
começa com a consciência de classe e salta para uma consciência racial, que não pode
ignorar uma profunda ancestralidade negra. E aqui não interessa o fenótipo dominante
em mim, mas a necessidade de uma radicalidade anunciada pela ancestralidade. Ou
como diz alguns, um caminho sem volta na luta antirracista.
A distância me reeducou, me fez, como diz Freire, “aprimorar os instrumentos
de compressão e análise da realidade” (p. 94). A presença do outro na solidão, o outro
no sentido mais radical do termo, me permitiu conversar com a ancestralidade e
comigo mesmo, na base da imaginação e que me possibilitou um reencontro.
o grande interesse em se rememorarem momentos passados é o de
vê-los como recursos que a gente, como leitor, como pessoa, pode
usar, com o intuito de melhor entender as ideias e melhor desocultar
o contexto humano, social e histórico em que o indivíduo que as
escreveu estava inserido (FREIRE e GUIMARÃES, 1987, p. 79).
No momento em que inicio o exercício da docência, e sou desafiado por
estudantes a como proceder, tive que mobilizar uma série de memórias de vida. A
primeira é que um grupo de jovens inseridos em uma instituição, que tem histórias
próprias, identidades variadas, a partir de minhas experiências, percebia muitas
semelhanças em relação ao que vivenciei como sindicalista. Pois, o trabalho político no
movimento social, exige uma didática própria, procedimentos próprios e, por vezes,
construções e formulações inovadoras, pois a realidade sempre nos coloca situações
inéditas aos quais devemos responder e que, portanto, nos exige produzir
conhecimentos.
Outra exigência, no exercício da docência, foi a necessidade de um trato
pedagógico diante do racismo e das discriminações de todos os tipos. Desde 1999, até
o momento em que escrevo este texto, onde passei pela Educação Básica (ensino
médio e anos iniciais) até a educação superior (graduação e pós-graduação), a
presença do racismo e várias opressões estavam e estão presentes. Portanto, meu
encontro com a ancestralidade não me permitiu, e não me permite, um não
tratamento pedagógico permanente sobre o racismo e o antirracismo. E as marcas
dessa postura pedagógica sempre se alimentaram do mergulho militante que fiz nos
movimentos negros. Estas marcas foram se construindo e reconstruindo durante os
ISSN 1807-6211 [Fevereiro 2022] Nº 38
39