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V.19, nº 38, 2021 (jan-abr) ISSN: 1808-799 X


A OFENSIVA ANTIGÊNERO NA SOCIEDADE BRASILEIRA1


Luciana Sardenha Galzerano2


Resumo

O artigo objetiva compreender a gênese e difusão da ideologia de gênero e sua repercussão na sociedade brasileira. O termo busca naturalizar as questões de gênero e ideologizá-las, evitando que sejam enfrentadas a partir dos estudos científicos da área. Apoiamo-nos no marxismo e nas teorias que dele partem para analisar as relações sociais de sexo/gênero, e na epistemologia feminista que questiona o masculino dito universal na produção da ciência. Observamos que a disseminação do discurso sobre a ideologia de gênero resulta em ofensivas antigênero em diversos países, incluindo o Brasil.

Palavra-chave: Ideologia de Gênero; Gênero; Relações Sociais de Sexo; Divisão Sexual do Trabalho.


LA OFENSIVA ANTIGÉNERO EM LA SOCIEDAD BRASILEÑA


Resumen

El artículo investiga la génesis y difusión de la ideología de género y su repercusión en la sociedad brasileña. La expresión busca naturalizar las cuestiones de género y ideologizarlas, evitando que sean enfrentadas desde los estudios científicos del área. Nos apoyamos en marxismo y las teorías que de él surgen para analizar las relaciones sociales de sexo/género, y en la epistemología feminista que cuestiona al masculino universal en la producción científica. Observamos que la difusión del discurso de la ideología de género resulta en ofensivas antigénero en varios países, incluido Brasil.

Palabra chave: Ideología de Género; Género; Relaciones Sociales de Sexo; División Sexual del Trabajo.


THE ANTI-GENDER OFFENSIVE IN BRAZILIAN SOCIETY


Abstract

The article aims to understand the origin and diffusion of gender ideology and its repercussion in Brazilian society. The expression tries to naturalize gender issues and ideologize them in a way to avoid the discussion in scientific areas. We use Marxism as the theorical reference and the theories that emerges from it to analyze the social relations of sex. Also, we support the Feminist Epistemology that questions the universal male in the scientific production. It is observed that the diffusion of gender ideology results in anti-gender offensives in several countries, including Brazil.

Keyword: Gender Ideology; Gender; Social Relations of Sex; Sexual Division of Labour.



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1 Artigo recebido em 01/09/2020. Primeira avaliação em 22/09/2020. Segunda avaliação em 30/09/2020. Aprovado em 07/10/2020. Publicado em 25/02/2021.

DOI: https://doi.org/10.22409/tn.v19i38. 45703

2 Mestra em Educação pela Universidade Estadual de Campinas - Unicamp, Campinas - São Paulo, Brasil e doutoranda em Educação pela Universidade de São Paulo - USP, São Paulo - Brasil.

E-mail: lucianasgalzerano@gmail.com. ORCID: 0000-0002-5818-5461. Lattes: http://lattes.cnpq.br/5729695358938810.

Introdução


O objetivo deste estudo é compreender a gênese e difusão do discurso sobre a ideologia de gênero ou teoria do gender/gênero e sua repercussão na sociedade brasileira. O termo foi cunhado pela Igreja Católica, numa tentativa de retorno à naturalização e biologização do gênero. Ao utilizar o conceito ideologia, setores religiosos e conservadores buscam impedir que a questão seja debatida e enfrentada no campo de estudos científicos sobre a temática.

Neste trabalho compartilhamos do pressuposto central da epistemologia feminista, isto é, o questionamento do masculino dito universal na produção da ciência (HARAWAY, 1994; HARDING, 2002; LOWY, 2009). Nas palavras de Lowy (2009, p.

40), “as definições vigentes de neutralidade, objetividade, racionalidade e universalidade da ciência, na verdade frequentemente incorporam a visão de mundo das pessoas que criaram essa ciência: homens – os machos – ocidentais, membros das classes dominantes”. E brancos, acrescenta Hirata (2014).

Não se objetiva recriar a ciência e produzir um método feminista totalmente distinto quanto aos procedimentos e técnicas de coleta e investigação de informações, mas indagar o que tem sido e o que deveria ser objeto de conhecimento. O questionamento, portanto, situa-se no plano epistemológico (HARDING, 2002).

Sabendo que não há neutralidade na produção da ciência, buscamos produzir um conhecimento situado de orientação teórica feminista, isto é, teorizar a partir de um ponto de vista feminista (HARAWAY, 1994). O referencial teórico adotado será o materialismo histórico e dialético e as teorias que dele partem para analisar as relações sociais de sexo/gênero, sobretudo a partir da contribuição das feministas materialistas francesas. A teorização em torno dessa temática questiona o pensamento naturalista e afasta os grupos sociais de homens e mulheres da bicategorização biologizante machos-fêmeas (HIRATA e KERGOAT, 2009).

A adoção da noção de relações sociais de sexo/gênero não significa que consideramos tais relações como as predominantes na sociedade, tampouco que o elo de dominação homem-mulher é a estrutura essencial. Só é possível trabalhar em conjunto sobre a totalidade do social se compreendemos que as relações sociais são consubstanciais e coextensivas (KERGOAT, 2010).

A escolha do objeto de estudo, portanto, não advém de mero acaso. Acreditamos que analisar a criação e difusão do discurso sobre a ideologia de gênero

no âmbito das relações sociais pode auxiliar na compreensão dos modos pelos quais estão sendo reproduzidas e legitimadas as relações de forças vigentes, e constituir um caminho inicial em busca de sua superação.


Articulando relações sociais de classe e relações sociais de sexo/gênero


A compreensão do objeto ora analisado insere-se no âmbito da análise das relações sociais. Para Kergoat (2010), relação social é uma relação antagônica entre dois grupos sociais, instaurada em torno de uma disputa. As relações formam uma teia em que há separação e entrelaçamento, contradição e coerência (HIRATA e KERGOAT, 1994). Busca-se, ademais, uma abordagem que articule relações sociais de classe, conceito de tradição marxista, e relações sociais de sexo/gênero, termo desenvolvido pelas feministas materialistas francesas.

Os antropólogos e sociólogos que estudaram o conceito de sexo social/gênero fizeram-no com base no quadro histórico do movimento feminista que tomou consciência de uma opressão específica: a enorme quantidade de trabalho realizada gratuitamente pelas mulheres em benefício dos outros e em nome da natureza humana, do amor e do dever maternal. O trabalho reprodutivo/doméstico era atribuído exclusivamente às mulheres de forma naturalizada e era invisível, pois não visto, não reconhecido e tampouco remunerado3 (KERGOAT, 2009).

Na análise desse tipo específico de trabalho, termos como dupla jornada ou conciliação de tarefas tratam-no como mero apêndice do trabalho assalariado. Consideramos, entretanto, indissociáveis os trabalhos produtivo e reprodutivo. O funcionamento de ambos é essencial para a manutenção da lógica capitalista. Kergoat (2009) ressalta, ademais, que o trabalho doméstico exercido de forma gratuita e naturalizada pelas mulheres também interessa aos homens, uma vez que os livra da realização de tarefas indesejadas, como a limpeza do banheiro. Disso surge a reivindicação de que a exploração – conceito central do marxismo e base da relação antagônica entre as classes – era insuficiente para analisar a opressão sofrida pela mulher nas relações homem/mulher no seio da sociedade. Compreender essa opressão específica em sua relação com a exploração de classe fazia-se necessário.


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3 Para discussão mais aprofundada, recomendamos a leitura de Delphy (2015) e Federici (2019).

O tema do trabalho feminino foi a porta de entrada dos estudos e pesquisas francesas sobre mulheres e relações sociais de sexo/gênero nos anos 1960 e 19704. De modo geral, os estudos dialogavam com o marxismo – em referência ou em oposição – na elaboração dos novos conceitos e essa constitui uma das principais diferenças entre o feminismo francês e o norte-americano.

Na sociologia francesa, o estudo sobre a articulação entre relações sociais de classe e relações sociais de sexo/gênero vem sendo desenvolvida desde os anos 1970 por Daniele Kergoat, com o objetivo de compreender as práticas sociais de homens e mulheres diante da divisão social do trabalho (HIRATA, 2014).

As relações sociais de sexo/gênero acontecem entre dois grupos antagônicos, os homens e as mulheres, em que se estabelece uma relação hierárquica, ou seja, uma relação de poder. As diferenças entre as atividades desenvolvidas não provêm de causa biológica, trata-se de construções sociais que possuem uma base material, o trabalho, e são expressas por meio da divisão sexual do trabalho.

A divisão sexual do trabalho é, portanto, a forma de divisão do trabalho social decorrente das relações sociais de sexo/gênero. Essa forma é histórica e adapta-se aos diferentes contextos, mas há dois princípios organizadores que são válidos para todas as sociedades conhecidas no tempo e no espaço: 1) separação, que indica a existência de trabalhos masculinos e trabalhos femininos, havendo a destinação prioritária dos homens à esfera produtiva e das mulheres, à reprodutiva; 2) hierarquização, que expressa que o trabalho do homem vale mais que o da mulher, ocupando ele, portanto, funções consideradas de forte valor social agregado como políticas, religiosas, militares etc. Esses princípios são aplicados graças à difusão e legitimação da ideologia naturalista, que reduz o gênero ao sexo biológico e entende as práticas sociais como meras execuções de papéis sociais que são resultado de um destino natural (KERGOAT, 2009).

As relações sociais de sexo/gênero e a divisão sexual do trabalho são indissociáveis e formam, epistemologicamente, um sistema. A análise em torno desse sistema busca, por um lado, compreender historicamente como as relações sociais materializaram-se nas instituições e legislações que, comumente, reproduzem e


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4 Dentre eles, destacamos os trabalhos de Guilbert e Isambert-Jamati, de 1962, mas traduzido para o português em 1973; e de Mathieu (1975/1976). O Brasil seguiu essa mesma direção, tendo relevância os estudos de Saffioti (1969) e de Blay (1978); na geração seguinte, destacaram-se as pesquisas de Souza-Lobo (1991).

legitimam as relações de forças entre os grupos num determinado momento histórico; por outro, apresentar as novas tensões geradas, buscando entender de que modo elas deslocam as questões e possibilitam a deslegitimacão de regras, normas e representações consideradas naturais. Nesse sentido, o debate não se encontra apenas no campo epistemológico, mas também no político (KERGOAT, 2009).

Kergoat (2010) argumenta que a inserção da mulher no mercado de trabalho não é suficiente para gerar uma contradição interna às relações sociais de sexo/gênero. Há um paradoxo, pois ao mesmo tempo em que a situação da mulher melhora no mercado de trabalho, há uma intensificação da divisão sexual do trabalho:


A participação da mulher no mercado de trabalho aumenta, mas as segmentações, horizontais e verticais, entre empregos masculinos e femininos, perduram. As desigualdades de salário persistem, e as mulheres continuam a assumir o trabalho doméstico. A meu ver, no entanto, isso não representa nenhuma aporia ou contradição interna às relações sociais de sexo, mas aponta para o fato de que o capitalismo tem necessidade de uma mãodeobra flexível, que empenhe cada vez mais sua subjetividade: o trabalho doméstico assumido pelas mulheres libera os homens e, para as mulheres de alta renda, há a possibilidade de externalização do trabalho doméstico para outras mulheres (KERGOAT, 2010, p. 94).


Esse paradoxo indica a imbricação das diferentes relações sociais na própria gênese da divisão sexual do trabalho, e aponta a impossibilidade de analisá-las da mesma maneira. Para Kergoat (2010, p. 103):


Compreender melhor as relações sociais e seu entrelaçamento, analisálas e elaborar um método para pensálas, é dar um passo em direção à sua superação. Recusarse a pensar por ideias e categorias fixas (raciocínio que leva a aporias em termos de ação política, como vimos — cf. os debates sobre o uso do véu islâmico) permite recolocar no centro da análise o sujeito político (e não a vítima de múltiplas dominações), levando em consideração todas as suas práticas, frequentemente ambíguas e ambivalentes.


Ainda segundo Kergoat (2010), três são as relações sociais fundamentais na sociedade: raça5, sexo/gênero e classe. São consideradas estruturais porque são relações de produção cuja base material é o trabalho. Elas organizam a totalidade das práticas sociais, operam e se manifestam sob suas três formas canônicas: dominação,


5 Embora o termo raça tenha uma carga social e histórica e não haja consenso entre os sociólogos, seu uso aponta para um conceito político, cultural e social que não deve ser considerado no sentido biológico. Raça deve ser entendida como uma categoria construída socialmente, resultado de discriminação e produção ideológica (KERGOAT, 2010).

opressão e exploração. Nenhuma delas tem prioridade sobre a outra, não havendo, portanto, nenhum tipo de hierarquia. Essas relações são consubstanciais e coextensivas.

A consubstancialidade “é o entrecruzamento dinâmico e complexo do conjunto de relações sociais, cada uma imprimindo sua marca nas outras, ajustandose às outras e construindose de maneira recíproca” (KERGOAT, 2010, p. 100). Forma-se um nó que só pode ser desatado na perspectiva da análise sociológica, e não nas práticas sociais. Já a coextensividade aponta para o dinamismo das relações sociais, indicando que elas se reproduzem e coproduzem mutuamente.

Na análise a partir da consubstancialidade não se pode pensar que as relações de classe estão inscritas exclusivamente na instância econômica e que as relações de sexo/gênero unicamente na instância ideológica. Cada sistema, afirma Kergoat (2010), possui suas próprias instâncias que dominam, oprimem e exploram economicamente e que se articulam entre si, de modo intra e intersistêmico.


A eclosão da ideologia de gênero: gênese e difusão mundial


A criação e difusão global do termo ideologia de gênero acontece pela ação de sujeitos individuais e coletivos que são produtos e produtores das relações sociais. É fundamental, portanto, averiguar as disputas vinculadas a esse processo e identificar os sujeitos envolvidos.

Saffioti (1999) identifica n’O Segundo Sexo, publicado em 1949 por Simone de Beauvoir, a primeira manifestação sobre gênero, ainda que a autora não dispusesse do termo naquele momento6. Ao afirmar que “Ninguém nasce mulher, torna-se mulher”, Beauvoir questionou o feminino como resultado do naturalismo e fatalismo biológico e afirmou a importância de sua construção social. Para Saffioti (2000), a frase de Beauvoir reúne o único consenso que existe entre as feministas sobre o conceito de gênero:



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6 Em sua obra pioneira, A mulher na sociedade de classes, de 1969, Saffioti quase não dialoga – e quando o faz, é em tom crítico – com Simone de Beauvoir. À época, a autora fez a opção metodológica de não a adotar por considerá-la demasiadamente culturalista. Ganhou proeminência em seus escritos a obra A mística feminina, de 1963, da feminista norte-americana Betty Friedan. Mais tarde, Saffioti (1999, 2000) fez uma autocrítica sobre as opções adotadas naquele momento, chegando a afirmar que Friedan plagiou a obra de Beauvoir.

Todo mundo diz: gênero é uma construção social. Muitas vezes, porém, quem diz nem sabe o que isso significa; mas todo mundo está de acordo que o gênero não é biológico, que ele é social. Esse é o único acordo; não existe consenso sobre mais nada; cada uma pensa o gênero de uma maneira diferente: umas são pós-modernas, outras são humanistas, outras partem da diferença sexual, outras são indiferentes à diferença sexual, enfim, há feminismos, teorias feministas e não “a teoria feminista”, não “o feminismo” no singular (SAFFIOTI, 2000, p. 22-23).


O termo gênero ganhou curso a partir de 1970 no ambiente acadêmico estadunidense (MIGUEL, 2016), mas ele não teve aceitação inicial em todas as partes do globo. Na sociologia francesa, por exemplo, gênero apresentava uma existência quase marginal, tendo sido elaborada e preferida a noção de sexo social.7

Portanto, ainda que o gênero tenha ganhado destaque no feminismo num curto espaço de tempo, o conceito nunca foi unânime. A trajetória de constituição do campo de estudos varia em cada contexto social; diversas correntes do feminismo e da teoria queer interpretam o gênero e sua relação com o sexo biológico de maneiras distintas. Se, por um lado, a tradição marxista influenciou discussões feministas em determinados contextos sociais, como é o caso do Brasil e da França, sobretudo nas décadas de 1970 e 1980, por outro, há feministas que não dialogam com a obra de Marx e seus intérpretes e tampouco se reivindicam materialistas8. Isso significa que

que as relações entre o feminismo e o marxismo não são rígidas e mecânicas9.

Esse vasto e complexo campo de estudos sobre gênero é desconsiderado na criação e difusão da terminologia ideologia de gênero ou teoria do gender/gênero. Foge ao escopo deste trabalho realizar um debate profundo sobre os distintos usos do conceito ideologia, mas importa afirmar que, sua utilização pela Igreja Católica e seus aliados expressa uma tentativa de ideologizar as questões de gênero, evitando que ela seja debatida e enfrentada no campo de estudos científicos sobre a temática. Setores religiosos e conservadores homogeneízam as distintas vertentes dos estudos científicos da área e atuam com o objetivo de deslegitimá-las na sociedade. Ao


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7 Sobre a evolução no tratamento da questão de gênero na França, ver Hirata (1989) e Hirata e Kergoat (2005).

8 O pensamento queer, do qual Judith Butler é uma das principais expoentes, costuma ser associado a uma corrente pós-moderna e pós-estruturalista, inspirando-se, em grande medida, na reflexão do filósofo francês Michel Foucault. Autoras como Arruzza (2011) e Noyé (2019) têm buscado aproximar o feminismo materialista e o movimento queer.

9 Foge ao escopo deste trabalho realizar uma análise sobre essas relações. Para aprofundar os estudos, recomendamos as obras de Hartmann (1979) e Arruzza (2019).

disseminarem o combate a uma suposta ideologia, esses setores defendem sua própria posição ideológica: antigênero e anticiência.

Há certo consenso entre diversos autores10 sobre a disseminação da recente ofensiva antigênero como uma reação de setores conservadores e religiosos às iniciativas feministas que tiveram êxito na inserção da categoria gênero nas conferências sociais da Organização das Nações Unidas a partir da década de 1990. Duas conferências chamaram a atenção da Igreja Católica: uma sobre população e desenvolvimento, realizada no Cairo, em 1994, e outra sobre as mulheres, em Pequim, em 1995.

A construção de uma doutrina contrária ao gênero teve início com o pontificado de Wojtyla (João Paulo II). Junqueira (2017) destacou três documentos eclesiásticos em que a ideologia de gênero ganhou notoriedade: uma nota da Conferência Episcopal do Peru de abril de 1998 (La ideologia de género: sus peligros y alcances)11, um documento da Cúria Romana de julho de 2000 (Família, Matrimônio e “uniões de fato”), o dicionário enciclopédico de 2003 (Lexicon: termos ambíguos e discutidos sobre família, vida e questões éticas)12. O Lexicon ganhou destaque; objetivava desmascarar termos ambíguos que servem para “camuflar estratégias contrárias à dignidade da pessoa e da família e à tutela da vida humana” (JUNQUEIRA, 2017, p. 39). Com relação ao gênero, há um rechaço de seu uso como categoria analítica e uma denúncia da promoção da desnaturalização da ordem sexual13.

O pontificado de Ratzinger (Bento XVI), a partir de 2005, foi marcado por pronunciamentos polêmicos sobre gênero e sexualidade. Seus discursos funcionaram como um sinal verde, fazendo eclodir um movimento transnacional antigênero, presente em mais de 50 países. Apesar dos distintos contextos, algumas características são comuns: defesa da família natural, fundada no matrimônio heterossexual e destinada à reprodução da vida; e defesa da primazia das famílias na educação moral e sexual dos filhos (JUNQUEIRA, 2017). Delineou-se, assim, o inimigo comum a ser combatido: a ideologia de gênero, como ficou conhecida no Brasil


10 Destacamos Rosado-Nunes (2015), Miguel (2016), Miskolci e Campana (2017), Junqueira (2017), Machado (2018).

11 A nota foi produzida pelo monsenhor Oscar Alzamora Revoredo, Bispo Auxiliar de Lima à época.

12 Os trabalhos foram conduzidos pelo presidente do Conselho Pontifício para a Família, à época, o cardeal colombiano Alfonso López Trujillo.

13 Segundo Rosado-Nunes (2015) há diversidade interna no catolicismo, não podendo tratá-lo como um bloco homogêneo. Para ela, o conservadorismo da Igreja Católica está ligado aos setores cujo discurso e prática são contrários aos direitos sexuais e reprodutivos.

e em outros países da América Latina, ou a teoria do gender/gênero14, na França e na Itália.

Além dos documentos e discursos da Santa Sé, destacaram-se produções de sujeitos ligados a organizações conservadoras e/ou religiosas. Em sua obra The Gender-Agenda: redefining equality, a jornalista e escritora norte-americana Dale O’Leary15 (1997) discutiu a radicalização do feminismo a partir das influências do pensamento marxista. Essa ideia da existência de uma relação mecânica feminismo- marxismo permitiu articular discursos sexistas e perspectivas políticas de combate ao socialismo; tal articulação foi rapidamente difundida e incorporada nos documentos da Igreja Católica (MACHADO, 2018).

Na América Latina, disseminou-se o livro do advogado argentino Jorge Scala16 (2010), denominado Ideologia de gênero: El género como herramienta de poder. Para ele, os estudos de gênero não se constituem em campo teórico, pois não partem de uma hipótese verificada experimentalmente, mas sim de um pressuposto falso, considerada por ele como uma ideologia. Afirmara ainda que a ideologia de gênero se impõe por meio da educação formal e dos meios de comunicação.

Para os setores religiosos e conservadores, o termo gênero, sem conotação ideológica, está relacionado ao conceito de natureza humana. Essa é entendida como decorrência de uma lei natural que é criada por Deus, comprovada pela biologia e incapaz de ser alterada. As diferenças biológicas conformam as mulheres à esfera doméstica, legitimando sua exclusão da esfera pública e reforçando sua inferioridade social e política. Há, portanto, uma exaltação dos papéis tradicionalmente classificados como femininos: esposas e mães. A defesa da família tradicional, que a Igreja Católica ajudou a moldar e que é um de seus fundamentos, é essencial para a organização de sua própria reprodução social e ideológica, num contexto de expansão da secularização (MIGUEL, 2016).

Ao questionar a ideia de natureza humana e de lei divina, as proposições feministas colocam em xeque um dos fundamentos da Igreja Católica, por isso são


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14 Rosado-Nunes (2015) destaca que, em determinados discursos católicos, o termo aparece em inglês (gender) numa tentativa de enfatizar a imposição cultural realizada pelos Estados Unidos. Para Junqueira (2017), o uso em língua inglesa objetiva, ainda, demonstrar sua “origem alienígena”.

15 A jornalista é ligada à Opus Dei, representa o lobby católico Family Research Council e participa do National Association for Research & Therapy of Homosexuality, que promove terapias reparadoras da homossexualidade (JUNQUEIRA, 2017).

16 É católico e professor de bioética (MACHADO, 2018).

classificadas como ideológicas, no sentido de falseamento da realidade. Sobre isso, Rosado-Nunes (2015, p. 1251-1252) afirma:


Os argumentos centrais para o tratamento negativo de gênero como uma ideologia perniciosa vinculam-se às suas concepções sobre a moral sexual e reprodutiva, e, por consequência, sobre família, alicerçadas em sua compreensão da “natureza humana”. A estrutura organizacional católica assenta-se em relações de poder hierárquicas e androcêntricas, construídas sobre diferenças sexuais consideradas definitivamente marcadas pela biologia. As proposições feministas ancoradas em uma perspectiva de gênero ou de relações sociais de sexo como prefere parte das especialistas francesas, questiona e desconstrói essa visão fixista e biologizante da natureza humana. Tal desconstrução afeta fortemente o edifício real e simbólico católico.


Nos últimos anos, os discursos contra a ideologia de gênero deslocaram-se dos contextos vaticanos e adentraram o âmbito político. Miskolci e Campana (2017) destacaram que, apesar de ter surgido no âmbito da Igreja Católica, setores evangélicos também aderiram à causa. Somam-se a eles, as organizações não governamentais pró-vida com características ligadas à religião e ao conservadorismo e outros grupos que apoiam a causa não apenas por motivos religiosos, como é o caso do Movimento Escola Sem Partido, no Brasil. Esses grupos atuam por meio de ações políticas (lobbies legislativos ou denúncias a funcionários públicos, sobretudo professores), jurídicas (apresentação de ações judiciais) e midiáticas (manifestações públicas, programas de rádio e televisão, congressos, redes sociais etc.).

Essa breve digressão demonstra que a gênese e difusão do termo ideologia de gênero caricaturiza17 e deslegitima um vasto campo de estudos sobre a temática ao mesmo tempo em que serve de arcabouço ideológico na disputa das políticas sociais. Para Machado (2018), o confronto envolvendo as questões de gênero retoma uma antiga disputa entre as esferas religiosas e científicas sobre a noção de verdade e como devem ser pensadas as relações humanas e a ordem social. A esfera religiosa apropria-se de ideias do campo científico para defender uma concepção que relaciona a verdade à fé e à autoridade divina.

Não nos esqueçamos, ademais, que as disputas envolvendo as questões de gênero e de sexualidade possuem base material: o trabalho e sua divisão social. As relações sociais ora destacadas têm se materializado em políticas sociais que tendem


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17 Rotulações como feminazis, destruidores de família, gayzistas tornaram-se comuns na sociedade brasileira.

a reproduzir e legitimar essa correlação de forças que favorece os interesses de grupos religiosos e conservadores e que perpetua a dominação, a opressão e a exploração. A biologização do gênero que naturaliza e atribui vontade divina aos supostos papéis sociais a serem desenvolvidos por homens e mulheres contribui para a intensificação e legitimação da divisão sexual do trabalho que confina as mulheres à esfera reprodutiva.


A ideologia de gênero no Brasil


Os discursos e documentos produzidos pela Santa Sé bem como as produções de O’Leary18 (1997) e de Scala19 (2010) chegaram em território latino-americano e influenciaram nas disputas relacionadas às temáticas de gênero e sexualidade nas políticas sociais. Para Miskolci e Campana (2017), esses embates ganharam relevância especial na América Latina, pois, por um lado, aconteceram avanços nos direitos sexuais e reprodutivos em alguns desses países nos últimos anos (descriminalização do aborto, reconhecimento de união homoafetiva, inclusão da educação sexual nas escolas20), por outro, há um certo distanciamento de católicos das normas de moral sexual impostas pelo Vaticano.

Apesar das diferenças em cada contexto nacional, Miskolci e Campana (2017) elencaram elementos comuns na América Latina: 1) aconteceram a partir da virada do milênio, 2) insurgiram nos países que passaram a ter governos mais alinhados à esquerda, 3) deflagraram-se em torno das reformas educacionais e legais.

Analisando o contexto em nosso país, Miguel (2016) afirmara que dois fenômenos se destacaram. O primeiro refere-se a uma retração dos consensos mínimos que, acreditava-se, demarcavam o debate público brasileiro; os direitos têm sido abertamente desafiados em nome da tradição, da moral ou mesmo da vontade divina. O segundo relaciona-se a uma aliança estabelecida entre o conservadorismo moral e o ultraliberalismo econômico, que se tornou a base da direita brasileira; sua


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18 O Movimento Escola Sem Partido disponibilizou uma tradução condensada da obra de O’Leary em seu site.

19 Publicado no Brasil em 2011 e distribuído pelo Observatório Interamericano de Biopolítica.

20 Para analisar os avanços e desafios envolvendo o gênero nas políticas educacionais, recomendamos Vianna e Unbehaum (2004), Carreira et al (2016), Vianna (2018).

ação conjunta gerou um programa sui generis, em que o Estado não deve interferir nas relações econômicas, mas deve regular intensamente a vida privada21.

Machado (2006) destaca que o fundamentalismo religioso se tornou uma força política no Brasil a partir da década de 1990, sobretudo com o investimento das igrejas neopentecostais para eleger seus pastores. O fundamentalismo advém da percepção de que há uma única verdade, divina e inconteste, que anula qualquer possibilidade de debate. Em trabalho posterior, Machado (2018) identificara uma aliança cada vez maior entre católicos e pentecostais, apesar das diferenças entre eles. Os primeiros destacaram-se pela defesa da vida, enquanto os segundos deram prioridade ao tema da sexualidade, combatendo a ampliação dos direitos sexuais.

O fortalecimento político dos pentecostais na Câmara de Deputados com a indicação do deputado e pastor Marco Feliciano (PSC-SP) para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em 2013 e, após, com a eleição de Eduardo Cunha (PMDB) para a presidência da casa, em 2015, também favoreceu os grupos católicos comprometidos com a luta contra a ideologia de gênero, que passaram a ser convidados a expressar suas ideias em diversas situações (MACHADO, 2018).

Ambos os segmentos (católicos e pentecostais) têm se aliado a diversas forças conservadoras no Congresso, com destaque para os latifundiários e os defensores dos armamentos. A ação conjunta desses setores costuma ser designada pela mídia como Bancada BBB, que significa boi, bala e Bíblia.

A eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, deu novo impulso ao fortalecimento desses setores. A Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional22 cresceu e passou a ser composta por 195 deputados, representando aproximadamente 18,5% do total. Em 2019, a Frente passou a ser coordenada por Silas Câmara (Republicanos- AM), pastor evangélico da Igreja Assembleia de Deus (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2019).

Na cruzada contra uma suposta ideologia de gênero no Brasil existe um bloco heterogêneo, composto por sujeitos diversos que se unem para combater o que elegeram como inimigo comum. Além das bancadas constituídas por legisladores


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21 Casimiro (2018) utiliza a expressão Nova Direita para designar a articulação entre grupos que aliam liberalismo econômico e autoritarismo social.

22 Lembremos que, embora a designação mais conhecida seja Bancada Evangélica, ela aglutina diferentes denominações protestantes e setores conservadores da Igreja Católica (MIGUEL, 2016).

ligados a grupos religiosos diferentes, há a atuação de sacerdotes e missionários que prestam assessoria parlamentar, fazem lobbies e expõem suas ideias em audiências públicas e seminários. Ao perceberem a insuficiência do discurso moral e religioso nas disputas, buscam acionar a retórica científica por meio da convocação de mulheres jovens que possuem formação universitária e que atuam em ONGs vinculadas às igrejas ou em movimentos como a Renovação Carismática Católica, o Pró-vida e Pró- família etc. (MACHADO, 2018).

Para além das discussões e disputas no âmbito do poder executivo, na sociedade civil, indivíduos (sacerdotes, pastores, bispos etc.) e grupos conservadores

– religiosos ou não – utilizam a mídia impressa e televisiva e as redes sociais para disseminar suas ideias. Dentre esses grupos, destaca-se a atuação do Observatório Interamericano de Biopolítica e do Movimento Escola Sem Partido.

O Observatório autodeclara-se uma “organização de cidadãos livres, conscientes e ativos dedicada à defesa da dignidade e dos direitos da pessoa humana”. Afirmam estar empenhados em contribuir para as condutas parlamentares comprometidas com a vida, a família, a educação e a liberdade (OBSERVATÓRIO, s/d). É dirigido pelo professor católico Felipe Nery. O Observatório foi o responsável pela distribuição do livro do advogado argentino Jorge Scala no Brasil.

O Movimento Escola Sem Partido (MESP) autodeclara-se uma “associação informal, independente, sem fins lucrativos e sem qualquer espécie de vinculação política, ideológica ou partidária”. Afirma estar preocupado “com o grau de contaminação político-ideológica das escolas brasileiras, em todos os níveis: do ensino básico ao superior”. Criado em 2004, foi baseado no grupo estadunidense No Indocrination; seu coordenador é o advogado Miguel Nagib (NAGIB, s/d).

Miguel (2016) destaca que, embora o Movimento tenha ganhado visibilidade e força política na luta contra a ideologia de gênero, ele nasceu com outra agenda: a luta contra a suposta doutrinação marxista existente nas escolas. Machado (2018) assevera que a difusão da errônea articulação rígida e mecânica entre marxismo e feminismo permitiu a ação conjunta dos setores religiosos com o Movimento Escola Sem Partido. Contribuíram para tal articulação propagandistas de extrema-direita, principalmente aqueles aliados a Olavo de Carvalho, que afirma que a dissolução da moral sexual tradicional é uma estratégia comunista (MIGUEL, 2016).

Inicialmente, a principal estratégia adotada pelo MESP foi a judicialização da relação entre professores e alunos. Após, o movimento passou a pressionar as

assembleias estaduais e municipais por projetos de leis que legitimassem suas propostas, criando o que se denominou Programa Escola Sem Partido23; a Frente Parlamentar Evangélica dominou as comissões em que os projetos foram discutidos. O MESP constitui exemplo de grupo que alia o conservadorismo moral e o liberalismo econômico, uma vez que há alianças entre o Movimento e grupos liberais como Instituto Millenium (IMil)24 e Movimento Brasil Livre. Nagib foi colaborador do Instituto e chegou a escrever artigo afirmando que a escola deve promover os valores do IMil: propriedade privada, responsabilidade individual e meritocracia25 (PERONI,

CAETANO, LIMA, 2017).

De acordo com Miskolci e Campana (2017), o discurso sobre a ideologia de gênero ganhou notoriedade no Brasil a partir de 2011, quando o Supremo Tribunal Federal reconheceu que a união homoafetiva tinha o mesmo status do casamento heterossexual. No mesmo mês dessa decisão, ganhou destaque a polêmica sobre o material didático do programa Escola sem homofobia, apelidado posteriormente pelos conservadores de kit gay26.

A luta contra uma agenda feminista no Congresso Nacional se intensificou com a apresentação do Projeto de Lei que discutiria o Plano Nacional de Educação (PNE)27. O documento, que deveria se referir aos anos de 2011-2020, foi aprovado com quase quatro anos de atraso e com muitas mudanças em sua versão original.

O texto final da Conferência Nacional de Educação (Conae) de 201028 trazia avanços frente às políticas vigentes para a educação no decênio anterior; entretanto



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23 É lícito ressaltar que foi Flávio Bolsonaro, senador e filho do atual presidente da república, Jair Bolsonaro e, à época, deputado do Estado do Rio de Janeiro (PSC), quem solicitou à Miguel Nagib a elaboração de um projeto de lei baseado nos princípios do Movimento Escola Sem Partido.

24 Em 2018, o IMil era o 34º maior centro de pensamento das Américas Central e do Sul, segundo o ranking Global Go To Think Tank¸ elaborado pela Universidade da Pensilvânia (INSTITUTO MILLENIUM, 2019).

25 Ressalta-se que Nagib se desvinculou do IMil e o artigo deixou de constar na página eletrônica do ESP.

26 Após sofrer forte oposição, a então presidente Dilma Rousseff vetou a distribuição do material. Vale lembrar, entretanto, que a polêmica em torno da existência de um suposto kit gay foi recuperada por setores religiosos e conservadores e voltou à tona nos meses que precederam as eleições presidenciais brasileiras em 2018.

27 Para aprofundamento da questão, recomendamos a leitura do dossiê intitulado Caminhos na construção do Plano Nacional da Educação: questões desafiadoras e embates emblemáticos, publicado pela revista Educação & Sociedade, em seu número 112. Seu acesso está disponível em:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=0101-733020100003&lng=pt&nrm=iso.>.

28 A Conae, ocorrida em Brasília, em 2010, foi precedida pelas conferências municipais, regionais e estaduais. Todas as etapas contaram com a participação de professores, gestores educacionais, estudantes, pais, pesquisadores e demais sujeitos e segmentos organizados em torno da educação

sua transformação no PL n. 8.035/2010, pelo governo brasileiro, não refletiu o conjunto das deliberações aprovadas. Além disso, o PL apresentava limites quanto à ausência de diagnóstico da realidade educacional brasileira e de processos avaliativos sobre o cumprimento das metas do PNE anterior (2001-2010) (OLIVEIRA et al, 2011). As mudanças pelas quais passou essa política demonstra as intensas disputas envolvidas no decorrer do processo. A Frente Parlamentar Evangélica foi uma das principais interlocutoras do Ministério da Educação nos movimentos que culminaram

na retirada de discussões de gênero e sexualidade do PNE29.

Naquele momento, D. Orani Tempesta, cardeal e arcebispo do Rio de Janeiro publicou um texto denominado Reflexões sobre a ‘ideologia de gênero’ que dialogava com documentos produzidos pela Santa Sé. Rosado-Nunes (2015) afirmara que o cardeal ocupava lugar de destaque na hierarquia eclesiástica, o que lhe conferia capital simbólico e real considerável. Não à toa, sua publicação influenciou fortemente as discussões do PNE.

A atuação do Observatório Interamericano de Biopolítica também foi intensa. Em 2014 realizou dois seminários cuja temática era a defesa da vida e da interpretação naturalista dos gêneros feminino e masculino. A tônica era auxiliar no assessoramento de parlamentares que estavam discutindo e votando o PNE. Nos anos seguintes, outros eventos semelhantes foram reproduzidos nos estados e municípios, quando da discussão dos Planos Estaduais e Municipais de Educação30 (MACHADO, 2018).

Em 2015, o Observatório (2015) publicou a cartilha “Você já ouviu falar sobre a ideologia de gênero? Conheça esta ideologia e entenda o perigo que você e seus filhos estão correndo!”. Esse material foi distribuído gratuitamente em sites de organizações cristãs e redes sociais com o intuito de popularizar o discurso sobre a ideologia de gênero e alertar sobre os supostos riscos da introdução do termo gênero nos planos municipais e estaduais de educação.

O Movimento Escola Sem Partido também teve atuação significativa nessa direção. Ao identificar na ideologia de gênero um potencial de visibilidade, o MESP


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brasileira – da creche à pós-graduação. O objetivo era fornecer os subsídios necessários para elaboração do PNE (OLIVEIRA el al, 2011).

29 Para compreender as disputas envolvendo as temáticas relacionadas ao gênero no PNE, recomendamos a leitura de Rosado-Nunes (2015), Reis e Eggert (2017), Luna (2017).

30 Após homologação do PNE, seguiu-se o desafio de elaboração ou adequação de planos de educação nos estados, no Distrito Federal e nos municípios.

abandonou a defesa de uma educação pretensamente neutra e apostou na ideia de primazia da família sobre a escola. Assim, reivindicava que as escolas não podem trabalhar qualquer conteúdo que seja contrário aos valores prezados pelos pais, tanto no que se refere às questões de gênero e sexualidade, quanto a outros conteúdos científicos como a teoria da evolução das espécies ou o heliocentrismo (MIGUEL, 2016).

Estabelecida a hierarquia entre família e escola, com o predomínio irrefutável da primeira, o slogan “Meus filhos, minhas regras”31 ganhou visibilidade nas redes sociais e passou a ser repetido nas intervenções públicas do grupo e de seus aliados. De acordo com Miguel (2016, p. 603-604), esse slogan sintetiza duas negações importantes:


A primeira é a negação do caráter republicano da instituição escolar. Sua função pedagógica incorpora também – e de forma central – a educação para o convívio com as diferentes visões de mundo, próprio de uma sociedade pluralista e democrática. A socialização na escola é importante, entre outros motivos, porque oferece às crianças o contato com valores diversos, ou diversamente interpretados, daqueles que estão presentes na família. A segunda é a negação do estatuto da criança como sujeito de direitos – o que inclui, aliás, o direito de conhecer o mundo e de adquirir os instrumentos para pensar com a própria cabeça.


Desde então, os temas envolvendo gênero e sexualidade têm se configurado nos mais polêmicos na elaboração e implementação de políticas educacionais brasileiras. E a influência dos setores religiosos e conservadores cresce. No documento final da Base Nacional Comum Curricular (BNCC)32, por exemplo, a sexualidade aparece limitada à prática heterossexual e reprodutiva e não há qualquer menção ao termo gênero33.


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31 É evidente a provocação ao slogan feminista “Meu corpo, minhas regras”.

32 Para compreender a influência da manipulação em torno da ideologia de gênero na BNCC, recomendamos Freire (2018).

33 O número de ocorrências do termo gênero nas diferentes versões da BNCC demonstra o intenso debate em torno dessa categoria na construção do documento. Na primeira versão gênero aparece 15 vezes e na segunda, 38. As terceiras versões são fragmentadas, há uma que trata da Educação Infantil e do Ensino Fundamental, em que gênero aparece 19 vezes, e outra que se refere ao Ensino Médio, em que aparece 1 vez. Na proposta final homologada pelo MEC não há qualquer menção ao termo.

Considerações finais


Os estudos sobre a epistemologia feminista auxiliam na compreensão de que a produção de ciência não é neutra e de que a existência de um suposto universal masculino frequentemente anula as visões de mundo daqueles que são dominados, oprimidos e explorados. As teorizações em torno da consubstancialidade das relações sociais buscam compreender historicamente a reprodução e legitimação dessa tríade dominação-opressão-exploração e apontar a existência de caminhos para sua superação.

Na inobservância de hierarquia entre as relações sociais fundamentais – raça, gênero e classe –, todas as lutas são legítimas, necessárias e igualmente importantes. Analisar os processos sociais pelo privilegiamento de uma única relação social obscurece as outras clivagens existentes na sociedade. A análise da gênese e difusão de uma ofensiva antigênero considerando a consubstancialidade das relações sociais é, portanto, fundamental para compreender por que se reproduz os diferentes modos de opressão e para apontar a necessidade e possibilidade de superá-los.

O sistema epistemológico relações sociais de sexo/gênero-divisão sexual do trabalho auxilia no questionamento da bicategorização biologizante de homens e mulheres como machos e fêmeas, respectivamente. Os sujeitos são dotados de vontades que independem da natureza biológica ou da vontade divina. As consequências desse processo ultrapassam os limites acadêmicos; mudanças de ordem prática podem ser geradas: liberdade sexual, rearranjos familiares, união homoafetiva, descriminalização do aborto, reconhecimento da diversidade sexual, criminalização da homofobia, equiparação salarial entre homens e mulheres, inclusão da educação sexual nas escolas etc.

Lembremos, entretanto, que a mudança de mentalidades acontece quando há conexão com a base material, isto é, com a divisão de trabalho concreta. E, as resistências só podem ser originadas nas práticas sociais e não nas relações intersubjetivas, ainda que ambas estejam relacionadas (KERGOAT, 2009).

A gênese e difusão da ideologia de gênero é caracterizada pela ação de diferentes sujeitos – individuais e coletivos – e a repercussão desse processo é marcada por intensas disputas. De um lado, setores religiosos e conservadores; de outro, movimentos feministas, LGBTQIA+ e simpatizantes; ainda que não sejam homogêneos, os grupos buscam aliar-se naquilo que consideram comum.

A disputa entre as esferas religiosas e as científicas em torno da noção de verdade é evidente. Ainda que os setores religiosos busquem atribuir um tom de cientificidade em seus discursos dando voz a sujeitos com formação superior ou ligadas ao âmbito acadêmico, a tônica que prevalece é o fundamento da fé, da moral e da vontade divina. Ao notarem a insuficiência argumentativa de seu discurso, esses setores adotam outras estratégias com o objetivo de deslegitimar o campo de estudos científicos da área: homogeneização das teorias do gênero, desconsiderando a complexidade de vertentes existentes; sua caricaturização, gerando denominações pejorativas como feminazi e gayzista; e sua denominação de ideologia, no sentido de falseamento da realidade, ignorando a cientificidade e validade dos estudos desenvolvidos.

A materialidade das disputas é notável na discussão sobre os papéis sociais que devem ser desenvolvidos por homens e mulheres. Ao naturalizar as relações sociais de sexo/gênero, setores conservadores e religiosos reproduzem e legitimam uma divisão sexual do trabalho que limita as mulheres à esfera do trabalho reprodutivo. A reprodução dos papéis tradicionalmente exercidos pelas mulheres – mães e esposas – atende aos interesses dos diferentes setores religiosos, que mantêm os fiéis sob sua dominação; dos setores burgueses, que seguem explorando o trabalho não-pago; dos homens, que se veem livres de realizar os afazeres domésticos necessários a sua própria sobrevivência.

Lembremos do paradoxo do trabalho doméstico. As mulheres inserem-se no mercado de trabalho, mas seguem assumindo os afazeres domésticos ou delegando- os para outras mulheres e, frequentemente, seus salários são menores que o dos homens, mesmo exercendo a mesma função. A divisão sexual do trabalho não apenas permanece, mas é intensificada. “Tudo muda, mas tudo permanece igual”, nas palavras de Kergoat (2010, p. 94). Isso não significa, entretanto, que a divisão sexual do trabalho é rígida e imutável.

A ofensiva antigênero vivenciada pelos diferentes países também funciona como uma forma de legitimar a violência aos sujeitos que não se enquadram no padrão biologizante de feminino e masculino. As consequências podem ser drásticas. De acordo com o Atlas da Violência 2020, no Brasil, em 2018 uma mulher foi assassinada a cada duas horas, tendo alcançado o número de 4.519; as negras representaram 68% desse total. O percentual de mulheres vítimas de violência no interior da residência foi 2,7 maior do que os homens; uma mulher foi assassinada

dentro de casa a cada 6 horas e 23 minutos. No período entre 2008 e 2018 o território brasileiro apresentou aumento de 4,2% nos assassinatos de mulheres e, nos anos entre 2013 e 2018, a taxa de homicídios na residência aumentou 8,3%. Esses dados evidenciam a dimensão da violência de gênero e do feminicídio, sobretudo de mulheres negras (CERQUEIRA, BUENO, 2020).

Com relação à violência contra a população LGBTQIA+, o Atlas da Violência 2020 demonstrou que houve um crescimento de 88% no registro de tentativas de homicídios de 2017 para 2018. Os dados do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (SINAN), que categorizam as informações somente pela orientação sexual (bissexual, homossexual ou heterossexual) mostraram que a maioria das vítimas eram negras (com exceção das vítimas bissexuais, em 2017), solteiras e moravam em áreas urbanas (CERQUEIRA, BUENO, 2020).

De acordo com dados coletados por Júlio Pinheiro Cardia, ex-coordenador da Diretoria de Promoção dos Direitos LGBT do Ministério dos Direitos Humanos, entre os anos de 2011 e 2018, 4.422 pessoas LGBTs foram assassinadas no Brasil, equivalendo a uma morte a cada 16 horas. As informações, disponibilizadas pelo pesquisador para a UOL, fazem parte de relatório encomendado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos no final de 2018. Ressalta-se que, nos últimos anos o governo federal cancelou a divulgação dos relatórios sobre o assunto (SOBRINHO, 2019).

As questões de gênero e sexualidade estavam entre as mais emblemáticas na elaboração e aprovação das políticas educacionais nos últimos anos. Como meio privilegiado para veicular conhecimentos, valores e ideologias, a instituição escolar tem se caracterizado como um intenso espaço de disputas. No Brasil, o Plano Nacional de Educação constitui caso exemplar. O slogan de uma educação neutra como defendem grupos como o Movimento Escola Sem Partido e o Observatório Interamericano de Biopolítica oculta a interpretação de que a escola, na verdade, precisa ser neutralizada. Os confrontos envolvendo as temáticas de gênero e sexualidade ilustram essa situação; impedir sua discussão nas salas de aula é estratégico para reproduzir a divisão sexual do trabalho e legitimar as situações de opressão, dominação e exploração vivenciadas cotidianamente pelas mulheres e pela população LGBTQIA+, sobretudo as negras.

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