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V.18, nº 35 - 2020 (jan-abr) ISSN: 1808-799 X


DOI: https://doi.org/10.22409/tn.v18i35.40510


ENCARCERAMENTO DAS MULHERES: TRABALHO, VIOLÊNCIA E ABANDONO1


Yara Elizabeth Alves2 Fernando Selmar Rocha Fidalgo3


Resumo4


Este artigo é resultante de pesquisa e objetiva discutir um dos seus eixos temáticos: o encarceramento das mulheres, tanto pela relação capital-trabalho quanto propriamente nas unidades prisionais. A pesquisa foi realizada a partir de análise documental, observação e entrevistas semiestruturadas com 14 mulheres que cumpriam pena em unidades localizadas na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Demonstra-se a coexistência das relações sociais de exploração econômica e de opressão sexual e evidencia-se que o modo de produção capitalista e o patriarcado combinam entre si e se reforçam mutuamente.

Palavra-chave: Capital-trabalho; Sistema prisional; Mulheres privadas de liberdade.


ENCARCELAMIENTO DE LAS MUJERES: TRABAJO, VIOLENCIA Y ABANDONO


Resumen


Este artículo es el resultado de una investigación y tiene como objetivo discutir uno de sus ejes temáticos: el encarcelamiento de mujeres, tanto en la relación capital-trabajo como en las cárceles. La investigación se llevó a cabo en base a un análisis documental, observación y entrevistas semiestructuradas con 14 mujeres que cumplieron su función en unidades ubicadas en la Región Metropolitana de Belo Horizonte. Demuestra la coexistencia de relaciones sociales de explotación económica y opresión sexual, y es evidente que el modo de producción capitalista y el patriarcado se refuerzan y refuerzan mutuamente.

Palabra chave: Capital-trabajo; Sistema prisional; Mujeres privadas de libertad.


IMPRISONMENT OF WOMEN: WORK, VIOLENCE AND ABANDONMENT


Abstract


This article is the result of research and aims to discuss one of its thematic axes: the imprisonment of women, both in the capital-labor relationship and in prison prisons. The research was carried out based on documentary analysis, observation and semi-structured interviews with 14 women who served their time in units located in the Metropolitan Region of Belo Horizonte. It demonstrates the coexistence of social relations of economic exploitation and sexual oppression, and it is evident that the capitalist mode of production and patriarchy are mutually reinforcing and mutually reinforcing.

Keywords: Capital-labor; Prison system; Women deprived of freedo


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1 Artigo recebido em 09/06/2019. Primeira avaliação em 29/08/2019. Segunda avaliação em 31/08/2019. Aprovado em 08/11/2019. Publicado em 23/01/2020.

2 Mestra e Pedagoga pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (FaE/UFMG). Doutoranda no Programa de Pós-graduação: Inclusão e Conhecimento Social (FaE/UFMG). Pesquisadora do Observatório Nacional do Sistema Prisional (ONASP). E-mail: yaraealves@gmail.com; https://orcid.org/0000-0003-4304-0275

3 Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professor Titular da FaE/UFMG. E-mail: fernandos@fae.ufmg.br; https://orcid.org/0000-0001-9412-612X

4 Uma versão anterior do artigo foi apresentada na 38ª Reunião Nacional da Anped (2017), com o título “Trabalho e educação nas prisões: a efetividade das práticas formativas para as mulheres privadas de liberdade”. No entanto, seu conteúdo foi substancialmente modificado.



310

Introdução


De acordo com dados do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (Infopen), em junho de 2016 a população prisional brasileira era de 726.712 pessoas, a terceira maior do mundo em números absolutos. A taxa de aprisionamento no Brasil era de 352,6 por 100 mil habitantes, sendo que a taxa média mundial era de 144 por 100 mil, segundo o Centro Internacional de Estudos Prisionais (ICPS, na sigla em inglês).

O número de pessoas em privação de liberdade no país cresceu 707% em relação ao total registrado no início da década de 90 (BRASIL, 2017a). Quanto à natureza da prisão, 40% eram provisórias, ou seja, mais de 290 mil pessoas estavam presas sem terem sido julgadas e sentenciadas, apesar das evidências de que grande parte delas poderia responder ao processo em liberdade (BRASIL, 2017a).

Os dados revelam o fenômeno de encarceramento em massa que, por sua vez, está relacionado de forma intrínseca à ineficácia do sistema prisional brasileiro. As violações dos direitos humanos, reiteradamente denunciadas por organizações nacionais e internacionais; os atos de violência intra e extramuros, repercutidos na mídia e a pouca capacidade de promover processos socializadores; são, dentre outras, expressões dessa ineficácia.

Em junho de 2016 havia no país 42.355 mulheres em situação de prisão, quantitativo que aumentou 656% desde o ano 2000, quando pouco menos de seis mil mulheres cumpriam pena no sistema prisional. No mesmo período, o número de homens presos cresceu 293%, indo de 169 mil em 2000 para 665 mil em 2016.

É possível observar que o crescimento da população carcerária total é expressivo e se contrapõe às tendências dos países que, historicamente adotaram políticas de hiperencarceramento, mas que nos últimos anos têm diminuído esse ritmo. No entanto, ao verificar o aumento do número de mulheres em privação de liberdade o movimento é ainda mais contundente. A expansão da população prisional feminina no Brasil não encontra parâmetro de comparabilidade entre o grupo de países que mais encarceram no mundo. Em 16 anos a taxa de aprisionamento do país passou de 6,5 presas por 100 mil mulheres em 2000, para 40,6 por 100 mil em 2016 (BRASIL, 2017b).

O cenário aponta a questão carcerária como uma das mais complexas da realidade social do país, sobretudo quando se trata do encarceramento das mulheres. Elas apresentam demandas específicas ao sistema prisional, contexto no qual comumente suas necessidades são desprezadas, uma vez que a ótica dos homens é tomada como regra. O que não raro é agravado por um histórico de violência física, sexual, psicológica e moral, pela suspensão temporária ou até mesmo definitiva do direito à maternidade, dependência química, entre outros.

Discutir a temática exige considerar as particularidades das relações sociais e dos vínculos estabelecidos por elas, bem como das formas de envolvimento com o crime. Com o intuito de conhecer e dialogar com as demais produções acadêmicas que tratam da temática, realizou-se um levantamento no Banco de Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior (CAPES) e na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (BDTD-IBICT). A partir dos descritores: “sistema prisional”, “mulheres privadas de liberdade”, “trabalho e educação em prisões”, foram identificadas 121 pesquisas, da área de educação, concluídas entre 1995 e 2017.

Após a leitura dos títulos, palavras-chave e resumos dessas produções, verificou-se que 16 deles discutiam questões referentes às mulheres privadas de liberdade: Noguez (2006), Braunstein (2007), Gomes (2008), Oliveira (2010), Coelho

(2010), Tavares (2011), Pereira (2013), Almeida (2013), Santos (2014), Gomes

(2015), Calicchio (2015), Miranda (2016), Silva (2016), Roza Pinel (2017), Santos (2017), Silveira (2017). Essas pesquisas abordam, entre outros, o significado da educação para as custodiadas; o currículo de escolas em unidades femininas; o cotidiano das turmas entre a cela e a sala de aula; a formação profissional das apenadas e os processos de socialização pós-cárcere.

Embora tais trabalhos, ao tratarem dos temas mencionados, discorram sobre as questões apresentadas neste artigo, eles não as toma como centrais. Assim, o presente texto contribui para a discussão, justamente ao se concentrar no imbricamento das relações que resultam no encarceramento das mulheres, pela contradição capital-trabalho e pela prisão-pena.

Esclarece-se que, o cárcere associado ao cumprimento de uma pena privativa de liberdade, foi criado em meados do século XVIII e princípio do XIX, com o advento do modo de produção capitalista. Antes desse período a prisão tinha natureza cautelar

e servia aos objetivos de contenção e guarda dos réus, para preservá-los fisicamente até o momento do julgamento ou da execução.

Apesar do circunscrito alcance quantitativo e territorial, as bridewells, rasp-huis e workhouses (casas de trabalho forçado) ofereceram métodos de organização à prisão moderna. A prática de aprisionamento nas casas tinha respaldo na necessidade de controle da população pobre e expropriada dos seus meios de produção e, posteriormente, de disciplinamento dessa força de trabalho à manufatura.

As instituições, portanto, se constituíram como instrumentos repressivos dos ex-trabalhadores agrícolas e desenraizados que, devido à crise irreversível do feudalismo, partem para a cidade e não são absorvidos pela nascente manufatura com a mesma velocidade com que deixam os campos (MARX, 1996, p. 356). Os que não conseguiam emprego sobreviviam de furtos, roubos e da mendicância, tornaram- se então uma “praga” para os proprietários, que buscariam formas de combatê-los, dentre elas, a prisão.

Segundo Melossi e Pavarini (2006) o capitalismo e o cárcere (nos termos indicados) surgiram ao mesmo tempo, em uma relação determinada. As modificações tão profundas que ocorreram ao nível estrutural provocaram “alterações igualmente radicais naquelas instituições e no conjunto dos processos de controle social e de reprodução da força de trabalho” (MELOSSI; PAVARINI, 2006, p. 26).

A ideia da privação de um quantum de liberdade, como forma de punição, só pode realizar-se de fato no sistema capitalista, ou seja, “naquele processo econômico em que todas as formas da riqueza social são devolvidas à forma mais simples e abstrata do trabalho humano medido pelo tempo” (MELOSSI; PAVARINI, 2006, p. 262). Nesse modo de produção os trabalhadores não estão mais sujeitos a um vínculo direto e imediato com o senhor. Eles têm a (única) “liberdade” de vender o seu tempo de trabalho, a sua força de trabalho e precisa fazê-lo, cedendo ao capitalista o direito de empregá-la (MARX, 1996, p. 111).

A relação capital-trabalho que, por si só já se constitui como uma prisão estabeleceu a pena privativa de liberdade, forma especificamente burguesa de punição. O como as mulheres experimentam esse encarceramento será tratado neste texto.

A investigação foi realizada a partir de análise documental e de pesquisa de campo, que compreendeu observação e entrevistas semiestruturadas. Tanto a

observação como as entrevistas foram registradas em caderno de campo, haja vista que no estado de Minas Gerais, na época, estava em vigor uma Circular que proibia a gravação de imagens e som no interior dos estabelecimentos prisionais.

A análise documental abrangeu o estudo das produções levantadas: teses, dissertações e artigos, bem como da legislação nacional (normas constitucionais, leis, decretos e resoluções), das normativas e publicações da Secretaria (Plano Estadual de Educação nas Prisões, diretrizes, cartilhas, e etc.) e de relatórios, tais como os do Infopen (BRASIL, 2017a, 2017b), Atlas da Violência (IPEA, 2018), entre outros.

Previamente aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (COEP), sob o nº CAAE 51489815.8.0000.5149, a pesquisa foi feita em duas unidades prisionais da Região Metropolitana de Belo Horizonte: um Complexo Penitenciário Feminino e um Presídio Feminino. Optou-se por pesquisar unidades femininas devido ao interesse em discutir o encarceramento das mulheres e também porque foi possível verificar, através do levantamento já descrito, lacunas na abordagem do tema.

Foram entrevistadas 14 mulheres em privação de liberdade – sete em cada uma das duas unidades – que estavam realizando cursos de formação profissional5. Para preservar a identidade delas, compromisso ético dos pesquisadores, foram utilizados nomes fictícios. As entrevistadas, cujas idades variavam entre 20 e 41 anos, foram convidadas a participar da pesquisa e, ao aceitarem, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Além das entrevistas com as apenadas, durante as visitas às unidades, foi possível conversar com algumas das profissionais que trabalhavam nesses espaços, principalmente as dos setores de atendimento. As informações fornecidas por elas também foram registradas em caderno de campo.

Após esta introdução, em “Sobre estar na prisão pelo capital-trabalho”, discute- se a divisão sexual do trabalho e as relações sociais de sexo, tanto conceitualmente quanto a partir de um conjunto de indicadores sobre o mercado de trabalho e de dados nacionais acerca da violência contra as mulheres. Em seguida, no “Sobre estra na prisão do capital-trabalho”, trata-se de aspectos referentes às mulheres em privação


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5 No Complexo Penitenciário foram entrevistadas as que estavam realizando o curso de cabelereiro. A oferta do curso foi fruto do Termo de Cooperação Técnica (TCT) entre a, na época, SEDS-MG e o Instituto Federal do Sul de Minas (Campus Muzambinho) e foi custeada pelo Programa Nacional de Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). No Presídio Feminino, as entrevistadas havia concluído o curso de costura.

de liberdade, observados durante a pesquisa de campo e em diálogo com as informações do Infopen. Por fim apresentamos as considerações finais.


Sobre estar na prisão pelo capital-trabalho


As condições em que vivem homens e mulheres não são produtos de uma causalidade biológica, mas sim construções sociais. Eles não são “uma ou duas coleções de indivíduos biologicamente diferentes. Homens e mulheres formam dois grupos sociais engajados nas relações sociais de sexo” (KERGOAT, 2009, p. 67). Assim como todas as relações sociais, essas possuem uma base material (o trabalho) e se expressam por meio da divisão sexual do trabalho.

A referida divisão tem como característica a destinação prioritária dos homens à esfera produtiva e das mulheres à esfera reprodutiva e, simultaneamente, “a ocupação pelos homens das funções de forte valor social agregado - políticas, religiosas, militares etc.” (KERGOAT, 2009, p. 67). Além disso, a mesma possui dois princípios organizadores: “o de separação (existem trabalhos de homens e trabalhos de mulheres) e o princípio hierárquico (um trabalho de homem “vale” mais do que um trabalho de mulher)” (KERGOAT, 2009, p. 67).

Observa-se que a dimensão exploração/opressão está essencialmente contida na divisão sexual do trabalho. Há uma imbricamento entre “opressão sexual (e de classe) e exploração econômica (e de sexo)” (HIRATA, 1995, p. 40). No modo de produção do capital a mulher padece tanto com uma como com a outra. A esfera das relações de classe é, ao mesmo tempo, a esfera em que se exerce o poder dos homens sobre as mulheres (HIRATA, 1995, p. 40).

Para abordar a justaposição de distintas relações sociais (de classe, de sexo e de raça), Kergoat (2010) recorre ao conceito de consubstancialidade e sua propriedade essencial, a coextensividade. A ideia de consubstancialidade refere-se ao entrecruzamento dinâmico e complexo do conjunto de relações sociais, “cada uma imprimindo sua marca nas outras, ajustando-se e construindo-se de maneira recíproca” (KERGOAT, 2010, p. 100). Já a coextensividade indica o dinamismo das relações sociais. O conceito busca dar conta do fato de que elas se produzem mutuamente.

A análise segundo essa perspectiva se opõe a ideia de que as “relações de classe se inscrevam unicamente na instância econômica e as relações patriarcais, unicamente na instância ideológica” (KERGOAT, 2010, p. 99). Cada um desses sistemas possui suas próprias instâncias, que se articulam de maneira intra e intersistêmica.

Nesse sentido, capitalismo e patriarcado são formas reciprocamente constitutivas de exploração e opressão. A luta de classes e a luta de sexos, bem como as relações sociais que as originam, exprimem-se continuamente na produção e na reprodução. O antagonismo entre os sexos não está, de forma alguma, circunscrito à reprodução, assim como, a contradição entre o capital e o trabalho não se restringe à produção (COMBES; HAICAULT, 1986).

Segundo Combes e Haicault (1986), homens e mulheres estão sempre (em ambas as esferas) numa relação antagônica, na medida em que pertencem a um ou a outro sexo - opressor ou oprimido - e, ao mesmo tempo, numa relação de aliança em uma base desigual, por serem de uma mesma classe social - uma das duas definidas pela relação de exploração.

As duas classes sociais são contraditórias, “mas a luta que opõe, de forma permanente e geral, o capital ao trabalho não exclui, obviamente, a diversidade das posições e dos interesses, nem a das relações sociais de oposição internas a cada uma das classes” (COMBES; HAICAULT, 1986, p. 39).

Para se fortalecer, o capital soube utilizar das relações de sexo preexistentes, impressa no patriarcalismo ocidental. As novas formas de organização do trabalho e da produção e os seus resultantes, como a precarização e a flexibilização, têm consequências diferentes para homens e mulheres (HIRATA, 2011). As últimas são mais atingidas por esses processos, conforme demonstrado através dos dados a seguir.


Na Tabela 1, constam os indicadores estruturais do mercado de trabalho.


Tabela 1- Indicadores estruturais do mercado de trabalho das pessoas de 16 anos ou mais de idade, por sexo - Brasil, 2016.


Total

Homens

Mulheres


Números absolutos (milhões)

População em Idade Ativa

159 938

76 244

83 694

População Economicamente Ativa (PEA)

102 357

57 440

44 917

População ocupada

90 792

51 665

39 126



Total

Homens

Mulheres

População desocupada

11 565

5 775

5 790


Proporção (%)

Nível de Ocupação

56,8%

67,8%

46,7%

Taxa de Desocupação

11,3%

10,1%

12,9%

Taxa de Atividade

64,0%

75,3%

53,7%

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, 2016, elaborada pelos autores


A população ocupada em 2016 foi estimada em 90,7 milhões de pessoas, sendo 51,6 homens (56,9%) e 39,1 mulheres (43,1%). Já a população desocupada, na época de 11,5 milhões, era formada por 5,7 milhões de homens (49,9%) e 5,8 milhões de mulheres (50,1%). Portanto, a taxa de desocupação das mulheres (de 12,9%) era maior do que a dos homens (de 10,1%).

Já a taxa de atividade - relação entre o número de pessoas economicamente ativas e o de pessoas em idade ativa num determinado período de referência - era de 64% da população total. Ao desagregar esse dado por sexo, verifica-se que a taxa de atividade dos homens era de 75,3% e a das mulheres de 53,7%, ou seja, de cada 10 mulheres em idade ativa, cinco estavam fora do mercado de trabalho.

Da população ocupada, 55,5 milhões eram trabalhadores formais6 (61,2%) e 35,2 milhões informais (38,8%). A proporção de homens em trabalhos formais era de 61,1% e a de mulheres 61,3% (ver Tabela 2), percentuais equiparados, mas com pesos diferentes nas categorias que os compõem (o detalhamento será feito a partir da Figura 1).


Tabela 2- Proporção de pessoas ocupadas em trabalhos formais, por sexo e cor ou raça - Brasil, 2016


Proporção em trabalhos formais (%)

População ocupada total

61,2

Sexo

Homens

61,1

Mulheres

61,3

Cor ou raça

Pessoas brancas

68,6

Pessoas pretas ou pardas

54,6

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, 2016, elaborada pelos autores


Ao realizar uma análise por cor ou raça é possível observar que a proporção de pessoas brancas em trabalhos formais foi de 68,6%, enquanto que a de pessoas negras (inclui pretos e pardos) foi de 54,6%. Essa diferença significa que há um



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6 O conceito de trabalho formal baseia-se na definição da Organização Internacional do Trabalho - OIT (International Labour Office - ILO) que inclui empregado com carteira de trabalho assinada, trabalhador doméstico com carteira assinada, militar, funcionário público estatutário, conta própria e empregador que contribuíam para a previdência social.

número maior de trabalhadores negros na informalidade, quando comparados com os brancos.

Os empregos informais (38,8% do total) são vivenciados por um grande número de pessoas sem acesso aos mecanismos de proteção social, que estariam relacionados a formalização. Elas estão, portanto, mais suscetíveis a situações adversas como, por exemplo, a doenças e a desocupação. Além disso, a informalidade inibe o acesso dos mesmos aos direitos básicos como a remuneração pelo salário mínimo, a licenças médicas, à maternidade ou por acidentes de trabalho e a aposentadoria.

Na Tabela 3 especifica-se a distribuição percentual da população ocupada por grupos de atividade.


Tabela 3- População ocupada de 16 anos ou mais na semana de referência, por sexo, segundo grupos de atividade - Brasil, 2016

Grupos de atividades

Total

Homens

Mulheres


Números absolutos (milhões)

Agropecuária

9 019

7 181

1 838

Indústria

11 468

7 508

3 961

Construção

7 416

7 173

243

Comércio e reparação

17 406

10 039

7 367

Administração pública

5 136

3 032

2 104

Educação, saúde e serviços sociais

10 516

2 516

8 001

Serviços domésticos

6 230

488

5 742

Demais serviços

23 595

13 726

9 869

Atividades mal definidas

6

4

2

Total

90 792

51 665

39 126

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, 2016, elaborada pelos autores


Ao considerar os três grandes grupos de atividade econômica, nota-se que do total da população ocupada, 9,9% participam da Agropecuária, 20,8% do grupo da Indústria (que inclui a atividade de Construção) e 69,3% do de Serviços (que compreende as demais atividades).

Entre as mulheres ocupadas na semana de referência, 4,7% encontravam-se na Agropecuária, 10,8% na Indústria e 84,5% no grupo de Serviços, percentual bem maior do que entre a população total (de 69,3%) e dos homens (de 57,7%). Isso significa que a inserção das mulheres no mercado de trabalho, se dá, sobretudo no grupo de Serviços, que concentra um pouco mais de 33 milhões de mulheres.

A preponderância do número de empregos nesse grupo (tanto entre a população ocupada total como entre as mulheres) pode estar associada à natureza

de parte de seus postos de trabalho, em que prevalecem menor formalização, jornadas mais flexíveis e menor sindicalização.

A Figura 1 apresenta a distribuição percentual da população ocupada, por posição na ocupação.


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45,0%

40,0%

35,0%

30,0%

25,0%

20,0%

15,0%

10,0%

5,0%

0,0%

40,9%

36,7%

29,1%


19,0%

15,5%

11,7%

11,3%

10,0%

6,5%

4,5%

0,4%

5,8%

3,3%

0,5%

3,5%

1,3%

Empregado com Empregado sem Militar e servidor Trabalhador Trabalhador Conta própria Empregador

carteira de trabalho assinada

carteira de trabalho assinada

estatutário doméstico com doméstico sem

Trabalhador familiar auxiliar

carteira assinada

Homens

carteira assinada

Mulheres

Figura 1- Distribuição percentual da população ocupada na semana de referência, por posição na ocupação - Brasil, 2016

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, 2016, elaborada pelos autores


Observa-se que o percentual de mulheres empregadas com carteira de trabalho assinada em 2016, era de 36,7%, enquanto que o de homens era de 40,9%. Da população ocupada masculina, 15,5% estavam empregados sem carteira assinada, da feminina, 11,7%. Quando se soma esses números aos da categoria “trabalhador doméstico sem carteira assinada” (0,5% dos homens e 10% das mulheres) totaliza-se 16% e 21,7%, respectivamente.

Cabe salientar o alto nível de vulnerabilidade dos trabalhadores domésticos sem registro na carteira de trabalho, em sua grande maioria mulheres, uma vez que os direitos trabalhistas dessa categoria só foram assegurados recentemente. Em 2013 foi aprovada a Emenda Constitucional nº 72 de 2 de abril, que ampliou para os empregados domésticos alguns direitos já conquistados pelo conjunto de trabalhadores urbanos desde 1988. Porém, grande parte desses direitos passou a ter validade somente em 2015, com a aprovação da Lei Complementar nº 150 de 1º de junho, que regulamentou a chamada PEC das Domésticas.

Tão significativo quanto o atraso de décadas e o debate provocado pelas alterações legais é o fato explicitado através dos dados acima: a maior parte das

empregadas domésticas segue desprotegida socialmente, sem acesso aos “novos” direitos conquistados.

A distribuição percentual da população ocupada por nível de instrução está ilustrada na Figura 2.


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Total Homens Mulheres

Pessoas pretas ou pardas


Pessoas brancas

Sem instrução e Ensino Fundamental incompleto ou equivalente Fundamental completo ou Médio incompleto ou equivalente

Médio completo ou equivalente e Superior incompleto ou equivalente Superior completo ou mais

38,7%

13,7%

21,2%

37,2%

17,0%

34,7%

40,8%

13,6%

21,8%

35,6%

16,8%

33,2%

37,9%

15,4%

28,3%

26,4%

11,0%

23,8%

14,4%

18,5%

Figura 2- População ocupada de 16 anos ou mais de idade, por nível de instrução e sexo - Brasil, 2016

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, 2016, elaborada pelos autores


Verifica-se que o nível de instrução das mulheres ocupadas na semana de referência é superior ao dos homens. O percentual de mulheres sem instrução e com ensino fundamental incompleto é de 21,8%, enquanto que o de homens 33,2%. No outro extremo da distribuição por níveis de instrução, 23,8% das mulheres possuem o ensino superior completo ou mais e 14,4% dos homens.

Ao comparar os dados relativos às pessoas brancas e negras, ficam evidentes as disparidades, fruto de um processo histórico perverso: 34,7% das pessoas negras ocupadas não têm instrução ou têm o ensino fundamental incompleto, já a proporção de pessoas brancas nesse nível é de 21,2%. Ao passo que 26,4% das pessoas brancas têm o ensino superior completo ou mais, apenas 11% das pessoas negras o concluíram.

Apesar de terem maior nível de escolaridade, as mulheres possuem um rendimento médio no trabalho principal7 inferior ao dos homens, conforme demonstrado na Tabela abaixo. A análise das condições de rendimento de homens e



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7 Soma do rendimento mensal do trabalho principal dividido pelo total da população ocupada de 16 anos ou mais de idade.

mulheres é importante, pois, além de ser um fator de estratificação social, tem interface com os demais temas sociais.


Tabela 4- Rendimento médio do trabalho principal das pessoas de 16 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por sexo e cor ou raça - Brasil, 2016



Sexo

Cor ou raça


Total

Homens

Mulheres

Branca

Preta e Parda


Média (em R$)

Brasil

2.021

2.251

1.710

2.629

1.455

Região Norte

1.495

1.568

1.375

2.040

1.355

Região Nordeste

1.349

1.433

1.227

1.828

1.186

Região Sudeste

2.369

2.715

1.929

2.978

1.605

Região Sul

2.173

2.459

1.799

2.342

1.558

Região Centro-Oeste

2.231

2.478

1.897

2.906

1.821

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, 2016, elaborada pelos autores


O rendimento médio da população ocupada em 2016 foi de R$ 2.021. A média nacional dos homens foi R$ 2.251 enquanto que a das mulheres de R$ 1.710. Nota- se que em todas as regiões do país o rendimento médio das mulheres é inferior ao dos homens. Outra disparidade pode ser observada quando se faz a análise por cor ou raça, na média nacional e também de todas as regiões, o rendimento das pessoas brancas é maior do que o das pessoas negras.

A razão entre o rendimento médio das pessoas ocupadas é especificada na Tabela 5.


Tabela 5- Razão entre o rendimento médio do trabalho principal das pessoas de 16 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência, em trabalhos informais e formais, segundo o sexo e a cor ou raça - Brasil, 2016


%

Razão informal/formal

47,9

Sexo

Razão mulheres/homens

76,0

Razão mulheres/homens formais

76,3

Razão mulheres/homens informais

63,5

Razão homens informais/homens formais

50,0

Razão mulheres informais/mulheres formais

41,7

Cor ou raça

Razão pretos ou pardos/brancos

55,3

Razão pretos ou pardos/brancos formais

61,4

Razão pretos ou pardos/brancos informais

54,4

Razão brancos informais/brancos formais

55,1

Razão pretos ou pardos informais/pretos ou pardos formais

48,9

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, 2016, elaborada pelos autores

Em 2016, as mulheres ocupadas em trabalhos formais ganhavam 76,3% do rendimento dos homens. Entre os trabalhadores informais essa razão foi de 63,5%. Na análise por cor/ou raça, o rendimento dos trabalhadores pretos ou pardos foi de 55,3% do rendimento dos trabalhadores brancos.

Além de ganharem menos no mercado de trabalho, as mulheres dedicam mais tempo do que os homens às atividades domésticas não remuneradas. Em 2016, 90,6% das mulheres em idade de trabalhar realizaram afazeres domésticos ou atividades de cuidados de moradores do domicílio ou de parentes não moradores, enquanto que 74,1% dos homens o fizeram. A média de horas semanais dedicadas a essas tarefas, em 2016, era de 11,1 para homens e 20,9 para as mulheres (quase o dobro).

Em síntese, o que os dados evidenciam é que, apesar de algumas conquistas recentes, as mulheres permanecem em empregos precários e em situações de grande vulnerabilidade. Recebem os piores salários e possuem jornadas extensas e incalculáveis de trabalho, resultado da acumulação da atividade remunerada com os serviços de cuidados.

Tais dados devem ainda ser associados aos que se referem à violência contra as mulheres, o que auxilia na discussão sobre as relações sociais vivenciadas por elas em distintos espaços e, principalmente, na compreensão do entrecruzamento dessas relações.

Segundo o balanço dos atendimentos realizados pela Central de Atendimento à Mulher - Ligue 180, em 2015 foram registradas 76.651 denúncias de violência contra as mulheres (ver a Tabela 6).


Tabela 6- Tipos de relatos de violência contra as mulheres - Brasil, 2015


Tipos

%

Relatos de violência física

38.451

50,15%

Relatos de violência psicológica

23.247

30,33%

Relatos de violência moral

5.556

7,25%

Relatos de violência patrimonial

1.607

2,10%

Relatos de violência sexual

3.478

4,54%

Relatos de cárcere privado

3.961

5,17%

Relatos de tráfico de pessoas

351

0,46%

Total

76.651

100%

Fonte: Central de Atendimento à Mulher - Ligue 180/SPM


Observa-se que os relatos de violência física e de violência psicológica são os mais recorrentes entre as denúncias, quando somados correspondem a 80,48% do total. A violência contra as mulheres ocorre de forma reiterada: em 39,73% dos

casos a agressão é diária e em 34,36%, a agressão é semanal. Ou seja, em 74,09% dos casos a violência ocorre com uma frequência muito alta (BRASIL, 2015c, p. 15).

Dos relatos de violência registrados na Central de Atendimento (um total de 76.651), 86,56% do total corresponderam a situações de violência doméstica e familiar contra as mulheres. Em 72% dos casos, as violências foram cometidas por homens com quem as vítimas têm ou tiveram algum vínculo afetivo: atuais ou ex- companheiros, cônjuges, namorados ou amantes. A relação entre vítima e agressor é indicada na Tabela abaixo.


Tabela 7- Relação entre vítima e agressor(a) - Brasil, 2015


Relação

%

Relações heteroafetivas

72,00%

Relações familiares

16,82%

Relações externas

10,89%

Relações homoafetivas

0,29%

Fonte: Central de Atendimento à Mulher - Ligue 180/SPM


Os números são estarrecedores, expressam uma violência contínua e crescente contra as mulheres. Há ainda as informações do “Atlas da Violência 2018”. Segundo os registros do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, em 2016, 4.645 mulheres foram assassinadas, o que corresponde a uma taxa de 4,5 homicídios para cada 100 mil mulheres.

Destaca-se que há diferenças significativas, ao se comparar os dados relativos às mulheres negras e às não-negras (brancas, amarelas e indígenas). Em 2016, a taxa de homicídios foi maior entre as mulheres negras (5,3) do que entre as não- negras (3,1) - a diferença é de 71%. Em relação aos dez anos da série (2006 a 2016), a taxa de homicídios para cada 100 mil mulheres negras aumentou 15,4%, enquanto que entre as não negras houve queda de 8%.

Em vinte estados8, a taxa de homicídios de mulheres negras cresceu no período compreendido entre 2006 e 2016, sendo que em doze deles o aumento foi maior que 50%. Quanto à evolução das taxas de homicídio de mulheres não-negras, neste caso, houve aumento em quinze estados e em apenas seis deles o aumento foi maior que 50%.



image

8 Acre (73,7%), Alagoas (5,7%), Amapá (10,4%), Amazonas (133,9%), Bahia (71,1%), Ceará (95,2%), Distrito Federal (4,5%), Goiás (48,0%), Maranhão (92,9%), Mato Grosso (50,8%), Mato Grosso do Sul (44,6%), Pará (92,8%), Paraíba (55,1%), Piauí (41,6%), Rio Grande do Norte (142,1%), Rio Grande do

Sul (57,1%), Roraima (214,0%), Santa Catarina (22,0%), Sergipe (87,8%) e Tocantins (43,6%).

É evidente a coexistência dos processos de exploração e de opressão que sofrem as mulheres. Ademais, ao tratarmos das privadas de liberdade, deve-se considerar, em relação com os já mencionados, os efeitos nefastos do encarceramento em suas vidas.


Sobre estar na prisão do capital-trabalho


Do total de mulheres privadas de liberdade (42.355, em junho de 2016) a informação sobre a faixa etária da população prisional feminina estava disponível para 74%. A partir da análise dessa amostra, verifica-se que 50% são jovens9, consideradas até 29 anos, segundo a classificação do Estatuto da Juventude (Lei nº 12.852/2013).

Quanto à raça, cor ou etnia, de acordo com os dados do Infopen, 62% das mulheres privadas de liberdade são negras. Entre a população maior de 18 anos, há aproximadamente 40 mulheres brancas em situação de prisão para cada grupo de 100 mil mulheres brancas, enquanto que existem 62 mulheres negras presas para cada grupo de 100 mil mulheres negras, o que expressa a disparidade entre o encarceramento de mulheres negras e brancas (Brasil, 2017b).

Sobre o nível de escolaridade, 66% da população prisional feminina ainda não acessou o ensino médio, tendo concluído no máximo o ensino fundamental10. E apenas 15% tem o ensino médio completo. Observa-se que a população carcerária feminina é, em sua maioria, jovem, negra e com baixa escolaridade.

Tabela 8- Número e idade dos filhos das entrevistadas


Nome fictício

Idade

Nº de filhos

Idade dos filhos

Dandara (dos Palmares)

20 anos

1

2 anos

Valentina(s)

25 anos

Não tem

-

Ana (Montenegro)

27 anos

2

5 e 7 anos

Carolina(s)

27 anos

2

4 e 8 anos

Rosa (Luxemburgo)

27 anos

2

6 e 10 anos

Olga (Benário)

29 anos

2

12 e 15 anos

Frida (Kahlo)

29 anos

2

10 anos

Laura(s)

31 anos

2

8 e 10 anos

Helena(s)

35 anos

1

13 anos

Antônia(s)

36 anos

Não tem

-

Nísia (Floresta)

36 anos

2

11 e 16 anos

Célia (Sánchez)

41 anos

3

5, 19 e 23 anos (é avó)


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9 27% têm de 18 a 24 anos e 23% de 25 a 29 anos (BRASIL, 2017b, p. 30).

10 Da população prisional feminina, 2% é analfabeta, 3% alfabetizada sem cursos regulares, 45% tem o ensino fundamental incompleto e 15% o ensino fundamental completo.


Nome fictício

Idade

Nº de filhos

Idade dos filhos

Fátima(s)

41 anos

4

6 anos e três maiores de idade11

Maria(s)

41 anos

2

19 e 24 anos (será avó)

Fonte: Caderno de campo (jul. 2016)


Segundo os dados do Infopen12, do total de mulheres presas, 74% têm filhos. Das 14 interlocutoras da pesquisa realizada, 12 têm filhos (85,8%), conforme indicado na Tabela 8, acima.

Ao destacar essa informação, o intuito não é reafirmar a associação (histórica e culturalmente construída) da mulher ao papel de mãe e esposa. O que se objetiva é evidenciar que a maternidade e as formas que as entrevistadas a vivenciam são recorrentes em suas falas e se articula a diversos outros assuntos, além de destacar o impacto do encarceramento sobre as famílias e a comunidade das mulheres que cumprem pena.

Dandara foi presa aos 18 anos grávida e, por isso, encaminhada ao Centro de Referência à Gestante Privada de Liberdade (MG). Nessa unidade, as mães ficam com seus filhos até que eles completem um ano de idade. Após esse período, a justiça decide sobre a guarda da criança, encaminhando-a normalmente para os familiares mais próximos. No caso de Dandara, seu filho passou a ser cuidado pela avó (materna) e ela foi transferida para o Presídio Feminino.

No momento da entrevista, aos 20 anos, com um filho de dois, Dandara estava no sistema prisional há dois anos e três meses, ou seja, ela nunca “viveu a maternidade” fora do cárcere. Condenada a uma pena de oito anos e 10 meses de reclusão por tráfico ilícito de drogas, ela terminará de cumprir a sentença, em teoria, quando o filho tiver oito anos de idade. Em tal situação, o sonho de Dandara é cuidar dele e, consequentemente, suas expectativas de futuro estão relacionadas a esse desejo: “Se eu tiver uma máquina de costura, eu posso trabalhar em casa e ficar com o meu filho. Eu mesma posso cuidar dele! Minha mãe vai para o trabalho dela e eu fico com ele” (CADERNO DE CAMPO, 2016, p. 36).

“Eu não fui mãe, dona. Eu não pude ser” (CADERNO DE CAMPO, 2016, p. 26) afirmou Olga. A entrevistada de 29 anos fez esse desabafo após relatar um pouco de


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11 A entrevistada não detalhou a idade dos três filhos, apenas disse que eles eram maiores de idade, justificando que já tinham autonomia, que já tinham a “vida deles”.

12 A disponibilidade de informações sobre o número de filhos permanece baixa em todo o país e foi possível analisar dados referentes a apenas 7% da população prisional feminina em junho de 2016, o que corresponde a uma amostra de 2.689 mulheres sobre as quais se tem informações (BRASIL, 2017b, p. 50).

sua história, aos doze anos de idade começou a passar por instituições de medidas socioeducativas: “Minha vida é marcada por entradas e saídas das prisões” (CADERNO DE CAMPO, 2016, p. 25).

Na ocasião da pesquisa Olga cumpria pena no sistema prisional pela segunda vez, nas duas foi indiciada por tráfico de drogas. Durante o cumprimento da primeira sentença ela perdeu a guarda do filho mais velho (que no momento da pesquisa estava com 15 anos). Pelo que relatou, os familiares não puderam assumir o cuidado de uma criança, devido à dependência química e ao envolvimento com o tráfico. Quanto ao pai do menino, de acordo com Olga, ele havia morrido.

A decisão judicial então foi de transferir a guarda da criança para outra família. Ao falar sobre o assunto a apenada se emociona e o que a pesquisadora poderia fazer a não ser esperar? “Esperar pelo tempo daquelas lágrimas que já foram de uma menina, depois de uma moça e agora são de uma mulher, de uma mãe” (CADERNO DE CAMPO, 2016, p. 25-26). Quanta história cabe em uma lágrima? Quantas lágrimas tiveram em sua vida, Olga?

“[…] Ainda dá tempo de ser mãe, não é?” (CADERNO DE CAMPO, 2016, p. 29). Essa pergunta foi feita por Fátima à pesquisadora. A entrevistada, condenada a uma pena de sete anos e oito meses por tráfico, estava na unidade há quatro anos, desde 2012. Fátima tem 41 anos e quatro filhos, três maiores de idade e um de seis anos. Quando foi presa, portanto, seu filho mais novo tinha dois anos.

“Ainda não fui mãe!” “Eu não pude ser mãe!” “Dá tempo de ser mãe?” As falas de Dandara, Olga e Fátima, respectivamente, expressam alguns dos sentimentos das entrevistadas sobre a maternidade. Para abordá-los recorreu-se a três histórias distintas, no entanto, isso não quer dizer que eles se constituam isoladamente, muito pelo contrário, são coexistentes, a história de Frida demonstra isso.

Frida, de 29 anos, foi condenada a 24 anos e quatro meses de prisão por tráfico de drogas (enquadramento em três Arts. da Lei 11.343/2006) e no período da pesquisa tinha cumprido sete anos e cinco meses da pena no Complexo Penitenciário Feminino. Mãe de dois filhos, ambos com 10 anos, Frida foi presa em 2009 quando eles tinham um pouco menos de três anos e ela 21. Além de se lamentar por isso, a apenada sente, dia após dia, as dificuldades de ser mãe enquanto no cárcere, na data da entrevista havia três meses que ela não recebia visitas e seis meses que não via

os filhos. Ao final do cumprimento de sua sentença ainda dará tempo de ser mãe? É o que Frida se questiona.

Tabela 9- Número de crimes tentados/consumados pelos quais as pessoas privadas de liberdade foram condenadas ou aguardam julgamento - Brasil, 2016


Homens

Mulheres

Total

Quantidade de crimes tentados/consumados

586.722

33.861

620.583

Código Penal

393.680

11.812

405.492


%

%

%

Grupo: Crimes contra a pessoa13

82.195

14%

2.491

7,4%

84.686

13,6%

Grupo: Crimes contra o patrimônio14

270.818

46,1%

7.991

23,7%

278.809

45%

Grupo: Crimes contra a dignidade sexual15

25.777

4,5%

305

0,9%

26.082

4,2%

Grupo: Crimes contra a paz pública16

9.349

1,6%

734

2,2%

10.083

1,6%

Grupo: Crimes contra a fé pública17

4.053

0,7%

184

0,5%

4.237

0,8%

Grupo: Crimes contra a administração pública18

494

0,1%

50

0,1%

544

0%

Grupo: Crimes praticados por particular contra a administração pública19

994

0,2

57

0,1%

1.051

0,1%

Legislação específica

193.042

22.049

215.091


%

%

%

Grupo: Drogas (Lei 6.368/1976 e Lei 11.343/2006)20

155.669

26,5%

21.022

62%

176.691

28,5%

Grupo: Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003)21

31.533

5,4%

582

1,7%

32.115

5,2%

Grupo: Crimes de Trânsito (Lei 9.503/1997)22

1.984

0,3%

44

0,1%

2.028

0,3%


image

13 O grupo inclui os seguintes crimes: Homicídio simples (Art. 121, caput); Homicídio culposo (Art. 121,

§ 3°); Homicídio qualificado (Art. 121, § 2°); Aborto (Art. 124, 125, 126 e 127); Lesão corporal (Art. 129,

caput e § 1°, 2°, 3° e 6°); Violência doméstica (Art. 129, § 9°); Sequestro e cárcere privado (Art. 148) e outros não listados acima, entre os artigos 122 e 154-A.

14 O grupo inclui os seguintes crimes: Furto simples (Art. 155); Furto qualificado (Art. 155, § 4° e 5°); Roubo simples (Art. 157); Roubo qualificado (Art. 157, § 2°); Latrocínio (Art. 157, § 3°); Extorsão (Art. 158); Extorsão mediante sequestro (Art. 159); Apropriação indébita (Art. 168); Apropriação indébita previdenciária (Art. 168-A); Estelionato (Art. 171); Receptação (Art. 180); Receptação qualificada (Art. 180, § 1°) e outros não listados acima, entre os artigos 156 e 179.

15 O grupo inclui os seguintes crimes: Estupro (Art. 213); Atentado violento ao pudor (Art. 214); Estupro de vulnerável (Art. 217-A); Corrupção de menores (Art. 218); Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual (Art. 231); Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual (Art. 231-A) e outros (Artigos 215, 216-A, 218-A, 218-B, 227, 228, 229, 230).

16 O grupo inclui o crime de Associação criminosa (Art. 288).

17 O grupo inclui os seguintes crimes: Moeda falsa (Art. 289); Falsificação de papéis, selos, sinal e documentos públicos (Art. 293 a 297); Falsidade ideológica (Art. 299) e Uso de documento falso (Art. 304).

18 Inclui os crimes de Peculato (Art. 312 e 313); Concussão e excesso de exação (Art. 316) e Corrupção passiva (Art. 317).

19 Inclui o crime de Corrupção ativa (Art. 333) e Contrabando ou descaminho (Art. 334).

20 O grupo inclui os crimes a seguir: Tráfico de drogas (Art. 12 da Lei 6.368/1976 e Art. 33 da Lei 11.343/2006); Associação para o tráfico (Art. 14 da Lei 6.368/1976 e Art. 35 da Lei 11.343/2006); Tráfico internacional de drogas (Art. 18 da Lei 6.368/1976 e Art. 33 e 40, inciso I da Lei 11.343/2006).

21 O grupo inclui os seguintes crimes: Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (Art. 14); Disparo de arma de fogo (Art. 15); Posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito (Art. 16); Comércio ilegal de arma de fogo (Art. 17); Tráfico internacional de arma de fogo (Art. 18).

22 O grupo inclui os crimes a seguir: Homicídio culposo na condução de veículo automotor (Art. 302) e outros (Art. 303 a 312).



Homens

Mulheres

Total

Grupo: Legislação específica - outros23

3.856

0,6%

401

1,3%

4.257

0,6%

Fonte: Infopen, jun. 2016, elaborada pelos autores


Não foi por acaso que os três casos citados referem-se às condenadas por tráfico de drogas. O número de crimes tentados ou consumados pelos quais as pessoas privadas de liberdade foram condenadas ou aguardam julgamento consta na Tabela 9. Esclarece-se que das unidades prisionais que participaram do levantamento do Infopen, apenas 66% informaram esses dados.

A partir da Tabela 9, acima, é possível observar que o encarceramento crescente das mulheres está relacionado, sobretudo, ao tráfico ilícito de drogas. Observa-se que, 62% dos crimes pelos quais as mulheres respondem referem-se ao tráfico. Os crimes contra o patrimônio são os de maior incidência entre os homens (46,1% do total). No caso das mulheres esses crimes correspondem a 19,7% do total.

Ao somar os dois percentuais, (62% correspondente ao tráfico ilícito de drogas e 23,7% aos crimes contra o patrimônio), verifica-se que 85,7% do total de crimes tentados ou consumados pelos quais as mulheres foram condenadas ou aguardam julgamento, diz respeito a uma das duas tipificações.

Dentre as 14 participantes da pesquisa, 11 foram condenadas exclusivamente por tráfico ilícito de drogas (78,5%); uma por tráfico, homicídio simples e homicídio qualificado e outras duas por homicídio, conforme especificado na Tabela 10.


Tabela 10- Crimes e tempo de condenação das entrevistadas


Idade

Crime(s) pelo(s) qual(is) foi condenada

Tempo no sistema prisional

Tempo total de condenação

Situação da condenada

20 anos

Tráfico de drogas

2 anos e 3 meses

8 anos e 10 meses

Primária

27 anos

Tráfico de drogas

2 anos e 4 meses

7 anos

Reincidente

27 anos

Tráfico de drogas

2 anos e 2 meses

8 anos

Primária

29 anos

Tráfico de drogas

5 anos e 2 meses

12 anos e 1 mês

Reincidente

29 anos

Tráfico de drogas

7 anos e 5 meses

24 anos e 4 meses

Reincidente

31 anos

Tráfico de drogas

1 ano e 6 meses

8 anos

Primária

35 anos

Tráfico de drogas

1 ano e 5 meses

5 anos e 6 meses

Primária

36 anos

Tráfico de drogas

2 anos e 3 meses

4 anos e 6 meses

Primária

36 anos

Tráfico de drogas

3 anos e 6 meses

7 anos e 2 meses

Reincidente

41 anos

Tráfico de drogas

4 anos e 7 meses

7 anos e 8 meses

Reincidente

41 anos

Tráfico de drogas

1 ano e 7 meses

8 anos

Primária

27 anos

Tráfico de drogas

Homicídio simples Homicídio qualificado

2 anos e 10 meses

28 anos e 4 meses

Primária


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23 Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990); Genocídio (Lei 2.889/1956); Crimes de tortura (Lei 9.455/1997); Crimes contra o Meio Ambiente (Lei 9.605/1998).


Idade

Crime(s) pelo(s) qual(is) foi condenada

Tempo no sistema prisional

Tempo total de condenação

Situação da condenada

25 anos

Homicídio simples

4 anos e 11 meses

12 anos

Primária

41 anos

Homicídio qualificado

3 anos e 11 meses

16 anos

Primária

Fonte: Caderno de campo (jul. 2016), elaborada pelos autores


A Lei 8.072/1990, em seu Art. 2º, equiparou o tráfico de entorpecentes e drogas afins aos crimes hediondos. A referida classificação proíbe a anistia, graça, indulto e fiança; permite o aumento do prazo da prisão temporária para 30 dias e impõe um período maior de cumprimento da pena em regime fechado, antes da progressão de regime, que se dará após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o réu for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente24.

Em 2006 entrou em vigor a “Nova Lei de Drogas” (Lei 11.343/2006), com o objetivo de descriminalizar o usuário25 e estabelecer punições mais severas para o traficante26. A partir dela, a punição para condenações por tráfico passou a ser uma pena de reclusão de cinco a 15 anos e pagamento de 500 a 1.500 dias-multa (Art. 33). Ademais, a nova legislação manteve a cargo do juiz a diferenciação entre tráfico e uso de drogas, de acordo com a natureza e a quantidade da substância apreendida, o local e as condições em que se desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente (Art. 28, § 2º).

Tal abertura valoriza a subjetividade da decisão e promove a discricionariedade dos operadores jurídicos.

Associada ao rigor punitivo, a subjetividade é um dos elementos propulsores do encarceramento das pessoas que são consideradas como “traficantes”, além de aprofundar a seletividade do sistema de justiça. Os efeitos da “Nova Lei de Drogas” e, por consequência, suas imprecisões (que dão margem a discussões entre especialistas) são objetos de diversas análises27.


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24 Redação dada pela Lei nº 11.464/2007.

25 Segundo o Art. 28 da Lei 11.343/2006, o usuário é aquele que “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.

26 De acordo com o Art. 30 da Lei 11.343/2006 será considerado traficante aquele que “importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.

27 Ver Grillo, Policarpo e Veríssimo (2011).

Os motivos da crescente participação das mulheres no tráfico de drogas são abordados por pesquisas que convergem na maioria dos argumentos e divergem em alguns, especialmente quanto à preponderância das causas.

As dificuldades econômicas estão entre essas razões. As mulheres são a cada dia mais, as únicas responsáveis pela manutenção financeira da família, o que torna premente a busca por alguma forma de rendimento. Diante da necessidade de garantir o presente, as expectativas de futuro são limitadas e o imediato é priorizado, o que facilita, sobretudo, “no caso das mais pobres e desamparadas, o envolvimento em atividades lucrativas a curto prazo” (SOUZA, 2005, p. 13).

Esclarece-se que ao indicar esse fator o intuito não é afirmar que a motivação para a prática de um crime se encerra nas privações econômico-financeiras, muito menos associar de modo mecânico a pobreza à violência. O que se espera é destacar o grau de vulnerabilidade das mulheres, “sua exposição maior ao atrativo de ganho fácil exercido pelo mundo do crime” (SOUZA, 2005, p. 13).

De forma relacionada ou não a essa razão há um entendimento por parte das mulheres de que o comércio de drogas ilícitas não requer o envolvimento profundo e exclusivo com a criminalidade. Principalmente na comercialização de pequenas quantidades, o tráfico de drogas possui características que facilitam a entrada das mulheres, aqui como no trabalho formal de maneira periférica e, de forma, que possam ser facilmente substituídas. Nesse sentido, a elas seria possível realizar as atividades desse e, ao mesmo tempo, serem responsáveis por outras tarefas, inclusive aquelas que culturalmente são designadas às mulheres (LAGO, 2014).

A afetividade também é um fator apontado pelas pesquisas. Costa (2008), por exemplo, demonstrou que as mulheres acabam sendo presas ao buscarem “ajudar” companheiros, pais, irmãos, filhos, ou outros. Essa “ajuda” pode se referir inclusive a tentativa de entrar nas unidades prisionais com drogas, nesse caso, são mulheres que vivem o cárcere antes mesmo de estarem nele (por conta da situação de pessoas próximas) e em determinado momento passam a senti-lo na própria pele (Lago, 2014). Dentre as entrevistadas, apesar de nenhuma ter sido presa nessas circunstâncias, muitas relataram sobre os vínculos que tinham e/ou ainda têm. Célia, por exemplo, definiu-se da seguinte maneira: “eu sou viúva e ex-esposa do tráfico” (CADERNO DE CAMPO, 2016, p. 55). Ana e Olga relataram que os seus irmãos

tinham envolvimento com o tráfico de drogas. A irmã de Frida estava presa na mesma unidade que ela.

Já no estudo de Helpes (2014) verificou-se que, apesar do relacionamento heteroafetivo ser um dos impulsionadores para o ingresso das mulheres no tráfico de drogas, o mesmo não foi frequente no universo da pesquisa. Elas não eram, necessariamente, movidas por sentimentos pelo companheiro, contrariando assim a concepção de passividade e subordinação. São mulheres que “escreveram suas histórias, desafiando milênios de tradição patriarcal. Em alguns casos, essa autonomia foi forjada pelo sofrimento, pela violência, pelo abuso e pela dor de suas mães, irmãs, ou delas mesmas” (HELPES, 2014, p. 8).

O que se observa é que não há um único fator motivador para o envolvimento das mulheres com o tráfico de drogas ou com qualquer outro crime. Seja “por amor ou pela dor”28, os mesmos se mostram como uma “opção” ao desemprego e/ou “alternativa” a empregos precarizados direcionados, geralmente, às mulheres com baixo nível de escolaridade.


Considerações finais


Neste artigo, espera-se ter evidenciado a espiral de exploração e opressão na qual (sobre)vivem as mulheres. A espiral é uma linha curva que, sem se fechar, gira em torno de um ponto central, dele se afastando ou se aproximando. Assim, a metáfora da espiral serve para demonstrar que a realidade não se fecha em si mesma, não há uma relação circular. Nesse sentido, ao abordar a temática, com base nos argumentos de Kergoart (2009, 2010), tratou-se dos entrecruzamentos, das interpenetrações das relações sociais.

Capitalismo e patriarcado combinam entre si e se reforçam mutuamente, ao encarcerar as mulheres. Os dados apresentados, ainda que de forma sucinta, demonstram que no mercado de trabalho as mulheres, sobretudo as negras e com baixo nível de escolaridade, são as que mais sofrem com os processos de precarização e flexibilização. As informações também indicam uma violência contínua e crescente contra as mulheres.


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28 Em alusão ao título da dissertação: RAMOS, Luciana Souza. Por amor ou pela dor: um olhar feminista sobre o encarceramento de mulheres por tráfico de drogas. Dissertação (Mestrado em Direito, Estado e Constituição) - Faculdade de Direito, Universidade de Brasília. Brasília, 2012.

As mulheres em cumprimento de pena são, não por mera coincidência, em sua maioria, jovens, negras e com baixo nível de escolaridade, respondendo majoritariamente por um tipo de crime, tráfico ilícito de drogas, cujo envolvimento está relacionado a diferentes fatores, mas que, sobretudo, que tira proveito da situação de vulnerabilidade em que elas vivem. Longe de “fechar um ciclo”, os argumentos aqui apresentados “lançam luz” sobre uma espiral.


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