conhecer
em várias epistemes.
Em várias disciplinas, os
mestres elaboram teorias e conceitos
próprios das suas comunidades. Aqui
podem entrar exemplos da pluralidade
de ontologias (o que se costuma
chamar
na Antropologia de virada
ontológica), específicas das várias
nações
indígenas, lembrando do que
já tivemos mestres e mestras de 25
nações, falando 13 línguas distintas.
Outros mestres trazem as ontologias
das diferentes nações de candomblé,
da jurema, dos
encantados, de tambor
de mina, entre outras tradições.
Vemos nas disciplinas ainda as
variáveis das narrativas e as
327
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
e ciências e artes afro
-diaspóricas.
Podemos identificar dezenas de
exemplos desses saberes abstratos
objetivados do Mundo 3 na lista das
disciplinas acima apresentada. No
caso do Encontro de Saberes, a
nsão transdisciplinar toma uma
feição nova, não mais eurocêntrica,
porque está tingida pelo princípio mais
dinâmico e menos essencializado da
polimatia dos mestres, que aprendem,
pesquisam e transmitem o que sabem
segundo princípios que agrupam os
riados de conhecimento e
unificam os seus modos de conhecer
Em várias disciplinas, os
mestres elaboram teorias e conceitos
próprios das suas comunidades. Aqui
podem entrar exemplos da pluralidade
de ontologias (o que se costuma
na Antropologia de virada
ontológica), específicas das várias
indígenas, lembrando do que
já tivemos mestres e mestras de 25
nações, falando 13 línguas distintas.
Outros mestres trazem as ontologias
das diferentes nações de candomblé,
encantados, de tambor
de mina, entre outras tradições.
Vemos nas disciplinas ainda as
variáveis das narrativas e as
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
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Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
cosmogonias das diferentes nações
indígenas.
e) epistemes;
Aqui chegamos à dimensão
catalisadora do ciclo interdependente
das sete dimens
ões e variáveis do
Epistemômetro. Partimos da episteme
ocidental moderna, que influencia,
entre outros fatores, a o
geral da universidade em unidades
acadêmicas: faculdades, institutos,
departamentos, centros, com seus
sistemas específicos de leg
científica. Nos casos em que as
unidades sejam
inter ou
transdisciplinares, podemos observar
se a inter ou a transdisciplinaridade
proposta é construída com a
combinação de disciplinas
eurocêntricas ou se incluem
abordagens ou temas derivados das
epistemes não-
ocidentais, tais como
as indígenas, afro-
brasileiras ou
outras.
Nesses casos, avaliaremos
também a relação entre a
transdisciplinaridade acadêmica e a
polimatia dos mestres e mestras.
Uma marca de diferença radical
a ser observada em relação à
episteme ocidental moderna é a
ativação do que chamo de
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
cosmogonias das diferentes nações
Aqui chegamos à dimensão
catalisadora do ciclo interdependente
ões e variáveis do
Epistemômetro. Partimos da episteme
ocidental moderna, que influencia,
entre outros fatores, a o
rganização
geral da universidade em unidades
acadêmicas: faculdades, institutos,
departamentos, centros, com seus
sistemas específicos de leg
itimação
científica. Nos casos em que as
inter ou
transdisciplinares, podemos observar
se a inter ou a transdisciplinaridade
proposta é construída com a
combinação de disciplinas
eurocêntricas ou se incluem
abordagens ou temas derivados das
ocidentais, tais como
brasileiras ou
Nesses casos, avaliaremos
também a relação entre a
transdisciplinaridade acadêmica e a
polimatia dos mestres e mestras.
Uma marca de diferença radical
a ser observada em relação à
episteme ocidental moderna é a
ativação do que chamo de
epistemologias do cosmos vivo,
presente nos povos indígenas, nas
religiões de matriz africana e em
praticamente todos os demais povos
tradicionais (
CARVALHO
2023). Com elas devidamente
ativad
as, descolonizamos o espaço
acadêmico eurocêntrico.
O protocolo de diálogo dessas
epistemes com a episteme ocidental
deverá incluir aqueles aspectos tidos
como dissidentes da Epistemologia
disciplinar hegemônica. Enuncio três
áreas que exigirão protocolos
de convivência
surgida com a contribuição do
Encontro de Saberes.
Em primeiro lugar, há que
promover o conhecimento tácito, modo
dominante de validação dos saberes
dos mestres e mestras dos povos
tradicionais. Thomas Kuhn menciona o
conhecimento tácito como um
componente relevante, ainda que
marginal, de um processo formalizável
de alcance do conhecimento válido
(isto é, o conhecimento explícito), no
Posfácio de 1969 ao seu famoso
Estrutura das Revoluções Científicas,
publicado orig
inalmente em 1962.
Kuhn retirou a importância do
conhecimento tácito da obra de
328
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
epistemologias do cosmos vivo,
presente nos povos indígenas, nas
religiões de matriz africana e em
praticamente todos os demais povos
CARVALHO
, 2020 e
2023). Com elas devidamente
as, descolonizamos o espaço
acadêmico eurocêntrico.
O protocolo de diálogo dessas
epistemes com a episteme ocidental
deverá incluir aqueles aspectos tidos
como dissidentes da Epistemologia
disciplinar hegemônica. Enuncio três
áreas que exigirão protocolos
novos
interepistêmica,
surgida com a contribuição do
Encontro de Saberes.
Em primeiro lugar, há que
promover o conhecimento tácito, modo
dominante de validação dos saberes
dos mestres e mestras dos povos
tradicionais. Thomas Kuhn menciona o
conhecimento tácito como um
componente relevante, ainda que
marginal, de um processo formalizável
de alcance do conhecimento válido
(isto é, o conhecimento explícito), no
Posfácio de 1969 ao seu famoso
A
Estrutura das Revoluções Científicas,
inalmente em 1962.
Kuhn retirou a importância do
conhecimento tácito da obra de
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Michael Polanyi, que dele fez uma
defesa extremamente elaborada,
colocando-
o no centro de sua tarefa
epistemológica de fundamentação do
conhecimento científico (e também
human
ístico) em pelo menos duas
densas obras:
Conhecimento Pessoal
(1962) e A
Dimensão Tácita
Desta segunda obra reiteramos um
lema básico do conhecimento tácito
que abre a possibilidade de diálogos
interepistêmicos com os saberes dos
mestres e mestras:
“...nós sabemos
mais do que somos capazes de dizer”
(id, p.
4). Mais ainda, o caminho do
conhecimento explícito pressupõe o
conhecimento tácito: ”o processo de
formalizar todo o conhecimento a
expensas de excluir qualquer
conhecimento tácito é autodestrut
(id, p. 20).
O que retiramos da lista das
disciplinas é uma espetacular
expansão de tradições de
conhecimento que deverão inspirar o
trabalho acadêmico correlato de
expansão de conhecimento explícito.
Para dar apenas alguns poucos
exemplos, pensemos n
o saber dos
pescadores artesanais de divisarem
cardumes no mar exclusivamente pelo
olhar, sendo capazes, inclusive, de
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Michael Polanyi, que dele fez uma
defesa extremamente elaborada,
o no centro de sua tarefa
epistemológica de fundamentação do
conhecimento científico (e também
ístico) em pelo menos duas
Conhecimento Pessoal
Dimensão Tácita
(2009).
Desta segunda obra reiteramos um
lema básico do conhecimento tácito
que abre a possibilidade de diálogos
interepistêmicos com os saberes dos
“...nós sabemos
mais do que somos capazes de dizer”
4). Mais ainda, o caminho do
conhecimento explícito pressupõe o
conhecimento tácito: ”o processo de
formalizar todo o conhecimento a
expensas de excluir qualquer
conhecimento tácito é autodestrut
ivo”
O que retiramos da lista das
disciplinas é uma espetacular
expansão de tradições de
conhecimento que deverão inspirar o
trabalho acadêmico correlato de
expansão de conhecimento explícito.
Para dar apenas alguns poucos
o saber dos
pescadores artesanais de divisarem
cardumes no mar exclusivamente pelo
olhar, sendo capazes, inclusive, de
identificar as espécies pelo borbulhar
das ondas; o saber dos caiçaras sobre
os regimes das chuvas e dos ventos; a
pesca em Laguna, Santa
com ajuda dos botos, que se
comunicam com os pescadores e
passam informações precisas para a
captura dos peixes. O enriquecimento
do saber acadêmico brasileiro, o
reconhecimento dos saberes dos
povos tradicionais e os benefícios
trazidos para to
dos os envolvidos
nesses diálogos é o horizonte atual da
descolonização do currículo através da
expansão epistêmica.
Além do conhecimento tácito, os
mestres e mestras manipulam e
transmitem conhecimento explícito não
matematizável. Aqui abrimos um outro
c
ampo de expansão epistêmica que
atravessa várias áreas do saber, das
tecnologias e do artesanato, tais como
a concepção da forma e a precisão de
alguns artefatos indígenas que
parecem quase impossíveis de serem
realizados sem o apoio de máquinas e
computad
ores. Vale a pena retomar
aqui um lema da epistemologia
goetheana, sobre a qual discorri em
outro trabalho: “existem coisas exatas
que não podem ser calculadas e
muitas coisas que não podem ser
329
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
identificar as espécies pelo borbulhar
das ondas; o saber dos caiçaras sobre
os regimes das chuvas e dos ventos; a
pesca em Laguna, Santa
Catarina,
com ajuda dos botos, que se
comunicam com os pescadores e
passam informações precisas para a
captura dos peixes. O enriquecimento
do saber acadêmico brasileiro, o
reconhecimento dos saberes dos
povos tradicionais e os benefícios
dos os envolvidos
nesses diálogos é o horizonte atual da
descolonização do currículo através da
expansão epistêmica.
Além do conhecimento tácito, os
mestres e mestras manipulam e
transmitem conhecimento explícito não
matematizável. Aqui abrimos um outro
ampo de expansão epistêmica que
atravessa várias áreas do saber, das
tecnologias e do artesanato, tais como
a concepção da forma e a precisão de
alguns artefatos indígenas que
parecem quase impossíveis de serem
realizados sem o apoio de máquinas e
ores. Vale a pena retomar
aqui um lema da epistemologia
goetheana, sobre a qual discorri em
outro trabalho: “existem coisas exatas
que não podem ser calculadas e
muitas coisas que não podem ser
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
levadas a um experimento decisivo”
(GOETHE, 2002, p. 51).
Res
saltar a centralidade da
transmissão oral, conectada com as
duas variáveis anteriores. Um novo
protocolo se fará necessário para a
convivência dos dois tipos de
validação do saber: o do letramento
acadêmico altamente especializado; e
o da oralidade plena,
baseada na
presença irrepetível e insubstituível do
mestre em sala da aula. Em suma,
deveremos desenvolver as
ferramentas epistêmicas necessárias
para validar não apenas os
documentos de saber acadêmico
escritos (ciência e arte) como os
documentos de memór
ia viva, da qual
contamos com a defesa magistral da
tradição viva de Amadou Hampaté
(2010).
f) modos de viver
Apesar da abstração
constitutiva da episteme e sua função
de fundamento para o conhecimento
acumulado por um determinado povo
em uma determinada época, os
diversos povos privilegiam princípios
epistêmicos que são compatíveis com
seu modo de viver. Os povos
indígenas, os povos de terreiros, as
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
levadas a um experimento decisivo”
saltar a centralidade da
transmissão oral, conectada com as
duas variáveis anteriores. Um novo
protocolo se fará necessário para a
convivência dos dois tipos de
validação do saber: o do letramento
acadêmico altamente especializado; e
baseada na
presença irrepetível e insubstituível do
mestre em sala da aula. Em suma,
deveremos desenvolver as
ferramentas epistêmicas necessárias
para validar não apenas os
documentos de saber acadêmico
escritos (ciência e arte) como os
ia viva, da qual
contamos com a defesa magistral da
tradição viva de Amadou Hampaté
Bâ
Apesar da abstração
constitutiva da episteme e sua função
de fundamento para o conhecimento
acumulado por um determinado povo
em uma determinada época, os
diversos povos privilegiam princípios
epistêmicos que são compatíveis com
seu modo de viver. Os povos
indígenas, os povos de terreiros, as
caiçaras, os quilombolas, os
extrativistas e todos os demais povos
tradicionais vivem em uma relação de
troca e diálogo com o meio ambiente,
ou seja, em uma relação sujeito
com a natureza. Não faria sentido par
eles, portanto, abraçar uma
epistemologia de base cartesiana
newtoniana que trataria as florestas,
os rios, a terra e o mar como mera
coisa extensa e inerte, desprovida de
sentimento e expressão, e que
pudesse ser manipulada e destruída
segundo as leis d
a ciência ocidental
moderna objetivada em tecnologia.
A questão do modo de viver foi
(re)colocada na academia ocidental no
final do século passado por Pierre
Hadot, na sua interpretação do saber
dos pensadores antigos (grecos e
romanos), equivalentes aos
mestres e mestras, chamando a
atenção para a perda do cultivo da
vida na sociedade ocidental que se
globaliza (HADOT,
2009 e
CLARK; MCGEE,
2013).
a mensagem, afim com a posição
externalista marxista, de que a
episteme moderna é i
modo de viver ocidental gerado antes
(obviamente, sem negar que a
recíproca também é verdadeira).
330
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
caiçaras, os quilombolas, os
extrativistas e todos os demais povos
tradicionais vivem em uma relação de
troca e diálogo com o meio ambiente,
ou seja, em uma relação sujeito
-sujeito
com a natureza. Não faria sentido par
a
eles, portanto, abraçar uma
epistemologia de base cartesiana
-
newtoniana que trataria as florestas,
os rios, a terra e o mar como mera
coisa extensa e inerte, desprovida de
sentimento e expressão, e que
pudesse ser manipulada e destruída
a ciência ocidental
moderna objetivada em tecnologia.
A questão do modo de viver foi
(re)colocada na academia ocidental no
final do século passado por Pierre
Hadot, na sua interpretação do saber
dos pensadores antigos (grecos e
romanos), equivalentes aos
nossos
mestres e mestras, chamando a
atenção para a perda do cultivo da
vida na sociedade ocidental que se
2009 e
CHASE;
2013).
Hadot trouxe
a mensagem, afim com a posição
externalista marxista, de que a
episteme moderna é i
nfluenciada pelo
modo de viver ocidental gerado antes
(obviamente, sem negar que a
recíproca também é verdadeira).
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Realizando o que o pensador francês
apenas pôde enunciar, diversos
modos não-
ocidentais de viver já
foram apresentados por mestres e
mestras
indígenas e quilombolas, tais
como Álvaro Tukano (2015), Davi
Kopenawa (2019)
e Antônio Bispo
(2019) na UnB, Maria Muniz (2021) na
UFMG, entre outros.
g)
propostas civilizatórias
Finalmente, em um nível mais
alto de abstração, este conjunto de
dimensões q
ue giram em torno de uma
episteme configura uma proposta
civilizatória. Neste momento, a
episteme hegemônica serve de
fundamento para um processo
civilizatório capitalista produtor de
desigualdade social crescente e
destruidor do meio ambiente sem
limites,
ambos processos em escala
planetária. Tal projeto é também
denominado ecocídio e/ou
capitaloceno e em suas referências
argumentativas a palavra “civilização”
sói ser precedida das palavras
“declínio” ou “decadência”.
14
Evito o termo antropoceno porque os povos
tradicionais d
e todo o mundo resistem e se
opõem ferozmente a tal projeto; neste sentido,
o termo não os representa e os silencia, na
medida em que eles também são “antropos”.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Realizando o que o pensador francês
apenas pôde enunciar, diversos
ocidentais de viver já
foram apresentados por mestres e
indígenas e quilombolas, tais
como Álvaro Tukano (2015), Davi
e Antônio Bispo
(2019) na UnB, Maria Muniz (2021) na
propostas civilizatórias
Finalmente, em um nível mais
alto de abstração, este conjunto de
ue giram em torno de uma
episteme configura uma proposta
civilizatória. Neste momento, a
episteme hegemônica serve de
fundamento para um processo
civilizatório capitalista produtor de
desigualdade social crescente e
destruidor do meio ambiente sem
ambos processos em escala
planetária. Tal projeto é também
denominado ecocídio e/ou
capitaloceno e em suas referências
argumentativas a palavra “civilização”
sói ser precedida das palavras
“declínio” ou “decadência”.
14O Mestre
Evito o termo antropoceno porque os povos
e todo o mundo resistem e se
opõem ferozmente a tal projeto; neste sentido,
o termo não os representa e os silencia, na
medida em que eles também são “antropos”.
quilombola Antonio Bispo cham
atitude de cosmofobia.
O Epistemômetro propõe
identificar o currículo dos cursos que
formam os jovens que darão
continuidade a essa distopia. Por outro
lado, vários projetos civilizatórios não
cosmicidas continuam vivos e em
expansão, inclusive nas
Eis alguns deles:
a)
Ubuntu ou Utu. O lema “Eu sou
porque nós somos”; ou “Eu sou
porque você é” é uma proposta
civilizatória comum a várias
nações
bantos e que
atualmente se difunde em um
movimento de unificação de
todos os habitantes da Áfric
também da Diáspora Africana
nas Américas.
b) O termo
Tianxia
Céu) é uma proposta
civilizatória chinesa antiga que
foi reformulada recentemente
por Zhao
Tingyang, que a
oferece como um novo modelo
para as relações internacionais
e governança
na cooperação irrestrita e na
postura radicalmente inclusiva
no conceito de
331
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
quilombola Antonio Bispo cham
a essa
atitude de cosmofobia.
O Epistemômetro propõe
identificar o currículo dos cursos que
formam os jovens que darão
continuidade a essa distopia. Por outro
lado, vários projetos civilizatórios não
cosmicidas continuam vivos e em
expansão, inclusive nas
universidades.
Ubuntu ou Utu. O lema “Eu sou
porque nós somos”; ou “Eu sou
porque você é” é uma proposta
civilizatória comum a várias
bantos e que
atualmente se difunde em um
movimento de unificação de
todos os habitantes da Áfric
a e
também da Diáspora Africana
Tianxia
(Tudo sobre o
Céu) é uma proposta
civilizatória chinesa antiga que
foi reformulada recentemente
Tingyang, que a
oferece como um novo modelo
para as relações internacionais
global baseada
na cooperação irrestrita e na
postura radicalmente inclusiva
no conceito de
wu wai (nada
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
fora).
c) O Sumaq Kausay
(Bem Viver) é
uma proposta civilizatória
formulada nos
países andinos,
servindo de fundamentação até
para a Constituição do Equa
É formulado também em aimará
como Suma Qamaña
guarani (especialmente da
Bolívia) com o termo
d) Aguyjé –
Também os povos
Guaranis Mbyáe Kaiowá do
Brasil expressam esse projeto
de vida pacificada e unificada
espiritualmente com a vida
sol
idária em comunidade com o
termo aguyjé, traduzido às
vezes, de um modo parcial,
como uma expressão de
gratidão.
e)
A perspectiva do axé
candomblé, tomado como o
coletivo dos povos de terreiro
em escala nacional, é uma
proposta civilizatória análoga ao
Ubuntu e ao
Tianxia
transcender as diferenças entre
estilos e nações e assim unificar
os seres humanos com os
ancestrais e o cosmos,
desdobrando-
se no quatérnio
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
(Bem Viver) é
uma proposta civilizatória
países andinos,
servindo de fundamentação até
para a Constituição do Equa
dor.
É formulado também em aimará
como Suma Qamaña
e em
guarani (especialmente da
Bolívia) com o termo
Teko Porã.
Também os povos
Guaranis Mbyáe Kaiowá do
Brasil expressam esse projeto
de vida pacificada e unificada
espiritualmente com a vida
idária em comunidade com o
termo aguyjé, traduzido às
vezes, de um modo parcial,
como uma expressão de
A perspectiva do axé
do
candomblé, tomado como o
coletivo dos povos de terreiro
em escala nacional, é uma
proposta civilizatória análoga ao
Tianxia
por
transcender as diferenças entre
estilos e nações e assim unificar
os seres humanos com os
ancestrais e o cosmos,
se no quatérnio
axé-ori-orixá-
egun.
15
Para a perspectiva do Ubuntu, ver Mugo
(2021) e Ngoenha (2011); para o modelo do
Tianxia, ver
Tingyang (2016); para o Bem
Viver e o Teko
Porã, ver Acosta (2016); para a
perspectiva do axé, ver (CARVALHO
332
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
egun.
15
Para a perspectiva do Ubuntu, ver Mugo
(2021) e Ngoenha (2011); para o modelo do
Tingyang (2016); para o Bem
Porã, ver Acosta (2016); para a
perspectiva do axé, ver (CARVALHO
, 2023d).
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
As variáveis surgem da análise
das inovações curriculares do
Encontro de Saberes. O círculo
delineia um sistema de
retroalimentação: cada uma delas
forma e é por sua vez formada por
todas as outras. Essa cadeia
interde
pendente, contudo, não gira
com uma velocidade estável, porque
algumas dimensões são mais
suscetíveis a mudanças rápidas que
outras. Os temas certamente sofrem
um ritmo mais veloz de mudança que
os paradigmas e as epistemes, por
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
As variáveis surgem da análise
das inovações curriculares do
Encontro de Saberes. O círculo
delineia um sistema de
retroalimentação: cada uma delas
forma e é por sua vez formada por
todas as outras. Essa cadeia
pendente, contudo, não gira
com uma velocidade estável, porque
algumas dimensões são mais
suscetíveis a mudanças rápidas que
outras. Os temas certamente sofrem
um ritmo mais veloz de mudança que
os paradigmas e as epistemes, por
exemplo; e estas, por sua v
mudar antes que os modos de viver e
as propostas civilizatórias.
Todavia, podemos observar as
variáveis a parte de qualquer uma,
independente do seu ritmo mais
provável de mudança. De fato,
diferentes edições do Encontro de
Saberes podem favorec
que outras, a depender das
circunstâncias e/ou das preferências
de cada mestre ou mestra.
Comentando brevemente o conceito
de
“programa de pesquisa” criado por
333
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
exemplo; e estas, por sua v
ez, podem
mudar antes que os modos de viver e
as propostas civilizatórias.
Todavia, podemos observar as
variáveis a parte de qualquer uma,
independente do seu ritmo mais
provável de mudança. De fato,
diferentes edições do Encontro de
Saberes podem favorec
er mais umas
que outras, a depender das
circunstâncias e/ou das preferências
de cada mestre ou mestra.
Comentando brevemente o conceito
“programa de pesquisa” criado por
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Imre Lakatos
para funcionar como
alternativa ao conceito de paradigma
de Thomas Kuh
n, talvez fosse possível
nomear o
próprio movimento do
Encontro de Saberes como um novo
programa de pesquisa em construção.
Em tal caso, ele não seria um
programa específico, pois essa
empresa textocêntrica excluiria
obviamente os mestres e faria o
Encontr
o de saberes retornar ao
monologismo acadêmico que
justamente queremos superar. Se
fôssemos fraseá-
lo nos termos de
Lakatos, aparentemente o que temos
até agora são embriões de vários
novos programas de pesquisa
raizeiras, das sementes crioulas,das
a
rquiteturas do barro e da palha, entre
outros, todos condicionados por uma
multiplicidade de interesses e
representações, teorias e abordagens,
modos de viver e projetos civilizatórios
trazidos pelos mestres e mestras das
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
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(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
para funcionar como
alternativa ao conceito de paradigma
n, talvez fosse possível
próprio movimento do
Encontro de Saberes como um novo
programa de pesquisa em construção.
Em tal caso, ele não seria um
programa específico, pois essa
empresa textocêntrica excluiria
obviamente os mestres e faria o
o de saberes retornar ao
monologismo acadêmico que
justamente queremos superar. Se
lo nos termos de
Lakatos, aparentemente o que temos
até agora são embriões de vários
novos programas de pesquisa
- das
raizeiras, das sementes crioulas,das
rquiteturas do barro e da palha, entre
outros, todos condicionados por uma
multiplicidade de interesses e
representações, teorias e abordagens,
modos de viver e projetos civilizatórios
trazidos pelos mestres e mestras das
dezenas de povos tradicionais
brasileiros.
Por isso, estamos diante de um
primeiro momento de uma afirmação
potente da pluralidade epistêmica sem
precedente na história das
universidades brasileiras. Obviamente,
essa afirmação da pluriepistemia
acadêmica é ainda pequena diante da
escala
absolutamente avassaladora
dos conteúdos eurocêntricos que são
ensinados e utilizados como referência
única de saber válido em todos os
nossos cursos. Apesar desse
contraste quantitativo ainda favorável à
episteme eurocêntrica, as disciplinas
do Encontro d
e Saberes afirmam uma
revolução qualitativa provavelmente
sem retorno: a tendência é que mais e
mais saberes não eurocêntricos sejam
incluídos com base nas epistemes
indígenas e afro-
diaspóricas.
Uma representação possível
desse modelo colonizado
monoepis
têmico é o gráfico a
334
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
dezenas de povos tradicionais
Por isso, estamos diante de um
primeiro momento de uma afirmação
potente da pluralidade epistêmica sem
precedente na história das
universidades brasileiras. Obviamente,
essa afirmação da pluriepistemia
acadêmica é ainda pequena diante da
absolutamente avassaladora
dos conteúdos eurocêntricos que são
ensinados e utilizados como referência
única de saber válido em todos os
nossos cursos. Apesar desse
contraste quantitativo ainda favorável à
episteme eurocêntrica, as disciplinas
e Saberes afirmam uma
revolução qualitativa provavelmente
sem retorno: a tendência é que mais e
mais saberes não eurocêntricos sejam
incluídos com base nas epistemes
diaspóricas.
Uma representação possível
desse modelo colonizado
têmico é o gráfico a
seguir.
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
Duas dimensões ressaltam
neste gráfico: a primeira delas, a
redução ou negação dos troncos das
epistemes indígenas e afro
pois o únic
o modo em que esses
saberes apareciam era pela sua
tradução ao paradigma eurocêntrico; a
segunda, é a escala simplificada em
que apareciam, pois 95% do conteúdo
ensinado e reproduzido estava
concentrado no tronco eurocêntrico.
Por mais de um século de vida
universitária, contávamos apenas com
um tronco epistêmico, o eurocêntrico,
e todos os saberes indígenas, afro
brasileiros, populares e dos demais
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
Duas dimensões ressaltam
neste gráfico: a primeira delas, a
redução ou negação dos troncos das
epistemes indígenas e afro
-brasileiras,
o modo em que esses
saberes apareciam era pela sua
tradução ao paradigma eurocêntrico; a
segunda, é a escala simplificada em
que apareciam, pois 95% do conteúdo
ensinado e reproduzido estava
concentrado no tronco eurocêntrico.
Por mais de um século de vida
universitária, contávamos apenas com
um tronco epistêmico, o eurocêntrico,
e todos os saberes indígenas, afro
-
brasileiros, populares e dos demais
povos tradicionais eram raramente
representados (e ainda assim de uma
forma breve e incompleta) com os
parâme
tros da episteme ocidental
moderna.
A Lei 10.639 de 2003 marcou o
primeiro momento de expansão da
diversidade temática; ensinar a
História da África e a Cultura Afro
Brasileira. Contudo, o modelo
epistêmico eurocêntrico não foi
diretamente questionado. Ma
não ficou clara a necessidade de se
apresentar os conteúdos da Lei
segundo o paradigma epistêmico afro
diaspórico, isto é: se deveríamos
335
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
povos tradicionais eram raramente
representados (e ainda assim de uma
forma breve e incompleta) com os
tros da episteme ocidental
A Lei 10.639 de 2003 marcou o
primeiro momento de expansão da
diversidade temática; ensinar a
História da África e a Cultura Afro
-
Brasileira. Contudo, o modelo
epistêmico eurocêntrico não foi
diretamente questionado. Ma
is ainda,
não ficou clara a necessidade de se
apresentar os conteúdos da Lei
segundo o paradigma epistêmico afro
-
diaspórico, isto é: se deveríamos
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
ensinar as culturas afro
vendo-
as do mesmo modo como são
vistas pelos negros que vivem nas
comunidades afro-
brasileiras. A Lei
11.645, de 2008, também significou
uma segunda expansão da
diversidade temática, ao tornar
obrigatório o ensino das culturas
indígenas (e por culturas indígenas
leia-
se a gama completa dos saberes
indígenas). Porém, assim como
10.639, ela não deixou explícito se as
culturas indígenas deveriam ser
ensinadas na perspectiva epistêmica
dos povos indígenas. Na medida em
que esse debate não apareceu, a
monoepisteme eurocêntrica
propriamente dita continuou
organizando o ensino s
uperior e a
inovação das duas Leis ficou restrita
ao plano curricular, e ainda mantido o
padrão letrado de ampliar a bibliografia
sobre os saberes indígenas e afro
brasileiros. Resumindo, o círculo
monoepistêmico acima representa o
modo como as duas Leis p
o avanço curricular, com ênfase quase
exclusiva na dimensão temática, duas
décadas atrás. De fato, nossa
realidade epistêmica, desde a
fundação das universidades até o
início de 2003, seria representada por
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
ensinar as culturas afro
-brasileiras
as do mesmo modo como são
vistas pelos negros que vivem nas
brasileiras. A Lei
11.645, de 2008, também significou
uma segunda expansão da
diversidade temática, ao tornar
obrigatório o ensino das culturas
indígenas (e por culturas indígenas
se a gama completa dos saberes
indígenas). Porém, assim como
a Lei
10.639, ela não deixou explícito se as
culturas indígenas deveriam ser
ensinadas na perspectiva epistêmica
dos povos indígenas. Na medida em
que esse debate não apareceu, a
monoepisteme eurocêntrica
propriamente dita continuou
uperior e a
inovação das duas Leis ficou restrita
ao plano curricular, e ainda mantido o
padrão letrado de ampliar a bibliografia
sobre os saberes indígenas e afro
-
brasileiros. Resumindo, o círculo
monoepistêmico acima representa o
modo como as duas Leis p
ropuseram
o avanço curricular, com ênfase quase
exclusiva na dimensão temática, duas
décadas atrás. De fato, nossa
realidade epistêmica, desde a
fundação das universidades até o
início de 2003, seria representada por
um único círculo, do tronco epistêmico
ocidental, com alguns pequenos
pontos internos representando as
eventuais menções ou os poucos
temas indígenas ou afro
que despertavam o interesse de
alguns pesquisadores
O quadro epistêmico se
transforma radicalmente nas
universidades após a e
Encontro de Saberes, que traz os
saberes indígenas e afro
para a sala de aula pela voz dos seus
mestres e mestras. Essa nova
realidade epistêmica pode ser
representada pelos três círculos
borromeanos seguintes.
16
Elaborei o modelo dos troncos epistêmicos
nos círculos borromeanos com mais detalhes
em Carvalho (2023b).
336
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
um único círculo, do tronco epistêmico
ocidental, com alguns pequenos
pontos internos representando as
eventuais menções ou os poucos
temas indígenas ou afro
-brasileiros
que despertavam o interesse de
alguns pesquisadores
O quadro epistêmico se
transforma radicalmente nas
universidades após a e
xpansão do
Encontro de Saberes, que traz os
saberes indígenas e afro
-brasileiros
para a sala de aula pela voz dos seus
mestres e mestras. Essa nova
realidade epistêmica pode ser
representada pelos três círculos
borromeanos seguintes.
16
Elaborei o modelo dos troncos epistêmicos
nos círculos borromeanos com mais detalhes
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
A lista de disciplinas do
Encontro de Saberes nos permite
visualizar o processo de ampliação e
diversificação dos troncos epistêmicos
no interior do nosso mundo
acadêmico. Os t
rês círculos
borromeanos expressam o processo
novo de cruzamento, fusão,
complementaridade, confronto ou
coexistência pacífica da episteme
eurocêntrica com as epistemes
indígenas e afro
-
Recapitulando, a primeira imagem
expressa a redução à con
meros objetos de estudo na
perspectiva eurocêntrica, que reinava
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
A lista de disciplinas do
Encontro de Saberes nos permite
visualizar o processo de ampliação e
diversificação dos troncos epistêmicos
no interior do nosso mundo
rês círculos
borromeanos expressam o processo
novo de cruzamento, fusão,
complementaridade, confronto ou
coexistência pacífica da episteme
eurocêntrica com as epistemes
-
diaspóricas.
Recapitulando, a primeira imagem
expressa a redução à con
dição de
meros objetos de estudo na
perspectiva eurocêntrica, que reinava
absoluta. Ou seja, as epistemes não
eurocêntricas eram (e ainda continuam
sendo em grande medida) subsumidas
aos parâmetros teóricos,
metodológicos e conceituais da
episteme eurocênt
rica. A segunda
imagem, dos nós borromeanos
formados pelos três círculos, pode ser
visualizado como um processo de
crescimento, autonomização e
diferenciação epistêmica, em que os
saberes indígenas e afro
finalmente transcendem e rompem
com sua
condição de subordinação e
confinamento no interior do círculo
autorreferente do tronco eurocêntrico,
337
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
absoluta. Ou seja, as epistemes não
-
eurocêntricas eram (e ainda continuam
sendo em grande medida) subsumidas
aos parâmetros teóricos,
metodológicos e conceituais da
rica. A segunda
imagem, dos nós borromeanos
formados pelos três círculos, pode ser
visualizado como um processo de
crescimento, autonomização e
diferenciação epistêmica, em que os
saberes indígenas e afro
-diaspóricos
finalmente transcendem e rompem
condição de subordinação e
confinamento no interior do círculo
autorreferente do tronco eurocêntrico,
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
que se representava, não como
eurocêntrico e monoepistêmico, mas
como universal.
Façamos ainda um pequeno
exercício de reconhecimento e
localização dos
conteúdos dos
saberes -
ocidentais, indígenas ou
afro-brasileiros -
ensinados nos cursos
do Encontro de Saberes, tanto no
modelo monoepistêmico como no
pluriepistêmico. Por exemplo,
podemos identificar o módulo de
arquitetura Kamayurá ou o gênero
musical d
a flauta xinguana Jacuí
como pertencente à parte
exclusivamente indígena dos três
círculos; o módulo sobre a tradição
Nagô, ou iorubá, como a parte afro
diaspórica; o módulo sobre a cantoria
nordestina caberia no espaço dos
saberes ocidentais; o módulo so
Congado encaixaria no nó superior
dos círculos que une os saberes
ocidentais com os saberes afro
diaspóricos; e o módulo sobre os
encantados dos Pataxós e
Tupinambás estaria na parte central,
onde os três troncos se entrecruzam.
Este é apenas um esboço
a complexidade epistêmica que
começa agora a se estabelecer nos
nossos cursos de currículo até agora
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Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
que se representava, não como
eurocêntrico e monoepistêmico, mas
Façamos ainda um pequeno
exercício de reconhecimento e
conteúdos dos
ocidentais, indígenas ou
ensinados nos cursos
do Encontro de Saberes, tanto no
modelo monoepistêmico como no
pluriepistêmico. Por exemplo,
podemos identificar o módulo de
arquitetura Kamayurá ou o gênero
a flauta xinguana Jacuí
como pertencente à parte
exclusivamente indígena dos três
círculos; o módulo sobre a tradição
Nagô, ou iorubá, como a parte afro
-
diaspórica; o módulo sobre a cantoria
nordestina caberia no espaço dos
saberes ocidentais; o módulo so
bre
Congado encaixaria no nó superior
dos círculos que une os saberes
ocidentais com os saberes afro
-
diaspóricos; e o módulo sobre os
encantados dos Pataxós e
Tupinambás estaria na parte central,
onde os três troncos se entrecruzam.
para ilustrar
a complexidade epistêmica que
começa agora a se estabelecer nos
nossos cursos de currículo até agora
cristalizado pelo tronco puramente
ocidental.
Na mesma medida em que as
duas epistemes iam saindo do seu
aprisionamento do círculo
eurocêntr
ico, iam também se
desvencilhando da sua condição de
objeto a ser interpretado e
representado na perspectiva exclusiva
da monoepisteme eurocêntrica. Os
diferentes espaços de interseção
gerados pelos três nós podem indicar
os sincretismos, hibridismos e fus
interepistêmicas várias que foram se
manifestando ao longo de nossa
história; e essas interseções podem
conviver com as perspectivas
exclusivas de cada um dos três
troncos, vistos cada um deles em suas
configurações históricas singulares.
Por outro lad
o, na imagem dos círculos
borromeanos não vemos apenas um
(como na primeira imagem), mas três
sujeitos.
A lógica Igbo do Ezumezu
desenvolvida por Chimakonam, isto é,
do terceiro incluído complementar,
presta-
se a representar o mundo que
começa a surgir co
m o Encontro de
Saberes como um novo espaço
pluriepistêmico: os padrões
eurocêntricos que serão rejeitados; os
338
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
cristalizado pelo tronco puramente
Na mesma medida em que as
duas epistemes iam saindo do seu
aprisionamento do círculo
ico, iam também se
desvencilhando da sua condição de
objeto a ser interpretado e
representado na perspectiva exclusiva
da monoepisteme eurocêntrica. Os
diferentes espaços de interseção
gerados pelos três nós podem indicar
os sincretismos, hibridismos e fus
ões
interepistêmicas várias que foram se
manifestando ao longo de nossa
história; e essas interseções podem
conviver com as perspectivas
exclusivas de cada um dos três
troncos, vistos cada um deles em suas
configurações históricas singulares.
o, na imagem dos círculos
borromeanos não vemos apenas um
(como na primeira imagem), mas três
A lógica Igbo do Ezumezu
desenvolvida por Chimakonam, isto é,
do terceiro incluído complementar,
se a representar o mundo que
m o Encontro de
Saberes como um novo espaço
pluriepistêmico: os padrões
eurocêntricos que serão rejeitados; os
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
que continuarão como sempre
estiveram; e os que serão
transformados a partir do filtro
poliepistêmico colocado pelos saberes
indígenas e afro-bra
sileiros.
Com o pluralismo epistêmico do
Encontro de Saberes entramos em
uma esfera nova de questões
epistemológicas, praticamente sem
precedentes na história da ciência
moderna. Pela primeira vez nesses
últimos trezentos anos de debate, as
questões e pre
tensões de
conhecimento válido foram colocadas
por sábios situados fora da
comunidade científica letrada
ocidental. Até mesmo a refutação dos
saberes ditos esotéricos, como a
astrologia, a alquimia, a numerologia,
entre outros, foi um movimento
iniciado e
mantido no interior daquela
comunidade letrada. Ou seja, tanto os
defensores desses saberes ditos
espirituais quanto seus críticos
estavam inseridos nesse grande
arquivo escrito; e o que mudou, em
parte, na postura dos críticos e
rejeitadores das ciências
esotéricas foi
(também) uma mudança do regime de
escrita, tema frequentado nos debates
epistemológicos e em suas
adjacências, como no livro de Michael
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
que continuarão como sempre
estiveram; e os que serão
transformados a partir do filtro
poliepistêmico colocado pelos saberes
sileiros.
Com o pluralismo epistêmico do
Encontro de Saberes entramos em
uma esfera nova de questões
epistemológicas, praticamente sem
precedentes na história da ciência
moderna. Pela primeira vez nesses
últimos trezentos anos de debate, as
tensões de
conhecimento válido foram colocadas
por sábios situados fora da
comunidade científica letrada
ocidental. Até mesmo a refutação dos
saberes ditos esotéricos, como a
astrologia, a alquimia, a numerologia,
entre outros, foi um movimento
mantido no interior daquela
comunidade letrada. Ou seja, tanto os
defensores desses saberes ditos
espirituais quanto seus críticos
estavam inseridos nesse grande
arquivo escrito; e o que mudou, em
parte, na postura dos críticos e
esotéricas foi
(também) uma mudança do regime de
escrita, tema frequentado nos debates
epistemológicos e em suas
adjacências, como no livro de Michael
de Certeau
A Fábula Mística,
mudança do regime discursivo logo
após Santa Teresa de Ávila, com a
passagem de uma escrita mística
visionária para uma escrita
racionalizada, na mesma época da
constituição da revolução científica
moderna (CERTEAU
,
Apesar das diferenças às vezes
radicais entre os debatedores, o tipo
de pluralismo acadêmico vigente,
mesmo com suas significativas
tensões internas, mantém uma
unidade argumentativa
palavras, um regime de linguagem
dada por um campo disciplinar
eurocêntrico perfeitamente
estabelecido e estável, que é o campo
da Epistemologia acadêmica,
obvi
amente muito anterior e agora
ainda à margem do Encontro de
Saberes. Contudo, já contamos com
um novo pluralismo epistêmico, em
que já surgiram os primeiros diálogos
interepistêmicos em algumas
disciplinas acadêmicas.
Ainda que não nos seja
possível, por agora, divisar os
contornos dessa futura Epistemologia
Comparada, ela muito provavelmente
deverá tomar em conta fortemente a
variável do interesse na construção do
339
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
A Fábula Mística,
sobre a
mudança do regime discursivo logo
após Santa Teresa de Ávila, com a
passagem de uma escrita mística
visionária para uma escrita
racionalizada, na mesma época da
constituição da revolução científica
,
1992).
Apesar das diferenças às vezes
radicais entre os debatedores, o tipo
de pluralismo acadêmico vigente,
mesmo com suas significativas
tensões internas, mantém uma
unidade argumentativa
– em outras
palavras, um regime de linguagem
-
dada por um campo disciplinar
eurocêntrico perfeitamente
estabelecido e estável, que é o campo
da Epistemologia acadêmica,
amente muito anterior e agora
ainda à margem do Encontro de
Saberes. Contudo, já contamos com
um novo pluralismo epistêmico, em
que já surgiram os primeiros diálogos
interepistêmicos em algumas
disciplinas acadêmicas.
Ainda que não nos seja
possível, por agora, divisar os
contornos dessa futura Epistemologia
Comparada, ela muito provavelmente
deverá tomar em conta fortemente a
variável do interesse na construção do
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Brasileiras. PragMATIZES - Revista Latino-
Americana de Estudos em
Cultura, Niterói/RJ, Ano 13, n. 25, p. 302-345
, set. 2023.
conhecimento válido, colocada por
Joseph Agassi ao invo
responsabilidade social (a qual
podemos estender aos interesses dos
povos tradicionais, das comunidades
negras, das mulheres etc.) como um
fator a influenciar a noção de
racionalidade científica (
1974).
Finalmente, no momento futuro
em que c
hegarmos à situação de
equanimidade plena entre os três
troncos, todas as relações
interepistêmicas geradas na e pela
nossa academia serão relações
sujeito-
sujeito, e não mais relações
sujeito-
objeto, em que invariavelmente
o lugar de sujeito era ocupado p
grupo branco monoepistêmico
eurocêntrico, e o lugar de objeto
ocupado apenas pelos indígenas e
afro-
diaspóricos. Assim,
Epistemômetro recolhe todas as
inovações trazidas pelo movimento do
Encontro de Saberes para projetar
nossos esforços para a co
epistêmica equânime no ensino
superior e na pesquisa.
Ou melhor, o
Epistemômetro nos indica o caminho
que devemos percorrer para a
construção de uma universidade do
comunismo epistêmico, em que todos
CARVALHO, José Jorge de. Epistemômetro. Uma Metodologia para a
Descolonização e Transformação do Currículo das Universidades
Americana de Estudos em
, set. 2023.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes -
(Dossiê "
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
conhecimento válido, colocada por
Joseph Agassi ao invo
car a
responsabilidade social (a qual
podemos estender aos interesses dos
povos tradicionais, das comunidades
negras, das mulheres etc.) como um
fator a influenciar a noção de
racionalidade científica (
AGASSI,
Finalmente, no momento futuro
hegarmos à situação de
equanimidade plena entre os três
troncos, todas as relações
interepistêmicas geradas na e pela
nossa academia serão relações
sujeito, e não mais relações
objeto, em que invariavelmente
o lugar de sujeito era ocupado p
elo
grupo branco monoepistêmico
eurocêntrico, e o lugar de objeto
ocupado apenas pelos indígenas e
diaspóricos. Assim,
o
Epistemômetro recolhe todas as
inovações trazidas pelo movimento do
Encontro de Saberes para projetar
nossos esforços para a co
-existência
epistêmica equânime no ensino
Ou melhor, o
Epistemômetro nos indica o caminho
que devemos percorrer para a
construção de uma universidade do
comunismo epistêmico, em que todos
os saberes públicos de todos estejam
disponíveis para todos sob o controle
de todos.
Referências
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O Bem V
Paulo: Autonomia Literária, Elefante
Editora, 2016.
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and the Decolonial Curriculum
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Conventionalism is more
Comprehensive than Modified
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Perspectiva do Axé como Episteme
340
ISSN 2237-1508
Imagens reflexas sobre os Encontros de Saberes no ensino superior
")
os saberes públicos de todos estejam
disponíveis para todos sob o controle
O Bem V
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;
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Brasileira e como Proposta
Civilizatória.
Cadernos de Inclusão
Brasília,
INCT de Inclusão, 2023d.
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Proposal to Transform the Curriculum
of Universities.
Towards a Multingual,
Multicultural, and
Pluriepistemic
Academic Institution.
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Inclusão, Brasília,
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Virus, revueltas
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Lecturas de la pandemia
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Brasileira e como Proposta
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