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RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
como ferramenta na Gestão Participativa Urbana: um caso em Campos
dos Goytacazes/RJ. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de Estudos
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 15, n. 28, p.48-72, mar. 2025.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
As Batalhas de Rimas como ferramenta na Gestão Participativa Urbana: um
caso em Campos dos Goytacazes/RJ
Carla Aparecida da Silva Ribeiro
1
Aline Couto da Costa
2
Simonne Teixeira
3
DOI: https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v15i28.65553
Resumo: O Hip-Hop, especificamente as batalhas de rimas, pode ser visto como um movimento
cultural e social de resistência e reivindicação de direitos por uma parte menos favorecida da sociedade.
No entanto, a cultura urbana frequentemente recebe pouco apoio do Estado e em 2020, com a
pandemia da COVID-19, os desafios enfrentados por esses atores foram ainda mais intensificados.
Este artigo teve como objetivo compreender, por meio de um estudo de caso, a atuação do coletivo
Manifestação Cultural de Rimas (MCR), no período de 2020 a 2021, no contexto da gestão participativa
urbana, destacando a importância da preservação dessa manifestação cultural e do espaço que ocupa
na cidade. A metodologia adotada incluiu: revisão bibliográfica e documental; estudo de caso; e
pesquisas de campo. Ao longo da análise, procurou-se demonstrar como a cultura local e a mobilização
de seus agentes podem ser utilizadas para que esses grupos se manifestem e sejam incluídos no
processo de gestão participativa urbana, contribuindo para a cidade, seja por meio da apropriação de
espaços subutilizados, da arte urbana, entre outros aspectos.
Palavras-chave: Hip-Hop; batalhas de rimas; gestão participativa urbana.
Rap Battles as a tool in Urban Participatory Management: a case in Campos dos Goytacazes/RJ
Abstract: Hip-Hop, specifically rhyme battles, can be seen as a cultural and social movement of
resistance and demand for rights by a less favored part of society. However, urban culture often receives
1
Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Políticas Sociais da Universidade Estadual do Norte
Fluminense Darcy Ribeiro (UENF). E-mail: caarla.ribeiroarq@gmail.com. ORCID:
https://orcid.org/0000-0001-9845-7903.
2
Doutora em Arquitetura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Docente no Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense (IFFluminense). E-mail:
alinecoutoarquitetura@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1533-2142.
3
Doutora em Filosofía i Lletras (História) pela Universitat Autònoma de Barcelona/Espanha; Pós-
doutorado na Escuela de Estudios Hispano-Americanos (CSIC/Espanha, 2011/2012). Bolsista
produtividade CNPq (2007-atual). Docente da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy
Ribeiro (UENF). E-mail: simonne@uenf.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2476-8247.
Recebido em 30/11/2024, aceito para publicação em 22/12/2024.
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RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
como ferramenta na Gestão Participativa Urbana: um caso em Campos
dos Goytacazes/RJ. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de Estudos
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 15, n. 28, p.48-72, mar. 2025.
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
little support from the State and in 2020, with the COVID-19 pandemic, the challenges faced by these
actors were even more intensified. This article aimed to understand, through a case study, the
performance of the collective Manifestação Cultural de Rimas (MCR), in the period from 2020 to 2021,
in the context of urban participatory management, highlighting the importance of preserving this cultural
manifestation and of the space it occupies in the city. The methodology adopted included: bibliographic
and documentary review; case study; and field research. Throughout the analysis, we sought to
demonstrate how local culture and the mobilization of its agents can be used so that these groups can
manifest themselves and be included in the urban participatory management process, contributing to
the city, whether through the appropriation of spaces underutilized, urban art, among other aspects.
Keywords: Hip-Hop; rap battles; urban participatory management.
Batallas de Rimas como herramienta en la Gestión Participativa Urbana: un caso en Campos
dos Goytacazes/RJ
Resumen: El Hip-Hop, especilmente las batallas de rimas, puede verse como un movimiento cultural y
social de resistencia y reivindicación de derechos por parte de una parte menos favorecida de la
sociedad. Sin embargo, la cultura urbana a menudo recibe poco apoyo del Estado y en 2020, con la
pandemia de COVID-19, los desafíos que enfrentan estos actores se intensificaron aún más. Este
artículo tuvo como objetivo comprender, a través de un estudio de caso, la actuación del colectivo
Manifestação Cultural de Rimas (MCR), en el período de 2020 a 2021, en el contexto de la gestión
urbana participativa, destacando la importancia de preservar esta manifestación cultural y del espacio
que ocupa en la ciudad. La metodología adoptada incluyó: revisión bibliográfica y documental; estudio
de caso; e investigación de campo. A lo largo del análisis, buscamos demostrar cómo la cultura local y
la movilización de sus agentes pueden ser utilizadas para que estos grupos puedan manifestarse y ser
incluidos en el proceso de gestión participativa urbana, contribuyendo a la ciudad, ya sea a través de
la apropiación de espacios subutilizados, arte urbano, entre otros aspectos.
Palabras clave: Hip-Hop; batallas de rimas; gestión participativa urbana.
As Batalhas de Rimas como ferramenta na Gestão Participativa Urbana: um
caso em Campos dos Goytacazes/RJ
Introdução
O Hip-Hop, nas palavras de
Tricia Rose (2021), é uma “forma
cultural” que emergiu nos EUA urbanos
pós-industrial ainda na década de
1960, resultado da reorganização
urbana, recessão econômica e crise
fiscal do estado, no declínio dos direitos
civis dos negros, que geraram
circunstâncias desesperadoras para os
jovens urbanos. De acordo com a
autora, o Hip-Hop possibilitou não a
sobrevivência de pessoas e instituições
abandonadas, mas serviu também
como fonte de prazer a esses sujeitos.
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
Afrika Bambaataa
4
, membro dos
Black Spades, gangue de rua nova-
iorquino, procurou desviar a raiva e o
entusiasmo dos jovens do Sul do Bronx
das guerras entre gangues, orientando-
os para a cultura (Lipsitz, 1994). O
movimento é constituído, desta forma,
pelas quatro vertentes culturais que
estavam em ascensão entre os jovens,
e que foram reunidos por Bambaataa: o
Rap
5
, o Break
6
, o Graffiti
7
e o DJ
8
.
Nesse contexto, o Hip-Hop, em
suas origens e em algumas de suas
expressões atuais, surgiu como uma
reação ao modelo de segregação
socioeconômica, cultural e espacial
hegemônico, em tom de resistência às
condições de vida que as pessoas à
margem da sociedade viviam como
forma alternativa de produzir o espaço
urbano e de adquirir uma identidade
coletiva através da cultura (Rose, 2021;
Lipsitz, 1994).
Podendo ser caracterizado
como um movimento cultural e social
4
Afrika Bambaataa é considerado por muitos
autores como um dos principais responsáveis
pelo programa ideológico que serve de base à
cultura Hip-Hop devido a criação da
organização Zulu Nation (Fradique, 2003),
contudo, outros nomes importantes podem ser
destacados como: Kool-Herc, Grand Master
Flash, entre outros (Rose, 2021; Lipsitz, 1994;
Herschmann, 2000; Teperman, 2015).
que promovia, em determinados
contextos, a resistência e a valorização
da juventude negra e periférica, o
movimento buscava expressar as
experiências de exclusão social,
econômica, educacional e racial vividas
por esses indivíduos, com o objetivo de
desafiar as estruturas que os
segregavam e afastá-los da violência
de seus entornos, promovendo ainda a
apropriação de espaços urbanos
subutilizados e/ou abandonados,
possibilitando a requalificação de áreas
urbanas.
Rose (2021) pontua que a
produção da cultura negra
contemporânea explora em muitas de
suas manifestações a herança da
escravidão. Exemplo disso é o rap,
onde se destacam as vozes das
comunidades marginalizadas, sendo
constituído por narrativas rimadas,
acompanhadas por uma música
altamente rítmica e com elementos
eletrônicos (Rose, 2021).
5
Gênero musical urbano com versos por vezes
improvisados, rimas simples, repleto de gírias e
ditados populares.
6
Dança urbana com movimentos acrobáticos.
7
Representações com aerossol de tinta, nas
paredes, muros, monumentos de uma cidade.
8
Disc Jockey - artista ou profissional que
seleciona e reproduz as mais diferentes
composições musicais, previamente gravadas.
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transformações da cultura")
Desde suas origens, o rap
possui uma dimensão política que se
tornou símbolo do movimento,
expressando descontentamento e
resistência em comunidades
racializadas em situações de pobreza e
segregação urbana. As letras dos
rappers frequentemente narravam
histórias cotidianas de forma rimada,
abordando temas que podiam variar
entre política, questões sociais e
sexuais (Rose, 2021). Essas narrativas
eram apresentadas em contextos de
improvisação, onde a habilidade verbal
era avaliada por meio de confrontos
simbólicos, dando origem assim às
batalhas de rimas, enfoque desta
investigação.
Apesar de ter se iniciado como
um fenômeno local, na escala dos
bairros, a cultura se expandiu, provida
pela mídia e pelas indústrias culturais,
como a indústria discográfica, televisiva
e cinematográfica. Atualmente, o Hip-
Hop e o rap o considerados
fenômenos globais, que dão origem a
uma multiplicidade de formatos
expressivos e subgêneros musicais.
No que se refere à vertente das
Batalhas de Rimas, sua evolução de
acordo com Santos (2023), pode ter
sido impulsionada principalmente por
duas questões intrínsecas: a disputa
territorial, envolvendo violência e
discursos de resistência; e o pacto de
paz, que faz parte das premissas
filosóficas do movimento Hip-Hop. A
prática de duelar com base em
habilidades líricas, em vez de físicas,
foi fundamental para o crescimento,
expansão (Santos, 2023) e adoção
dessa vertente pela cultura Hip-Hop.
O município de Campos dos
Goytacazes, localizado na região Norte
do Estado do Rio de Janeiro, com uma
população de 483.540 (quatrocentos e
oitenta e três mil quinhentos e
quarenta) habitantes (IBGE, 2022) e
uma área de 4.032 km², conta, em
tempos mais recentes, com a Quadra
Hugo Oliveira Saldanha, situada abaixo
do viaduto da Ponte Leonel Brizola,
como o principal palco da cultura Hip-
Hop, sendo um dos ocupantes o
coletivo de batalhas de rimas intitulado
Manifestação Cultural de Rimas (MCR).
A ponte está localizada na região
central do município, entre o Centro
Histórico e dois dos bairros mais
elitizados da região. Não registros
precisos dos primeiros indícios do Hip-
Hop na cidade; contudo, de acordo com
Gonçalves (2019), em 2004,
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
começaram as ocupações no Centro do
município.
As batalhas de rimas, segundo
discursos de seus manifestantes
(Ribeiro, 2019), possibilita aos jovens,
que em grande maioria estão em
vulnerabilidade social, espaço para
gerar e consumir cultura, reivindicar
direitos, denunciar as mazelas de suas
realidades, além de ser um refúgio da
violência, territorialismo do tráfico e da
negligência do Estado. Contudo, os
membros do coletivo MCR discursam
em seus encontros culturais sobre a
dificuldade em manter o movimento
devido à indiferença e à falta de
investimento do poder público com o
espaço e com a cultura urbana.
Mattoso (2010) aborda que
grande parte da juventude brasileira é
acometida pelo agravamento das
condições sociais, principalmente
aqueles que residem nos centros
urbanos. De acordo com ele, a pobreza
é um fato urbano, onde a “reprodução
da pobreza é mediada pela reprodução
do modo urbano das condições de vida,
através da dinâmica do mercado de
trabalho e da natureza do sistema de
proteção social” (Mattoso, 2010, p.76).
A problemática enfrentada por esses
atores sociais se acentuou ainda mais
no ano de 2020, quando foi declarada a
pandemia da COVID-19 pela OMS. No
contexto cultural, a pandemia paralisou
as ações e atividades, colocando os
fazedores culturais com sua
sobrevivência comprometida (Peixe,
2021).
De acordo com a Lei no. 10.257,
de 10 de julho de 2001, que institui o
Estatuto da Cidade, “Aqueles que estão
engajados na transformação da cidade
rumo à superação de uma ordem
urbanística excludente, patrimonialista
e predatória podem ter no Estatuto da
Cidade um instrumento importante”
(Brasil, 2001, p. 23). Junto a isso, pode-
se destacar as gestões participativas,
que, de acordo com Gohn (2001),
tratam-se de canais de participação
que visam a interlocução entre a
população e o poder público, que
surgem nas cidades como instrumento
de democratização dos processos de
gestão e administração entre estes
atores ou setores da sociedade, para
que, assim, o Estado possa garantir a
pluralidade e a diversidade que a
formam.
Contudo, em muitos casos, a
gestão participativa não passa de uma
pseudoparticipação (Tenório;
Rozenberg, 1997), não atendendo as
53
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
necessidades de toda a população,
principalmente daqueles que mais
necessitam e têm menos voz. Unem-se
a isso administrações e políticas
reduzidas à dimensão eleitoral, que,
segundo Fernandes (2010), geram
acordos e decisões que abandonam a
complexidade da vida urbana.
Serpa (2010) traz a ideia da
cidade como fenômeno cultural, que
poderia ser traduzida e sintetizada
através da ideia de centralidade. Para o
autor, pensar a cidade como
centralidade traz a possibilidade de
pensá-la como “possibilidade de
encontro, de aproximação, de
simultaneidade, de reunião, de
intercâmbio e de relações. Então, a
cidade como fenômeno cultural é,
sobretudo, uma cidade que centraliza
as criações humanas” (Serpa, 2010,
p.29).
Neste sentido, este artigo tem
como objetivo compreender, por meio
de um estudo de caso, a atuação do
coletivo Manifestação Cultural de
Rimas (MCR), no período de 2020 a
2021, no contexto da gestão
participativa urbana, destacando a
importância da preservação dessa
manifestação cultural e do espaço que
ocupa na cidade. Com o intuito de
alcançar tal objetivo, a pesquisa, fruto
da dissertação de uma das autoras
deste trabalho, adotou uma abordagem
qualitativa.
Além da fundamentação teórica,
realizada através de uma ampla revisão
bibliográfica e documental, foi realizado
um estudo de caso associado a uma
pesquisa de campo. Essa etapa teve
como foco a caracterização dos
espaços utilizados pelos agentes
formadores do movimento em Campos
dos Goytacazes, com ênfase na Ponte
Leonel Brizola. A pesquisa de campo
adotou uma abordagem na qual a
pesquisadora estabeleceu contato
direto com os manifestantes e com o
espaço estudado, utilizando coleta de
registros dos participantes da
manifestação quando estas ocorriam;
visitas da pesquisadora a Ponte Leonel
Brizola em diferentes dias e horários
com gravações periódicas e registros
fotográficos; entrevistas não
estruturadas com os organizadores e
participantes da manifestação; rodas
de conversa com a organização do
coletivo; e entrevista com membros
responsáveis pela elaboração do Plano
de Cultura municipal.
Cabe ressaltar que, devido ao
contexto da pandemia da COVID-19, os
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
procedimentos metodológicos
precisaram ser adaptados conforme as
orientações da Organização Mundial da
Saúde (OMS) e da Organização Pan-
Americana da Saúde (OPAS) (2020).
Dessa forma, nos casos em que o
contato virtual não foi possível, as
entrevistas presenciais ocorreram em
locais abertos e arejados, com
distância mínima de 1 metro entre a
pesquisadora e os entrevistados, com o
uso obrigatório de máscaras e
higienização frequente das mãos com
álcool em gel 70%. As entrevistas
foram devidamente autorizadas pelo
Comitê de Ética, garantindo os
protocolos de segurança e integridade
dos participantes.
Os dados coletados foram
documentados por meio de imagens,
registros escritos e transcrições das
entrevistas, permitindo uma análise
comparativa das mudanças no espaço
estudado e do impacto da ausência das
manifestações durante a pandemia.
Esses dados contribuíram para a
compreensão da relação entre o
coletivo MCR, o espaço urbano e a
gestão participativa da cidade.
Breve contextualização histórica do
Hip-Hop em Campos dos
Goytacazes
O surgimento da cultura Hip-Hop
em Campos dos Goytacazes não
possui um marco exato e consensual
entre os membros do movimento,
conforme apontado na bibliografia
consultada e nas entrevistas realizadas
para esta pesquisa. Contudo, cabe
abordar aqui um breve delineamento
acerca da cultura na cidade, a fim de
compreender os desdobramentos no
contexto da investigação.
Em entrevista para Ribeiro
(2021), o rapper e Mestre em Políticas
Sociais, Paulo Roberto Gonçalves,
afirmou que, com base em suas
pesquisas e vivências, os primeiros
sinais da cultura Hip-Hop na região
central surgiram com o graffiti, por volta
de 2004. Por sua vez, Victor Almeida
(2021), conhecido artisticamente como
Lebron Victor, fundador da Nação
Basquete de Rua (NBR) e participante
do movimento Hip-Hop por meio do
basquete, além de empresário e ex-
Diretor de Projetos da Secretaria
Municipal de Desenvolvimento
Econômico e Turismo, comentou à uma
das autoras deste texto, para sua
pesquisa de dissertação, que, embora
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não tenha vivenciado o início do
movimento na cidade, participou de
uma nova fase da cultura no início dos
anos 2000, quando os elementos se
integraram em ocupações no centro da
cidade.
Almeida (2021) também relatou
que, por volta de 2002, realizavam-se
batalhas de rima nos bairros de Ururaí
e Custodópolis, localizados na periferia
de Campos dos Goytacazes. Segundo
o entrevistado, a roda de Ururaí era a
mais representativa e conhecida,
contudo, ambas aconteciam há
algum tempo, embora ele não tenha
conseguido especificar uma data exata.
No entanto, ressalta-se a ausência de
registros ou documentos que
confirmem esses eventos e suas
respectivas datas.
Reforçando a escassez de
pesquisas, bibliografias e dados
históricos sobre a cultura Hip-Hop em
Campos dos Goytacazes, em agosto
de 2021, o coletivo de graffiti da cidade,
conhecido como Lamparones, lançou
no YouTube o documentário Linha do
Tempo do Graffiti em Campos dos
Goytacazes, dividido em duas partes.
9
Codinome do pichador, criado em uma
estética própria, com letras estilizadas e
sobrepostas (Diógenes, 2014).
Conforme relata Anna Franthesca
Santos (2021), arte-educadora,
produtora cultural e integrante do
coletivo, que também foi entrevistada
para a pesquisa, a ideia do
documentário surgiu quando ela
percebeu, durante suas pesquisas de
especialização e pós-graduação, que a
história, da qual ela faz parte, estava
sendo registrada em trabalhos
acadêmicos com diversos erros.
De acordo com Anderson
Santos, mais conhecido por seu nome
artístico Andinho Ide (Linha, 2021), ele
foi o pioneiro do graffiti em Campos dos
Goytacazes, iniciando essa prática em
1998 por meio do xarpi
9
. Em 2000, ao
receber um serviço na gráfica onde
trabalhava, que trazia como plano de
fundo um mural grafitado, decidiu
aprofundar-se na arte, iniciando suas
pesquisas. Segundo o artista, ele
adquiriu algumas latas de tinta e
começou a reproduzir as imagens nas
ruas. Com o tempo, amigos e outros
praticantes do xarpi passaram a se
reunir com ele, fortalecendo a cena
local (Linha, 2021).
56
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transformações da cultura")
Em 2004, os amigos Andinho
Ide, Fabi e Endi 317 fundaram o
Progressivo Art Crew. No mesmo ano,
organizaram o primeiro encontro de
graffiti em Campos dos Goytacazes,
que ocorreu no Condomínio Chácara
da Lapa, no bairro da Lapa, onde
grafitaram uma parede do local. Esse
evento atraiu novos curiosos pelo
movimento, ampliando a adesão à
prática do graffiti na cidade.
No documentário, os artistas
relatam as dificuldades enfrentadas
nesse período, como a ilegalidade do
xarpi, a falta de recursos e materiais,
incluindo tintas, e o limitado
reconhecimento da arte urbana. Diante
desses obstáculos, eles eram
obrigados a grafitar em locais pouco
visados do município. No entanto, a
crew
10
começou a ganhar força e, em
2005, recebeu reconhecimento do
Serviço Social do Comércio (SESC),
que passou a apoiar suas iniciativas
educacionais, culturais e esportivas.
Além disso, os grafiteiros conquistaram
espaço nas universidades e ampliaram
sua atuação por meio de mutirões em
comunidades e oficinas realizadas em
escolas.
10
Em português: gangue ou grupo.
No que diz respeito ao viaduto
da Ponte Leonel Brizola, o grafiteiro
Jhony Misterbod destaca:
A primeira vez que a gente
tentou pintar o viaduto, foi em
2007, inclusive tem esse graffiti
até hoje lá. Foi um domingo,
um dia com os alunos,
apareceu a guarda, tentou
apreender o nosso material.
Apreendeu o meu caderno de
desenho, apreendeu tudo, mas
a gente tinha conseguido uma
autorização pra pintando e
conseguiu recuperar né, esse
material. Inclusive, os próprios
guardas que apreenderam a
gente, pediu pra tirar foto do
graffiti com a gente. Então isso
também foi uma coisa muito
marcante também, acredito
que na história de Campos.
Mas depois a gente parou de
pintar ali no viaduto né,
voltando em 2014, a pintar
de novo no viaduto, e a voltar a
ter de novo a mesma
repressão. Mas a gente
conseguiu um contato direto
com a Secretaria de Cultura, e
conseguiu uma autorização.
Hoje até o graffiti em Campos,
através do viaduto, existe uma
autorização, assim, é, existe
uma liberação pra tá fazendo a
arte em Campos (Linha, 2021,
s.p.).
Embora o Hip-Hop seja
tradicionalmente composto pelos
quatro elementos principais, o skate e o
basquete podem ser considerados
movimentos significativos incorporados
57
RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
à cultura devido ao seu forte caráter
urbano. Essas práticas,
frequentemente realizadas nas ruas
das periferias, acompanharam o
surgimento do movimento. Almeida
(2021) relata que sua ligação com o
basquete começou aos 11 anos, ainda
na escola. No entanto, foi a partir de
2005 que passou a praticar o esporte
nas ruas, inspirado em filmes norte-
americanos, como Space Jam.
O empresário destaca o primeiro
Fórum de Cultura Hip-Hop no Norte e
Noroeste Fluminense, realizado em
2006 no CIEP Maestro Villa Lobos, em
Guarus, como marco inicial do
basquete em Campos dos Goytacazes.
Almeida (2021) comenta que foi
convidado a participar do evento Hip-
Hop Inter Rio e, após
desentendimentos que levaram à
extinção do Fórum, decidiu fundar a
NBR em 2006 para retomar os ideais do
projeto, com foco na integração do Hip-
Hop e inclusão de jovens periféricos.
Em 2009, a NBR se formalizou como
ONG e iniciou diversos projetos sociais
em parceria com o SESC, beneficiando
comunidades carentes. Também em
11
Acrobacias com motos.
2009, realizaram o evento Open Run,
reunindo diversas manifestações
culturais e esportivas, como basquete,
rappers, b.boys, DJs, grafiteiros,
capoeira, wheeling
11
e BMX
12
.
As rodas de rap da cidade,
segundo entrevistas concedidas por
Gonçalves (2019) a Ribeiro (2019),
foram influenciadas pelas batalhas de
MC do Rio de Janeiro. Pequenos
grupos periféricos se organizaram e
começaram a ocupar a Praça São
Salvador, um local que contava com
a presença de praticantes de skate e
BMX, conforme o relato do rapper e
pesquisador. A praça, devido a
diversos fatores como o fácil acesso
por transporte público e uma grande
área aberta com piso liso e resistente
de granito, que facilitava a prática de
break, skate e BMX, tornou-se o lugar
ideal para esses encontros, atraindo
também os adeptos do rap.
Segundo Gonçalves (2019)
apud Ribeiro (2019), a ocupação da
Praça São Salvador começou a gerar
atritos com o poder público. A praça,
que havia sido reformada em 2005,
tornou-se um espaço de disputa
12
Esporte praticado com bicicleta, com
inúmeras manobras, conhecido também como
Bike Freestyle.
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RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
como ferramenta na Gestão Participativa Urbana: um caso em Campos
dos Goytacazes/RJ. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de Estudos
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 15, n. 28, p.48-72, mar. 2025.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
política, religiosa, urbana, cultural e
comercial. Os praticantes da cultura
urbana, então, iniciaram manifestações
de resistência para preservar o uso do
local para seus encontros. No entanto,
a guarda municipal, em uma das ações
de represália, formou um cordão para
retirar os manifestantes da praça.
Ao ser questionado sobre os
eventos e as repressões ocorridas na
Praça São Salvador, Almeida (2021)
ressalta que, além das batalhas de rima
e da prática do skate, havia um uso
intenso de maconha e depredações no
espaço, o que gerou conflitos com a
polícia, que passou a intervir. Contudo,
pode-se destacar um trecho da
entrevista do skatista e grafiteiro
Misterbod a Gonçalves (2019):
[...] proibiram a gente de andar
de skate na praça São
Salvador tava tendo muito atrito
com a guarda então a gente
andava vinha a guarda, a gente
parava voltava no outro dia e
andava de novo e fomos
insistentes nisso. [...]
falavam para a gente ir para a
rodoviária, mas estava tendo
muito roubo. Aí falavam para a
gente ir para o Jardim São
Benedito, andar de Skate no
Jardim São Benedito, porém a
galera do basquete, várias
vezes rolou treta, quase rolou
briga. Porque o mesmo espaço
que a galera joga basquete não
dava para se andar de skate
(Misterbod, 2019 apud
Gonçalves, 2019, p.55)
Percebe-se neste sentido que,
além do conflito com a guarda e/ou a
polícia municipal, também havia um
conflito territorial interno entre as
diferentes linguagens da cultura Hip-
Hop. Gonçalves (2019), dando
continuidade ao relato de Misterbod,
acrescenta que os skatistas da época
se organizaram para dialogar com o
poder público e reivindicar a criação de
novos espaços para a prática do
esporte, devido à degradação das
pistas existentes na cidade.
[...] fizemos uma manifestação
pedindo uma pista de skate
Plaza, uma pista Plaza ao estilo
pista de rua, tipo uma praça né
para skate que tinha na
rodoviária com padrões de
campeonatos de skate no estilo
formato street, então a gente
estava fazendo este apelo na
época, o Romeu Lins era
secretário de esportes radicais
na fundação, esse apelo era
diretamente com ele primeiro
[...] através disso tudo teve uma
reunião, com o Romeu Lins
com o Magno que era
presidente da fundação e
esportes, então teve uma
reunião, chamou a gente,
chamou a galera do basquete
também, nós nem sabíamos
porque a galera do basquete
estava lá, naquele momento,
não entendi [...] Aí com isso no
dia da reunião falaram que
fariam uma quadra de
basquete de rua, na qual a
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RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
como ferramenta na Gestão Participativa Urbana: um caso em Campos
dos Goytacazes/RJ. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de Estudos
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
gente também poderia andar
de skate. E foi isso que
aconteceu e nós também não
ficamos satisfeitos com isso
porque isso foi um cala boca,
ligado, não foi o que a gente
pediu, foi um cala boca para a
gente parar de encher o saco
deles (Misterbod, 2019 apud
Gonçalves, 2019, p.55)
De acordo com Ribeiro (2019),
em 2004, a "Ponte de Rosinha"
começou a ser construída após a
proposta de Rosângela Barros Assed
Matheus de Oliveira Garotinho,
conhecida como Rosinha Garotinho,
então Governadora do Estado do Rio.
O objetivo da obra era estabelecer uma
ligação viária entre as Avenidas Hélio
Póvoa, no centro, e Tancredo Neves,
em Guarus. O Diário Oficial publicou a
liberação de recursos no valor de 42
milhões de reais, provenientes do
Conselho Superior do Fundo Estadual
de Conservação Ambiental e
Desenvolvimento Urbano (FECAM).
Após oito meses de paralisação
das obras, a ponte foi inaugurada em
2007 com o nome de Ponte Rosinha
Garotinho. Contudo, por ordem do
Ministério Público, em cumprimento à
Lei 6.454 de 1977, que proíbe a adoção
de nomes de pessoas vivas para obras
públicas, a ponte foi renomeada para
Ponte Leonel Brizola, em homenagem
ao ex-governador do estado do Rio.
Almeida (2021) relata que foi
convidado por secretários da gestão da
época, que tinham o objetivo de criar
um projeto inspirado no Viaduto Negrão
de Lima, também conhecido como
Viaduto de Madureira, onde acontece o
Baile Charme. O viaduto, reconhecido
como um centro de concentração
popular, foi crucial para a difusão da
cultura negra no estado, com o Hip-Hop
como um de seus principais
protagonistas. Os eventos acontecem
todos os sábados e o viaduto é
considerado patrimônio imaterial da
cidade.
Segundo Almeida (2021), após
reuniões com os gestores, foi
desenvolvido o projeto da quadra, que
foi inaugurada em 2011 com o nome de
Quadra de Esportes Hugo Oliveira
Saldanha (Imagem 1). O espaço foi
concebido como um ponto de
referência, no entanto, ele observa:
E quando inaugura a gente
se frustra, em algumas
questões, com a gestão da
fundação, e a gente até discutiu
muito isso com eles, porque as
medidas da tabela eram
horríveis, a quadra ela não foi
concebida da forma que ela
deveria ser ocupada, então, de
imediato ela se vazia. A galera
do basquete não culpa, se a
60
RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
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transformações da cultura")
galera do basquete jogou ali, a
galera assim, que eu digo, que
movimenta o basquete, se
jogou umas 10 vezes foi muito.
(Almeida, 2021, s.p.)
Figura 1 - Quadra de Esportes Hugo Oliveira
Saldanha
Fonte: Facebook NBR, 2021
Ainda segundo Almeida (2021),
a ocupação do espaço pela prática de
skate começou a acontecer, com a
presença de algumas pessoas que não
estavam realmente envolvidas com o
movimento de basquete de rua, mas
que aproveitavam o local para jogar.
Retomando o relato de Misterbod dado
a Gonçalves (2019), o skatista confirma
essa ocupação e acrescenta que o
espaço contava com WI-FI e tomadas,
o que facilitou a realização de outras
atividades no local.
Além da disputa territorial entre o
skate e o basquete, durante as
entrevistas realizadas, percebeu-se
13
Nome fictício para guardar o anonimato do
entrevistado.
também certa animosidade entre os
grupos de skatistas e os dançarinos de
break. O dançarino Jonas
13
comenta
que o break começou a ocupar o
espaço com ensaios da dança de rua,
chegando a ficar com a chave que
trancava a quadra. No entanto,
segundo ele, o processo de trancar a
quadra não durou muito tempo, devido
a atritos com os skatistas, que
brigavam pelo uso do espaço.
O skatista Fábio
14
comenta que
a ocupação do espaço para o skate
começou junto com o basquete e que,
"teve uma época que trancavam e essa
chave ficava na nossa mão também, só
que não durou muito, a gente abriu
buraco ali e entrava. É um espaço
público, não tem como privar a gente de
usar" (Fábio, 2021, s.p.). Segundo ele,
o primeiro evento realizado na quadra
foi organizado pelo grupo de skatistas,
com patrocínio da loja Fluir,
especializada em artigos esportivos
urbanos na época.
Além da disputa pelo espaço, a
quadra enfrentou um processo de
abandono e falta de manutenção por
parte do poder público, o que resultou
14
Nome fictício para guardar o anonimato do
entrevistado.
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RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
na ocupação por pessoas em situação
de rua, que começaram a danificar os
mobiliários urbanos. (Almeida, 2021)
Em entrevista para Ribeiro
(2019), Luis Cláudio Ribeiro Silva,
conhecido como Sativa’Mente,
comenta sobre o surgimento do Rima
Cabrunco, nome que faz referência à
gíria popular campista. O coletivo, que
realizava batalhas de MCs, teve sua
primeira roda cultural embaixo do
Viaduto Leonel Brizola, em setembro
de 2012, e rapidamente ganhou
reconhecimento entre os adeptos do
Hip-Hop (Ribeiro, 2019).
Almeida (2021) acrescenta que
o Rima Cabrunco (Imagem 2) surgiu
com o objetivo de dar uma nova voz ao
Hip-Hop na cidade, sendo conhecido
como a "batalha do real" ou "batalha do
conhecimento". Segundo ele, os MCs
utilizavam a batalha para expressar a
realidade de suas vidas. Quando
questionado sobre a presença da roda
cultural na ponte, o diretor de projetos
explica que as questões ambientais e
referências de grandes capitais, como o
Viaduto de Madureira, onde as batalhas
de Hip-Hop sempre aconteceram sob
os viadutos, foi um ponto decisivo. Com
a ocupação dos rappers, o Progressivo
Art Crew também começou a se
apropriar do local.
Figura 2 - Encontro do coletivo Rima Cabrunco
Fonte: Facebook NBR, 2021
O coletivo iniciou a ocupação
dos pilares da ponte, transformando o
espaço em uma galeria a céu aberto. A
identidade Hip-Hop se apropriou do
local e, para todos os entrevistados
envolvidos na cultura, a área sob o
viaduto é considerada um palco da
cultura urbana, sendo responsável pela
difusão do movimento na cidade,
tornando-se, assim, uma referência da
cultura urbana local.
A partir desse momento,
movimentos como o Coletivo Cultural
Resistência Goytacá, o Baile Charme e
o Mutirão de Grafite começaram a se
consolidar no espaço. "É um polo onde
acontece tudo, nenhum espaço na
cidade tem cultura urbana como nesse
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RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
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transformações da cultura")
espaço aqui" (Gonçalves, 2019, s.p.
apud Ribeiro, 2019, p. 62).
O palco presente atualmente na
quadra, foi inaugurado no primeiro
festival de graffiti de Campos, realizado
em 2016 pela Prefeitura, por meio da
Fundação Municipal da Infância e da
Juventude e da Fundação Cultural
Jornalista Oswaldo Lima. Almeida
(2021) relata que a solicitação para o
palco veio de um representante do
passinho durante uma reunião de
organização do evento. O festival, com
o tema "História de Campos e Paz",
contou com a participação de 20
grafiteiros e foi realizado no dique do
Rio Paraíba do Sul, entre as Pontes
Barcelos Martins e General Dutra. A
festa de encerramento, com
apresentações de rap e break,
aconteceu na quadra sob o Viaduto
Leonel Brizola.
O basquete de rua teve grande
destaque no Brasil entre 2004 e 2008,
contudo, de acordo com Almeida
(2021), perdeu força após 2010,
desaparecendo também em Campos.
O skate, por sua vez, contou com o
apoio do SESC, que promovia eventos
e oficinas na cidade.
As batalhas de rimas na cidade,
organizadas pelo coletivo Rima
Cabrunco, promoviam rodas culturais,
doações de livros, exposições e a
comercialização de produtos próprios
no espaço, com o objetivo de levar
conhecimento e cultura para os jovens
das periferias. No entanto, o movimento
começou a se desarticular devido ao
desligamento de membros fundadores,
como o caso de Sativa’Mente. Além
disso, o coletivo enfrentou a falta de
apoio por parte do município e
frequentemente sofria repressões por
parte da guarda municipal. Diante da
necessidade de encontrar formas de
sustento, os organizadores começaram
a se afastar, o que levou ao fim do
movimento (Ribeiro, 2019).
Com o fim do Rima Cabrunco,
alguns dos jovens que participavam
das rodas culturais e batalhas de rimas
perceberam a necessidade de se unir
novamente para retomar as atividades
embaixo do viaduto, o que resultou na
criação da Manifestação Cultural de
Rimas (MCR) em 2014. O coletivo
continua ativo até os dias atuais e
completou 10 anos em 2024.
Até o ano de 2022, a MCR
contava com cinco organizadores,
sendo três homens e duas mulheres.
Dois dos organizadores fundaram o
coletivo junto com o intitulado Mano 10
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transformações da cultura")
e mais três amigos, que, embora não
façam parte do movimento atualmente,
são reconhecidos como importantes
para o início do coletivo.
De acordo com Mateus Cunha
(2021), um dos organizadores e
fundadores da MCR, houve um hiato
entre o fim do Rima Cabrunco e o início
da MCR, mas nenhum dos
entrevistados soube precisar a duração
desse período. Cunha (2021) ainda
compartilhou que, ao ser convidado
para se juntar ao novo coletivo, sugeriu
que as batalhas acontecessem em um
dia fixo da semana. Inicialmente, elas
ocorriam a cada 15 dias, aos bados,
com o tempo, a MCR passou a ser
realizada semanalmente, às sextas-
feiras, 19h.
Segundo os entrevistados, tanto
integrantes quanto frequentadores do
coletivo Manifestação Cultural de
Rimas (MCR), o movimento
inicialmente contava com um fluxo
intenso de jovens que faziam parte de
diversas manifestações culturais
urbanas, como rappers, skatistas,
dançarinos de break, grafiteiros e DJs.
No entanto, ao longo do tempo, o
coletivo começou a perder muitos
desses frequentadores.
De acordo com as falas
coletadas, os principais motivos para
esse abandono foram a ausência de
estrutura, tanto do próprio movimento
quanto do espaço em que as atividades
ocorriam. A falta de recursos e
condições adequadas para acomodar e
atrair esses jovens parece ter sido um
fator crucial para a diminuição do
público e a perda do dinamismo que o
movimento tinha no início. Isso é
evidenciado tanto pelas entrevistas
quanto pelas imagens analisadas no
estudo.
Se o viaduto tivesse tudo
estruturado e tal. Mas rap é
coisa de vagabundo, é mais
difícil alguém entrar (Integrante
1, 2021, s.p.).
É o lugar menos iluminado. É
um atrativo para as pessoas de
rua, e a gente aqui pra ser
visto. E parte elétrica, às vezes
a gente quer fazer um evento
maior, colocar som e é precário
(Integrante 2, 2021, s.p.).
A falta de microfone bom,
qualidade do som, querendo ou
não é entretenimento
(Integrante 3, 2021, s.p.).
[...] Alguns pararam de ir. Não
que isso seja culpa das
pessoas, porque a gente
também não tem estrutura pra
poder oferecer pra esses
artistas também, a gente acaba
fazendo por amor, pra não
deixar o movimento acabar
(Organizador 1, 2021, s.p.).
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RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
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De acordo com os membros
organizadores da Manifestação
Cultural de Rimas (MCR), até o ano de
2022, o coletivo nunca contou com
equipamentos próprios, como caixas de
som e microfones. Até este período, o
grupo precisava buscar os aparelhos
emprestados, geralmente com
qualidade inferior, o que resultava em
problemas de ruídos e dificuldades de
audição para o público. Essa falta de
infraestrutura adequada prejudicava a
experiência das batalhas e as
atividades culturais realizadas no
espaço.
Além disso, a viabilidade do
movimento era uma questão constante.
Os organizadores mencionaram que
muitas vezes precisavam transportar os
equipamentos por grandes distâncias,
utilizando bicicletas ou carregando-os
nas costas, o que frequentemente
causava atrasos nas atividades, além
de ser fisicamente desgastante.
De acordo com um dos
organizadores, a tomada disponível na
quadra também não funcionava, tendo
ele mesmo que fazer a conexão com o
poste de luz, utilizando uma extensão
para ligar a caixa de som. No entanto,
ele mencionou que houve uma
explosão na ligação e que, em algumas
ocasiões, ao chegar ao local, o sistema
não estava funcionando. Em uma
dessas situações, conforme relatado
pelo organizador, uma pessoa em
situação de rua, que compartilhava o
espaço com eles, os ajudou. Em outras
ocasiões, alguns membros
comentaram que a batalha
aconteceu de forma improvisada, à
capela, sem som ou eletricidade.
Todos os entrevistados
mencionaram que as pessoas em
situação de rua o o apenas um
problema social, mas também
impactam o convívio e contribuem para
a estigmatização do espaço. Entre os
relatos, um dos organizadores contou
que, em uma das tentativas de
compartilhar o local, uma pessoa em
situação de rua ameaçou sua
namorada, que também faz parte da
organização, com uma faca. Além
disso, ele expressou o desconforto de
ter que limpar o espaço, devido ao mau
cheiro e às fezes deixadas no local por
essas pessoas. Também mencionaram
a deterioração do ambiente, com
ocupantes cortando as grades,
quebrando os bancos, o piso e os
refletores. Segundo um dos
organizadores, quando solicitaram a
intervenção do município, a guarda
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transformações da cultura")
chegou com jatos d'água para expulsá-
los, mas, dias depois, eles retornaram
ao local.
Contudo, cabe ressaltar que,
apesar de todos os problemas
estruturais do movimento e do espaço,
até o recorte temporal apresentado,
bem como das desavenças internas, os
participantes de todas as vertentes do
Hip-Hop demonstram um forte
sentimento de pertencimento em
relação ao local.
Rapaz, esse espaço aqui é da
gente, do Hip-Hop em geral,
porque esse espaço é desde o
Rima Cabrunco, desde a época
do Sativa’Mente, do Graveto, a
galera que é referência
passou por aqui. Grafiteiro,
Misterbod, skatista, então, é
mais do que merecido a gente
ter esse local, porque senão
fica isso que vocês estão
vendo, abandonado, morador
de rua, falta de segurança, e
não é isso que a gente quer, a
gente quer cultura,
desenvolvimento urbano e
muita arte pra favela e pro
centro também. (Integrante 4,
2021, s.p.)
Aqui é foco do Hip-Hop na
cidade. (Integrante 1, 2021,
s.p.)
É um espaço totalmente de
acolhimento, o movimento Hip-
Hop trouxe isso pra esse
espaço, é você olhar em
volta. Tudo aqui é intervenção
nossa, para além da quadra,
até a tomada, pra conseguir ter
a batalha. (Integrante 3, 2021,
s.p.)
É possível perceber que, apesar
de todos os desafios enfrentados e da
redução do público, muitos dos
integrantes enxergam na batalha um
espaço de refúgio, onde podem
expressar sua arte e compartilhar as
realidades do cotidiano por meio da
música.
A MCR no contexto da gestão
participativa urbana
Com a pandemia da COVID-19,
que teve seu primeiro caso confirmado
na cidade de Campos dos Goytacazes
em 23 de março de 2020 (Portal Oficial
da Prefeitura de Campos dos
Goytacazes, 2020), o mundo se viu
forçado a adotar o isolamento social
como medida para conter o avanço da
doença. Nesse contexto, os
interlocutores da cultura urbana ficaram
privados de seu espaço de expressão.
Os organizadores apontaram na
ocasião que, pela falta de acesso direto
à internet para muitos integrantes, a
continuidade do movimento tornou-se
inviável de forma virtual. Dessa
maneira, a última ocupação do coletivo
no viaduto ocorreu em março de 2020,
antes do Lockdown, se ausentando por
dois anos do espaço público.
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transformações da cultura")
O impacto da retirada do
movimento foi evidente no local, que
passou a evidenciar um aumento
significativo de pessoas em situação de
rua, sem iluminação e ainda mais
impactado pela ausência de
manutenção, como ilustrado na
Imagem 3.
Figura 3 - A quadra no ano de 2021
Fonte: Acervo Pessoal, 2021
Em 2021, o coletivo procurou
uma das autoras deste texto que
mantinha contato com os
organizadores para a realização de sua
pesquisa de dissertação, que teve
como objetivo a construção de um
plano de ação participativo direcionado
ao grupo. O coletivo, ciente do
documento que estava sendo
construído, solicitou que ela
intermediasse, junto ao Conselho
15
Fundado em 1978, com o intuito de gerir a
cultura no município (Prosas, 2021).
Municipal de Cultura (COMCULTURA),
uma reestruturação mínima do espaço
que permitisse o retorno das batalhas
ainda naquele ano.
Com o objetivo de incluir a pauta
no conselho, a pesquisadora contatou o
conselheiro de Artes Urbanas, pedindo
que ele inserisse o tema em uma
reunião. Dessa forma, no dia 16 de
novembro de 2021, o representante da
cadeira da época apresentou
brevemente a proposta como parte dos
assuntos gerais na reunião do
COMCULTURA.
Em resposta, a Presidente da
Fundação Cultural Jornalista Oswaldo
Lima (FCJOL)
15
e do COMCULTURA
sugeriu que o retorno das atividades
fosse adiado para 2022, devido à
pandemia da COVID-19. Na sequência,
para mediar a discussão, uma das
autoras pediu a palavra e defendeu o
coletivo, destacando a relevância da
manifestação e o estado de abandono
do espaço residual sob o Viaduto
Leonel Brizola, com o argumento de
que, considerando a liberação da
prefeitura para a reabertura de bares e
a realização de eventos, desde que
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transformações da cultura")
seguidas as medidas de segurança,
não fazia sentido impedir a realização
do evento. Após a intervenção da
pesquisadora, a presidente da FCJOL
comprometeu-se a agendar uma
reunião com o coletivo para tratar do
assunto, reunião que foi marcada no
dia seguinte à solicitação.
Assim, no dia 23 de novembro
de 2021, às 10h30, ocorreu uma
reunião no Teatro Trianon, com a
presença de: Auxiliadora Freitas,
presidente da FCJOL; Wellington
Levino, comandante da Guarda Civil
Municipal (GCM); Rodrigo Carvalho,
secretário de Desenvolvimento
Humano e Social; Jackson Souza,
subsecretário de Posturas; Marcos
Moreira, subsecretário de Segurança
Pública; Kátia Macabu, diretora
executiva das Artes e Culturas da
FCJOL; David de Oliveira Montezuma,
conselheiro de Artes Urbanas;
representantes do Centro Pop; dois
organizadores da MCR; e uma das
autoras deste artigo. Durante a reunião
(Imagem 4), a pesquisadora
apresentou uma breve retrospectiva da
trajetória do coletivo e do Viaduto
Leonel Brizola, destacando a
relevância de ambos para a arte urbana
da cidade.
Figura 4 - Reunião do coletivo MCR com o
poder público
Fonte: Acervo Pessoal, 2021
O coletivo, por intermédio da
pesquisadora, apresentou um Ofício de
Solicitação, no qual pleiteava a
aprovação do Plano de Ação MCR pela
FCJOL, além de seu encaminhamento
à Diretoria Executiva. O objetivo era
garantir que tanto a gestão atual quanto
as futuras assumissem o compromisso
de implementar as ações de
responsabilidade do poder público.
Adicionalmente, foram requisitadas
demandas urgentes previstas no plano,
indispensáveis para o retorno da
ocupação do espaço pela MCR, tais
como: realocação e ressocialização
das pessoas em situação de rua;
limpeza da quadra; reparo da
iluminação; conserto das tomadas; e
manutenção geral do local.
Conforme ilustrado na Imagem
5, que apresenta a reportagem
publicada no Portal Oficial da Prefeitura
68
RIBEIRO, Carla; COSTA, Aline; TEIXEIRA, Simonne. As Batalhas de Rimas
como ferramenta na Gestão Participativa Urbana: um caso em Campos
dos Goytacazes/RJ. PragMATIZES - Revista Latino-Americana de Estudos
em Cultura, Niterói/RJ, Ano 15, n. 28, p.48-72, mar. 2025.
www.periodicos.uff.br/pragmatizes - ISSN 2237-1508
(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
Municipal de Campos dos Goytacazes
(2021), os participantes da reunião
assumiram o compromisso de atender
às demandas apresentadas, com
destaque para a requalificação da área
inferior do Viaduto Leonel Brizola. A
divulgação dessa notícia também
ocorreu no perfil oficial da FCJOL no
Instagram.
Figura 5 - Reportagem sobre a reunião
Fonte: Portal Oficial Da Prefeitura
Municipal de Campos Dos Goytacazes, 2021
O retorno da MCR, contudo,
agendado para o dia 17 de dezembro
de 2021 (Imagem 6), ocorreu sem que
todas as demandas fossem
plenamente atendidas. A realocação e
ressocialização das pessoas em
situação de rua não foi realizada; em
vez disso, a Guarda Municipal as
retirou de maneira brusca. A limpeza da
quadra foi feita apenas algumas horas
antes do evento, após insistentes
apelos da organização, que utilizou
contatos pessoais, como mensagens
via WhatsApp, para pressionar os
secretários responsáveis na época.
Figura 6 - Flyer do evento
Fonte: Instagram MCR, 2021
Embora o aluguel dos
equipamentos de som tenha sido
disponibilizado, os reparos necessários
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na iluminação, o conserto das tomadas
e a manutenção geral do espaço não
foram realizados. Como resultado, a
organização precisou custear um
gerador para garantir o funcionamento
do som e conduziu o evento no escuro.
Figura 7 - Limpeza da quadra
Fonte: Acervo Pessoal, 2021.
Entretanto, é importante
destacar que, apesar das falhas do
poder público em cumprir plenamente
os acordos para a realização do evento,
ainda em 2021, uma semana após o
retorno da MCR para o espaço, foram
realizados reparos na iluminação e nas
tomadas da Quadra Hugo Oliveira
Saldanha, bem como sua pintura.
Assim, apesar dos contratempos,
ressalta-se a relevância da ocupação e
da participação do coletivo e de seus
integrantes, que além de fortalecer sua
atuação social e promover maior
engajamento da comunidade,
conseguiu efetuar alterações
significativas no espaço público.
Nesse contexto, pode-se
recorrer a Lefebvre (2001), que
argumenta que a transformação da
cidade deve ser conduzida pelo
coletivo, com o espaço público sendo
um lugar capaz de acomodar a
diversidade das atividades cotidianas,
como trabalho, descanso, cultura,
conhecimento, lazer, ócio, trocas e
comércios. Segundo o autor, a
reivindicação e a luta por esses
espaços podem ocorrer por meio da
arte, de atividades lúdicas
comunitárias, festas e jogos realizados
no ambiente público.
Segundo Lerner (2003, p.46),
"Quanto mais se entender a cidade
como integração de funções, de renda,
de idade, mais encontro, mais vida ela
terá." Esse entendimento reforça a
importância da pluralidade no ambiente
urbano, um princípio também defendido
por Jacobs (1961), como essencial
para a vitalidade das cidades. Nesse
contexto, fica evidente que a MCR, no
recorte apresentado, possuiu um papel
crucial na requalificação do local.
Considerações finais
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(Dossiê "Hip-Hop no Brasil: a produção de sentidos e as
transformações da cultura")
O Hip-Hop, conforme abordado
até agora, pode ser uma ferramenta
significativa para enfrentar a
segregação socioeconômica, cultural e
espacial, além de oferecer uma
alternativa para a criação de espaços e
a construção de uma identidade
coletiva entre jovens em situação de
vulnerabilidade social. Nesse contexto,
em 2014, surgiu a Manifestação
Cultural de Rimas (MCR) na cidade de
Campos dos Goytacazes, como
resposta à carência de movimentos
culturais direcionados a esse público no
município.
A manifestação, que ocorre sob
o Viaduto Leonel Brizola, um espaço
público central da cidade reconhecido
como um importante palco da cultura
urbana, realizava todas as sextas-
feiras, batalhas de rimas e
apresentações individuais. No entanto,
em março de 2020, com o início da
pandemia de COVID-19, o coletivo teve
que encerrar suas atividades, tanto
presencialmente, em função das
medidas de isolamento social, quanto
virtualmente, devido à falta de recursos.
Com o afastamento do grupo do
espaço, este foi sendo negligenciado
pelo poder público e deteriorado por
pessoas em situação de rua. Devido a
ações junto aos órgãos públicos
municipais, o coletivo contribuiu para a
requalificação da Ponte Leonel Brizola,
reativando o espaço como um ponto de
encontro público e atribuindo uma nova
identidade à cidade.
Este estudo, objetivou-se assim
a analisar a atuação do coletivo MCR
na gestão participativa urbana,
abrangendo o período de 2020 a 2021.
Como pode-se perceber, o coletivo se
apresentou como um canal para o
desenvolvimento de ações políticas
entre seus integrantes,
predominantemente oriundos de áreas
periféricas, promovendo práticas
reivindicatórias e incentivando uma
gestão urbana mais inclusiva.
Acredita-se assim, que a cultura
urbana, especificamente o Hip-Hop e
as batalhas de rimas, como
apresentado, seja uma ferramenta
essencial para o desenvolvimento
cultural, social, político e econômico de
seus membros, contribuindo para a
inclusão dos jovens e assegurando seu
papel ativo como cidadãos.
Referências
ALMEIDA, Victor Hugo Ribeiro.
Entrevista concedida a Carla Aparecida
da Silva Ribeiro. Campos dos
Goytacazes, 12 ago. 2021.
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