MOVIMENTOS INSURGENTES EM TEMPOS PANDÊMICOS NA EDUCAÇÃO
INFANTIL: POLÍTICAS GONÇALENSES
INSURGENT MOVEMENTS IN PANDEMIC TIMES IN CHILDHOOD
EDUCATION: GONÇALENSE POLICIES
Mônica de Souza Motta
79
Graciane de Souza Rocha Volotão
80
Resumo
O artigo propõe uma reflexão sobre as políticas de atendimento à educação infantil no
segundo maior município do Estado do Rio de Janeiro, e tem como intuito discutir
acerca do papel político do atual Plano Municipal de Educação, Lei 1067/2020.
Como recorte reflexivo, direcionamos o nosso olhar para a meta 1 que determina a
universalização do atendimento da pré-escola e a ampliação das vagas para a creche.
Para dialogarmos sobre o atendimento no contexto pandêmico, na perspectiva
teórico-metodológica abordamos as análises documentais da Constituição Federal
(1988), Plano Municipal de Educação de São Gonçalo/RJ (2015/2024), bem como os
dados estatísticos fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e
da Secretaria Municipal de Educação (SEMED).
Palavras-chave: Educação Infantil. Políticas de atendimento. Plano Municipal de
Educação. Contexto Pandêmico.
Abstract
The article proposes a reflection on the policies to assist early childhood education in
the second largest municipality in the State of Rio de Janeiro, and aims to discuss the
political role of the current Municipal Education Plan, Law No. 1067/2020. As a
reflective perspective, we direct our gaze to goal 1, which determines the
universalization of pre-school care and the expansion of daycare spaces. In order to
talk about the care in the pandemic context, in the theoretical-methodological
perspective, we approach the documental analyzes of the Federal Constitution (1988),
Municipal Education Plan of São Gonçalo/RJ (2015/2024), as well as the statistical data
provided by the Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE) and the Municipal
Department of Education (SEMED).
Keys words: Childeducation. Service policies. Municipal EducationPlan.
Pandemiccontext.
80
Mestra em Educação pela Uerj/Proped, Professora Supervisora Educacional (SEMED/SG)
gracianevolotao@hotmail.com – ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3336-0753
79
Mestra em Educação pela UERJ/FFP, Professora Supervisora Educacional (SEMED/SG) -
monica_mtt2004@yahoo.com.br – ORCID: http://orcid.org/0000-0002-6041-3486
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Introdução
A carta magna do Brasil determina o direito de todos à educação e define
como dever do Estado a garantia da “Educação Infantil, em creche e pré-escola, às
crianças até 5 (cinco) anos de idade” (art. 208, inciso IV). A Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, Lei 9.394/96, em seu artigo 21, inciso I, apresenta em seu texto
a regulamentação da Educação Infantil, incluindo-a como a primeira etapa da Educação
Básica.
O acesso à escola pública também está previsto na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, Lei 9.394/96 com o indicativo que todas as pessoas devem ter
oportunidades de estarem em escolas, em condições apropriadas que propiciem o
aprendizado, a justiça social e o exercício da cidadania.
Nesse contexto, os marcos legais acima referenciados apontaram a elaboração
dos Planos Nacionais de Educação, o que provocou alguns desafios para os municípios
que, diante dos novos indicativos legais, precisaram articular a participação da
sociedade civil organizada, com o intuito da formulação dos seus respectivos planos, de
acordo com suas realidades e peculiaridades locais.
Assim, o Plano Nacional de Educação (PNE, 2014-2024) passou a ser
identificado como marco norteador para que o Distrito Federal, os Estados e os
Municípios elaborassem e organizassem de forma democrática seus respectivos
planos, com o indicativo da participação efetiva da sociedade civil organizada.
Entretanto, podemos apontar que o campo da política pública educacional no Brasil é
historicamente marcado pela descontinuidade das ações governamentais. Apesar dos
planos representarem uma exigência legal não é uma tarefa fácil articular um sistema
de ensino a uma cultura de planejamento de longa duração, como nos indica Souza &
Alcântara (2017).
Em outras palavras, ao construirmos uma política com objetivos e metas
amplas que representem os interesses da maioria da sociedade civil organizada
necessitamos caminhar para uma nova cultura política (SOUZA & ALCÂNTARA, 2017,
p.768) voltada para a implantação de projetos que avancem para além de mandatos de
governo, ou seja, os planos possuem a peculiaridade de serem uma política de Estado
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e não de governo. Assim, na busca das suas efetivações, os mesmos anunciam em seus
próprios textos a avaliação e o monitoramento das metas e estratégias estabelecidas.
Na abordagem reflexiva do Plano Municipal de Educação pactuamos com os
apontamentos de Lopes (1992) ao considerar que “tanto o documento ensina sobre o
que relata quanto o trabalho que se faça sobre ele” (LOPES, 1992, p.113 nota 4). E
em diálogo com Evangelista (2012, p. 56) compreendemos que “a análise de
documentos implica em considerá-la(s) resultantes de práticas sociais e expressões da
consciência humana possível em um dado contexto histórico e político”. Nesse sentido,
as formulações de políticas públicas educacionais com o intuito do direito à educação
infantil nos conduzem a discorrer sobre o papel do Estado e das classes sociais na
construção dos direitos e da democracia (BOSCHETTI, 2009).
Dessa forma, entendemos que durante a tramitação e elaboração das políticas
públicas educacionais ocorreram lutas ideológicas e políticas. Todavia, as discussões,
acordos e debates não findam com a promulgação da lei, pois os textos são traduzidos
na pluralidade e submetidos às diversas interpretações na atuação das políticas (BOWE
et al., 1992 apud MAINARDES, 2006, p. 53).
No contexto, referente à abordagem metodológica as análises documentais
dos textos legais caracterizam uma fonte de estudo sob a perspectiva do contexto
histórico e social em que foram elaborados, o conhecimento dos interesses, os motivos
da sua formulação, a vericidade da sua procedência, bem como os conceitos-chave que
nos direcionam para o entendimento do sentido dos termos empregados. Assim, a
abordagem de uma interpretação coerente é pautada no tema proposto e nas
inquietudes da pesquisa (SÁ-SILVA; ALMEIDA; GUINDANI, 2009).
Nesse sentido, nosso artigo fora organizado em três momentos que abordam:
a contextualização do município de São Gonçalo/RJ e o recorte do texto legal do Plano
Municipal de Educação; o contexto pandêmico e os movimentos insurgentes, além das
considerações finais que tratam de um diálogo reflexivo articulado com as questões
que configuram-se em um desafio fundamental para o município em tempos de
pandemia da covid-19.
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O município de São Gonçalo: um gigante populacional
Como recorte reflexivo direcionamos nosso olhar para o município de São
Gonçalo, localizado no leste metropolitano, identificado como a maior cidade do
Estado do Rio de Janeiro, tendo em vista sua estimativa populacional acima de um
milhão de habitantes (IBGE, 2020). Dessa forma, nos reportando a rede pública
municipal de educação com o intuito de discutir acerca do papel político do atual Plano
Municipal de Educação, Lei de 658/2015 alterada pela Lei 1067/2020 com
abrangência para o decênio de 2015/2024.
No entendimento da amplitude do Plano, optamos neste artigo analisar a
meta 1 que determina:
Universalizar e garantir, até 2016, a Educação Infantil na pré-escola para as
crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliar a oferta de
Educação Infantil em creches de forma a atender, no mínimo, 70% (setenta
por cento) das crianças de até 3 (três) anos até o (terceiro ano) do início
da vigência deste PME, adequando as unidades existentes aos padrões de
infraestrutura para atenderem às características singulares da Educação
Infantil (Lei de nº 658/2015 alterada pela Lei n° 1067/2020).
Com a finalidade de uma melhor compreensão do contexto da população
provável para a Educação Infantil no município de São Gonçalo/RJ, seguimos os
indicativos registrados no sítio do IBGE , nos anos de 2014 que totalizou 12.407
81
nascidos vivos com uma taxa de 13,38% de mortalidade infantil e em 2017, último ano
disponível, 11.290 nascidos vivos com uma taxa de mortalidade infantil de 12,17%.
Ao saber que a população tem mais de 10.000 nascidos vivos a cada ano,
podemos perceber a necessidade de planejamento, tendo em vista o crescimento do
público para o atendimento na educação infantil. Com a intenção de verificar se esses
números estavam sendo acompanhados, realizamos o levantamento do quantitativo de
matrícula na rede pública e privada de educação, dessa vez apurando os anos de 2014,
em que foi realizada a análise situacional do Plano Municipal de Educação, Lei 58/2015
alterada pela Lei de nº 1067/2020 (PME) e o ano de 2020, conforme tabela abaixo:
Título: Matrículas na rede pública e privada
81
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/sao-goncalo/pesquisa/39/30279
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Tabela 1: Matrículas (2014 e 2020) na rede pública e privada de educação.
Rede
de matrículas em
2014 (creche)
de matrículas
em 2020 (creche)
de matrículas
em 2014
(pré-escola)
de matrículas
em 2020
(pré-escola)
Municipal
813
1.332
3.472
5.024
Privada
3.883
4.285
12.115
9.105
Total
4.696
5.617
15.587
14.129
Fonte: elaborada pelas autoras com base no Censo escolar 2014 e 2020.
Podemos notar que em 2020 um aumento da rede municipal de educação
de 921 matrículas de creche em relação ao ano de 2014. Esse processo de crescimento,
apesar de ser pequeno, não acontece ao observarmos as matrículas de pré-escola na
rede privada que decresce em relação a 2014, totalizando a diferença de 3.010
matrículas a menos entre os anos.
De 2014 a 2020, foram seis anos de vigência do Plano Municipal de Educação,
logo, percebemos que nesse tempo, o censo aponta que em 2014 existiam 291
82
escolas privadas e em 2020, totalizavam 310 escolas com atendimento em todas as
modalidades e etapas da educação básica. No que se refere às escolas municipais, não
houve mudança em relação ao quantitativo de unidades escolares, permanecendo em
110 escolas, dessas apenas 27 atendem a faixa etária de creche e 73 atendem a
pré-escola. Cabe informar que das 73 unidades que oferecem o atendimento a
pré-escola, 43 delas ofertam outras modalidades e etapas da educação básica e não
atendem a creche, que é o público de 0 a 3 anos.
No ano de 2017, o Relatório de Avaliação do Plano Municipal de Educação
apontou o não cumprimento da meta de universalização da pré-escola (4 e 5 anos), o
resultado de atendimento foi de 22,4% e na perspectiva de ampliação das vagas para a
creche (0 a 3 anos) o percentual de matrículas estava em torno de 12,8%. Além de
indicar que o maior número das matrículas públicas na Educação Infantil estaria sendo
realizadas pelas creches conveniadas em torno de 65% e os restantes 35% nas
82
https://www.qedu.org.br/cidade/2806-sao-goncalo/censo-escolar
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escolas/Unidades Municipais de Educação Infantil (UMEI) municipais, caracterizando
um atendimento marcado pela parceria público-privado.
Segundo o Protocolo de Retomada das Aulas Presenciais no Município de São
Gonçalo/RJ , pelo Decreto N.º 326/2020, publicado no Diário Oficial de 29 de outubro
83
de 2020, havia no município 33 escolas privadas comunitárias conveniadas com o
poder público municipal, com atendimento de Educação Infantil: creche e pré-escolar
com total de 3.059 matrículas.
Os dados apresentados apontam o quantitativo pouco expressivo no
atendimento à educação infantil pela rede pública municipal de educação. Em
contrapartida, observamos o número significativo de matrículas efetivadas na rede
privada. Esse contexto nos sugerem um descuido do governo municipal para com a
educação dos “pequenos” (TAVARES, 2003).
Como uma das marcas mais fortes do poder local, o setor privado é
predominante no atendimento da Educação Infantil no município, contrariando os
termos legais e ratificando o aumento das desigualdades sociais e educacionais. “Nesse
sentido, é importante afirmar a Educação Infantil como um direito de todas as crianças
e de suas famílias, independentemente de idade, classe econômica ou etapa educativa
que frequentam” (CAMPOS, 2016, p. 366).
O contexto pandêmico: movimentos insurgentes
O Brasil, no ano de 2020, foi acometido pela pandemia da covid-19 provocada
pelo novo vírus SARS-Cov2 que alterou tragicamente a rotina escolar de inúmeras
crianças no território nacional, como também modificou de forma súbita as práticas
educativas dos profissionais da educação.
No contexto pandêmico, novos desafios, diálogos e procedimentos que, até
então, não faziam parte das ações pedagógicas começaram a compor os
planejamentos educacionais no âmbito dos sistemas municipais de educação.
83
https://servicos.pmsg.rj.gov.br/diario/2020_10_29.pdf
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192
Cabe informar que após a suspensão das aulas no dia 16 de março de 2020
foram publicados o Decreto 061/2020 do prefeito da cidade de São Gonçalo/RJ e em
31 de março de 2020 a Portaria 057/2020 pela Secretaria Municipal de Educação sobre
o período de isolamento social na prevenção e combate a covid-19.
A Portaria delega à escola a responsabilidade por disponibilizar todas as
atividades pedagógicas através das mídias digitais, sem, contudo, compartilhar quais
seriam os meios digitais e como os docentes fariam usos das tecnologias. Portanto,
coube aos docentes, sem formação específica para a utilização das ferramentas
tecnológicas, mais uma responsabilidade. Necessitaram assumir os caminhos e dar
conta da sua própria formação, como também dos seus alunos, utilizando seus
próprios recursos financeiros, além das despesas com internet e outros gastos na
manutenção desses aparatos digitais.
Embora na legislação haja um destaque em que os recursos pedagógicos não
deveriam substituir o docente e as aulas presenciais, uma contradição pela
desvalorização desse profissional, pois coube a ele reorganizar estratégias e viabilizar o
acesso junto às crianças e famílias, em busca de alternativas para o processo ensino
aprendizagem, sem direito a uma formação ou acompanhamento mais próximo das
suas questões pessoais e sociais no decorrer da pandemia.
Nesse caso, a Portaria 057/2020 publicada em diário ocial de 31 de março
indica que à Secretaria Municipal de Educação/SG cabe apenas o papel de fiscalizador
das ações escolares, sem nenhuma participação efetiva na formação e na orientação
pedagógica junto aos docentes, crianças e famílias. Os profissionais da educação foram
desafiados a realizar a educação em uma situação não esperada. Como trabalhar
questões de socialização, coletividade, identidade e afetividade de maneira remota?
Não bastasse os desafios impostos pela falta de infraestrutura da maioria dos
prédios públicos e privados que atendem a educação infantil no município, e pela
ausência de planejamento para ampliação das matrículas na rede municipal, ainda se
fazia necessário aos docentes reinventar a forma de interação com as crianças e as
famílias. Ressaltamos, portanto, que os desafios impostos aos profissionais de
educação foram diversos, visto que além de não ter formação específica para lidar com
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as tecnologias, havia a necessidade de conectividade desses atores e das crianças, em
especial, na educação infantil, onde as ações são articuladas com suas respectivas
famílias.
Diante disso, as desigualdades sociais no município se tornaram mais
evidentes e, consequentemente, a desigualdade educacional que existia, visto não
haver acesso garantido para a matrícula do público alvo da educação infantil, com a
pandemia, as crianças ficaram completamente impossibilitadas de frequentarem os
espaços escolares.
É importante destacar que os prédios das escolas precisaram fechar e os
docentes das redes pública e privada tiveram que se reinventar. Com isso, os
profissionais da educação da rede municipal de São Gonçalo passaram a postar em
grupos de Whatsapp e Facebook , em atividades e vídeos para interagir com as
84 85
crianças e famílias, em virtude da ausência do suporte tecnológico da Secretaria
Municipal de Educação.
As escolas da rede privada, em grande parte, adotaram plataformas de
sistemas de educação de editoras e utilizaram salas virtuais gratuitas como Google
Meet , Zoom e Google Classroom . Quanto às escolas da rede pública municipal de
86 87 88
São Gonçalo/RJ, não tiveram disponíveis nenhuma plataforma e as redes sociais foram
os meios de comunicação dos docentes com as crianças e suas famílias.
Nesse contexto, torna-se importante apontar os movimentos insurgentes dos
docentes junto ao Sindicato dos Profissionais da Educação (SEPE) na luta pela
implementação de suportes tecnológicos e financeiros por parte da Secretaria
Municipal de Educação para organização das atividades pedagógicas, visto que o
Facebook e WhatsApp são ferramentas para uso pessoal.
88
Sistema de gerenciamento de conteúdo para escolas que procuram simplificar a criação, a distribuição
e a avaliação de trabalhos. Ele é um recurso do Google Apps para a área de educação e foi lançado o
para o público em agosto de 2014. (Wikipédia)
87
Serviço de conferência remota "Zoom" que combina videoconferência, reuniões online, bate-papo e
colaboração móvel (Wikipédia)
86
Aplicativo de videoconferência baseado em padrões que usa protocolos proprietários para
transcodificação de vídeo, áudio e dados. (Wikipédia)
85
Mídia social e rede social virtual lançada em 4 de fevereiro de 2004. (Wikipédia)
84
Aplicativo multiplataforma de mensagens instantâneas e chamadas de voz para smartphone.
(Wikipédia)
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Os aplicativos e plataformas gratuitas expõem os usuários, em especial os
docentes, crianças e famílias, invadindo suas privacidades. O WhatsApp, por exemplo,
é invasivo, devido ao usuário receber a mensagem assim que lhe é enviada, causando
descompasso entre os horários, com o risco de interferir, inclusive, em suas vidas
privadas.
A rede social Facebook não tem ações voltadas para as questões educativas,
suas interações estão voltadas para ações exclusivamente pessoais, amorosas e sociais
do mundo adulto. É importante destacar que a rede social Facebook tem limitação de
idade, em que sua utilização segue prerrogativa do registro válido de autorização de
idade, devido a exposição de fatos, assuntos e interações que ferem as garantias de
proteção e de direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Ao tratarmos dos docentes com o uso do WhatsApp e Facebook apontamos
inclusive o desrespeito ao seu direito de escolha e a exposição dos seus registros
pessoais, conforme comprovada em diversos processos que revelam a vulnerabilidade
dos dados dos usuários dessas redes pelos documentários que registram a ameaça a
vida privada e até mesmo a democracias dos países, como: Get me Roger Stone ;
89
Privacidade Hackeada ; Driblando a democracia ; O papel do Facebook no Brexit e a
90 91 92
ameaça à democracia, que apontam as questões de insegurança e revelam a possível
exposição de dados dos docentes, crianças e famílias.
Sobre este assunto, destacamos que em 2020 foi criado um Projeto de Lei
3477/2020 para disponibilizar internet e computadores para os profissionais de
educação e estudantes, porém o mesmo foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro. Dito
isto, é importante destacar que um desmonte nas políticas públicas na esfera
nacional, incluindo a Emenda constitucional 95/2016 que inviabiliza recursos para a
educação, a saúde e assistência social, o que acaba impactando na esfera municipal.
92
Carole Cadwalladr·TED2019, Translatedby Maurício Kakuei Tanaka; ReviewedbyMaricene Crus,
https://www.ted.com/talks/carole_cadwalladr_facebook_s_role_in_brexit_and_the_threat_to_democra
cy/transcript
91
Documentário francês, “ Driblando a Democracia”, dirigido por Thomas Huchon, 2019, Vimeo.
90
Diretores: KarimAmer, JehaneNoujaim, 2019, Netflix.
89
Documentário americano de 2017, escrito e dirigido por Dylan Bank, Daniel DiMauro e Morgan Pehme,
Netflix
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195
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb),
aprovado em dezembro de 2020, foi incluído ao texto constitucional após mobilização
da sociedade civil organizada, sendo uma conquista para a educação pública, mesmo
diante das tentativas por parte do governo federal de retiradas de recursos sob a
alegação de necessidades de investimentos em outras políticas públicas.
Saliente-se que, para a educação infantil, o Fundeb prevê um acréscimo no
investimento de forma gradual. Entretanto, para efetivar o texto constitucional,
ainda a necessidade de normatizar o repasse dos recursos da cesta do Fundeb,
incluindo o custo aluno qualidade (CAQ).
No ano de 2021, mais especificamente no dia 08 de março, às escolas da rede
municipal de São Gonçalo/RJ reabriram para aulas presenciais no formato híbrido no
momento de agravamento da pandemia no país, conforme aponta a nota técnica da
Fiocruz . No período de 16 a 30 de março foram registradas 20 mortes pela covid-19
93 94
e desde do início da pandemia até a data recortada nesse artigo o município registrou
a perdeu 2.461 pessoas.
Após a Lei Estadual 9224/2021, publicada 24/03/2021, que instituiu
feriados dos dias 26 e 31 de março e 01 de abril de 2021 para conter a disseminação do
vírus foi publicado o decreto municipal n.º 108/2021 em que as aulas presenciais nas
escolas no município foram novamente interrompidas a partir do dia 25 de março de
2021, estando remotamente até o dia 05 de abril, sendo renovado pelo Decreto n.º
120/2021 até o dia 11 de abril de 2021, com possibilidade de ampliação do período,
conforme a avaliação do comitê de crise municipal. Informamos que no final do prazo
determinado no decreto não houve a prorrogação da suspensão das aulas presenciais.
Com o retorno das aulas presenciais no formato híbrido, as atividades
realizadas de forma remota permanecem com a utilização dos recursos próprios dos
docentes, crianças e famílias no que se refere ao uso de computadores, celulares e
internet por meio das redes sociais.
94
https://www.osaogoncalo.com.br/geral/105820/sao-goncalo-registra-20-mortes-por-covid-19-nesta-te
rca-feira-6
93
https://portal.fiocruz.br/noticia/covid-19-nota-tecnica-aponta-agravamento-da-pandemia
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196
Cabe destacar que foi instituída a entrega de material apostilado, de maneira
contínua para as crianças que as famílias optaram por atividades remotas e presenciais
devendo essas apostilas serem elaboradas pelos docentes e entregues em dias
agendados pela unidade escolar. Nesse contexto apontamos os movimentos
insurgentes dos profissionais da educação infantil que se recusa a deixar-se aprisionar
na estreiteza burocrática de procedimentos escolarizantes” (FREIRE, 2001, p.16) contra
a utilização do material impresso retornando a uma proposta combatida durante
anos que não corresponde às ações pedagógicas voltadas para as atividades que
considerem o lúdico, a socialização e a interação no desenvolvimento do processo de
ensino aprendizagem.
Considerações finais
Por meio desse estudo observamos, portanto, que o município ainda não
atingiu a meta de universalização e ampliação de vagas para a creche conforme
determina o PME (2015/2024), como também não vem apresentando ações que
garantam o acesso e a permanência das crianças pequenas. Notamos, com isso, que
ocorrem movimentos insurgentes de mulheres organizados em busca do atendimento
às crianças na faixa de creche e pré-escola no âmbito da municipalidade no que se
refere ao direito à educação infantil na cidade.
Nesse contexto, outra movimentação percebida no território foi de iniciativa
dos docentes junto ao Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe) com as
denúncias em relação às condições sanitárias inadequadas para o combate à pandemia
nos espaços escolares. Como também no atendimento às crianças matriculadas na
rede municipal no que se refere à ausência das tecnologias digitais.
Além do movimento de luta contra uma proposta pedagógica para educação
infantil de distribuição sistemática de apostilas que inviabiliza o lúdico, a interação e a
socialização, conceitos essenciais para o desenvolvimento do processo de ensino
aprendizagem nesta etapa da educação. Pensamos em “uma prática educativa e a uma
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reflexão pedagógica fundada ambas no sonho por um mundo menos malvado, menos
feio, menos autoritário, mais democrático, mais humano” (FREIRE, 2001, p. 17).
Ainda nesse contexto, também apontamos o movimento insurgente dos
profissionais da educação do município de São Gonçalo/RJ pelo não retorno às
atividades presenciais sem segurança, denominado Greve pela Vida, na clareza política
que o professor tem em relação ao seu posicionamento em face de a favor de quem
pratico” (FREIRE, 2001, p. 25), que enfatiza a luta prioritariamente em defesa da vida
dos docentes, das crianças e das famílias.
Destacamos, diante dos fatos, a ausência de políticas públicas educacionais e
apontamos que os movimentos insurgentes, como o de mulheres e dos profissionais de
educação no âmbito da municipalidade são mobilizações fundamentais que se fazem
necessárias principalmente diante das desigualdades sociais e educacionais, agravadas
ainda mais pela pandemia. Assim, os movimentos são essenciais na luta pela efetivação
dos direitos determinados nos textos legais. Nesse sentido, recorremos ao mestre
Freire (1997, p. 5) apontando que “há uma esperança, não importa que nem sempre
audaz, nas esquinas das ruas, no corpo de cada uma e de cada um de nós”
Faz-se pertinente retornar por meio desse estudo a importância da formação
de um planejamento que objetive a continuidade de políticas públicas educacionais na
perspectiva da priorização das crianças na cidade e que busquem a preservação da
vida, da saúde e da educação de qualidade conforme determina a Constituição Federal
(1988) e as demais legislações que garantem proteção integral às crianças.
Cabe reiterar que ocorreu um agravamento das desigualdades sociais,
econômicas e educacionais na pandemia da covid-19. Nesse sentido, entendemos ser
importante relatar que o município de São Gonçalo/RJ contabilizou em 05 de junho de
2021 um total 82.108 casos confirmados, desses 77.895 foram considerados curados,
haviam 86 pessoas hospitalizadas na Rede Pública Municipal de Saúde, com 1.666
pessoas em quarentena domiciliar. Esses dados mostram o quanto as famílias
gonçalenses foram impactadas nos anos de 2020 e 2021 pelas ausências de políticas
públicas diante de uma crise sanitária, política e econômica.
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SÃO GONÇALO. Decreto 061/20, publicada em diário ocial de 13 de março de 2020. Dispõe
sobre as medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância
internacional decorrente do coronavírus e dá outras providências.
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SÃO GONÇALO. Portaria 057/20, publicada em diário ocial de 31 de março de 2020. Dispõe
sobre as orientações para as unidades de ensino das Redes Pública Municipal e Privada do
Sistema de Ensino, de São Gonçalo, no período, de medidas de isolamento social previstas
pelas autoridades municipais na prevenção e combate ao coronavírus - COVID -19.
SÃO GONÇALO. Portaria 087/20, publicada em diário ocial de 22 de julho de 2020. Dispõe
sobre a reorganização das atividades educacionais para o ano letivo de 2020 nas unidades
escolares da Rede Pública Municipal de Ensino de São Gonçalo e dá outras providências.
SÃO GONÇALO. Decreto 108/2021 publicado em diário oficial de 24 de março de 2021
dispõe sobre medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância
internacional, decorrente do novo coronavírus.
SÃO GONÇALO. Decreto 120/2021 publicado em diário oficial de 05 de abril de 2021
realiza adequações em medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de
importância internacional decorrente do coronavírus.
TAVARES, M. T. G. Os pequenos e a cidade: o papel da escola na construção de uma
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Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: [s.n.],
2003.
Data do envio: 07/04/2021
Data do aceite: 17/08/2021
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