construir competências e habilidades necessárias para a inserção em um mercado
de trabalho radicalmente interativo, digital e desafiador também sustenta a proposta.
No entanto, tal argumento se mostra imerso numa contradição, uma vez que, frente
a tudo que já foi exposto, é possível perceber que este movimento de reestruturação
tecnológica tem sido implementado no sentido de transformar trabalho vivo em
trabalho morto, gerando cada vez mais indivíduos desempregados
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Além disso, é preciso destacar também que este discurso da educação 4.0
produz uma desconfiguração e uma limitação da função docente. Neste contexto, o
professor perde um pouco da profundidade de sua atuação e passa a ser apenas
um mediador e motivador do processo. O aluno, aqui, aprende sozinho, de forma
autônoma, através de práticas e metodologias ativas. É uma simplificação e redução
da educação, que perde sua abrangência teórica, emancipatória e humana e passa
a ser concebida apenas com a função de produzir adaptação da força de trabalho ao
sistema de produção. Sobre essas metodologias ativas e construtivistas focadas no
“aprender a aprender” e no “aprender fazendo”, Newton Duarte (2011) afirma que o
conceito de aprendizagem significativa acaba se tornando uma ideia ligada apenas
aos interesses e realidades dos estudantes, fundada em um ideário iminentemente
pragmático, representada por um projeto educacional raso, superficial, aligeirado e
que não traz nenhum tipo de expansão ou alargamento da visão do aprendizado,
das necessidades e das expectativas do processo de ensino e aprendizagem, nem a
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Vale notar que este argumento, em última análise, se relaciona diretamente com a questão da
empregabilidade: um discurso perverso que transfere toda responsabilidade do desemprego ao
indivíduo, negando as causas sociais e sistêmicas que geram a falta de oportunidades de trabalho. A
estratégia aqui é mascarar a crise estrutural do mundo do trabalho e atribuir o desemprego ao
indivíduo que não reúne as competências e habilidades demandadas pelo mercado.
compreensão, é necessário recordar que no contexto político, econômico e social brasileiro das
décadas de 1960 e 1970, vários sociólogos se dedicaram à análise das transformações contraditórias
em que o desenvolvimento do país se deu. Florestan Fernandes (1975) analisou, neste ínterim, o
processo de revolução burguesa nacional dentro de um contexto de capitalismo dependente. A
conclusão do autor indicou que a natureza do processo de modernização conservadora do Brasil
impunha o fato de que, aqui, este movimento não se deu com a superação do atraso representado
pelas elites nacionais (sobretudo as elites agrárias), cuja atuação reforçava a situação de
dependência e subalternidade do país, visto apenas como fornecedor de matéria-prima bruta para os
países centrais. Muito pelo contrário, o caso brasileiro usou o atraso como motor de impulsionamento
da modernização (FERNANDES, 2009). Nessa mesma direção, sinaliza Francisco de Oliveira (2003)
para quem, no Brasil, foi o arcaico que alavancou o processo de expansão e acumulação capitalista,
produzindo, como consequência disso, uma pequena classe superprivilegiada e uma numerosa
massa de pobres e miseráveis. Não se nega, portanto, que o processo de modernização
conservadora do país tenha se dado a partir das marcas do atraso, dentre as quais se destacam o
autoritarismo, o coronelismo, a manutenção da exploração, da dependência e da desigualdade.