A PÓS-GRADUAÇÃO EM CENTROS REGIONAIS
BRASILEIROS como espaço de
internacionalização at home
Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)
Araguaia. MT, Brasil
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUCRS)
Porto Alegre, RS, Brasil
DOI: https://doi.org/10.22409/mov.v7i14.42338
Em
um contexto no qual a internacionalização da Educação Superior se expande de
forma acentuada junto com a globalização e a sociedade do conhecimento, a ciência
destacou-se nas últimas duas décadas, sendo que o Brasil ocupa, atualmente, o
13º lugar na produção científica mundial. Esse artigo objetiva refletir sobre a
pós-graduação em centros regionais, considerando o fato de que são
determinantes na produção da ciência em determinadas regiões brasileiras.
Busca-se, assim, sugerir a internacionalização at home para os arranjos locais articulados aos contextos globais. A
relevância científica deste estudo é o diálogo inovador de pensar sobre a
internacionalização em casa, para os centros regionalizados de Pós-graduação
brasileiros. E, consecutivamente, propor indicativos de como internacionalizar
a universidade de maneira efetiva nesses espaços territoriais. O procedimento
metodológico utilizado foi um levantamento bibliográfico e documental de
caráter exploratório, que se configurou como um cerco em torno do problema. A abordagem
de análise, em relação ao objetivo, foi crítica. Em síntese, é possível
destacar que nem todas as regiões brasileiras conseguem avanços, pois
algumas reagem passivamente aos processos de internacionalização. Enquanto
outros espaços agem na construção de uma identidade internacional. As análises
desta investigação propõem que a pós-graduação nos centros regionais
devem funcionar como uma possibilidade de internacionalização at home. Isso é facilitado por meio da
articulação com as grandes universidades que já tem a internacionalização da
educação superior presentes em suas ações diárias.
Palavras-chave: Educação Superior. Regionalização.
Internacionalização at home.
Pós-graduação.
POSTGRADUATE
IN BRAZILIAN REGIONAL CENTERS
as an internationalization space at home
ABSTRACT
In a context where the
internationalization of Higher Education expands sharply along with
globalization and the Knowledge Society, science has stood out in the last two
decades. Brazil currently occupies the 13th
place in the world's scientific production. This article reflects on
postgraduate studies in regional centers, considering
that they are determinants in the production of science. internationalization at home is proposed for
local arrangements linked to global contexts. The scientific relevance of this
study is the innovative dialogue of thinking about internationalization at
home, for the regionalized centers of Brazilian
Postgraduate Studies. The methodological process used was a bibliographic and documentary
procedure, which was configured as a siege
around the problem, from a critical approach. It is possible to point out that
not all Brazilian regions are making progress, as some passively react to
internationalization processes. While other spaces act to build an international
identity. The analyzes of this investigation propose
postgraduate studies in regional centers as a
possibility for internationalization at home. This is facilitated through
networking with universities that have the internationalization of higher
education present in their daily actions.
Keywords: High education. Regionalization. Internationalization at home. Postgraduate.
POSGRADUACIÓN
EN CENTROS REGIONALES BRASILEÑOS como un espacio de internacionalización en casa
RESUMEN
En un contexto
donde la internacionalización de la educación superior se expande fuertemente
junto con la globalización y la sociedad del conocimiento, la ciencia se ha
destacado en las últimas dos décadas, con Brasil actualmente ocupando el 13 °
lugar en la producción científica en todo el mundo. Este artículo tiene como
objetivo reflexionar sobre estudios de posgrado en centros regionales,
considerando el hecho de que son determinantes en la producción de ciencia en
ciertas regiones brasileñas. Por lo tanto, buscamos sugerir la
internacionalización en casa para los arreglos locales articulados a contextos
globales. La relevancia científica de este estudio es el diálogo innovador del
pensamiento sobre la internacionalización en el hogar, para los centros regionalizados
de estudios de posgrado brasileños. Y, consecutivamente, proponer indicaciones
sobre cómo internacionalizar la universidad de manera efectiva en estos
espacios territoriales. El procedimiento metodológico utilizado fue una
encuesta exploratoria bibliográfica y documental, que se configuró como un
cerco al problema. El enfoque de análisis, en relación con el objetivo, fue
crítico. En resumen, cabe destacar que no todas las regiones brasileñas
avanzan, ya que algunas reaccionan pasivamente a los procesos de
internacionalización. Mientras que otros espacios actúan para construir una
identidad internacional. Los análisis de esta investigación proponen que los
estudios de posgrado en centros regionales deberían funcionar como una
posibilidad de internacionalización en el hogar. Esto se facilita al
articularse con las principales universidades que ya tienen presente la
internacionalización de la educación superior en sus acciones diarias.
Palabras clave: Educación universitaria. Regionalización. Internacionalización en casa. Posgraduación.
Introdução
A internacionalização da Educação
Superior se expande de forma acentuada junto com a globalização e a sociedade
do conhecimento (HARGREAVES, 2004; DIDRIKSSON,
2006).
Inúmeras vezes se corporifica por meio dos intercâmbios, mobilidade de
acadêmicos e/ou professores, cooperação em projetos de pesquisas e parcerias
institucionais.
Assim, a Educação Superior vive um
momento sócio-histórico e econômico singular com vistas à educação global
(UNESCO, 2015). Recentemente, organismos multilaterais, entre eles a
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) passaram a
propor modelos alternativos de internacionalização, entre eles se destacam a
internacionalização do currículo e a internacionalização at home (em casa).
Articulado a esse movimento, conforme
explicita Didriksson (2008) está um desafio de
mutação, de transição histórica de longo prazo, que se identifica como complexo
e condutor de forças centrípetas e centrífugas. Essas transformações no contexto sócio-histórico e econômico mundial
geram contextos emergentes, que
para Morosini (2014, p. 386) são: “configurações em
construção na educação superior observadas em sociedades contemporâneas e que
convivem em tensão com concepções pré-existentes, refletoras de tendências
históricas”.
Isso significa dizer que, representa contextos que
possuem um ethos que
sugere interação com outras formas de realidades; ainda que exista uma relutância das instituições de educação superior
(IES), “[...] de assumir o fato de que são, acima de tudo, agências de
desenvolvimento humano e social” (BAWDEN, 2013, p. 49).
Exigiu-se, deste modo, nos últimos anos a
modernização da universidade, visto que os contextos emergentes induzem a novas
arquiteturas acadêmicas (FRANCO e MOROSINI, 2012). Esse contexto
se caracteriza como um momento de transição entre um modelo ideal weberiano e
um neo-liberal. Clemente e Morosini
(2019) consideram que tal movimento traz prismas multifacetados de temáticas e
requer dedicação para o desenvolvimento de conceitos e práticas
diversificadas.
Na América Latina, os contextos
emergentes são caracterizados, segundo Didriksson
(2006) por vários indicativos, sendo que os mais sensíveis à temática em estudo
são: sistemas de educação superior complexo, heterogêneo e segmentado; sistemas
multicampus e interiorizado com estruturas
diferenciadas em expansão; institutos tecnológicos; investigações com
multiplicidade de espaços de produção de conhecimento; e, massificação da demanda
social por educação superior.
Esse artigo objetiva refletir sobre a
pós-graduação em centros regionais, considerando o fato de que são
determinantes na produção da ciência em determinadas regiões brasileiras,
sugere-se a internacionalização at home para os
arranjos locais articulados aos contextos globais. A relevância científica
deste estudo é o diálogo inovador de pensar sobre a internacionalização em casa,
para os centros regionalizados de Pós-graduação brasileiros. E,
consecutivamente, propor indicativos de como internacionalizar a universidade
de maneira efetiva nesses espaços territoriais.
O
procedimento metodológico utilizado nesta investigação foi um levantamento
bibliográfico e documental de caráter exploratório, que se configurou como um
cerco em torno do problema (GATTI, 2007). A abordagem de análise, em relação ao
objetivo, foi crítica. Alves-Mazzotti e Gewandsznajder (1999) esclarecem que essa abordagem é
essencialmente relacional. Partiu-se do pressuposto de que nenhum processo é
isolado, acima dos conflitos da sociedade. Estão sempre vinculados às
desigualdades culturais, econômicas e políticas que a dominam.
Para esse percurso analítico, o artigo
foi dividido em três partes, além da introdução e das considerações finais. A
primeira apresenta uma breve constituição histórica do sistema de
Pós-graduação; a segunda destaca o contexto das regiões brasileiras com base no
conceito de território; e, na terceira parte, a internacionalização at home é a discussão realizada à luz do
arcabouço teórico sobre a Pós-graduação e a regionalidade.
1.
O contexto global do sistema de Pós-graduação no Brasil
Este
estudo parte da compreensão do papel da Pós-Graduação articulada a uma sociedade
internacionalizada, tendo como princípio basilar o conhecimento. Deste modo, busca-se enfatizar o
sentido e os rumos da Pós-Graduação, em um país situado na América Latina, que
possui limitações do ponto de vista político e social, atingido pelos percalços
da globalização econômica, que, segundo Nez (2014) impõe
limites à sua esfera científica-tecnológica.
A história da Educação Superior pode ser
dividida em duas etapas: antes e depois da implantação da Pós-graduação. Para
Oliveira (1995) esse processo é recente e se mescla com a introdução da
pesquisa no Brasil. Bianchetti
e Machado (2012) pontuam que a história da pesquisa foi implementada em quatro
momentos: inicialmente, realizadas por profissionais estrangeiros; depois, a criação
dos institutos de pesquisa e o início da Pós-graduação Stricto Sensu; e, por fim, as políticas desencadeadas pela
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES), validando
o sistema nacional de Pós-graduação (SNPG).
A
partir da década de 50, a pesquisa passou a fazer parte das preocupações dos gestores
e a aparecer nos programas e metas de governo. Morosini
(2009) considera que nesse momento é que se tornam nítidas as estratégias de
condições promotoras da pesquisa no estado brasileiro. Os cursos de
Pós-graduação são aqueles que se realizam após a graduação. O Lato Sensu assume a forma de
aperfeiçoamento/especialização, constitui-se um prolongamento da graduação. Já
o Stricto Sensu possui objetivo da
formação dos pesquisadores. Este estudo se dedica a analisar a Pós-graduação Stricto Sensu.
Depois
da reforma universitária (lei nº. 5.540/68) e da regulamentação do
credenciamento das IES é que se demarca a expansão da Pós-graduação, visto que
os programas começaram a se instalar em diferentes regiões do país. A
necessidade da titulação acadêmica para ascensão na carreira docente foi uma
das justificativas, pois, segundo Oliveira (1995) ampliou a demanda.
Destaca-se,
então, que a pressão do mercado de
trabalho, valorizando a titulação ampliou a solicitação por vagas. Closs (2002) considera que a partir de 1968, se inicia um
período de crescimento e somente na década de oitenta há sensível redução na
demanda. Castro (1985) sinaliza que o número de programas aumentou oito vezes até
1981.
Santos e Azevedo (2009) acrescentam que em 2008
existiam 2.588 cursos. Esse salto quantitativo da Pós-graduação Stricto Sensu se evidenciou quando os
programas foram definidos como foco privilegiado das políticas de incremento da
produção científica e tecnológica dos últimos governos.
Nez (2014) em balanço sobre os cursos de pós-graduação
brasileiros informa que no ano de 2013, havia um total de 5.333, acrescido de
mestrados e doutorados profissionalizantes. Se for levado em conta os últimos
10 anos, observa-se um crescimento
resultante da necessidade de
professores titulados para o exercício docente.
Ressalta-se, entretanto, que os mestrados acadêmicos
foram criados em 2000, e
contabilizam na última atualização, 44 programas com 904 cursos. Segundo a
Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG) têm como finalidade oferecer
formação continuada para profissionais que querem continuar a estudar, mas não
obrigatoriamente trabalhar na Educação Superior.
Antes de mais nada,
o mestrado profissional (MP) é um título terminal, que se distingue do
acadêmico porque este último prepara um pesquisador, que deverá continuar sua
carreira com o doutorado, enquanto no MP o que se pretende é imergir um pós-graduando
na pesquisa, fazer que ele a conheça bem, mas não necessariamente que ele
depois continue a pesquisar. O que importa é que ele (1) conheça por
experiência própria o que é pesquisar, (2) saiba onde localizar, no futuro, a
pesquisa que interesse a sua profissão, (3) aprenda como incluir a pesquisa
existente e a futura no seu trabalho profissional (CAPES, 2020, p.1).
Do balanço dos resultados da plataforma,
existem atualmente, 4.639 programas, entre profissionais e acadêmicos, distribuídos
nas 5 regiões brasileiras, isso demonstra o tamanho e a abrangência que o SNPG
possui. Conforme pode ser
observado no quadro seguinte, os
mestrados e doutorados acadêmicos possuem significativa diferença dos profissionalizantes,
até por sua tradição nas universidades.
Tabela 1 – Programas e cursos de mestrado e doutorado por região geográfica
Fonte: Extraído de MEC/CAPES (2020).
Todavia,
do resultado geral informado por Nez (2014) comparado
com a última atualização oficial que foi em 2018 (constante na tabela 1), é
notória uma redução de 13% no total de programas que eram 5.333 e hoje são,
4.639. Os processos avaliatórios e classificatórios podem ser uma das
justificativas da diminuição dos cursos/programas, além da ausência de
políticas de incentivo para o crescimento do SNPG, ao contrário o que se tem
acompanhado é um encolhimento e desmonte dos mesmos. Prova disso, é a
diminuição e cortes de bolsas e recursos financeiros de vários programas que
vem acontecendo ao longo de 2019 e 2020.
Segundo Moreira (2018, p. 1), o país vive uma crise grave nos
aspectos econômico, social e político. “A ciência brasileira faz parte deste
contexto e atravessa um momento difícil. Temos desafios a enfrentar, sendo que
o mais imediato deles se refere ao corte acentuado de recursos ocorrido nos
últimos anos”.
Os cortes afetam direta e profundamente as
agências de fomento de apoio a projetos de pesquisa e de infraestrutura para os
pesquisadores e as IES. Borssoi e Nez
(2019) constatam que a realidade da pesquisa nas universidades brasileiras se
agrava com a Emenda Constitucional (EC 95), pois o limite de gastos
impossibilita as condições mínimas, expansão, valorização dos profissionais, o
que afetará a Educação Superior como um todo.
Além disso, Franco e Morosini
(2011) salientam que há uma marcante vinculação intersetorial que impregnou os
primórdios das políticas de Pós-graduação no Brasil. Deste modo, remonta-se ao
problema crônico das regiões brasileiras, que causa uma assimetria acentuada. Baumgarten (2007) destaca que a tendência da
concentração da pesquisa em pólos foi intrínseca ao
próprio processo histórico de desenvolvimento técnico-científico. Também indica
que a ausência de políticas adequadas às diferentes realidades do país, pode
ser considerada como um fator que favoreceu sobremaneira o aumento da concentração
em alguns espaços em detrimento de outros.
Castro (1985) identificou que como poderia se
esperar, a Pós-graduação teve seu início na região Sudeste. As iniciativas
federais foram responsáveis pela maioria dos programas no Rio de Janeiro e em
Minas Gerais, enquanto São Paulo, através de uma instituição estadual, se
incumbia de desenvolver inicialmente os cursos naquela região. A região Sudeste
ainda mantém predomínio em número de cursos e programas, que pode ser observado
na tabela 1.
Morosini (2009) explicita que entre as “debilidades” que
marcaram a trajetória da Pós-graduação no Brasil, destacam-se: falta de planejamento
do crescimento do sistema; assimetrias das áreas do conhecimento e número
insuficiente de programas nas regiões norte, nordeste e centro-oeste. Santos e
Azevedo (2009) corroboram que no centro-oeste, o quadro de assimetrias é maior,
uma vez que a Pós-graduação concentra-se em Brasília e em alguns outros pontos
isolados. Cury (2004, p. 780) esclarece que: “[...] é preciso não esquecer de
que o princípio federativo exige mais equilíbrio e o desenvolvimento regional é
um princípio constitucional”.
Ainda com base nas últimas informações oficiais da
CAPES de 2018 e na comparação com os estudos de Nez (2014), identificou-se que o norte e o nordeste tiveram acréscimos, enquanto todas as outras
diminuíram as ofertas. Esse panorama mostrou-se diferente apenas nos dados
atuais, isso significa dizer que parece ser um sinal de que as assimetrias da
Pós-graduação estejam sendo tratadas aos poucos na realidade brasileira. Isso
facilita a oferta de formação por meio deste nível de educação, nas regiões
mais afastadas dos grandes centros.
2. O contexto local das
regiões brasileiras
Neste mundo
globalizado, o espaço geográfico ganha cada vez mais expressão, visto que na
competitividade que se vive, os lugares repercutem os embates entre os diversos
atores e o território (SANTOS, 2001). A linguagem cotidiana frequentemente
confunde território e espaço. Para alguns, o território viria antes do espaço;
para outros, o contrário que é verdadeiro.
A palavra espaço abriga uma pluralidade
de sentidos, e, é utilizada em inúmeras acepções. Assim,
deve ser considerado
com um conjunto indissociável de que participam, de um lado, certo arranjo de
objetos geográficos, objetos naturais e objetos sociais, e, de outro, a vida
que os preenche e os anima, seja a sociedade em movimento. [...] O espaço, por
conseguinte, é isto: um conjunto de formas contendo cada qual frações da
sociedade em movimento (SANTOS, 1988, p. 10).
Nesse sentido,
o espaço é o resultado da ação do homem, intermediados pelos objetos. Santos
(2001, p. 55) referenda que são os lugares, “[...] que realizam e revelam o
mundo, tornando-o historicizado e geografizado,
isto é, empiricizado”.
Com relação ao
conceito de território, Santos e Silveira (2008, p. 19) destacam que “[...] tem
como sinônimo pertencer aquilo que nos pertence”. Num sentido mais restrito, é um nome político
para o espaço de um país. Porém, essa definição não significa apenas o
resultado da superposição de um conjunto de sistemas e de coisas criadas pelo
homem. “O território é o chão e mais a população, isto é, uma identidade, o
fato e o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence” (SANTOS, 2001, p.
47).
Nessa
perspectiva, o território representa uma arena de movimentos revelando “[...]
as ações passadas e presentes, mas já congeladas nos objetos, e as ações
presentes constituídas em ações” (SANTOS e SILVEIRA, 2008, p. 247). O mundo
encontra-se organizado em subespaços articulados dentro de uma lógica global.
Destarte, para entender o funcionamento do território, é preciso captar esse
movimento, onde a região oferece uma visão dinâmica.
Segundo Corrêa
(1986, p. 46) uma região é o resultado de múltiplas determinações, isso
significa dizer, “da efetivação dos mecanismos de regionalização sobre um
quadro territorial [...], caracterizado por uma natureza já transformada,
heranças culturais e materiais e determinada estrutura social e seus
conflitos”. Para Santos (1996, p. 49) as regiões são subdivisões do espaço nacional
e mesmo do local. São lócus de
lugares funcionais, “não há outra forma para a existência do todo social que
não seja a forma regional”.
É preciso
esclarecer que o conceito de região é plurívoco e foi produzido ao longo dos
anos. Corrêa (1986) considera que se iniciou com uma discussão sobre a região
como paisagem; tendo sua definição aprimorada para um conjunto de relações
culturais, que tem apropriação simbólica de uma porção de espaço, sendo
elemento constituinte de uma identidade.
Haesbaert (2010) elucida que a regionalização identifica
parcelas do território que servem como instrumento que revela as articulações
ligadas à ação concreta de controle, produção e significação dos sujeitos
sociais, que se constroem no entrecruzamento de múltiplas dimensões (econômica,
política e cultural), autenticando as análises de Santos (1996).
Assim, nas regiões brasileiras em
desenvolvimento que são heterogêneas e desiguais, conforme proposições teóricas
desveladas, os cenários dos contextos emergentes estão ligados à complexidade
da oferta de Educação Superior, e, aqui neste estudo, em especial, da
Pós-graduação.
Segundo Altbach
(2009, p. 36) os países em desenvolvimento têm inúmeros desafios para superar, que,
“[...] exigem um sistema acadêmico diferenciado”. O Brasil tem um SNPG singular
do restante da América Latina que foi organizado ao longo dos anos. Todavia, é
preciso reconhecer as desigualdades e trabalhar neste ponto para ampliar a
oferta para as regiões menos atendidas, mas que são, de fato e de direito,
indispensáveis no desenvolvimento regional.
O mapa a
seguir identifica os cursos/programas de pós-graduação no Brasil, levando em
consideração a distribuição quantitativa em cada estado.
Figura 1 – Programas de pós-graduação no Brasil (Ano base: 2018).
Fonte: Extraído de GEOCAPES (2020).
Santos (1996) aponta
que nas regiões onde o sistema de ações são mais densos está o centro do poder,
o mapa reforça onde estão localizados a maior quantidade de programas de
pós-graduação no Brasil. Observa-se a mesma descrição da tabela 1, só que nesse
caso, identificam-se os estados (em vermelho) que possuem entre 172 a 916
cursos/programas, espalhados na região sul e sudeste (Minas, Gerais, Rio Grande
do Sul, São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro e Bahia). Esses espaços concentram
uma quantidade significativa de oferta e reforçam as justificativas históricas
de terem sido elencados como prioritários na construção do SNPG.
Entretanto,
para Santos (1988, p. 21), “cada
lugar é singular, e uma situação não é semelhante a qualquer outra”. Para os
outros lugares, é necessário se pensar numa forma de internacionalização da
Educação Superior diferente dos processos e fluxos que existem nos grandes centros
universitários, que exigem estruturas das quais algumas instituições menores
não dispõem.
3.
O desafio da internacionalização at home para o
desenvolvimento da pós-graduação em centros regionais
A
internacionalização em casa é uma das
modalidades de internacionalização, definida por Crowther
(et al., 2000) como toda e qualquer atividade
acadêmica internacional. O termo abarca as funções constitucionais do ensino,
da pesquisa e da extensão universitárias, bem como, as atividades
contemporâneas relacionadas à inovação e a universidade-empresa (MOROSINI,
2018).
O conceito
de internacionalização at home, internacionalização do campus, ou
ainda chamada de internacionalização doméstica, surgiu na década de 90, criado
por Nilsson (2003). Para além de uma formação técnica
qualificada, Baranzeli (2019) explicita que também tinha
como finalidade a formação de cidadãos que respeitasse as culturas, fornecendo
experiências multiculturais aos estudantes. Tenciona, deste modo, uma nova
estrutura curricular nas IES.
Para Morosini
(2018), a internacionalização da educação superior estende-se desde a
mobilidade, que é a concepção mais usual, até a produção em redes, e, mais
recentemente, a internacionalização at home
(IaH). Todavia, em algumas universidades
periféricas não há política institucional de internacionalização, nem para a
Pós-graduação, muito menos para a graduação. Essas acabam acontecendo por meio
de iniciativas individuais de professores, tendo como foco a mobilidade
acadêmica e os acordos de cooperação técnico-científicos, que nem sempre são
institucionalizados (NEZ, 2019).
Segundo
investigação realizada pela CAPES (2017), que foi respondida pelos programas de
Pós-graduação, observa-se que existem, pelo menos, dois grupos distintos de IES
no Brasil. Um deles aproveita melhor das condições de fomento, o que reflete em
número elevado de bolsas, de acordos de cooperação internacional, e de
projetos. Esse grupo possui maior quantidade de cursos de pós-graduação, permitindo
uma ação coordenada da instituição. O segundo grupo contém a maior quantidade de
instituições, no entanto, número menor de programas e cursos, detectou-se na
pesquisa realizada que essa situação reflete menores índices de
internacionalização da educação superior.
Alguns elementos analíticos
da investigação relacionados à institucionalização dos processos de
internacionalização nas IES brasileiras podem ser observados no gráfico que
segue.
Gráfico
1 – Porcentagem de instituições, por agrupamento, sobre
os planos de internacionalização.
Fonte: Extraído de MEC/CAPES
(2017).
Os dados apresentam as IES,
por agrupamento, em relação aos planos institucionais de internacionalização.
Fica nítida a diferenciação, com 62% - cluster 2 (verde) as universidades dizem
possuir um plano. Enquanto que o cluster 1 (azul) 38% informam
que é necessário uma consultoria externa para sua construção e implementação,
que reforçam as reflexões de Nez (2019), no que tange
à institucionalização dos processos.
As
conclusões deste estudo explicitam que existe uma forte tendência nacional à
internacionalização passiva, com baixas taxas de atração de profissionais
internacionais, contudo, pode-se considerar que é um cenário dinâmico, visto
que os professores visitantes já aparecem entre as prioridades do processo de
internacionalização das IES (CAPES, 2017).
Em
seu papel de agência governamental e de incremento de fomento, a CAPES, vem
realizando discussões com o objetivo de esboçar modelos e formas alternativas
de projetos e parcerias. A internacionalização das universidades brasileiras é
um processo necessário que deve permitir “que a educação superior se torne responsiva aos desafios de uma
sociedade globalizada, mas deve ser entendida como um meio e, não, um fim em si
mesmo” (CAPES, 2017, p. 44 – grifos nossos).
Para Haesbaert (2010) existem algumas possibilidades para dar
conta dos processos da articulação regional. Nez
(2014) elucida que há um rumo promissor no diálogo interinstitucional. Contudo,
faz-se indispensável uma política interna de internacionalização para a
Pós-graduação baseada na proposta at home, para que
essas IES regionais a oportunizem e solidifiquem esse espaço.
Assim, entre
os eixos da internacionalização, a at home, pode ser
o caminho para a diminuição das assimetrias brasileiras. Wit (2011) expõe que a internacionalização
de currículos e processos de ensino aprendizagem tornou-se tão relevantes
quanto à mobilidade e a cooperação, que foram ao longo dos anos, modelos mais
presentes.
Para
que esse modelo em casa se efetive, é imperioso que se leve em conta os
seguintes indicativos: “[…] planes de estudios y
programas, procesos de enseñanza
y aprendizaje, actividades
extracurriculares, vínculos con grupos locales culturales o étnicos, y actividades de investigación y
académicas” (WIT, 2011, p. 6). Essas condições proporcionariam a
internacionalização em casa, visto que incentivam uma conscientização
internacional e habilidades interculturais em um mundo globalizado, tornando os
acadêmicos ativos, principalmente nas instituições periféricas e regionalizadas.
Esses
aspectos, é claro, não descartam a internacionalização no exterior (out),
incluindo todas as formas de ensino além-fronteiras: mobilidade, projetos e
programa de cooperação técnica, entre outras. Aupetit
(2017, p. 325) destaca que: “Promueven fundamentalmente la movilidad saliente,
pese a la retórica sobre la necesaria diversificación de las actividades en
vista de garantizar una internacionalización en casa o bien comprensiva”.
Os
processos não são excludentes, entretanto, devem estar entrelaçados em
políticas institucionais, que as universidades nem sempre tem condições de
realizar por falta de apoio ou aparato técnico, quando estão espalhadas no
interior do Brasil, conforme ilustra a figura 1 e com poucos programas de
Pós-graduação em algumas regiões dispostos na tabela 1.
A
internacionalização at home desenha possibilidades reais de ações
internacionais. Existem diversos modelos para sua ascensão, Baranzeli
(2019) apoiada em Beelen (2017), sugere as dispostas
na figura seguinte, que possibilitariam atividades práticas tanto na graduação,
quanto na Pós-graduação.
Figura 2 – Ferramentas práticas da internacionalização em casa.
Fonte: Baranzeli
(2019) adaptada de Beelen (2017).
Vale
ressaltar que as conclusões sobre a importância da internacionalização, hoje,
em tempos de pandemia, não estão restritas à regionalidade, mas se estendem a
todo o globo. Os impactos dessa crise mundial ainda não são possíveis de serem
mensurados, mas um primeiro reflexo é identificável: a mobilidade, tanto out como in, diminuiu drasticamente; e, provavelmente, retornará, em
patamares menores do que os anteriores.
Esse
impacto tem seus principais reflexos nos países desenvolvidos e no fluxo Ásia,
Europa e EUA. No global sul, e, no Brasil em particular, os percentuais de
mobilidade são baixos e não sofrerão grande impacto. No contexto global,
provavelmente, o desenvolvimento do nacionalismo excludente, que impõe fortes
restrições a entrada de estudantes, e a exigência de
pagamento de taxas e mensalidades, restringirão ainda mais o intercâmbio das
camadas altas e médias.
Para
suprir esse processo de internacionalização que está sendo minimizado, se aponta
como foco norteador para este momento, a internacionalização at home. Acompanha esse desenvolvimento a
educação on-line e suas inúmeras possibilidades. É um grande desafio, pois,
essa transição de modelos implica em capacitação de docentes, acadêmicos, corpo
técnico, entre outros elementos, tais como; política institucional, suporte de
conexão de internet e computador, que constituem a cultura do on-line.
Para
concluir, pode-se aproveitar esse cenário nacional ambíguo e incerto com
grandes restrições da ciência, tecnologia e inovação (C, T & I) para usar a
internacionalização at home como estratégia para avanços na
busca de internacionalizar a educação superior nas diversas regiões
brasileiras.
Considerações finais
A ciência cresceu nas últimas duas décadas
e o Brasil ocupa o 13º lugar na produção científica mundial. A Educação
Superior é assinalada nesse período, pela expansão acelerada de quantidade de
vagas, por políticas de diversificação e por uma tendência de privatização. Paralelamente,
advêm um processo de internacionalização regional (transfronteiriço) e transnacional,
sul-norte e sul-sul que possui presença marcante.
A
reflexão sobre o espaço e a discussão sobre a regionalidade, neste estudo, se articula
aos contextos emergentes. Isso se
configurou na inserção de componentes que fazem de uma determinada fração do
território o lócus de um tipo de atividade globalmente articulada a uma
sociedade do conhecimento. “É importante
retomar a assertiva que afirma que as políticas globais adquirem interferências
dos contextos particulares” (MOROSINI, 2018, p. 127).
A
internacionalização das universidades brasileiras é necessária para tornar a
educação superior responsiva aos desafios da sociedade globalizada. Tem, deste
modo, o potencial de transformar as vidas dos acadêmicos, permitindo a
construção de competências; além disso, possui um papel cada vez maior para
ciência através da intensa troca de conhecimentos.
Sintetizando, a proposta neste estudo busca incentivar e solidificar a
internacionalização at home, por meio
da Pós-graduação, com vistas a oferecer oportunidades de experiências internacionais e
interculturais. De acordo com Nilsson (2003) e Stallivieri (2016) está no cerne do esforço
institucional garantir que todos se beneficiem da internacionalização de
alguma forma, especialmente os que não têm a oportunidade de estudar no
exterior.
Neste
cenário emergente articulado a regionalidade, vincula-se esta análise,
tornando-se fundamental pensar, em atividades que poderiam ser oferecidas a
todos os acadêmicos, buscando a inclusão da dimensão internacional e
intercultural nas atividades do ensino, da pesquisa e da extensão universitária.
Partindo da alusão de Santos (1996) de que aos
atores mais poderosos se reservam os melhores pedaços do território, revelam-se
diferenças de condições de produção do conhecimento no país. Destarte, a Pós-graduação,
como meio de internacionalização da Educação Superior tem influência do, no
e sobre o território. Do território, porque a partir dele se
apresentam os requisitos de uma cultura internacionalizada. No território, porque seus resultados
interferem no desenvolvimento da região de forma global/local e são abarrotados
de elementos da regionalidade; e sobre,
porque incidem diretamente na sociedade envolvida em seu entorno.
Deste modo, o espaço ocupado é sempre histórico e
deriva da conjunção entre as características da materialidade territorial e das
ações dos seus atores ou sujeitos. Nem todas as regiões conseguem avanços, pois algumas reagem passivamente aos processos
de internacionalização, porque não se sentem partícipes. Enquanto outros
espaços agem na construção de sua identidade internacional.
Então, a saída seria a cooperação
interinstitucional, em níveis e direções diversificadas que se materializam
como ferramentas para as práticas. A ênfase é no trabalho colaborativo
potencializando a internacionalização at home, nos
“sertões” do Brasil, onde é pouco provável que a internacionalização seja
efetiva.
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SOBRE AS AUTORAS
EGESLAINE
DE NEZ é doutora em
Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mestra em
Educação pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, professora da Universidade
Federal de Mato Grosso (UFMT), Campus Universitário do Araguaia, coordenadora
do Grupo de Estudos sobre Universidade (GEU/Unemat/UFMT),
membro do Centro de Estudos de Educação Superior (CEES). Fez estágio
pós-doutoral pela Pontifícia Universidade Católica (PUCRS).
E-mail: e.denez@yahoo.com.br
MARILIA
COSTA MOROSINI é doutora em
Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mestra em
Sociologia Educacional, professora aposentada da UFRGS, professora da Pontifícia
Universidade Católica (PUCRS),coordenadora do Centro de Estudos em Educação
Superior (CEES/PUCRS), Rede Sulbrasileira de
Investigadores da Educação Superior (RIES), do Observatório de Educação
Qualidade do Ensino Superior (CAPES/INEP). Fez estágio pós-doutoral no
LILLAS/Universidade do Texas.
E-mail: marilia.morosini@pucrs.br
Recebido em: 26.04.2020
Aceito em: 18.05.2020