A CONDIÇÃO DE VIDA E AS EXPECTATIVAS DE JOVENS DO CAMPO E DA CIDADE FRENTE AO TRABALHO, À EDUCAÇÃO E AO FUTURO¹


Rafael Márcio Kreutzer2 Adriana D’Agostini3


Resumo

Trata-se de jovens de escolas rurais e urbanas, problematizando sua condição de trabalho, educação e perspectivas de futuro. A pesquisa de campo foi através de questionários e grupos focais. Os dados evidenciaram mais semelhanças do que divergências entre a condição dos jovens urbanos e rurais. A maioria dos jovens são trabalhadores desde muito cedo e para muitos a educação aparece como alternativa para o mercado de trabalho capitalista, além de tenderem a rejeitar a autoridade da instituição escolar e do Estado. Os jovens procuram na escola espaços de cultura, esporte e sociabilidade.


Palavras-chave: Juventude. Trabalho. Educação.


Resumen

Trata de jóvenes de escuelas rurales y urbanas, problematizar su condición de trabajo, educación y perspectivas de futuro. La investigación de campo fue a través de cuestionarios y grupos focales. Los datos evidenciaron más similitudes que divergencias entre los jóvenes rurales y urbanos. La mayoría de los jóvenes son trabajadores desde muy temprano y para muchos la educación es alternativa para el mercado de trabajo capitalista, además de tender a rechazar la autoridad de la institución escolar y del Estado. Los jóvenes buscan en la escuela espacios de cultura, deporte y sociabilidad.


Palabras clave: Jóvenes; Trabajar; Educación.


Introdução


Este artigo é um desdobramento de duas outras pesquisas: uma delas, a maior, vem sendo realizada em dez escolas, que atendem os jovens da região periférica do centro de Florianópolis, buscando as relações que estes jovens fazem entre a escola, o trabalho e a cultura de onde vivem3. A segunda pesquisa


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1 DOI: https://doi.org/10.22409/tn.16i30.p10093

2 Professor de História da Rede Pública de Ensino. Pesquisa desenvolvida em 2016, como bolsista PIBIC-UFSC. E-mail: rafakretzer@gmail.com

3 Professora Dra. do Departamento EED/CED/UFSC, membro do grupo de pesquisa TMT. E-mail: d.agostini@ufsc.br

4 O projeto de pesquisa mencionado se chama Juventude pobre e escolarização: relações com a

escola e a cultura em territórios de precariedade, coordenado pela Prof.ª Drª Luciana Pedrosa

está vinculada à primeira e tem como objetivo traçar as semelhanças e as diferenças entre a juventude do campo e da cidade quanto às suas perspectivas diante do trabalho, da educação e do futuro4.

Mudanças econômicas, tecnológicas, demográficas, sociais e culturais, a nível mundial a partir da segunda metade do século XX, aprofundaram uma fissura entre a jovem geração que surgia a partir da década de 1950 e a geração de seus pais (HOBSBAWM, 1995). A crise econômica que se iniciou na década de 1970; o acirramento do desemprego crônico (MÉSZÁROS, 2002) e as reformulações de propostas educativas liberais (ALGEBAILE; RUMMERT; VENTURA, 2011) evidenciaram a reestruturação do capital e já apontavam para os obstáculos que enfrentaria a juventude do século XXI.

O objetivo desta pesquisa é analisar quais as condições em que se encontram os jovens do campo e da cidade no que se refere ao trabalho, à educação e ao futuro, e quais as expectativas que estes jovens têm quanto a estes três elementos.

Para a coleta de dados desta pesquisa estivemos em quatro escolas públicas de Santa Catarina. Duas do campo: EEM Paulo Freire e EEM Semente da Conquista, situadas em assentamentos da reforma agrária, em Abelardo Luz. E duas da cidade: EEB Getúlio Vargas e Instituto Estadual de Educação, situadas no centro de Florianópolis, na região do entorno do Maciço do Morro da Cruz, um complexo montanhoso situado na zona central de Florianópolis onde se concentram dezenas de comunidades em condição de vulnerabilidade socioeconômica. Os sujeitos da pesquisa foram 319 jovens estudantes da cidade e 152 jovens estudantes do campo, totalizando 471 jovens5 – a maioria entre 15 e



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Marcassa, docente do departamento de Metodologia de Ensino, na Universidade Federal de Santa Catarina.

4 O projeto de pesquisa mencionado se chama Juventude do campo e da cidade: relação trabalho, educação e perspectivas de futuro, coordenado pela Prof.ª Drª Adriana D’Agostini, docente do departamento de Estudos Especializados em Educação, na Universidade Federal de Santa Catarina.

5 A diferença entre o número de jovens pesquisados nas escolas da cidade e nas escolas do

campo é um indicativo e uma problematização sobre o êxodo rural jovem e a pouca oferta de Ensino Médio no campo, questões que orientam as condições de existência em um lugar, porém estes aspectos serão tratados mais a frente neste artigo.

18 anos. Como dados para a análise trabalhamos 471 questionários6 respondidos pelos jovens, três grupos focais (entrevistas coletivas)7 realizadas com os jovens das escolas urbanas, uma roda de conversa realizada com jovens do MST8, em que participavam alguns jovens dos assentamentos de Abelardo Luz, e um diário de campo. Para a análise, devido à proximidade da temática e poucas pesquisas referentes aos jovens do campo, nos apoiamos também nos depoimentos frutos das entrevistas contidas na tese de doutorado da professora e pesquisadora Janata (2012), realizadas com jovens do Assentamento Marcos Freire (MST), situado em Rio Bonito do Iguaçu, Paraná.

Os dados apresentaram mais semelhanças do que divergências entre a condição dos jovens urbanos e campesinos. Foi possível perceber que a grande maioria dos jovens, tanto do campo quanto da cidade, são trabalhadores desde muito cedo e que para muitos deles a educação aparece como alternativa para o mercado de trabalho capitalista, embora não saibam ao certo que tipo de trabalho buscam nesse mercado. Boa parte dos jovens não apresentou projetos sólidos, seguros ou esperançosos para as suas vidas, mas por outro lado demonstraram, em certa medida, rejeição à autoridade da instituição escolar e do Estado e, ainda, procuraram na escola aquilo que ela não se propõe: espaços de cultura, esporte e sociabilidade. Partindo do percurso histórico que apontávamos, percebemos a juventude imersa em incertezas de um contexto de convenções sociais e culturais esfaceladas, do desemprego crescente e do comprometimento das políticas educacionais com a lógica da economia liberal. Esses jovens quase sempre demonstraram conformismo e alienação diante desta situação, mas por outro lado há indícios de negação desse contexto, reivindicando, quase nunca de forma consciente e tampouco organizada, algo mais que a vida reduzida reservada a eles pelo capital.


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6 Os questionários apresentavam 36 perguntas fechadas e uma aberta. Estivemos presentes em sala enquanto os jovens respondiam e os instruímos para que assinalassem apenas uma alternativa por questão. Algumas questões tinham a alternativa “outro”, onde poderiam dar uma resposta mais específica. O tratamento estatístico foi realizado pelo programa de estatística descritiva chamado de software MODALISA 7, Licence Educátion et Récherche.

7 Os grupos focais eram feitos de acordo com a disponibilidade dos estudantes e da escola, variando entre cerca de 4 a 15 participantes.

8 A roda de conversa com os estudantes do campo foi possível devido a um trabalho dos autores

em um curso de formação para jovens do MST, onde ocorreu uma roda de debates sobre a juventude do campo.

O jovem trabalhador estudante


Quanto à categoria trabalho, buscamos conceituá-la segundo a teoria marxiana desde os apontamentos de Manacorda em sua obra Marx e a Pedagogia Moderna (MANACORDA, 2010). Assim, conforme indica o autor, levamos em consideração o caráter unilateral, empobrecido e predatório do trabalho sob a sociedade capitalista assentada sobre a divisão do trabalho, ao mesmo tempo em que percebemos a possibilidade da humanização dos indivíduos por meio do enriquecimento e ampliação dos significados do trabalho, podendo o indivíduo tornar-se omnilateral, ou seja, um indivíduo de múltiplas e integrais capacidades técnicas e intelectuais.

Em Marx e a Pedagogia Moderna buscamos também os fundamentos para a categoria educação, compreendendo que na sociedade capitalista a divisão entre trabalho prático e intelectual leva, por consequência, à unilaterialidade do ensino, tanto àquele voltado para a classe trabalhadora, puramente prático, quanto àquele voltado para a classe dominante, puramente abstrato (MANACORDA, 2010).

Para a categoria juventude, levamos em consideração as contribuições de Marialice Foracchi, que situa a juventude para além de questões estritamente biológicas e/ou geracionais, conferindo a esses conceitos também um caráter social na medida em que os jovens refletem de maneira especial as contradições do sistema capitalista (1972, p. 22). Dessa forma, a autora busca compreender o comportamento dos jovens como um acontecimento sócio-histórico. A partir dessa perspectiva9, pensamos a delimitação etária da juventude. Como atesta Suáres (2013), na sociedade moderna, a juventude passa a fazer parte de um ciclo de vida segmentado, especializado e instrumentalizado, e que, a partir desses pressupostos, passa a ser submetida a uma hierarquia de valores entre as gerações. O autor coloca que “a divisão etária da sociedade se potencializa

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9 As categorias idade e geração são compreendidas por nós, a partir da perspectiva social de Foracchi (1972), que não faz uma cisão entre social, cultural e biológico e sim tenta demonstrar que a idade, a geração e as atividades direcionadas ao desenvolvimento em cada fase da vida são conduzidas pelas vivências e experiências sociais das pessoas. Assim, tem importância para o desenvolvimento humano as funções biológicas e cronológicas que tomaram diferentes formas de acordo com suas relações sociais ao longo dos tempos. Exemplo disso é a mudança conceitual da faixa etária que a juventude compreende, extremamente social e contextualizada, aumentou de 18 anos para 24 anos, depois para 29 anos e em alguns casos (Itália) para 39 anos, implicando a dependência econômica, de moradia, emprego, anos de escolarização.

consideravelmente quando se articula com a divisão social do trabalho, dos gêneros e do conhecimento”10 (SUÁRES, 2013, p. 17). Assim, de acordo com os estudos sobre a juventude e considerando uma delimitação sócio-histórica de idade, para esta pesquisa compreende-se juventude entre 12 e 29 anos.

Em relação aos jovens de nossa pesquisa, percebeu-se que é um mito dizer que a vida no campo e na cidade são opostas, romantizando, geralmente, um dos lados. Há os que dizem da suposta salubridade de viver no campo, outros que dizem das “grandes” oportunidades de se ter uma vida de sucesso na cidade. Porém, ambos os espaços são parte do mesmo processo sócio-histórico do contexto capitalista e sofrem das principais contradições deste sistema. Os nossos dados não negam essa tendência, percebemos mais convergências do que divergências entre jovens do campo e da cidade, salvo algumas especificidades.

Começando pela condição financeira familiar, as respostas dos questionários nos mostram que a grande maioria dos jovens desta pesquisa são de famílias cuja renda mensal gira em torno de 1 a 4 salários mínimos, estando o contexto do campo um pouco mais precarizado11. Além disso, para o caso da cidade, alguns dos jovens, durante um dos grupos focais, relataram ajudar com as despesas da família. Um deles falava: “Eu dava cento e [inaudível] reais. Eu ganhava R$ 900,00 e o resto ficava para mim1213. Enquanto que o outro complementa: “[Eu] dava uma quantia, uns 200 pila [reais] para minha mãe14. No caso dos jovens do campo, Janata aponta, em sua tese, a participação dos jovens para a contribuição na economia doméstica “ajudando os pais nos serviços que envolvem o cuidado no lote” (JANATA, 2012, p. 110).

O trabalho é bastante presente na vida de grande parte dos jovens pesquisados, daqueles que vivem na cidade, 46% afirmaram já ter trabalhado ou ainda trabalhar, 51,9% disseram nunca ter trabalhado e 2,2% não responderam. A situação dos jovens do campo é ainda mais agravante, 70,3% afirmaram já ter trabalhado ou trabalhar, 28,3% afirmaram nunca ter trabalhado e 0,7% não



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10 Tradução livre do espanhol para o português.

11 O salário mínimo na época em que foram aplicados os questionários estava no valor de R$ 724,00.

12 Optaremos por dar uma numeração aos jovens para não os expor.

13 Jovem 1 (Grupo Focal realizado em 04/11/2015).

14 Jovem 2 (Grupo Focal realizado em 04/11/2015).

responderam15.

E ainda, se considerarmos o trabalho doméstico ou trabalho informal, o número daqueles que já trabalharam e/ou trabalham aumentam. O trabalho doméstico como extensão do trabalho fora de casa fica evidenciado na fala de um dos jovens urbanos durante os grupos focais: “Eu sempre ajudei em casa […]. Os meus pais ficam o dia todo fora e então eu faço as coisas em casa e para mim16.

Sobre trabalhar e estudar ao mesmo tempo, um dos jovens comentava: “No primeiro mês fiquei cansadão, tinha que vir para o colégio de manhã e ia pro banco [onde trabalhava como estagiário] de tarde, chegava em casa à noite e dormia cansado. Mas depois fui acostumando, né?”17. Nessa mesma entrevista os jovens comentam que ajudam com as atividades domésticas limpando a casa e contribuindo na hora de cozinhar.

Os trabalhos fora de casa a que os jovens se referem nas falas supracitadas são respectivamente um cargo de estágio em uma agência bancária e um trabalho informal (sem carteira assinada) como pedreiro. O crescente desemprego18 é parcialmente diluído em forma de trabalhos informais e/ou precarizados, de carga horária fragmentada e vínculos volúveis como estágios e contratos que dificilmente passam dos três meses. O desemprego estrutural do capitalismo impõe novas nomenclaturas e conceitos sobre o que é estar empregado a partir da lógica da “flexibilização” de contratos – para os que ainda possuem contratos – e impõe a informalidade para outra numerosa parte de trabalhadores, principalmente aos jovens estudantes/trabalhadores em busca de seu primeiro trabalho.

O trabalho informal parece permear a vida dos jovens pesquisados de uma


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15 Este contraste entre jovens do campo e da cidade quanto à iniciação no trabalho pode ser apenas aparente, uma vez que para os jovens do campo a conexão entre o trabalho na lavoura e o trabalho em casa é bem mais expressa que no caso dos jovens da cidade, que nem sempre percebem o trabalho doméstico conectado a jornada fora de casa.

16 Jovem 3 (Grupo Focal realizado em 30/11/2015).

17 Jovem 1 (Grupo Focal realizado em 04/11/2015).

18 No Brasil, os últimos índices de desemprego apontam para 16% da população brasileira

desempregada, sendo deste percentual 15% de desemprego entre jovens. Nos países considerados desenvolvidos, os índices de desemprego também crescem: 24,4% na Grécia; 20,9% na Espanha; 12,2% em Portugal e 10,3% na França. É importante ressaltar que estes índices consideram um amplo significado para empregabilidade, levando em conta uma série de empregos informais, bem como fragmentos de jornada de trabalho – um sujeito que trabalhe uma vez por semana pode ser considerado não desempregado. Dados relativos aos meses de dezembro de 2015 e fevereiro de 2016 – Disponível em: <http://pt.tradingeconomics.com/country- list/unemployment- rate&gt> Acesso em 24 out. 2016.

maneira muito perversa. Percebemos, por meio dos nossos dados, que muitos dos jovens urbanos têm sua vida atravessada pelo narcotráfico de forma direta e/ou indireta. As respostas que obtivemos dos jovens urbanos para a questão “Por que você acha que os jovens desistem da escola?”, nos dão algumas pistas sobre o envolvimento de alguns deles com drogas e narcotráfico. Quase metade dos respondentes da cidade apontou que as desistências são por desânimo e desmotivação para os estudos (44,7%). Em seguida, vem a questão da necessidade de trabalhar, com 16,6%, e depois, com 13,1%, vem a resposta “se envolvem com álcool e/ou drogas”.

Tendemos a crer que quando os jovens citadinos apontam o envolvimento com drogas como motivo de desistência escolar, o apontam não só pelas mazelas do uso dessas drogas, mas pelo fato de trabalharem com o narcotráfico ou pelo fato de terem suas vidas, de algum modo, atravessada pelos desdobramentos dessa atividade. Estas evidências foram identificadas principalmente nas questões abertas dos questionários, onde os jovens escreviam pareceres sem se identificar, o assunto das drogas e do tráfico foi recorrente várias vezes.

O trabalho, a ausência do trabalho ou a precarização extrema do trabalho atravessam a vida de parte relevante dos jovens desta pesquisa, sendo essa categoria indispensável para entendermos as perspectivas dos mesmos.


A escola e as perspectivas de futuro


De acordo com os questionários aplicados, o trabalho ou a necessidade de trabalhar é uma realidade para mais de 60% dos jovens urbanos e para mais de 80% dos jovens do campo. Podemos pensar que aqueles que não trabalham, mas que dizem precisar trabalhar, não o fazem por opção, pois decidem terminar os estudos primeiro ou, o que é mais provável, porque mesmo querendo não encontram emprego. Esta última alternativa é a mais provável, pois, como vimos, a condição econômica das famílias de onde vêm esses jovens não lhes deixa muitas alternativas. Sobre esse ponto Janata (2012, p. 110) expressa,


Empregar-se tardiamente, aliado à permanência nos estudos, não é um contexto colocado a grande parte dos jovens da classe trabalhadora. […] Como afirma Frigotto (2004), [os jovens] associam constantemente trabalho e estudo. Quando não o

fazem, não ocorre pelo fato de ser uma opção, e sim uma falta dela (JANATA, 2012, p. 110).


Podemos pensar ainda que, na impossibilidade de encontrar trabalho ou não se submetendo a qualquer tipo de trabalho, buscam na escola o meio de formação para um melhor desempenho profissional.

A relação dos jovens com a escola nos coloca uma série de reflexões a serem consideradas. Vamos tentar trabalhar algumas que julgamos as mais relevantes, a começar pela escolarização como formação para o trabalho.

Vimos até aqui que os jovens abordados nessa pesquisa têm sua condição social e suas expectativas enviesadas pelo trabalho – pela presença ou ausência dele – e a escola, naturalmente, não fica fora dessas expectativas. Dentre as utilidades da escola, os estudantes apontam a oportunidade de melhor inserção no trabalho, ou, ainda, a única chance de inserção no trabalho, já que sem escolarização, considerando os altos níveis de desemprego, não há oportunidades de trabalhar ou restam os subempregos e empregos informais.

Em um dos grupos focais, um estudante dizia que desejava fazer um supletivo para então trabalhar19. Mostrando, portanto, de forma bastante direta qual objetivo dava para os estudos. Outro estudante dizia que necessitava estudar “pelo menos até o segundo ano do ensino médio. […] Tipo, hoje [em dia], na COMCAP20 pede o segundo ano do ensino médio. É um dos serviços que ganham bem. Na COMCAP ganha mil e pouquinho [reais]”21. Evidenciando mais uma vez a relação que fazem entre educação e trabalho. Já a perspectiva de futuro está em pequenos sonhos, delineados “entre “plano b” e “saídas de emergência”” (Silva, 2015), como ser empregável, por exemplo.

No caso dos jovens campesinos, Janata constatou em sua pesquisa que dentre os 138 jovens que acabaram o Ensino Médio na escola do assentamento em Rio Bonito do Iguaçu – PR, permaneceram lá apenas 42, o que corresponde a 32%. Dentre os motivos, a autora destaca a busca de trabalho, uma vez que a produção no lote muitas vezes não é suficiente para a sobrevivência da família (JANATA, 2012, p. 115). A autora traz alguns depoimentos em sua pesquisa: “Saí


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19 Jovem 2 (Grupo Focal realizado em 04/11/2015).

20 A Companhia de Melhoramento da Capital (Comcap) é a empresa responsável pela coleta do lixo e pela limpeza de Florianópolis.

21 Jovem 1 (Grupo Focal realizado em 04/11/2015).

assim para... Como eu posso dizer? Ali não tinha muito serviço, tipo, no lote do pai o que eles fazem, trabalham, eles se viram sozinhos. Mas eu lá ia estar sobrando, não fazia muita coisa. Então achei que devia sair pra trabalhar.”

Relatos parecidos foram trazidos por jovens de Santa Catarina em roda de conversa durante um seminário de formação efetuado com jovens camponeses de diversas regiões do Estado. Esses jovens comentavam sobre a dificuldade em compartilhar o lote com os pais, dizendo não ter um espaço para sua produção autônoma, sendo assim, o que podiam fazer era ajudar os pais, às vezes podendo opinar, às vezes não, na produção, que em última instância era coordenada pelo patriarca.

Devem servir ainda de pista sobre as motivações de evasão rural dos recém-formados jovens do campo, os comentários de alguns professores e gestores das escolas envolvidas nesse trabalho, dizendo que era comum jovens se escolarizarem para então trabalhar fora do assentamento, em grandes empresas de alimentos como a Aurora e a Perdigão22.

No questionário, fizemos a pergunta: “Por que você vem à escola?”. O retorno com maior incidência, para a juventude de ambas as regiões, foi: “para adquirir conhecimento”, com 45,3% para os jovens da cidade e 55,3% para os campesinos. Em segundo lugar, veio a resposta: “porque desejo melhorar meu futuro e de minha família”, respectivamente com 25,6% e 28,3%.

Esta resposta, consideramos ter um sentido bastante pragmático e diretamente relacionado ao trabalho, ou seja, os jovens vão à escola para conseguir um bom emprego e melhorar o seu futuro e de sua família. Quanto à primeira resposta, aquela com maior incidência, é de significado ambíguo e demanda um pouco mais de atenção. O que querem dizer com “conhecimento”? Esta foi exatamente a pergunta que fizemos em um grupo focal. Os jovens colocaram o seguinte:


Jovem 1: o que tem utilidade.

Jovem 2: o que se pode levar para o futuro.

Jovem 3: penso que a escola tem que nos preparar para o mundo lá fora. Qualquer escola está preparando a gente para agir lá fora, sempre tem muita competição, tem amizade. Porque lá fora a gente vai ter que conversar, que se envolver com o trabalho de outras pessoas (Jovem 4: e pedir ajuda) é. Porque a final de


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22 Informações obtidas no diário de campo.

contas sem conhecimento a gente não chega em lugar nenhum. Jovem 2: tem que ter conhecimento para a vida toda, lá fora tudo exige conhecimento. Conhecimento é futuro.


O futuro com o qual estão lidando em suas falas, não é um futuro histórico, social, aberto a transformações radicais, mas um futuro pragmático, imediato, que diz respeito a sua sobrevivência no mercado de trabalho.

O que querem dizer com “conhecimento que tenha utilidade para o futuro” aparece mais nítido na continuação das falas. Sobre a importância do conhecimento contido no conteúdo das disciplinas um dos jovens comentou que depende “do que a pessoa quer na sua carreira […]”. Ou seja, há uma associação direta entre conhecimento e trabalho. O mesmo jovem, ao responder sobre as possibilidades de inserção no mercado de trabalho, disse que “depois dos estudos e de tudo que tens que aprender, tens que ir para o mercado de trabalho e aí tu vais aprender com os teus acertos e com os teus erros. […]”.

Em outra fala temos ainda:


Porque, tipo, o mercado de trabalho escolhe as pessoas que tiram as melhores notas, que tem os melhores currículos. Então a gente tem que se preparar para ter as melhores notas, os melhores currículos, para quando chegar lá na frente, a gente ter a oportunidade de trabalhar naquilo que a gente se formou. Não simplesmente pegar qualquer emprego.23


São relatos bastante esclarecedores quanto à ideia que têm de “conhecimento”. Algo diretamente relacionado às oportunidades de trabalho no mundo capitalista.

Na mesma direção dos dados da presente pesquisa, Guimarães, ao pesquisar escolas na periferia do Rio de Janeiro, sintetiza o caráter da escola como ponte para melhores oportunidades de emprego. Vejamos:


Pode-se perceber, ainda, entre os estudantes das escolas pesquisadas, a visão da escola como fonte de instrumentalização para inserção na vida social e cultural através da apropriação mínima dos códigos de acesso à cultura letrada ou, ainda, pela via dos certificados escolares como estratégia de fuga de precárias condições de vida diante da elevação da exigência de credenciais educacionais para inserção no mercado de trabalho […]


23 Jovem 4 (Grupo Focal realizado em 11/11/2015).

(GUIMARÃES, 1998, p. 216).


Esta autora ainda expõe que


A visão restritiva do papel que pode ser desempenhado pela escola como possibilidade de melhoria de suas condições de vida e de trabalho não se origina, assim, apenas das novas condições econômicas e de emprego a que estão submetidos os jovens das camadas sociais menos favorecidas economicamente. Está contida na própria construção que se fez dessa escola. (GUIMARÃES, 1998, p. 215).


É dizer que além das condições econômicas dos jovens, também influencia em sua visão sobre a escola aquilo que historicamente é colocado sobre ela e aquilo que recentemente também vem se propagandeando.

A escola moderna surge no contexto capitalista e com o objetivo de domesticar moralmente e tecnicamente as massas para o trabalho explorado e para a vida alienada24. Desde seu surgimento até os dias atuais a escola moderna passa por transformações, mas nunca em sua estrutura essencial, mantendo sempre seu objetivo de manutenção da estrutura socioeconômica capitalista.

Com a reestruturação do capital frente à crise econômica iniciada na década de 1970, à financeirização da economia, ao crescimento do Terceiro Setor25, à reprimarização da economia brasileira e à diminuição da industrialização, consequentemente aumentou o desemprego e impulsionou outro modelo educacional necessário ao desenvolvimento do capital, ou seja, o modelo pedagógico das competências. A reconfiguração do trabalho leva a reconfiguração no plano pedagógico. De acordo com a nova perspectiva educacional capitalista, não mais é importante o ensino centrado nos conhecimentos disciplinares, mas sim competências específicas voltadas para objetivos determinados do mercado de trabalho. A Pedagogia da Competência é


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24 Autores como Thompson (2002) e Enguita (1989) possuem trabalhos bastante especiais sobre o tema e os tomamos como referência.

25 Terceiro setor é formado por associações e entidades sem fins lucrativos, e é classificado como terceiro setor, em sociologia. O termo é de origem americana, Third Sector, muito utilizado nos

Estados Unidos, e o Brasil utiliza a mesma classificação. A sociedade civil é dividida em três setores, primeiro, segundo e terceiro. O primeiro setor é formado pelo Governo, o segundo setor é formado pelas empresas privadas, e o terceiro setor são as associações sem fins lucrativos. O terceiro setor tem se ampliado e se apropriado do fundo público de forma gerencial e privada através das parcerias entre público-privado, atuação de ONGs, OCIPs, OSs contribuindo para a precarização e terceirização dos serviços público (Montaño, 2002).

essencialmente pragmática: para qualquer aprendizagem que se pretenda é necessário já haver um fim. Autoras como Rummert, Algebaile e Ventura (2011) atentam para o fato de no Brasil esses esforços já serem correntes desde a década de 1990. São exemplos disso os constantes ataques à escola pública, na mira de todos os instrumentos que o capitalismo dispõe, desde o sucateamento e a precarização do ambiente escolar, de seus recursos e de seus funcionários, até o ataque ideológico, notadamente por parte dos aparatos midiáticos, e, ainda, por meio da imposição de diretrizes educacionais pautadas por organismos internacionais.

Vejamos as respostas dos jovens sobre o que pretendem após terminar o ensino básico e sobre quais são seus projetos profissionais. A começar pelos jovens do campo: 31,6% respondeu “fazer uma faculdade e trabalhar” e 22,4% respondeu “fazer um curso técnico profissionalizante e arrumar um emprego”. Ou seja, mais de 50% dos jovens do campo pretendem dar continuidade aos estudos relacionando-os ao trabalho.

A resposta sobre o que querem estudar está ainda um pouco imprecisa. Na questão que deveriam responder se possuem um projeto profissional, dos jovens campesinos, 36,8% responderam que não tinham nenhum projeto profissional naquele momento, outros 23% responderam “um projeto que me realize profissionalmente” e 17,8% responderam “qualquer um porque dependerá das oportunidades”. Se considerarmos esta última resposta e a primeira como uma só, teremos mais da metade dos jovens sem projeto profissional, e se arriscarmos interpretar “um projeto que me realize profissionalmente” como um não-projeto, teremos quase a totalidade nesta situação.

O caso dos jovens urbanos não muda muito: 35% pretendem fazer uma faculdade ao mesmo tempo em que trabalham, outros 15,3% pretendem estudar para o vestibular e/ou ENEM, e 12,8% pretendem fazer um curso técnico profissionalizante e arrumar um emprego. Vemos, então, mais da metade dos jovens com intenções de continuar os estudos, sendo que quase a metade pensa nos estudos vinculados ao trabalho.

Porém, novamente vemos um grande número de jovens sem projeto profissional. “Um projeto que me realize profissionalmente” foi a resposta mais procurada, com 35%; em seguida vem “fazer um concurso público”, com 19,1%;

outros 14,7% responderam não ter um projeto profissional no momento; e apenas 9,7% apontaram projetos específicos. Se novamente considerarmos as respostas “Um projeto que me realize profissionalmente” e “não tenho um projeto profissional no momento”, teremos praticamente 50% de jovens sem projeto profissional.

A fala de um jovem citadino entrevistado talvez esboce bastante do que seria um projeto que realize profissionalmente: “uma profissão que eu goste, que eu possa me realizar, que me dê dinheiro, mas não só isso, mas fazer o que eu gosto.”26 Mas o que gostam, poucos arriscam dizer. Via de regra, os projetos são imediatistas, o que se almeja é a melhor maneira de sobreviver.

Esta perspectiva nos parece muito adequada à nova ordem econômica de que falávamos, bem como suas correspondentes propostas para a educação, ou seja, uma educação de caráter comportamental, flexível, assistencialista, segregada, meritocrática, moldada de acordo com as necessidades atuais do sistema, a saber: pluriatividade; rebaixamento salarial; retirada de direitos; destruição de forças produtivas; migrações forçadas; terceirização e precarização da força de trabalho, através da ampliação das expropriações e exploração dos trabalhadores. Nesse sentido, é coerente que os jovens queiram dar continuidade aos estudos, buscando melhor inserção no mundo do trabalho, mas que ao mesmo tempo não saibam o que necessitam para melhor se prepararem. O próprio sistema não lhes exige esta certeza, o bom mesmo é que estejam em constante “formação”, adquirindo competências para “o que der e vier”.

No entanto, apesar do forte vínculo que esses jovens fazem entre educação para o mercado de trabalho como perspectiva de futuro, vemos, ao mesmo tempo, algumas pistas de negação do sistema escolar vigente.


Indicativos de negação do formato escolar tradicional


Começamos encontrando um dos indicativos de negação do formato escolar tradicional quando os jovens dessa pesquisa demonstraram reprovar a estrutura física da escola e, além disso, demonstraram estar conscientes do papel do Estado nesta negligência. Um indicativo disso está nas respostas à pergunta


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26 Jovem 5 (Grupo focal realizado em 30/11/2015).

“O que mudariam na escola?”, os jovens de ambas as localidades geográficas majoritariamente responderam a “estrutura física (salas de aula, laboratórios, quadras, biblioteca)”, com 34,4% para os citadinos e 38,8% para os campesinos. E se trouxermos os dados da questão sobre o que os jovens pensam serem os principais problemas da escola, teremos com maior incidência a resposta que aponta para “a falta de investimento do governo”, com 27% de peso sobre as respostas do campo e 20,9% sobre as da cidade. É importante ressaltar, para esta última questão, que, quando os jovens indicam a falta de investimento do governo como problema, podem estar indicando mais do que problemas da estrutura física da escola. Por exemplo, nas questões abertas dos questionários, um dos jovens campesinos expressou estar ciente das dificuldades da profissão de professor, dizendo que “pelo trabalho que fazem, os professores deveriam receber um salário melhor”.

A desaprovação dos jovens quanto à estrutura física da escola pode indicar apenas que querem melhores condições estruturais no sentido de preparo para a inserção no mercado, mas os dados que seguem nos apontam para além disso. A reprovação dos jovens diante da estrutura escolar não se dá apenas em relação ao seu aspecto físico, mas também com relação à forma como socialmente e ideologicamente está estruturada a escola.

A começar pelos jovens da cidade, ainda sobre a pergunta “O que mudariam na escola?”, a segunda resposta com maior incidência (15,6%) foi “direção”. O que ficou claro nos grupos focais é que essa rejeição significa uma resistência à estrutura hierárquica, autoritária e unilateral, como geralmente são conduzidas as escolas. Essa interpretação se fortalece quando observamos a mesma questão respondida pelos jovens do campo.

Neste caso, “a direção” aparece como a opção menos procurada, com 0,7%. E se checarmos outra questão, sobre o aspecto mais positivo da escola, em primeiro lugar, com 19,1%, os jovens campesinos responderam “direção”. Ou seja, o ponto de vista dos jovens do campo em relação à direção é contrário ao dos jovens urbanos. Mas por que pensamos ser este um fator de reafirmação do descontentamento dos jovens urbanos pela estrutura autoritária e hierárquica?

Temos, para as escolas do MST, um contexto peculiar, onde a cogestão é possível e frequentemente as lutas e greves por melhorias nas escolas e por

melhorias de condições de trabalho para os professores, em muitos casos, acontecem de forma conjunta entre gestão, professores e estudantes. Janata afirma que no ambiente de luta pela terra por parte dos trabalhadores do MST, “a escola passa a configurar-se num importante espaço formativo. Essa tem sido uma característica que vem acompanhando a trajetória da educação e da escola no MST […]” (JANATA, 2012, p. 135). Normalmente, a construção da escola no assentamento é garantida por meio de lutas acirradas, no caso específico das duas escolas de assentamento que analisamos aqui, além de os diretores serem (na época em que realizamos a pesquisa) militantes do Movimento, houve tentativas de implementar outras formas de organização escolar que não a tradicional27. Parte dos jovens pesquisados vivenciam na prática formas de ensino e organização escolar que prezam pela formação integral do estudante, bem como uma tentativa de organização escolar mais horizontal, coletiva, visando a participação conjunta entre gestão, professores e estudantes28. Nesse sentido, a aprovação dos jovens do campo quanto as gestões de suas escolas evidenciam um apreço por formas diferenciadas de organização escolar, confirmando os motivos pelos quais os jovens urbanos não gostam da direção de suas escolas29.

Seguindo com a análise dos dados, vemos ainda outros indicativos quanto à desaprovação dos jovens diante do formato escolar. Percebemos uma resistência desses jovens em aceitar a forma como os professores ensinam. E aqui vemos convergir novamente os pareceres dos jovens de ambos os espaços geográficos. Começando pelos jovens da cidade, na pergunta do questionário sobre o que dificulta seus estudos dentro da escola, colocaram: “a forma como os professores ensinam”, totalizando 18,1% das respostas; “dificuldade de aprendizagem (concentração, memorização, entendimento)”, com 17,5%; “o ambiente escolar (barulho, indisciplina, brigas)”, com 15,9%; “não tenho dificuldades”, com 15,9%; “estrutura, os materiais e recursos da escola”, com

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27 Uma das escolas estava realizando estudos e reformulação curricular fundamentado na pedagogia social de Pistrak (2003), que organiza o currículo a partir de complexo de estudos, escolhidos a partir da análise da realidade, além de ter como elemento fundamental a auto- organização dos estudantes e a autogestão.

28 Informações obtidas no diário de campo.

29 Não queremos dizer com isso que as escolas do MST sejam radicalmente diferentes de outras escolas. Vimos até aqui que os jovens do campo e da cidade apontaram mais convergências que

divergências quanto sua relação com a escola. Além disso, as escolas do Movimento, por fazerem parte do sistema público de ensino e se situarem em uma sociedade capitalista, inevitavelmente carregam consigo as contradições dessa condição, mesmo experimentando novas situações pedagógicas.

10,3%.

Para os jovens campesinos, temos um contexto semelhante. Em ordem de maior incidência ficou: “não tenho dificuldades”, com 23%; em seguida, “a forma como os professores ensinam”, com 20,4%; depois vem “o ambiente escolar (barulho, indisciplina, brigas)”, com 15,8%; a relação com os colegas da turma, 14,5%; “dificuldade de aprendizagem (concentração, memorização, entendimento)”, com 11,8%; “estrutura, os materiais e recursos da escola”, 7,9%.

Nos grupos focais, vimos que os métodos de ensino dos professores parecem incomodar muitos dos estudantes. Eles se queixaram da maneira tradicional de tratar os conteúdos e até mesmo do autoritarismo. Um dos jovens do campo, na opção “outros” da questão sobre os motivos pelos quais os jovens desistem da escola respondeu o seguinte: “Ao tirar notas baixas os jovens têm vontade de parar”. Podemos pensar que nessa rejeição ao método avaliativo tradicional está contida uma rejeição ao formato tradicional de ensinar.

Temos ainda como exemplo algumas falas obtidas nos grupos focais. Quando perguntamos “o que é uma educação de qualidade”, os estudantes se opuseram aos métodos de ensino dos professores:


Jovem 6: […] Não adianta o professor vir e ficar falando: os portugueses vieram aqui e descobriram o Brasil. Na Física Delta = q.f.i, entendeu?

Jovem 5: Fazer a gente interagir, na atualidade tem muita gente que não está nem aí para o que está aprendendo, na minha sala muitas vezes eu não gosto do assunto porque a forma como o professor tenta ensinar aquilo é de uma maneira que eu não entendo e nem pedindo ajuda eu consigo entender e que eu vá conseguir levar para o futuro.

Jovem 8: A gente tem aqueles professores que passam a aula inteira passando o conteúdo e aí se passa a aula inteira e você não entendeu nada do que ele falou […]

Jovem 9: As vezes é muito monótono. Autoritários.

Jovem 3: No primeiro ano nós tivemos um projeto que eles tentavam fazer umas aulas diferenciadas, mas depois voltou tudo como sempre foi.30


Ainda na questão sobre as dificuldades dentro do ambiente escolar, é curioso que 15,9% e 23% dos jovens, cidade e campo respectivamente, tenham apontado não ter dificuldades com os estudos, enquanto temos visto até aqui

todas as dificuldades colocadas pela sua situação econômica, ambiente de violência, etc. Podemos pensar talvez que não reconheçam suas dificuldades, ou que estejam conformados com sua situação. Talvez não reconheçam a escola dentro de sua formalidade, talvez seus objetivos para com a escola sejam outros, e nisso se sentem contemplados, sem nenhuma dificuldade.

Um jovem campesino respondeu na opção “outros” da questão que lhe perguntava “por que estudava naquela escola”, que o fazia para “fugir do serviço”. Outro jovem, agora de uma escola urbana, ao falar no grupo focal sobre o que achava a respeito do que era ser um bom aluno, mostrou-se bastante seguro sobre a forma que encontrou de vivenciar o formato escolar.


Entrevistador: O que é ser um bom aluno? Jovem 2: Tirar nota boa.

Entrevistador: E para tirar nota boa tu fazes o quê? […]

Jovem 2: Colo.31


Vemos então muitos jovens, tanto do campo quanto da cidade, apontarem que a escolarização institucional não faz sentido para eles. Vimos aparecer em suas respostas a falta de interesse dos estudantes pela escola, a indisciplina, o barulho e as brigas no ambiente escolar. Já vimos também nas questões anteriores que os jovens apontam como principal motivo de desistência da escola o “desânimo e a desmotivação para os estudos”, com 44,7% e 40,1%, cidade e campo.

Os jovens demonstraram que percebem os estudos como forma de inserção no mundo do trabalho capitalista, e, por outro lado dão pistas claras de que a escolarização tal como prevista institucionalmente não tem significado para eles. Aqui é importante considerar duas situações possíveis: uma delas seria interpretar que os jovens rejeitam a organização escolar tradicional, mas em favor de uma ideia liberal mais atualizada, como a das competências, tal como pareciam defender alguns jovens, segundo os relatos que trouxemos anteriormente. Outra situação seria de fato uma descrença nas promessas de ascensão social do sistema capitalista vigente.

Guimarães diz o seguinte sobre a relação dos jovens com as escolas que

pesquisou em sua tese:


[Os estudantes] estabelecem com a escola uma relação ambígua. A escolaridade não representa, para esses jovens, uma possibilidade real de mudança em suas vidas, de modo a projetar no futuro uma utilidade ampla e um sentido para os estudos. Mesmo os que afirmam desejar uma profissão futura que, teoricamente, pressuponha um nível mais alto de escolaridade, como engenharia, advocacia, fisioterapia, não relacionam os estudos com a profissão almejada e afirmam não estudar. (GUIMARÃES, 1998, p. 215).


Podemos pensar então que se por vezes os jovens associam-se ao discurso ideológico da adaptação necessária à reestruturação do sistema capitalista, aderindo às prerrogativas da pedagogia das competências, vemos ao mesmo tempo esses jovens darem sinais de que percebem os limites das instituições escolares como instrumento de sucesso profissional.

Guimarães nos leva ainda a outra questão:


A imagem de escola construída pelos estudantes é o espelho do que ela de fato proporciona a esses seguimentos da população. Não é estranho, então, que a vejam como lugar de encontro social, de encontrar colegas, de fazer bagunça, de zoar, […] de evitar a família ou evitar ficar em casa lavando um tanque de roupa. A estratégia pela qual se concebe a escola parece operar através de um mecanismo de inversão, onde os elementos valorizados se caracterizam por aquilo que ela não se propõe como tarefa ou por atividades que, por princípio, ela excluí. (GUIMARÃES, 1998, p. 217).


A escola está afastada da realidade dos jovens e estes, por sua vez, negam o modelo escolar convencional. Mas não simplesmente a rechaçam, a ressignificam também, fazendo dela uma extensão de sua realidade, e/ou, mesmo, conseguem dela aquilo que não possuem no seu dia a dia, como espaços de lazer, esporte e sociabilidade.

Veremos, em seguida, alguns elementos que apontam para a reapropriação da escola por parte dos jovens. Dados que, ao mesmo tempo em que indicam as carências desses jovens no que diz respeito a uma vida plena de humanidade, colocam também a necessidade e o esforço desses jovens por buscar recursos formativos para além daqueles que o Estado capitalista lhes oferece.


Uma possibilidade de reapropriação da escola


Diante dos dados dessa pesquisa, nos chamou a atenção a reduzida fração de tempo que os jovens compartilham entre si e seu empenho na busca por esses momentos.

Ao perguntar a respeito do que os jovens mais faziam quando não estavam na escola, mais da metade dos jovens campesinos responderam que ajudam em casa (52,6%), e outros 15,1% responderam que trabalham. Considerando as duas opções como trabalho, teremos um total de 67,7% de jovens campesinos que passam o tempo ‘fora da escola’ trabalhando. Apenas 3,3% disseram passar o tempo com os amigos.

Quanto aos jovens urbanos, a maioria revela empenhar seu tempo não escolar navegando na Internet (24,7%); em seguida, vêm empatadas as respostas de que ajudam em casa e trabalham (cada uma com 10,6%), competindo com “passo o tempo com meus amigos” (10,3%). Juntando “trabalho” com “ajudo em casa”, teremos 21,2% dos jovens que passam seu tempo ‘fora da escola’ trabalhando. Aparentemente, temos aqui um contraste entre jovens do campo e da cidade, onde a maioria dos campesinos afirmam passar o tempo trabalhando, já os citadinos supostamente despendem mais tempo na internet do que trabalhando.

Temos visto que a internet é utilizada entre os jovens principalmente para “socializar” com outras pessoas e para o “lazer”. É raro os jovens a utilizarem para fazer pesquisas, ler notícias, etc. Os jovens normalmente estão conectados a redes sociais como o Facebook, WhatsApp, Twitter, Instagram, Tinder, etc. Além disso, a Internet é utilizada também para entretenimento, é onde os jovens buscam vídeos, filmes, videoclipes e jogos. Os motivos pelos quais os jovens buscam os meios eletrônicos para sociabilizar e se entreter têm sido uma questão amplamente discutida, na qual não nos aprofundaremos. No entanto, temos alguns indicativos para o caso de nossos jovens.

Esta competição que aparece para os jovens urbanos entre tempo empenhado para navegar na Internet e tempo empenhado no trabalho pode ser ilusória. Embora apenas 10,6% tenham apontado o trabalho como atividade que

mais se empenham fora da escola, ao lado de 24,7% que apontam para a Internet nesta mesma pergunta, vimos no começo deste artigo que para os jovens urbanos, ao responderem a pergunta sobre qual era sua situação de estudante, cerca de 30% apontaram trabalhar e estudar ao mesmo tempo. Ou seja, sabemos que são mais de 10,6% os que gastam seu tempo fora da escola trabalhando. Nossa hipótese para este impasse é que diante do fato de que a Internet vem sendo nestes últimos anos facilmente acessada por eletrônicos móveis como o celular – alguns dados apontam para a existência de mais celulares do que pessoas no Brasil – os jovens, por sua vez, frente a exaustivas horas de trabalho e frente a necessidade de se relacionar com seus coetâneos e de ter acesso à cultura (indústria cultural), acabam encontrando na Internet uma saída. Por meio de seus celulares, os jovens se entretêm e “socializam” enquanto estão no ônibus, durante o trajeto de ida e vinda para o trabalho; enquanto estão no intervalo do almoço; ou mesmo durante o próprio período de trabalho ou de aula. Ou seja, os jovens trabalham e estudam ao mesmo tempo em que “sociabilizam”.

Além disso, ainda que os jovens tenham algum tempo para se encontrar pessoalmente com os amigos com a finalidade de socializar e se entreter – por exemplo, os jovens desempregados, considerando que não estejam buscando ganhar a vida em atividades informais –, como e onde o fariam? O acesso à cidade é limitado, o transporte coletivo não é de fácil acesso, são poucas linhas nos finais de semana, sobretudo nos bairros periféricos, e, sendo poucas linhas, os ônibus contornam dezenas de ruas, para dar conta de inúmeros bairros antes de chegar ao seu destino final. Tudo isso por um preço nada acessível, sobretudo para famílias cuja renda mal alcança quatro salários mínimos.

Supondo ainda que o transporte fosse acessível a todos – uma hipótese longe de ser verdade – que espaços os jovens teriam para se encontrar? Os teatros, cinemas, casas de música, estádios de futebol são caros, poucos e de difícil acesso. Os eventos culturais públicos são extremamente raros, as praças, quadras de futebol, basquete e vôlei (para não falar das outras modalidades de esporte) são poucas, precarizadas e sem manutenção. A cidade segue a lógica individualista, segregadora, desumana e alienadora do capital. Para os jovens campesinos esta situação se agrava, uma vez que o transporte coletivo é inexistente e os espaços de lazer são ainda mais escassos.

Diante dessa situação, os jovens têm seus espaços de sociabilidade limitados ao círculo familiar, à Internet (no caso dos jovens urbanos) e à escola. Seus meios de entretenimento são a televisão, também a Internet e de certa forma a escola. Diante disto, não surpreende que quando questionados sobre onde e com quem se sentem mais felizes, a maioria dos jovens, do campo e da cidade, responderam “em casa” (45,4% e 41,6%, respectivamente) e “com a família” (55,3% e 36,3%).

E para outra pergunta do questionário, sobre se os jovens participavam de algum grupo como grupo de jovens, igreja, partidos políticos, ONGs, movimentos sociais, movimentos culturais, associação de futebol, etc., a grande maioria respondeu não participar de nenhum grupo: 74,2% dos jovens urbanos e 50% dos jovens campesinos. E a segunda resposta com maior incidência foi “igreja” e “grupo de jovens”, sendo que muitas vezes os grupos de jovens são vinculados à igreja. Dos citadinos, 10,3% dos jovens responderam participar da igreja e 6,3% dos grupos de jovens, totalizando 16,6%. No caso dos campesinos, 18,4% dos jovens participam da igreja e 9,2% do grupo de jovens, totalizando 27,6%. Para os campesinos ainda temos 5,9% que dizem participar de movimento cultural e 3,9% que dizem participar de movimento social, totalizando 9,8%.

Por outro lado, vemos, ainda nas duas questões sobre onde e com quem se sentem mais felizes, os jovens valorizarem a escola e os amigos. No caso dos jovens citadinos, para além daqueles que responderam se sentirem melhor e mais felizes “em casa” (41,6%), houve também (em ordem de maior incidência) a resposta “nas festas e baladas”, com 11,6%, e “na escola”, com 9,7%. Estes dois últimos podemos considerar como espaços de socialização entre coetâneos, tendo então uma porcentagem de 21,3% daqueles que se sentem melhor e mais felizes em espaços onde podem encontrar pessoas de sua faixa etária, contra 41,8% daqueles que responderam estar melhor em casa. Considerando ainda que ‘estar em casa’ pode significar ‘estar na Internet com os amigos coetâneos’.

Para os campesinos, temos um arranjo parecido de 45,4% que responderam “em casa”, 21,1% que responderam “na escola” e 11,2% que apontaram “nas festas e baladas”. Estas duas últimas somando um total de 32,3%.

Sobre com quem se sentem mais felizes, para os jovens citadinos, as

respostas mais comuns, depois de família, foram “com meus amigos” (15,6%) e “com o(a) namorado(a)” (14,7%). Se pensarmos ambos os casos como convivência entre pessoas da mesma idade, teremos um total de 30,3% de jovens que se sentem felizes entre seus coetâneos, competindo em porcentagem com aqueles que dizem se sentir felizes com a família (36,3%). Dos jovens do campo, 13,2% disseram sentir-se melhor e mais feliz com os amigos e 3,9% responderam “com o(a) namorado(a)”. Somando uma porcentagem bastante baixa, de 17,1%, perto daqueles que responderam “com a família”, 55,3%. Consideremos, no entanto, a maior dificuldade com que os jovens do campo têm acesso à Internet e ainda a distância geográfica entre as casas e espaços de encontro.

Podemos pensar que são poucos os jovens que se atraem pelo seu grupo etário, ou, por outro lado, podemos pensar que apesar dos impedimentos para estarem juntos, os jovens mesmo assim se atraem por sua geração. Temos reafirmada, dessa forma, a colocação de Foracchi (1972) sobre a busca dos jovens por seus grupos etários à medida em que as instituições lhes negam ser jovens. A escola acaba sendo o espaço onde isto mais acontece, já que lá passam grande parte de seu tempo por longos anos. Vimos anteriormente que a escola, para inúmeros jovens, não lhes parece atrair pelo formato institucional, nem pelo seu conteúdo. Muitos estudantes reclamaram da forma como se ensina na escola, da sua estrutura física e organizativa e dos conteúdos que se mostram distantes da realidade. Mas agora a escola aparece dentre os lugares que os jovens se sentem melhor e mais felizes. Que parte das escolas lhes atrai?

Se voltarmos à questão sobre qual o aspecto mais positivo da escola, teremos 17,8% dos jovens urbanos apontando para os “estudantes”, com incidência menor apenas que aqueles que apontaram para os “professores” (24,7%). No caso dos jovens campesinos, temos 11,8% das respostas apontado para os “estudantes” como aspecto mais positivo na escola, atrás de “direção” (19,1%), “estrutura física” (16,4%) e “professores” (15,1%). Mas no caso das escolas do campo vimos os motivos pelos quais esses pontos aparecem em destaque: a escola como um todo lhes dá maiores possibilidades de sociabilidade se comparada às escolas urbanas. É importante ainda considerar a existência da rádio comunitária e da sala de computação (também conquistada pelo Movimento) que fica ao lado de uma das escolas, mantendo trabalhos

conjuntos32.

Vale refletir também sobre o que pensam os jovens quando apontam os professores ou a estrutura escolar como aspectos positivos. A ideia que fazem da estrutura física da escola, bem como daqueles que a compõem, fica mais clara com as falas de um grupo focal feito em uma das escolas urbanas. Perguntamos o que fariam se tivessem que defender a escola e um deles respondeu: “proteger a escola, eu protegeria. Mais as pessoas que estão dentro dela do que o edifício”. O “edifício” arriscamos considerar como a instituição escolar representada em seu aparato físico e organizativo. Sendo assim, os jovens demostram apreciar mais as relações sociais que podem desempenhar dentro da escola do que a que ela formalmente se propõe.

Este apreço para as relações sociais oportunizadas pela escola aparece também quando outro jovem, ao responder esta mesma pergunta, diz: “defenderia os colegas que fiz aqui e os professores que posso chamar de amigo, não a escola em si33. Além de afirmar novamente o desprezo pela instituição escolar e enaltecer a relação com os colegas, aparece também a valorização do professor como amigo, não sendo mencionados os seus métodos educativos, nem sua autoridade.

Na opção “outros” da questão que perguntava sobre o aspecto mais positivo da escola, aparecem mais alguns exemplos do que estes jovens buscam no ambiente escolar. Além do esporte, que aparece repetidas vezes, estão como aspectos positivos também a paquera, a diversidade de pessoas, o grêmio estudantil, a aula de música e a rádio da escola. Ou seja, todos aspectos culturais e de sociabilidade.

Janata, em sua tese, traz a fala de uma estudante do Colégio Iraci que coloca a importância destes aspectos para a sua formação:


O coral contribuiu bastante. Eu era um pouco tímida, aí desinibiu um pouco, questiona mais, vai procurar saber melhor. […] Era um momento de diversão, era muito bom. A gente cantava, se divertia, ria, fazia teatro, saía cantar em outros lugares. […] E as amizades. Amigos, assim, era bem importante e mexia com uma coisa de sentimento. A professora era bem querida e tem coisas que levo até hoje. As viagens, que a gente saia, se divertia


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32 Informações registradas no diário de campo.

33 Jovem 6 (Grupo focal realizado em 30/11/2015).

bastante. Eu nunca fui de sair muito, na comunidade não tinha muito lazer. Então, quando ia na escola é que achava isso. Lá na escola tinha o coral, tinha o teatro, tinha a música, tinha a banda. Então era um monte de coisa que a escola proporcionava, pela escolha. Nós escolhemos o coral porque me indicava. Eu depois ajudei a coordenar o coral por um período. […]. (JANATA, 2012, p. 176, depoimento).


A valorização que os jovens dão para estes elementos nos aponta à carência em seu cotidiano de momentos de amizade, diversão, cultura do corpo. A escola passa a ser um dos poucos lugares onde ainda podem contar com isso, mesmo com todos os seus limites quanto à abertura para essas demandas.


Considerações finais


Campo e cidade fazem parte de um mesmo contexto capitalista de exploração e precarização da vida dos trabalhadores, sendo assim, a juventude trabalhadora urbana e campesina se encontra em situações e questionamentos muito parecidos. A escola, tanto do campo quanto da cidade, uma vez que submetida às diretrizes e legislações nacionais que, por sua vez estão influenciadas pelas políticas liberais internacionais para a educação, carregam em si as demandas do capital. Uma parte relevante dos jovens do campo e da cidade agarram as oportunidades de educação existente para sobreviver às condições impostas pelo sistema capitalista, busca na educação a promessa de melhor se situar no mundo do trabalho. Mas ao mesmo tempo, a juventude de ambos os espaços geográficos dá sinais de que percebem as limitações do capital.

É bastante significativa a relação dos jovens com as mais diferentes formas de trabalho, seja ajuda doméstica, trabalho formal, informal, estágio. Esse elemento ocupa um tempo e espaço elevado na vida dos jovens, que cientes da situação de desemprego aderem ao discurso liberal de qualificação profissional, inovação, empreendedorismo, construindo o “pequeno sonho” da empregabilidade.

Os dados da pesquisa demonstraram que os jovens buscam na escola objetivos diversos e controversos, como a certificação para o mundo do trabalho, o conhecimento de forma pragmática, os espaços de socialização proporcionados pelo jogo, o esporte, a música, a arte, o teatro, a interação coetânea, a amizade.

Buscam espaços que possam exercer sua humanidade para além das balizas de um sistema que demonstra, por meio da ineficácia de suas instituições, estar falido. Os jovens buscam seu grupo geracional para compartilhar suas ideias, suas aflições, suas alegrias, suas utopias e neste sentido a escola, ao mesmo tempo em que sofre uma rejeição de sua forma institucional, é valorizada por ser hoje o locus que proporciona o encontro com jovens e adultos para além do convívio familiar.

Diante do exposto neste artigo é mister repensar a escola em sua totalidade, sua organização institucional e pedagógica, a fim de viabilizar uma educação voltada para o futuro, ou seja, para o pensamento crítico e criativo em relação a realidade social e capaz de auxiliar/apoiar a auto-organização de jovens frente às transformações sociais necessárias para a sobrevivência do planeta. Temos indicativos de experiências pedagógicas nessa perspectiva nas próprias escolas pesquisadas, pois as escolas de assentamento de reforma agrária, com auxílio do MST, têm desenvolvido com êxito uma organização pautada na cogestão, participação, descentralização, ressignificação curricular frente aos desafios da realidade, buscando tempos e espaços pedagógicos que contemplem as diversas dimensões humanas, ou seja, uma formação omnilateral que de acordo com os dados de nossa pesquisa, a partir das respostas dos jovens, podem resultar numa escola que contemple suas expectativas frente à relação trabalho e educação.


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Recebido em: 14 de março de 2018. Aprovado em: 10 de maio de 2018. Publicado em: 21 de novembro de 2018.