V.20, nº 42, 2022 (maio-agosto) ISSN: 1808-799 X
KOSSAK, Alex2. Novo Ensino Médio ou renovação das condições de manutenção da velha dualidade educacional? 2020, 442f. Dissertação [Mestrado em Educação] – Programa de Pós-Graduação em Educação, Contextos Contemporâneos e Demandas Populares, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Seropédica (RJ); Nova Iguaçu (RJ), 2020.
Esta dissertação se desenvolveu sob a orientação do Prof. Dr. José dos Santos Souza no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação, Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), na Linha de Pesquisa “Desigualdades Sociais e Políticas Educacionais”. Este trabalho se desenvolveu de forma vinculada ao projeto de pesquisa intitulado “Mediações entre a escola e o mundo do trabalho na formação de técnicos de nível médio”, elaborado no Grupo de Pesquisas Sobre Trabalho, Política e Sociedade (GTPS), sob a coordenação desse mesmo professor e contou com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) 3.
O Ensino Médio no Brasil é historicamente marcado por uma dualidade estrutural manifestada em uma educação distinta para as diferentes classes sociais. No contexto de crise orgânica do capital, a classe dominante busca recompor suas bases de acumulação de capital por meio da reestruturação produtiva e da renovação dos mecanismos de mediação do conflito de classes, com vistas à manutenção das condições objetivas e subjetivas do sociometabolismo do capital. Nos
1 Resumo expandido recebido em 28/05/2022. Aprovado pelos editores em 03/06/2022. Publicado em 21/07/2022. DOI: https://doi.org/10.22409/tn.v20i42.54679.
2Mestre em Educação pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). E-mail: alexkossak@hotmail.com. Lattes: http://lattes.cnpq.br/2166901116621860. ORCID: 0000-0002-9150-388X.
3 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001. Acesso a tese: https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/trabalhoConclusao/viewTrabalhoConclu sao.jsf?popup=true&id_trabalho=10568613.
desdobramentos dessa recomposição burguesa, percebe-se no campo estrutural grande processo de desindustrialização, desemprego estrutural e intensificação da precariedade do trabalho. No campo superestrutural, percebe-se a redefinição da relação do Estado com a Sociedade, de seu papel e de seus modelos gerenciais, propagando assim um novo modelo de gestão pública que enaltece a ideologia do Estado Mínimo. É neste contexto em que o Ensino Médio vem sendo reformado para atender de forma mais imediata às demandas de formação de um trabalhador de novo tipo, mais adequado tanto às demandas de produtividade e competitividade das empresas quanto às demandas éticas e morais de um modo de regulação social orientado pela lógica mercantil. Tais reformas visam mudanças não só na gestão dos sistemas e das unidades escolares, mas também na gestão do currículo, tendo como referências estruturais a ideologia da sustentabilidade, do empreendedorismo e da empregabilidade. Diante deste contexto, elegemos como objeto de análise as mudanças curriculares promovidas pela parceria público-privada entre o Instituto Ayrton Senna e a Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro, onde a ideologia privada foi institucionalizada a partir da Deliberação Nº 344 do ano de 2014, do Conselho Estadual de Educação, como uma espécie de “laboratório” para a Reforma do Ensino Médio que ocorreu subsequentemente na instância federal. Para esta análise, tomamos como referência empírica, a proposta do “Ensino Médio em tempo integral, com ênfase em empreendedorismo aplicado ao mundo do trabalho” implementada a partir da Resolução SEEduc/RJ Nº 5.508/2017. Nosso objetivo foi explicar a relação entre a concepção de Ensino Médio contida na parceria “Solução Educacional” estabelecida entre o Instituto Ayrton Senna e a SEEduc/RJ e a Reforma do Ensino Médio instituída pela Lei Nº 13.415/2017. Trata-se de uma pesquisa básica, de abordagem qualitativa, de caráter explicativo, que se insere na categoria de pesquisas de tipo documental, embora também se utilize de instrumentos típicos de um levantamento cuja fonte de coleta de dados são entrevistas semiestruturadas aplicadas a gestores escolares, embora também se valha de fontes bibliográficas primárias e secundárias (legislação, documentos governamentais, projetos pedagógicos etc.).
No primeiro capítulo apresentamos o problema da pesquisa, a delimitação do objeto de estudo e os procedimentos metodológicos adotados. O segundo capítulo
trata de uma revisão da literatura4 sobre o objeto de estudo como uma primeira inserção investigativa. Foram realizadas buscas em repositórios importantes para a área de educação, dentre eles a Scientific Electronic Library Online (SCIELO); a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDBTD) do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT); os trabalhos publicados em anais das reuniões científicas da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd); o Indexador Online de Periódicos na Área da Educação (EDUC@), vinculado à Fundação Carlos Chagas (FCC); e o Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
No prosseguimento da pesquisa, o terceiro capítulo constitui-se no desenvolvimento de nossa fundamentação teórica, assim como nossa metodologia, e a reflexão sob a influência dos Organismos Internacionais no campo educacional brasileiro por meio da análise dos documentos por estes produzidos. Aqui utilizamos categorias analíticas importantes para o desenvolvimento das reflexões produzidas como sociometabolismo do capital (MÉSZÁROS, 2011), crise orgânica do capital (GRAMSCI, 2007), recomposição burguesa (SOUZA, 2015), nova gestão pública (SOUZA, 2015), racionalidade do capital (DARDOT; LAVAL, 2016), capital humano (FRIGOTTO, 2006; SOUZA, 2005), pedagogia das competências (RAMOS, 2006). Assim, fundamentamos e explicitamos como ocorre o processo de captura da subjetividade e conformação do nexo psicofísico (ALVES, 2007) da classe trabalhadora pelo capital e seu sistema sociometabólico.
No quarto capítulo procuramos apontar e descrever o percurso dos dispositivos legais que regulam sob a educação básica no Brasil e no Estado do Rio de Janeiro, principalmente no que condiz o Ensino Médio. Aqui apontamos dispositivos como resolução, leis, portarias que constituem o processo de Reforma (contrarreforma) do Ensino Médio, antecedentes e sucessores da Lei federal 13.415/17 (BRASIL, 2017) e da Deliberação Nº 344 do ano de 2014, do Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro (RIO DE JANEIRO, 2014).
No quinto capítulo, trazemos a análise da nossa referência empírica, o curso de “Ensino Médio em Tempo Integral com ênfase em Empreendedorismo Aplicado ao Mundo do Trabalho”, e os resultados do levantamento das informações no Estado do
4 Tomamos como marco temporal de partida para realizar as pesquisas a institucionalização da LDB, no ano de 1996, até o ano de 2018.
Rio de Janeiro. Foram entrevistados os gestores de quatro escolas públicas do estado do Rio de Janeiro.
A análise desenvolvida na pesquisa nos permitiu constatar que a nova pedagogia política do capital, baseada na pedagogia das competências e no ideário da terceira via, parte de proposições disseminadas pelos organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), a Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (CEPAL) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), para construir a concepção do “Novo Ensino Médio” presente não só na parceria estabelecida entre o Instituto Ayrton Senna e a SEEduc/RJ, mas também na parceria desta com o SEBRAE. Tais resultados nos levaram à conclusão de que a Reforma do Ensino Médio em curso no Brasil tem como um de seus laboratórios a experiência do Estado do Rio de Janeiro e que, a despeito do que consta no discurso oficial, tal reforma corrobora a manutenção da desigualdade social e das condições sociometabólicas do capital por meio da captura da subjetividade do trabalhador, conformando-o, seja no aspecto psicofísico, seja no aspecto ético e moral.
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