V.21, nº 44, 2023 (janeiro-abril) ISSN: 1808-799 X


EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL DO SÉCULO XXI: POLÍTICAS,

CRÍTICAS E PERSPECTIVAS VOL. 1 E 2 [José Deribaldo Gomes dos Santos, Domingos Leite Lima Filho, Henrique Tahan Novaes – Orgs.]1


Hemerson Moura2 Ana Carolina Bordini Brabo Caridá3


Passados sete anos do golpe empresarial-parlamentar-jurídico-midiático que destituiu o governo Dilma Rousseff e mergulhou o Brasil em uma tragédia personificada na figura de um governante ilegítimo e outro facínora, o livro Educação profissional no Brasil do século XXI: políticas, críticas e perspectivas ganha o seu segundo volume em um contexto auspicioso porque vemos no nosso horizonte a possibilidade real de reconstrução do país, a começar pela necessária revogação da contrarreforma do Ensino Médio (Lei 13.415/2017).

Composta por dois volumes organizados pelos professores e pesquisadores doutores José Deribaldo Gomes dos Santos (GPTREES/UECE), Domingos Leite Lima Filho (GETET/UTFPR) e Henrique Tahan Novaes (GPOD/Unesp-Marília), esta coletânea reúne textos de pesquisadoras/es das cinco regiões do país vinculadas/os a instituições educacionais sediadas em 14 estados da federação – algo que, de certo modo, atesta a riqueza da diversidade de olhares que o livro congrega – e traz grande contribuição para a luta política da classe trabalhadora, para o campo de estudos


1 Resenha recebida em 27/03/2023. Aprovada pelos editores em 28/03/2023. Publicada em 13/04/2023. DOI: https://doi.org/10.22409/tn.v21i44.57848.

2 Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia e Sociedade na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (PPGTE-UTFPR). Mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Professor de Sociologia do Instituto Federal do Maranhão (IFMA) - Campus São João dos Patos. E-mail: hemerson@alunos.utfpr.edu.br.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/1093967469321053. ORCID: https://orcid.org/0009-0006-9633-716X.

3 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia e Sociedade na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (PPGTE/UTFPR). Mestra em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Docente em Sociologia no Instituto Federal de Santa Catarina - Campus São José (IFSC/SJ). Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Trabalho, Educação e Tecnologia (GETET-UTFPR). E-mail: carolcarida@gmail.com.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/7147483920181186. ORCID: https://orcid.org/0009-0000-5845-314X.


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Trabalho e Educação, de maneira mais ampla, e para as pesquisas sobre Educação Profissional, de modo particular.

O volume 1, lançado no ano de 2021, conta com prefácio escrito por Marcos Vinicius Francisco, apresentação assinada pelos organizadores e 9 capítulos divididos em duas partes. A Parte I – Educação profissional e políticas educacionais é composta por 4 capítulos e a Parte II - A expansão das redes estaduais e federal de educação profissional: críticas e perspectivas, por outros 5.



O volume 2, por sua vez, publicado em 2023, prefaciado por Eneida Shiroma e também apresentado pelos organizadores, possui 12 capítulos no total, mantém a


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mesma estrutura do primeiro volume, com duas partes de mesmo título, alterando-se apenas o número de capítulos da Parte II, composta por 8 textos.

O livro vem a público em um contexto de transformação da educação brasileira operada legalmente por meio da Lei 13.415/2017, da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio (BNCC, 2018) e da Base Nacional Comum para Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação, 2019). Todos estes dispositivos têm impactado drasticamente a organização das redes de ensino, o currículo e a formação docente, com seus efeitos concretos sendo sentidos mais recentemente com o início do processo de implementação nas redes estaduais.




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As autoras e autores da coletânea estão atentos às mudanças recentes na educação brasileira. Jamais perdem de vista o fato de que as constantes reformas são parte da estratégia do capital-educador para levar à frente o processo de empresariamento da educação através de institutos e fundações que têm atuado entranhados e de forma descentralizada na estrutura do Estado. Também não perdem de vista o fato de que a atuação empresarial compõe o quadro de tentativas burguesas de sanar a crise estrutural do capital que a cada dia se torna mais aguda e irremediável.

Dessa forma, a obra acaba também por nos oferecer um contraponto científico- ético-político à atual contrarreforma do Ensino Médio. Fazem isso a partir de diversos estudos que, de um lado, apresentam densidade teórico-conceitual, e de outro, problematizam empiricamente o que vem acontecendo no chão das escolas. Operam com propriedade categorias da pesquisa educacional vinculada à tradição marxista tais como formação humana omnilateral, politecnia, trabalho como princípio educativo, dualidade estrutural da educação, dentre outras.

Como sabemos, a Educação Profissional (EP) brasileira ganhou novos contornos na primeira década do século XXI no marco do Decreto 5.154/2004, que revogou o Decreto 2.208/1997, e da Lei 11.892/2008, que criou os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Assim, o livro atualiza o estado da arte da EP no país, demonstrando que nas últimas duas décadas essa modalidade educacional ganhou espaço na agenda de agências multilaterais e tem sido propagandeada por setores do empresariado como a solução para o desemprego crônico. Setores estes, aliás, que têm induzido o Estado na condução da formação de uma mão de obra barata e dócil para um mercado de trabalho precarizado com ampla difusão da ideologia do empreendedorismo.

Nessa esteira, além de importantes debates terem sido suscitados, em especial em torno do Ensino Médio Integrado (EMI) e suas diferentes concepções, a expansão da EP, conforme documenta a obra, se torna a tônica da União, dos estados da federação e, principalmente, da iniciativa privada. Embora seu foco na análise da EP esteja evidenciado no título, cabe salientar que a coletânea reflete de maneira ampla sobre como os projetos formativos vêm se transformando na educação brasileira após as iniciativas de desmonte e privatização dos direitos, característica do capitalismo dependente de corte ultraneoliberal.



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Estudando os desdobramentos desses processos desencadeados no início do século, os inúmeros objetos de pesquisa analisados neste livro testemunham que a EP no Brasil se materializa de maneira heterogênea, a depender da região do país, da unidade da federação, da inter-relação entre as políticas educacionais nacionais, da instituição que executa a política educacional, do alinhamento dos governos à proposta de precarização curricular e formativa demandada pelo capital, e das correlações de força entre setores da burguesia e representantes do projeto educacional da classe trabalhadora.

Em sua profundidade conceitual e empírica, os dois volumes contemplam todas as regiões do país, realizando análises da realidade da EP em escolas federais, estaduais e privadas. Com a leitura do conjunto é possível ter uma visão ampliada das aproximações e distanciamentos em relação aos distintos projetos formativos presentes em cada instituição abordada. A obra contribui ainda, para os leitores iniciantes, com a compreensão da gênese da EP, seu desenvolvimento ao longo da história, suas contradições, suas diferenças nas distintas redes de ensino e suas mais recentes configurações nesse país de dimensões continentais.

Em que pese o imperativo da síntese, faz-se necessário ao menos registrar a variedade dos temas abordados em cada um dos volumes, pois é neles que se desenrola o exposto até aqui. Na Parte I do volume 1 as investigações se debruçam sobre: a profissionalização precarizada como uma exigência capitalista; as apropriações conceituais sobre a tecnologia no campo Trabalho e Educação; o processo de implementação do Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio no Paraná; as políticas de qualificação profissional dos cortadores de cana em Alagoas. Na Parte II, três textos apresentam pesquisas acerca da expansão das redes de EP dos estados de São Paulo, Ceará e Piauí; um texto aborda as contradições no perfil socioeconômico dos estudantes atendidos pelo EMI do Instituto Federal de São Paulo (IFSP); e um realiza um balanço da EP em Goiás, apresentando criticamente algumas conquistas no interior do Instituto Federal de Goiás (IFG).

No volume 2, a Parte I é composta por textos que versam sobre: a relação entre trabalho, tecnologia, ciência e cultura como base para a formação integral na Educação Profissional e Tecnológica; conquistas e contradições em um curso técnico integrado ao Ensino Médio do Centro Paula Souza em São Paulo; os elementos históricos e conceituais da educação profissionalizante no Brasil que expressam o seu



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caráter classista; a produção acadêmica brasileira acerca da Pedagogia da Alternância.

A Parte II, ainda do volume 2, aborda: as redes estaduais de EP no Ceará, Espírito Santo e Bahia; a pós-graduação em Ensino Tecnológico do Instituto Federal do Amazonas (IFAM); as políticas de formação do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) direcionadas ao seu próprio corpo docente; as alterações no ambiente político e social brasileiro dos últimos vinte anos e seus impactos na Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT); a oferta de EP no Maranhão no contexto de expansão da RFEPCT; as reiteradas tentativas de intervenção do governo federal, entre 2019 e 2022, nessa mesma Rede.

Como esperamos ter evidenciado, acima de tudo a coletânea deixa candente a luta de classes contemporânea por distintos projetos de educação e sociedade. Na obra, o debate acerca da contraposição entre uma educação libertadora que forme para além do capital versus o projeto da burguesia de empresariamento da educação se complexifica frente a empiria e a diversa realidade nacional, abrindo caminhos para aprofundar as análises, sugerindo a sequência de estudos e pesquisas.

Pelo exposto, recomendamos enfaticamente este livro para todos, iniciantes e iniciados, que desejam compreender a educação no Brasil nesse conturbado e já longo século XXI. Se os próprios organizadores fizeram questão de registrar a insuficiência de dois volumes para abarcar “a gama de questões que cercam a educação profissional no contexto de crise estrutural do capital” (LIMA FILHO; SANTOS; NOVAES, 2023, p. 19), aguardamos ansiosos pelo volume 3 que certamente nos brindará com estudos de outras realidades das unidades da federação ainda não contempladas, azeitando ainda mais o debate educacional brasileiro.


Referências


SANTOS, J. D. G. dos; LIMA FILHO, D. L; NOVAES, H. T. (Org.). Educação

profissional no Brasil do século XXI: políticas, críticas e perspectivas - vol. 1. Marília: Oficina Universitária; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2021. 272 p.


LIMA FILHO, D. L; SANTOS, J. D. G. dos; NOVAES, H. T (Org.). Educação

profissional no Brasil do século XXI: políticas, críticas e perspectivas - vol. 2. Marília: Oficina Universitária; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2023. 376 p.


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