PROJETO INSTITUINTE: PROCESSOS FORMATIVOS POR UMA EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA

       PROJETO INSTITUINTE: PROCESSOS FORMATIVOS POR UMA EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA

INSTITUTIONAL PROJECT: EDUCATION PROCESSES FOR AN ANTI-RACIST EDUCATION

Bianca de Macedo Abreu[1]

Juliana de Macedo Abreu [2]

Resumo

Este artigo aborda a educação como possibilidade de conhecimentos que oportuniza as pessoas a transformarem vidas pelos saberes oriundos das vivências, trocas, reflexões e aprendizados. Objetivamos compartilhar atividades provenientes de projeto instituinte, realizadas em uma unidade de rede municipal, com ênfase em uma educação antirracista, pautadas na conscientização das diferenças e das diversidades evidenciadas, para fortalecer a formação integral dos indivíduos de modo igualitário. A proposta educacional tem a finalidade de contribuir para os processos formativos e estão embasadas, predominantemente, em referenciais curriculares e nas leis 10.639/2003 e 11.645/2008.  Estas são desenvolvidas para além das atuais políticas educacionais, pela importância das histórias que constituem a realidade brasileira e de luta por uma política integrada, emancipatória e significada.

Palavras-chaves: Processos formativos. Educação antirracista. Projeto instituinte. Política integrada. Referenciais curriculares.

Abstract

This article addresses education as a possibility of knowledge that gives people the opportunity to transform lives through living wisdom arising from life acquired knowledge, exchanges, reflections and learning. We aim to share activities from an instituting project, carried out in a municipal  education unit, with an emphasis on anti-racist education, based on awareness of the differences and diversities highlighted, to strengthen the integral education of individuals in an egalitarian way. The educational proposal aims to contribute to the education processes and is predominantly based on curricular references and laws 10,639/2003 and 11,645/2008. These are developed beyond current educational policies, due to the importance of the stories that constitute the Brazilian reality and the struggle for an integrated, emancipatory and meaningful policy.

Keys words: Education processes. Anti-racist education. Institutional project. Integrated policy. Reference Curriculum.

Introdução

"A nossa escrevivência não pode ser lida como história de ninar os da casa-grande, e sim para incomodá-los em seus sonos injustos" (Conceição Evaristo, 2007).

Como diz Marx, os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem, pois, há a sociedade e o Estado que determinam sistemas econômicos e políticos que refletem o momento histórico, as diretrizes educacionais, o ambiente cultural, a localização geográfica, o status social entre tantas outras condições de vivências das pessoas. É sobre as desigualdades existentes em diversos âmbitos que a epígrafe se refere. A “escrevivência”[3] proposta por Evaristo nos remete a importância dos registros de nossas histórias, daquilo que vivenciamos, dos privilégios que observamos e sentimos, visto que, a articulação das palavras estabelece uma relação de saber e poder. Por isso, há luta: pela igualdade de direitos, pelo respeito às diferenças, enfim, pela busca de uma sociedade mais justa e igualitária.

Muitos são os relatos que evidenciam a historicidade destes campos de batalha cotidianos. Um enfrentamento infindável com e pelas práticas de liberdade. Para a inclusão dos grupos excluídos é necessário entender que o discurso acontece a partir das produções sociais, do poder e do saber contido neste, no qual a palavra é um elemento fundamental da composição do discurso. É na articulação das palavras, na comunicação que o homem faz por meio da palavra que podemos encontrar uma das formas do poder e do saber. Os saberes produzidos entre homens e poderes pode acarretar um enfrentamento nos âmbitos social e político. São efeitos do poder nas histórias dos espaços e poderes.

 Pelo poder da educação nos processos formativos das pessoas, apresentaremos alguns movimentos instituintes que aconteceram no espaço educacional da Unidade Municipal de Educação Infantil (UMEI) Jorge Nassim Vieira Najjar, para despertar o interesse das crianças para as artes e os saberes, em sua amplitude conceitual, a partir dos 450 anos da cidade, fundada por um indígena, a fim de conhecer as contribuições culturais que fizeram e fazem a história deste município, com destaque para música, literatura, artes plásticas e esporte, em diversas áreas de produção cultural e desportiva. Tomando por base os feitos de niteroienses, pontuamos as histórias, o meio natural, as culturas e o etnoconhecimento dos povos originários nas produções curriculares.

O trabalho foi embasado em referenciais curriculares e nas leis 10.639/03 e 11.645/08, para imersão dos valores afro-brasileiros e indígenas, com o intuito do fortalecimento de abordagens antirracistas que interroguem o eurocentrismo[4]. Buscamos assim, a valorização da formação integral dos estudantes a partir de um enfoque humanista, democrático, participativo, crítico e consciente de seu papel na sociedade.

Objetivamos assim, compartilhar atividades pedagógicas realizadas que aconteceram de forma transversal, em que as diferenças e as diversidades são evidenciadas para fortalecer a formação integral das crianças, para além das atuais políticas educacionais visto que abrangemos outros âmbitos como a social e a cultural. Ainda, temos o objetivo de refletir sobre os processos formativos dos professores e de contribuir para estudos na área com reflexões acerca da necessidade de uma política integrada, emancipatória e significada.

Podemos considerar a “escrevivência” como um dos tipos de narrativa pelo viés metodológico que retrata experiências de uma sociedade excludente e racista que compromete a transformação do espaço que vivemos. Atualmente, pesquisas no campo educacional pontuam a narrativa como uma força de conhecimento no campo das ciências sociais e humanas, pois oportuniza o protagonismo às diferentes classes sociais, e na educação, a produção dos professores. Logo, em algumas situações podem ser reconhecidas como metodologia, pelo observar do caminhar pela educação e para o mundo, com reflexão sobre as práticas pedagógicas que potencializem a diferença em si, em que o sujeito singular emerge por meio de atos de criação. À luz de Josso (2010), é uma troca de experiências que corrobora para o processo formativo ligada ao impulso de transformação perante ao que se vivencia.

Tempos entre Tempos de História e de Luta para a Formação Humana

As leituras na forma de ver e pensar o mundo que discutem a formação econômico social da sociedade brasileira, a política e a situação histórica do Brasil de capitalismo dependente nas relações entre estado e sociedade favoreceram entender e refletir sobre a nossa realidade de vida e as repercussões no campo educacional.

Para melhor entendermos estes contextos, faremos um breve percurso de tempos entre tempos que evidenciam histórias de luta, com conquistas, retrocessos e avanços na parte documental legislativa no Brasil, para propiciar condições igualitárias com objetivo de igualdade civil, política e moral, em que não haja espaço para discriminações e nem marginalizações de raça, gênero, credo ou qualquer outra condição que evidencie a diferença na constituição do sujeito para sua formação humana de modo integral, principalmente na área da educação.

No início dos tempos não havia um acordo legalmente estipulado sobre a convivência dos grupos. Esta ausência de regras era uma regra que dependia do bom senso das pessoas, para que pudesse acontecer o convívio de forma mais harmoniosa, mesmo sem o estabelecimento formal destas. Segundo Ellen Wood (1995), na antiguidade, tanto os romanos antigos como os gregos produziram alguns dos principais avanços da separação conceitual de Estado e sociedade, estabelecendo assim, criação de critérios não formalizados anteriormente.

Outro destaque para a autora é o pensamento político inglês dos séculos XVI e XVII, no qual havia uma confusão nos conceitos de sociedade pela subordinação desta ao Estado, o que refletia uma organização política única, na qual a classe dominante tinha domínio dos poderes econômicos e políticos, “como acontecia no caso dos arrendamentos feudais ou no caso dos impostos e do controle da administração pública do absolutismo como os principais meios de apropriação privada” (Wood, 1995, p.206-207).

No século XVIII aparece a concepção do termo sociedade civil representando uma esfera diferenciada do Estado e das noções anteriores de sociedade, apresentando “uma gama de interações sociais fora da esfera privada do lar e da esfera do mercado, a arena de produção, distribuição e troca” (Wood, 1995, p. 206). De acordo com a autora, Marx descobriu que o estado expressava particularidades da sociedade civil e suas relações de classe, e partindo desta premissa explorou a formação da sociedade civil sob a forma de uma crítica da economia política. De acordo com as ideologias de Marx, a história das sociedades tem sido a história de luta de classes. Pela questão de posses, muitas acabam perdendo sua identidade de classe.

Foi necessária a reformulação Gramsci para ressuscitar o conceito de sociedade civil como princípio organizador central da teoria socialista. O objetivo dessa nova formulação foi reconhecer a complexidade do poder político nos Estados parlamentares ou constitucionais do Ocidente, em comparação com as autocracias mais abertamente coercitivas e a dificuldade de suplantar um sistema de dominação de classe em que o poder de classe não apresenta ponto de concentração visível no Estado, mais se confunde pela sociedade e suas práticas culturais (Wood, 1995, p. 207).

A autora coloca os sistemas capitalista e o socialista como antagônicos, evidenciando uma interdependência entre eles, visto que um só existe por causa do outro. Isto nos sugere a reflexão de como a democracia se situa ou é constrangida pelo próprio capital. Ao mesmo tempo há uma manifestação que na teoria socialista os conflitos que tangenciam as relações sociais são mais propícios para melhor distribuição do poder entre as classes, consequentemente menos favorecimento, privilégio, monopólio de uma em relação a outra. Com isso, é possível compreender melhor as relações e inter-relações com o Estado nesta historicidade econômica, política e social. Os elementos constitutivos destas relações nos levam a pensar ainda mais no contexto de sociedade. Para Ellen Wood,

O conceito de ‘sociedade civil’ está sendo mobilizado para servir a tantos e tão variados fins que é impossível isolar uma única escola de pensamento associado a ele; mas surgiram uns temas comuns. ‘Sociedade civil’ é geralmente usado para identificar uma arena de liberdade (pelo menos potencial) fora do Estado, um espaço de autonomia, de associação voluntária e de pluralidade e mesmo conflito, garantido pelo tipo de ‘democracia formal’ que se desenvolveu no Ocidente (Wood, 1995, p. 208).

Estes temas elencados pela autora foram: sociedade civil; Estado; espaço não estatal; poder político versus poder social; direito público versus direito privado; propaganda e (des)informação sancionadas pelo estado versus a livre circulação de opinião pública, entre outros. Estes tópicos referem-se a estrutura e natureza do estado capitalista. Portanto, demarcam a questão da privatização dos bens públicos, da opressão e desvalorização da democracia e da divisão de classes. Ainda, ressalta o resgate do papel da imprensa, da liberdade de expressão e do respeito pelo outro.

A pluralidade das relações e práticas sociais também fazem parte das discussões sobre Estado e sociedade, abordando para além da economia capitalista as questões de gênero, raça, religião, a gestão das políticas sociais, manifestações antidemocráticas entre outros embates englobando conservadorismos, o neoliberalismo e demais correntes que nos possibilitam compreender melhor a particularidade da realidade social na complexidade do capitalismo, da democracia institucional e da cidadania.

Wood (1995) destaca que as teorias da sociedade civil reconhecem problemas como a violência, o racismo, a opressão em vários órgãos e setores da sociedade, assim como a falta de respeito, e a falta de liberdade. A liberdade pregada pela democracia, mas que não é de fato contemplada por todos. A autora ainda defende que as liberdades civis é o que podemos chamar de forma vaga na atualidade de direitos humanos, pelos princípios de legalidade, da liberdade de expressão e de associação, e pela proteção da esfera não-estatal.

É aqui que o culto da sociedade civil, a sua representação como esfera da diferença e da diversidade, fala mais diretamente às preocupações dominantes da nova esquerda. Se há algo que une os vários ‘novos revisionismos’ – desde as mais herméticas teorias ‘pós-marxista’ e ‘pós-modernistas’ até o ativismo dos ‘novos movimentos sociais’ – é a ênfase na diversidade, na ‘diferença’, no pluralismo (Wood, 1995, p. 219).

Entendemos a diversidade pautada na ideia de padrão. Então, o que for diverso ao padrão já existente gera a diversidade. Já o conceito de diferença é mais amplo, porque traz a marca do diferente, o ser único de cada pessoa com todas as suas peculiaridades e necessidades. Somos diferentes e estamos constantemente em processo de diferença. Pensamos que a expressão pluralismo é mais que uma pluralidade, ou seja, mais que uma unidade, é um campo de saber que trata desta multiplicidade de possibilidades.

O racismo generalizado e arraigado no ocidente, “é geralmente atribuído ao legado cultural do colonialismo e da escravidão que acompanharam a expansão do capitalismo” (Wood, 1995, p. 230), pois o escravo era tratado como um produto na visão economicista, e consequentemente, capitalista.

No tempo do império no Brasil, o sistema escravocrata é um triste exemplo de desrespeito das relações sociais e raciais e de soberania descabida de governo, pois “se encarregava de não permitir que a ‘família negra’ se constituísse, fragmentando o elo parental básico, distanciando os filhos dos pais” (Farias, 2005, p. 42). Nesta citação, muitos são os absurdos que determinados grupos sociais sofrem, as injustiças e desigualdades evidenciadas. Como mãe, ser apartada de seu/sua filho/a é uma crueldade imensurável. A mulher negra tinha que deixar seu filho/a recém-nascido/a para ser ama de leite do filho/a da “senhora da casa-grande”, e em muitos casos as crianças eram vendidas e as mães não as viam mais. Embora as desigualdades sociais aconteçam ainda hoje, as circunstâncias são outras. Existem leis que garantem este convívio das mães com seus/suas pequenos/as, da mesma forma que incentivam o aleitamento materno.

Hoje, temos o termo racismo estrutural para formalizar este conjunto de práticas institucionais, históricas, culturais e interpessoais dentro de uma sociedade que frequentemente coloca um grupo social ou étnico em uma posição melhor para ter sucesso e ao mesmo tempo prejudica outros grupos de modo consistente e constante causando disparidades que chegam a letalidade.  

Há meio século, Martin Luther King Jr.[5], que foi um grande líder pacifista nos Estados Unidos, lutou incessante e pacificamente contra o preconceito racial e pelos princípios de liberdade e igualdade, e pelos direitos civis na América. Um de seus maiores discursos da história foi "I have a dream" (eu tenho um sonho). Várias foram as lutas contra o racismo. Muitas foram as conquistas.

Maiores ainda são os desejos de uma sociedade na qual as pessoas não são julgadas pelo tom de sua pele, pois, no mesmo país, décadas depois morre George Floyd[6] (afro-americano) asfixiado por policial que se ajoelhou no pescoço dele por minutos, mesmo ele falando com dificuldade “I can’t breathe” (eu não posso respirar). Esta ação fatal motivou em larga escala o movimento Black Lives Matter (vidas negras importam) contra a violência direcionada às pessoas negras, como forma de apoio ao movimento antirracista e para cobrar das autoridades que resguardem vidas negras.

Outro exemplo, símbolo de luta contra o racismo, é Nelson Mandela[7] que após longos anos de prisão chegou a presidência da África do Sul. Foi o líder do movimento contra o Apartheid (separação), que vigorou por 46 anos (1948-1994), na África do Sul. Foi criado pelas elites brancas que controlavam o país e sustentavam-se no mito da superioridade racial europeia e que segregava os negros no país. Estes fatos nos ajudam a refletir sobre a história, a sociedade e o estado na esfera do pluralismo. Afinal, somos todos seres humanos em nossas diferenças, nutrindo o ideal de vivermos juntos em harmonia e com oportunidades iguais.

Com ênfase na diversidade, na diferença e no pluralismo, destacamos a Semana de Arte Moderna[8], movimento artístico e cultural de grande importância nacional no século XX do modernismo, que completou cem anos em 2022. Foi realizada exatamente cem anos depois da Independência do Brasil (em 1922), no qual o país passava por diversas modificações sociais, políticas e econômicas (advento da industrialização, fim da Primeira Guerra Mundial). Portanto, história recente do Brasil, dos últimos dois séculos, de luta pela liberdade, pelo reconhecimento de seus processos de identificação como quebra de padrões, vínculos já existentes para valorização do que é nosso (país, corpo, e tudo aquilo que há nosso pertencimento enquanto sociedade ou pessoa).  

Tudo aquilo que realizamos, as observações que suscitamos da realidade nos proporcionam outras possibilidades de fazer, como aconteceu com os artistas da Semana de Arte Moderna. Os modernistas faziam a antropofagia, como profundos observadores da realidade social. Descrevem essa realidade não com longos tratados políticos, mas como arte. A arte como princípio político.

O modernismo retrata esta realidade brasileira que abarca conceitos de nacionalidade, diversidade, diferença e pluralismo pode ser apreciada na tela “Os operários” de Tarsila do Amaral (representante aqui dos intelectuais e artistas que se reuniram para apresentar na Semana de Arte Moderna) exemplifica o rompimento de padrões artísticos vigentes até então. Este evento cultural reuniu diversos tipos de arte como pinturas, poesias, esculturas, danças, entre outras e causou um grande impacto entre os artistas mais conservadores da época pois trazia uma dura crítica às regras importadas e à falta de liberdade de expressão dos artistas brasileiros. Por meio da arte moderna muitos puderam trazer o Brasil para suas artes e o nativismo que faltava em muitas obras anteriores, ou seja, a nossa história, sociedade e estado.

Todas estas formas de produções culturais nos permitem além de uma apropriação de elementos tão pertinentes à realidade brasileira a fruição das leituras propostas em cada uma delas para refletirmos sobre. Porém, temos outras leituras que nos permitem pensar como da parte legislativa documental para cumprimento de normatizações.

A Constituição Federal de 1988[9], vigente até os dias atuais, reconhece o direito à educação de todos os brasileiros não apenas como garantia de acesso, mas também pelo padrão de qualidade como um dos princípios segundo o qual se estruturará o ensino público. Por fim, temos quase dois séculos de história legislativa em que a educação aparece institucionalizada. Gradativamente, ela foi ganhando espaço com avanços, retrocessos e reações. Da independência do Brasil para a primeira Constituição em 1824 foram dois anos para a produção das leis mais importantes de um país que trata justamente da elaboração de outras leis, mais específicas de áreas afins, estipulando como devem ser feitas, por quem, e assim por diante.

A nossa sétima e vigente Constituição de 1988 embasou outras importantes conquistas legais, como: a construção de um Sistema Nacional de Educação, a Lei de Diretrizes Básicas da Educação Nacional (LDBEN) nº 9394 de 1996[10], e o Plano Nacional de Educação (PNE), em suas duas edições: 2000-2010 e 2014-2024.

As leis 10.639/2003 e 11.645/2008 alteram, enriquecendo, a nossa terceira e vigente LDBEN nº 9.394/96, para incluir a obrigatoriedade das temáticas História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, respectivamente. A lei 10.639 completou duas décadas, 20 anos em 2023, de normatização para garantir a amplitude dos conhecimentos históricos e culturais da formação dos povos brasileiros, dos processos formativos dos cidadãos brasileiros ricos pelas diversidades e diferenças.

                                                Imagem 1: A diferença nos une.

Fonte: Próprio autor, 2023.

As leis, mencionadas acima, sinalizam a obrigatoriedade destas culturas no currículo do Ensino Fundamental e Ensino Médio. Mas, sabemos que a abrangência da diversidade e a pluralidade cultural ultrapassam e contemplam a grade curricular de todas as modalidades de ensino e da vida. A rede municipal de Niterói tem os Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói (2022), documento construído democraticamente e de qualidade referenciada socialmente que norteiam as propostas pedagógicas da educação deste município.

Os referenciais curriculares potencializam as conversas sobre currículo nas unidades de educação, com amplo diálogo com professores, equipes de articulação pedagógica e demais profissionais da educação.

O currículo é território político, no qual as disputas pela significação não cessam. É cultura, movimento e diferença; produz novos sentidos, é ato criativo, invenção e, portanto, provoca deslocamentos em sentidos hegemônicos, que dificultam o fluxo do diferir. A luta política e o debate sobre as políticas curriculares que desenvolvemos neste processo de pensar os novos Referenciais Curriculares denunciam as estratégias que tentam domesticar as diferenças e, contra todas as tentativas de significar de tal modo, o currículo, com o que e como devemos ensinar (Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói da Educação Infantil, 2022, p. 57).

Os referenciais curriculares proporcionam a abrangência curricular dos movimentos culturais e das diferenças regionais para além dos pontos presentes na Base Nacional Curricular Comum (BNCC) que padroniza, homogeniza os conteúdos, objetivos e habilidades, desconsiderando a pluralidade brasileira, o que dificulta o trabalho com as diferenças e peculiaridades das regiões e das pessoas. A LDBEN 9394/96, no artigo 26, aponta a necessidade de uma da BNCC a ser complementada por uma parte diversificada. Porém, a escola é produtora de cultura e isto precisa ser valorizado. É importante incentivar a multiplicidade. Caso contrário, desconsideraremos o sujeito no processo de aprender a aprender, naturalizando o básico como mínimo.  

Sendo assim, os movimentos instituintes previstos nos referenciais curriculares impulsionam os Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) como documentos de produção curricular de cada unidade escolar. Portanto, amparados legalmente, vimos como sendo de fundamental relevância que as crianças da Educação Infantil conheçam pessoas que, com suas diversas contribuições fizeram e fazem da cidade uma referência.

Uma primeira mudança que promovemos é destacar a diferença (e não a diversidade) como pressuposto e sentido potente no currículo, ou seja, pensar a diferença cultural para além da identidade. Compreendemos que o conceito de identidade e as políticas de identidade manifestam demandas por reconhecimento nos currículos, envolvendo, principalmente, o movimento negro e os povos indígenas [...] (Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói da Educação Infantil, 2022, p. 56).

Contemplamos, assim, no nosso currículo as políticas de identidade e diferenças culturais com os temas das relações étnico-raciais, a presença da história e cultura dos povos indígenas e dos afro-brasileiros no Brasil, com experiências de quilombolas e indígenas, consequentemente a influência nos saberes ambientais e recursos naturais presentes em nosso meio ambiente, como possibilidades de produção curricular e o ato de educar em lógicas mais próximas a nossa realidade histórica.

Na expressão de sentidos e possibilidades de pensar a produção curricular, os referenciais curriculares oportunizam aos profissionais de educação a construção de uma proposta institucional comprometida com a teoria curricular.

[...]nos projetos instituintes, que potencializam o currículo como espaço de criação, um currículo instituinte de sentidos, um currículo que aposta na luta pela justiça social e na educação que produz na diferença, assumindo um projeto de educação antirracista e contra todas as discriminações, para lutar pela justiça social, que defendemos aqui como o emergir do sujeito singular. E mesmo reconhecendo a incerteza do horizonte e a impossibilidade plena de realização de qualquer projeto, apresentamos o melhor de nós nesta luta (Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói da Educação Infantil, 2022, p. 59).

Os projetos instituintes são práticas incorporadas ao instituído, promovendo na política curricular movimentos que podem reforçar os processos de reflexão, mas também outras questões que oportunizam novos sentidos, tornando a política curricular e a produção de currículos espaço de criação, em constante fluxo entre permanência e mudança, e não de repetição.

Abordaremos um destes projetos instituintes desenvolvidos em rede municipal de educação. A Unidade Municipal de Educação Infantil (UMEI) Jorge Nassim Vieira Najjar participa destes movimentos instituintes realizando atividades, durante todo o ano, com foco no reconhecimento da identidade de cada criança e suas culturas, no respeito às diferenças contra todas as discriminações, e na pluralidade das diversidades existentes no mundo que nos cerca e nas vidas que nos rodeiam.

Projeto Instituinte desenvolvido com Base nas Leis 10.639/2003 e 11.645/2008

Em 2023, o projeto instituinte da UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar recebeu o título de “450 anos de Niterói: conhecendo as contribuições culturais que fizeram e fazem a história de nossa cidade”, em decorrência da data simbólica do tempo de criação do município. É um local marcado pela diferença, pois Niterói foi fundada, com a posse solene em 1573, por um índio, o Arariboia, pertencente a tribo Temiminó, recebendo a denominação de São Lourenço dos Índios. Quantas cidades no Brasil foram fundadas por um índio?

Imagem 2: Nós fazemos parte desta tribo.




Fonte: Próprio autor, 2023.

Como mostra o cartaz construído pelo Grupo de Referência da Educação Infantil (GREI) 3B, todos os niteroienses fazem parte desta tribo. Foi um trabalho com abordagem a partir de histórias de criação da cidade, e consequentemente, de hábitos e atitudes da cultura indígena no decorrer dos tempos. Mas, qual a história da Aldeia São Lourenço dos Índios a Niterói?

São Lourenço dos Índios passa a se chamar, em 1819, Vila Real da Praia Grande. Só em 1834 é elevada à categoria de cidade, denominando-se Nictheroy (água escondida em tupi-guarani), tornando-se capital da Província do Rio de Janeiro. A importância político-administrativa deu novo impulso à cidade e seu crescimento tornou-se cada vez mais visível, com a multiplicação das edificações públicas comerciais, residenciais e também a abertura de novas ruas (Prefeitura de Niterói, 2021, s/p).

Com o intuito de conhecer e valorizar as histórias, lendas, belezas naturais, equipamentos culturais e programações culturais com cunho também pedagógico, assim como, de contemplar os parâmetros estabelecidos nos referenciais curriculares e nas leis 10.639/2003 e 11.645/2008 é que elencamos esta temática para o projeto instituinte. Porém, a UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar trabalha durante todo ano em seus projetos para uma educação antirracista, com a abrangência desta parte legislativa de forma transversal, mas, sobretudo, pela importância do tema para a formação integral das crianças.

Imagem 3: O Tupi que você fala.

Fonte: Próprio autor, 2023.

A imagem acima evidencia a leitura e literatura presente em nosso cotidiano, mas sobretudo as influências linguísticas oriundas de língua indígena pertencente ao nosso vocabulário. Foram utilizadas colagens com alimentos característicos da comida indígena e que consumimos. A pintura foi realizada com tintas naturais confeccionadas pelas crianças com mediação do professor, mostrando a importância desta na cultura indígena nos corpos, nas festas, entre outras celebrações ou rituais. As dobraduras remetem aos hábitos indígenas no modo vestir, antes e agora, enfim, em seus comportamentos e modo de ver a vida.

O nosso objetivo geral foi de reconhecer a história brasileira pela contribuição de todas as raças, principalmente pelas histórias que fizeram e fazem dos registros de nossa cidade, oportunizando assim, o empoderamento dos costumes e culturas negra e indígena que por cerca de cinco séculos foram descriminalizadas e diminuídas. Como específicos elencamos: apresentar às crianças as diversas formas de manifestações culturais, adaptando à sua realidade o conhecimento sobre personalidades que contribuíram e contribuem com a cultura de Niterói; proporcionar experimentações e vivências indispensáveis para o desenvolvimento infantil e um conhecimento focal da cidade de Niterói; trabalhar as múltiplas linguagens; ampliar a coordenação motora global por meio da promoção de atividades físicas.

Imagem 4: Apresentação do projeto instituinte

Fonte: Próprio autor, 2023.

A arte acima foi exposta no Museu de Arte Popular Janete Costa, no mês de novembro, junto com a produção das outras unidades escolares que se inscreveram para participar do movimento instituinte proposto pela Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME) de elaboração de projetos instituintes, o qual tem um edital, publicado em Diário Oficial (DO) com regras e normas para registro do documento que passa por avaliação de comissão definida pela FME. As escolas que têm os projetos instituintes aprovados saem publicadas em DO para recebimento de verba escolar, definida previamente, que possibilita suporte financeiro para execução dos projetos. No final do ano, há a prestação de contas financeira, e, de certa forma, pedagógica, quando a FME organiza uma semana de trocas de experiências dos projetos instituintes desenvolvidos na rede municipal.

O banner retrata um compilado de algumas atividades desenvolvidas no decorrer do ano de 2023, na UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar, sobre as contribuições históricas e culturais que fizeram e fazem parte da cidade de Niterói que completou 450 anos. Pontuaremos a seguir algumas propostas pedagógicas desenvolvidas neste projeto instituinte, englobando o conhecimento de pontos turísticos que evidenciam a construção da historicidade da cidade, assim como, equipamentos culturais e áreas verdes públicas existentes.

À luz de Josso (2010), o viés metodológico será a narrativa, baseados nos conceitos de vivências formadoras. Por meio de narrativas de histórias, a autora acredita que essa prática oferece uma possibilidade de experiência de autoconsciência por meio de nossas responsabilidades como sujeitos do processo. Josso (2010) afirma, ainda, que as narrativas são construídas, centradas em vivências, nas práticas e nas reflexões sobres estas.

O movimento de refletir provoca sensações e análises que se transformam em experiências transformadoras e que interferem na prática do indivíduo. Acreditamos que uma experiência vivida pode oferecer uma valiosa contribuição no processo de aprendizagem, nas diversas áreas do conhecimento e no processo formativo.

Por meio das narrativas é permitida a compreensão da realidade humana, buscando fortalecimento no processo ensino aprendizagem e transformação social, por meio das experiências variadas. Neste sentido, pensamos em uma qualidade de educação voltada para a formação integral da criança, formando cidadãos conscientes, protagonistas e preparados para a vida em sociedade.

Tomando por base os referenciais curriculares e os parâmetros das leis federais 10.639/03 e 11.645/08, a partir das políticas de identidade, promovemos de forma transversal, durante todo ano, atividades em que ofertarmos as crianças vivências com múltiplas linguagens, possibilidades de ressignificações e aprendizagens tendo como base a contribuição cultural, com ênfase em movimentos culturais na música, esporte, arte, literatura.

Imagem 5: Múltiplas linguagens.



Fonte: Próprio autor, 2023.

A imagem retrata o movimento cultural pesqueiro existente em Niterói, com a praia que recebe nome indígena e que boa parte de nossas crianças frequenta. Então, canções e histórias ajudaram para a construção do cartaz, assim, vários elementos foram utilizados para a arte produzida (areia, dobraduras, pintura, colagens...). Todas as crianças da UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar brincaram de pescaria para interagirem, se divertirem e entenderem como funciona o mecanismo da pesca e a importância desta.

No plano de ação da unidade escolar, pretendemos proporcionar práticas pedagógicas condizentes com a faixa etária dos nossos alunos. O trabalho é feito levando em consideração a forma de expressão de cada artista em destaque, ou seja, as crianças serão convidadas a serem protagonistas no processo de criação e execução das diversas manifestações culturais a que forem apresentadas.

Na literatura, uma das ações foi convidar a artista niteroiense Patrícia Schunk para realizar um encontro com autora, em que realizou a contação da história de seu livro “Descobrindo a cor de dentro”[11] para as crianças no espaço da UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar. A temática aborda uma proposta para uma educação antirracista e atenta às discussões étnico-raciais, com uma linguagem propicia a nossa faixa etária. O debate é pautado a partir de uma compreensão de que é urgente apoiar, fortalecer e mobilizar o respeito às diferenças, mostrando que como seres humanos, independentemente da cor da pele, por dentro somos iguais em nossa formação corporal interna, com enfoque na cor do sangue que pulsa e nos mantém vivos.

Imagem 6: Encontro com a autora Niteroiense.

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Fonte: Próprio autor, 2023.

A maioria das professoras releu depois o livro com seu Grupo de Referência da Educação Infantil (GREI) e discutiram de forma crítica buscando a diminuição da desigualdade social, além de minimizar questões de desigualdade racial dentro das instituições de ensino, considerando que a importância do espaço escolar para essas discutições que buscam o conhecimento e a evolução humana comportamental e intelectualmente. Portanto,

A leitura constitui um elemento essencial na formação do aluno, pois é capaz de levá-lo a desenvolver a reflexão e a capacidade crítica, sendo também uma prática que contribui para o processo de reconhecimento de si mesmo e do outro. A leitura, mais do que um mero exercício que desenvolve o nível intelectual do indivíduo, possibilita a ampliação da leitura de mundo, o crescimento interior, a vivência de diferentes experiências que aguçarão emoções e sentimentos. Por meio da leitura, o ser humano não só adquire conhecimento, como também pode transformá-lo, em um processo contínuo de construção e aprimoramento. Ler é criar uma teia de sentidos que se diferencia de leitor para leitor, é interagir com o texto e lhe atribuir sentidos, em um contínuo processo dialógico (Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói da Educação Infantil, 2022, p. 63).

As leituras, que vão muito além da decodificação dos códigos linguísticos, fazem parte deste arsenal ideológico que nos possibilita um novo olhar para algo já existente, pensamentos, conhecimentos e saberes.

Nossa vida intelectual está intimamente relacionada aos modos e efeitos de leitura de cada época e de seu segmento social. Destacamos a obra ficcional “A Menina que roubava livros” de Markus Zusak[12], como exemplo de uma história que se passa no ano de 1939, em plena Segunda Guerra Mundial. O cenário em questão é a Alemanha nazista, que recebia bombardeios rigorosos e cada vez mais frequentes em suas cidades, no qual havia a proibição da leitura. Muito provavelmente a censura acontece pelo reconhecimento da leitura como arsenal ideológico de conhecimentos e criticidades, uma força de opressão da sociedade contra o estado, o que poderia interferir no sistema de poder estipulado naquele espaço e naquele tempo.

Logo, pelo poder e saber contidos nas palavras, na UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar muitas foram as leituras realizadas com predominância na inserção da história e da cultura afro-brasileira e indígena, reconhecendo e valorizando os aspectos herdados da história do negro africano e dos índios nativos em nossa cultura local contribuindo para uma igualdade étnico-racial.

Imagem 7: Princesa Ashanti.

Fonte: Próprio autor, 2023.

Após a leitura do livro, a professora do GREI 3A, em 2023, construiu com o seu grupo a protagonista da história, Ashanti, uma princesa de uma comunidade da África. Diversos foram os conteúdos trabalhados. No momento da foto acima, a docente realizava uma contação, junto com seu grupo, da história “Ashanti, nossa pretinha”[13] para as outras crianças da UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar. Durante este processo, diversas foram as proposições para que as crianças pensassem sobre o racismo estrutural. A paute do debate não foi somente para fins de atendimento legal, mas pelo compromisso com o desenvolvimento de uma educação potencialmente democrática, pensada no âmbito da empatia e comprometida com um reparo histórico.

A funcionalidade da escrita também aparece, pois, as crianças coletivamente escreveram, junto à arte da personagem, o nome Ashanti. Consta duas escritas, cada letra feita por uma criança, na qual acontecia o reconhecimento de cada uma delas, vinculando-as principalmente aos nomes das crianças do GREI, dos familiares e da unidade municipal XXX. O trabalho de sequência das letras foi importante nesta atividade porque havia uma continuidade na escrita, assim como, da fonética.

Nas ações pedagógicas relacionadas à música, destacamos a contação de história com músicas, instrumentos musicais, e outros elementos originários da cultura africana e dos povos originários. Na foto abaixo, dentro do contexto da proposta, a convidada está com uma boneca Abayomi saindo das águas do mar em interação com as crianças.

Imagem 8: Cultura Afrobrasileira.

Fonte: Próprio autor, 2023.

Para quebrar os paradigmas da alienação europeia na história do Brasil, em que remetia aos negros e índios apenas como meros escravos, trouxemos ritmos, uma singularidade histórica e cultural, para enaltecer nossa cultura e mostrar a realidade das influências na constituição de nossa sociedade.

Também tivemos o encontro com a personalidade musical niteroiense Bia Bedran, que cantou e remexeu com nossas crianças. Assim, vamos conhecendo nossa cidade e artistas.

Imagem 9: Personalidade Niteroiense da música

Fonte: Próprio autor, 2023

Como ilustração do trabalho com as artes plásticas, apresentamos a criação e recriação da personagem do livro “O cabelo de Lelê”[14], realizada pelo GREI 4B e apresentada para todas as outras crianças por meio de contação de história da professora junto com o seu grupo.

              Imagem 10: Respeito não tem cor.

Fonte: Próprio autor, 2023.

Este encontro de saberes neste modo especial de pensar a vida é proveniente das reflexões e produções de pessoas que se predispõem as trocas destas experiências, permitindo ser afetado pela história do outro ou não.

O debate consciente e crítico de nossas histórias e culturas transversaliza a dimensão do nosso currículo escolar. Como reconhecimento de força política e a importância do dia da Consciência Negra, em 20 de novembro, instituído pela Lei 12.519/2011, é feriado em alguns estados como é o caso do Rio de Janeiro. Esta data foi escolhida em referência ao dia em que Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, teria sido capturado e morto em 1695.

Para a reafirmação de uma educação antirracista, todas os grupos de referência realizaram atividades para o dia da Consciência Negra para minimizar as tensões raciais tão sentidas diariamente na vida do negro no Brasil.

Imagem 11: Dia da Consciêcia Negra.

         


                                                           
Fonte: Próprio autor, 2023.

Mostramos no decorrer do artigo que as atividades da Consciência Negra não acontecem somente no mês de novembro, em decorrência das mobilizações e da luta antirracista. Agora, em continuidade do projeto instituinte da UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar, com destaque para a cultura indígena, compartilharemos outras propostas que tratam dos 450 anos de Niterói, do conhecimento as contribuições culturais que fizeram e fazem a história de nossa cidade. Logo, demos enfoque a nossa UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar, que faz parte da cidade e da história desta, localizada na comunidade do Capim Melado, no bairro de Ititioca, onde a maioria das crianças mora e a condução local mais comum.

Imagem 12: O melhor lugar de Niterói é a minha escola.


           Fonte: Próprio autor, 2023.

Para conhecer mais a nossa cidade, saímos dos muros de nossa unidade em alguns dias do ano de 2023, realizando algumas aulas passeio por equipamentos culturais de nossa cidade que fazem parte da nossa história niteroiense, como: o MAC (Museu de Arte Contemporânea de Niterói); o Teatro Popular de Niterói Oscar Niemeyer, no qual todas as crianças assistiram uma peça e receberam ao final o livro “A Teia das Águas”, de Roseana Murray; visita guiada pelo Horto Municipal do Fonseca; o Campo São Bento, espaço bucólico da cidade; Biblioteca Popular Anísio Teixeira, na qual aconteceram contações de histórias e brincadeiras.

Imagem 13: Passeios pela cidade de Niterói

Fonte: Próprio autor, 2023

Esta imagem mostra o quanto as crianças ficaram felizes em participar dos passeios propostos, e também, como precisam conhecer e explorar mais os espaços da cidade onde residem. No cartaz acima foram pedidas fotos das crianças em algum local de Niterói, inclusive foi uma sugestão feita para o recesso de julho, para que se possível, visitassem algum local do município com a família. Enfim, nos passeios realizados pela UMEI Jorge Nassim Vieira Najjar, a comunidade escolar e local aguardavam com grande felicidade a chegada dos ônibus. Parecia festa na rua! Acreditamos que seja porque a nossa unidade é a primeira e única escola na comunidade.

Assim, avaliamos que o projeto instituinte intitulado “450 anos de Niterói: conhecendo as contribuições culturais que fizeram e fazem a história de nossa cidade”, teve seus objetivos alcançados e que as experiências foram formadoras para muitas crianças, professores e responsáveis. Com isso, acreditamos que o trabalho desenvolvido pautado nos referenciais curriculares e nas leis 10.639/2003 e 11.645/2008 contribuiu para uma formação humana mais justa e igualitária.

Considerações finais

O nosso contínuo esperançar, como diz Paulo Freire, não vem do esperar (embora seja do mesmo radical), mas da esperança da defesa da educação no modo de pensar a formação como um desenvolvimento humano global (pessoal e social), na qual atitudes discriminatórias não são toleradas, pois, buscamos conhecimento e respeito para as diferenças entre os sujeitos que são cidadãos com direitos iguais, independente de raça, gênero, necessidade especial ou credo.

Existem necessidades ideológicas e econômicas que, sob o capitalismo, ainda são atendidas pela opressão de raça e gênero, e outras categorias que sofrem algum tipo de violência ou exclusão. É preciso eliminar estas desigualdades existentes, permitindo a revalorização dos bens extra econômicos, cujo o valor foi deteriorado pela história e pela economia capitalista.

Pontuamos uma história de militância por igualdade social que permite reconhecimento dos diversos papéis, ecoando vozes das casas, famílias, trabalhos e em diferentes espaços de participação na sociedade. Mas, sobretudo, com enfoque na educação e na possibilidade que este campo de conhecimentos oportuniza as pessoas a transformarem vidas pelos saberes oriundos das vivências, trocas, reflexões e aprendizados.

Em suma, nas histórias de vida e nas experiências o foco maior é nos contextos social e político, muito mais do que no cognitivo, porém, a fundamentação teórica e o rigor acadêmico devem estar presentes, tornando confiáveis as produções dos registros. É importante o professor saber, ter consciência do que está fazendo e de como seu trabalho pode afetar as pessoas, tanto de forma positiva quanto negativa. Por isso, são tão importantes os processos formativos que oportunizam a reflexão das práticas educativas que contribuem para a formação humana e integral dos indivíduos.

Referências

Arroyo, Miguel. Currículo, território em disputa. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2013.

FARIAS, Mabel. Infância e educação no Brasil nascente. In. VASCONCELLOS, Maria. R, de. (Org.). Educação da Infância: história e política. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

Brasil. Lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Disponível em:

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm#:~:text=LEI%20No%2010.639%2C%20DE%209%20DE%20JANEIRO%20DE%202003.&text=Altera%20a%20Lei%20no,%22%2C%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias. Acesso em: 15/03/24

Brasil. Lei 11.645, de 10 março de 2008.Disponível em:

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm. Acesso em: 15/03/24

Josso, Marie-Christine. A experiência de vida e formação. 2. ed. rev. e ampl. Natal, RN, EDUFRN, São Paulo: Paulus, 2010.

Referenciais Curriculares da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói da Educação Infantil. Disponível em:          
https://drive.google.com/file/d/1AMy8cVNcEQSCHdx7TfNysABnpwQylLqm/view. Acesso em 21 de jan. de 2024.

Prefeitura de Niterói. A cidade. Disponível em: https://niteroi.rj.gov.br/2021/03/29/niteroi/. Acesso em 27 de jan. de 2024.

Wood, Ellen Meiksins. Democracia contra capitalismo. São Paulo: Editora Boitempo, 1995.

Data do envio: 18/02/2024

Data do aceite: 20/03/2024

Revista Aleph, Niterói, Abril . 2024, p. 1 - 28  ISSN 1807-6211                  


[1] Doutoranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação: Processos Formativos e Desigualdades Sociais (FFP/UERJ/PPGedu). Professora da Unidade Municipal de Educação Infantil (UMEI) Jorge Nassim Vieira Najjar da Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME). E-mail: biamacedoabreu24@gmail.com e Telefone: 21996292026. ORCID (https://orcid.org/0000-0002-1460-4003).

[2] Mestranda em Novas Tecnologias Digitais na Educação (Unicarioca). Professora da Unidade Municipal de Educação Infantil (UMEI) Jorge Nassim Vieira Najjar da Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME).. E-mail: jumacedoabreu@gmail.com e Telefone: 21987869938 . ORCID (https://orcid.org/0009-0009-5390-5405).

[3] Evaristo, Conceição (2007). Da grafia-desenho de minha mãe, um dos lugares de nascimento de minha escrita. In: Alexandre, Marcos A. (org.) Representações performáticas brasileiras: teorias, práticas e suas interfaces. Belo Horizonte: Mazza Edições, p. 16-21.

[4] Termo utilizado aqui como crítica à cultura eurocentrista, à centralidade do governo europeu que governava o Brasil durante o regime imperial, em que trazia do continente africano pessoas para serem exploradas como escravas, ou seja, como um produto economicamente vantajoso, na visão capitalista.

[5] Disponível em: https://www.americanrhetoric.com/speeches/mlkihaveadream.htm. Acesso em 15 de mar. de 2024.

[6] Disponível em: https://www.acegis.com/2021/05/racismo-e-violencia-policial-o-caso-de-george-floyd/. Acesso em 15 de mar. de 2024.

[7] Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/biografia/nelson-mandela.htm. Acesso em 15 de mar. de 2024.

[8] Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/literatura/semana-arte-moderna-1922.htm. Acesso em: 15/03/24

[9] Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 15/03/24

[10] Brasil. Lei de Diretrizes Básicas da Educação Nacional 9394 de 20 de dezembro de 1996.Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em: 15/03/24

[11] Schunk, Patricia. Descobrindo a cor de dentro. 1ª edição: Editora Brinque Ler, São Gonçalo/RJ, 2020.

[12] ZUSAK, Markus. A menina que roubava livros. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2008.

[13] Santo, Taís Espírito. Ashanti, nossa pretinha. Editora Malê, 2021.

[14] Belem, Valeria. O cabelo de Lelê. 1º edição: Editora Nacional, 2007.