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V.19, nº 38, 2021 (jan-abr) ISSN: 1808-799 X


Dissertação de Mestrado1


BORGES, Priscila Moreira2. Trabalhadoras do Brasil, uni-vos: a Central Única dos Trabalhadores (CUT) - uma história escrita sob uma perspectiva de gênero. 2018. 91p. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Política Social. Universidade Federal Fluminense. Niterói.


Resumo expandido3


Esta dissertação foi defendida em 2018 e analisou as relações de gênero na trajetória da Central Única dos Trabalhadores (CUT) entre os anos de 1983 e 2010. A preocupação desta pesquisa foi avaliar no mundo sindical de que forma a desigualdade também estava nos organismos de poder da instituição. A partir desse contexto analisou-se, sobretudo, a implantação de uma política de gênero em seu interior (inserção nas diretorias; instâncias internas de organização das mulheres; políticas de promoção de participação feminina). Apesar de inúmeros esforços como políticas de cotas para as diretorias, o poder sindical ainda se mantém extremamente masculino. A escolha da CUT foi por esta ser a maior central sindical do país e a pioneira nas discussões de gênero. Utilizou-se como metodologia a análise documental das resoluções dos Congressos Nacionais da CUT (CONCUT) e a revisão bibliográfica de marcos teóricos como a divisão sexual do trabalho, representação política e organização sindical.

A luta das mulheres brasileiras para ocupar o espaço público e participar da vida política como cidadãs de direitos é antiga e muitas vezes esquecida. Os homens foram os reais sujeitos de direitos de nossa história. A eles coube o espaço público, o


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  1. Resumo recebido em 31/08/2020. Aprovado pelos editores em 10/09/2020. Publicado em 25/02/2021. DOI: https://doi.org/10.22409/tn.v19i38.45654

  2. Mestre em Política Social pela Universidade Federal Fluminense - UFF, Niterói - Brasil. Áreas de estudo: divisão sexual do trabalho; trabalho de cuidado; políticas públicas.

    E-mail: mborgespricila@gmail.com; Lattes: http://lattes.cnpq.br/5934840994764716. ORCID: 0000-0003-1437-3660.

  3. Dissertação defendida em (31/08/2018), pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Política Social da UFF, orientada pela Profª Hildete Pereira de Melo.

reconhecimento e a representatividade. O Brasil é um dos campeões mundiais em baixa representação feminina na política. Por exemplo, nas Américas, estamos apenas à frente do Haiti em termos de representação parlamentar feminina.

A maior parte dos estudos sobre a participação das mulheres na política analisa cargos eletivos no legislativo ou no executivo, ligados à macro política. A questão é que os espaços de poder na política são inúmeros e diversos. A construção de lideranças políticas vêm muitas vezes de movimentos sociais organizados, como agremiações estudantis, sindicais, de luta por moradia ou terra, entre tantos outros.

Os fios condutores desta reflexão foram os conceitos da divisão sexual do trabalho e a representação política das mulheres como o fator mobilizador dessa dissertação: pesquisar o nível de participação política das mulheres trabalhadoras. E fazer isso analisando eleições para cargos eletivos como câmaras, senado ou ainda do executivo, partiria de uma distância muito grande entre o poder e o sujeito a ser estudado: as mulheres trabalhadoras. Por que, então, não analisar as instâncias de poder político menos distantes delas, os sindicatos?

Esta pesquisa se propôs a fazer algo novo no estudo sobre a representação das mulheres: analisar seu engajamento e participação nos sindicatos do Brasil. Travando o desafio de unir os debates entre o feminismo e o sindicalismo. Para tanto, abordou-se, nessa dissertação, o conceito de divisão sexual do trabalho na vida das mulheres como responsável pela subalternidade da condição feminina na sociedade e por conseguinte, na representação política. Embora não fosse um dos objetivos iniciais deste trabalho, essa dissertação acaba por trazer à luz alguns dos nomes de mulheres que participaram ativamente da organização dos trabalhadores e das trabalhadoras ao longo das últimas décadas, e que sistematicamente têm suas trajetórias invisibilizadas.

Ao longo dos Congressos da CUT é possível destacar algumas medidas importantes para o debate de gênero no interior da central como: em 1986, a proposta da criação de uma “Comissão da Questão da Mulher Trabalhadora - CQMT” dentro da entidade; em 1991, a aprovação em plenário de uma resolução da luta pela legalização do aborto, o que acabou por legitimar a entrada da CUT futuramente na Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos; em 1994, a aprovação da orientação política de cota mínima de 30% e máxima de 70% para cada gênero

nas diretorias da entidade; em 2003, a criação das Secretarias Nacional e Estaduais sobre a Mulher Trabalhadora.

A CUT, desde sua fundação, traz em seus documentos e resoluções uma preocupação com a realidade da mulher trabalhadora. Ao longo dos Congressos, é possível perceber através dos documentos, alguns elementos que sinalizam para as dificuldades das mulheres exercerem sua vida política por completo nos sindicatos. Há uma referência, em todos os anos analisados, à pauta da Creche como política pública de Estado, reivindicando o programa “Creche para todos” em diversos congressos e pontuando que esta precisa ser uma luta da entidade como um todo. Essa argumentação se baseia no debate sobre a divisão sexual do trabalho e até mesmo do trabalho invisível das mulheres exercido dentro de casa, sustentando que as mulheres permanecem sobrecarregadas no mercado ao serem responsáveis pela dupla função.

Além disso, em mais de um congresso analisado existe a demanda para que os espaços de encontros e congressos da CUT disponibilizem creche para as crianças, sustentando que a participação das mulheres na vida sindical fica prejudicada pela divisão sexual do trabalho e por elas serem as principais responsáveis pelo cuidado dos filhos. Há, inclusive, a construção de uma linha argumentativa, que se repete em alguns anos, que fala de uma “política adequada no movimento sindical que estimule e facilite a participação das mulheres”. Com algumas especificidades, esse argumento surge e ressurge ao longo dos anos, e condiciona a participação das mulheres na luta geral da classe trabalhadora à garantia desta política. Fica evidente, com a repetição de apresentações neste sentido, a dificuldade das mulheres em se desonerarem das obrigações da vida e do espaço privado para conseguir viver em plenitude a sua vida pública, seja no sindicato, seja no mercado de trabalho.

É possível também assinalar a pressão feita pelas mulheres da CUT para a efetivação das políticas de cuidados na sociedade e no aparelho sindical: seja como formulações de políticas públicas acerca do tema da mulher trabalhadora e sindicalista, seja como políticas internas das entidades sindicais. A grande questão era e é evitar que estas políticas fiquem apenas setorizadas e registradas no caderno de resoluções a cada ano, para que não virem guetos femininos de discussão. Este é, inclusive, um forte debate quando da criação da Comissão Nacional sobre a

Questão da Mulher Trabalhadora na entidade. E isto acaba sendo reforçado pela própria estruturação dos documentos congressuais, em que a parte de discussão sobre mulheres chega sempre apresentada de maneira setorizada e não interseccional.

Apesar das tentativas de produção de políticas para aumentar a inserção das mulheres, como a aprovação de cota estatutária de 30% em 2008, percebe-se que os homens ainda são super-representados na executiva e direção nacional. Ao longo da trajetória analisada neste trabalho foi possível verificar que no ano de 1986 as mulheres eram apenas 6,70% dos cargos de diretoria e, na medida que as reivindicações feministas avançaram na sociedade, em 1994 as mulheres conseguiram chegar a uma taxa de participação de 32% nos cargos de direção. Em 2000 a presença feminina atingiu seu ápice com 40% de participação. Em 2003 o número voltou a cair para 35,5% e em 2009 chegou a 29,6%. Observa-se que o movimento sindical segue à risca o viés de gênero que caracteriza nossa sociedade e que o patriarcado permanece presente no sindicalismo, apesar das políticas de cotas implementadas pela CUT.

A partir dessas análises, é necessário aprofundar o conhecimento acerca das políticas para as mulheres defendidas ao longo dos anos nos congressos da CUT, como a questão da maternidade vivida pelas mulheres trabalhadoras; a socialização do cuidado pelo Estado; a precarização do trabalho das trabalhadoras domésticas e a questão das mulheres rurais, que aparecem com muita centralidade e frequência nas resoluções congressuais. É necessário cruzar as informações do que foi debatido nos congressos da CUT e o que se tornou política pública e direito para as mulheres trabalhadoras e, dessa forma, analisar a participação da CUT nas campanhas por estas garantias. No entanto, esta não foi uma questão tratada nesta pesquisa.

Pode-se concluir que há um limite para as políticas de promoção de maior participação das mulheres, seja por falta de uma instância que regule e fiscalize o cumprimento dessas medidas, seja pela extrema limitação gerencial dos cargos ocupados por essas mulheres. Além disso, apesar de grandes avanços na elaboração de políticas específicas de gênero, os setoriais de discussão sobre as relações de gênero acabam, aparentemente, por desonerar o restante da central sindical de uma incorporação mais ampla das políticas para as mulheres.

Referências


CUT. Caderno de Resoluções do CONCUT. Disponível em:

<http://cedoc.cut.org.br/resolucoes-de-congressos>; vários anos.


DELGADO, Maria Berenice. Mais Mulheres na direção da CUT. Estudos Feministas. ano 4. 138. 1996.


MELO, Hildete. CASTILHO, Marta. Trabalho reprodutivo no Brasil: Quem faz? Revista Economia Contemporânea. Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 135-158, jan./abr. 2009.


                       ; THOMÉ, Débora. Mulheres e poder: histórias, ideias e indicadores. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2018.


SOUZA-LOBO, Elisabeth. A classe operária tem dois sexos: trabalho, dominação e resistência – 2. ed. – São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2011.


                                       . O Gênero da Representação: Movimento de mulheres e representação política no Brasil (1980-1990) - Revista Brasileira de Ciências Sociais. nº 17. Ano 6. p. 7-14. Brasil. Outubro, 1991.