V.22, 49 - 2024 (setembro-dezembro) ISSN: 1808-799 X Dissertação de Mestrado 1 LOPES, Cláudia Cerqueira 2 . As consequências da precarização do trabalho na vida escolar do(a) estudante trabalhador(a) da EJA (educação de jovens e adultos 3 . 2023. 105f. Dissertação (Mestrado em Educação Profissional em Saúde) Fiocruz, Rio de Janeiro. Resumo expandido Esse trabalho é resultado da pesquisa realizada para o mestrado da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio Fiocruz, e tem o propósito de investigar os impactos da precarização do trabalho na vida escolar de estudantes trabalhadores(as) matriculados(as) no Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA) localizado no bairro da Maré, no município do Rio de Janeiro. Para dissertar sobre o tema foi preciso examinar as transformações ocorridas no capitalismo, desde as três últimas décadas do século XX, que modificaram o mundo do trabalho. A história da EJA está relacionada com a evolução do capitalismo global, o qual têm relações com o desenvolvimento do capitalismo no Brasil. O Estado brasileiro sempre esteve à disposição da burguesia, garantindo o seu desenvolvimento. Tal benefício se manifesta por meio de políticas públicas que garantem a reprodução do capitalismo e os privilégios da burguesia. A EJA é afetada por essa dinâmica do capitalismo e seus sujeitos, em sua grande maioria, constituem a parcela da população mais explorada. “A EJA sempre se destinou aos(as) subalternizados(as) da sociedade, ou seja, a classe trabalhadora” (Ventura, 2001, p. 2). 3 Dissertação defendida em 18/03/2024, orientada pelas professoras Marise Ramos e Filippina Chinelli. Link: https://epsjv.phlnet.com.br/beb/textocompleto/mfn21918.pdf . 2 Mestre pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio - FIOCRUZ, Rio de Janeiro - Brasil. E-mail: claudiacerqueiralopes@gmail.com . Lattes: http://lattes.cnpq.br/9327466479224762. ORCID: https://orcid.org/0009-0008-8023-9658 1 Dissertação recebida em 25/09/2024. Aprovada pelos editores em 31/10/2024. Publicado em 05/12/2024. DOI: https://doi.org/10.22409/tn.v22i49.64828 1
Para Gerbelli (2022), a vida dos(as) estudantes da EJA é afetada pelo avanço do capitalismo flexível, da financeirização e da plataformização, acarretando o agravamento da precarização da vida dos sujeitos da EJA. A partir de meados da década de 1970 o capitalismo mundial vivenciou uma crise do modelo taylorista-fordista de produção. Esse padrão não conseguia mais garantir as exigências de acumulação do capitalismo. Como afirma Harvey (2016, p. 135), as dificuldades de acumulação do capitalismo foram atribuídas à rigidez do padrão que se manifestava na produção, no mercado de trabalho, na esfera política, nos gastos públicos, impedindo a expansão do capital. A rigidez apontada no mercado de trabalho vem sendo utilizada como justificativa para o ataque sistemático aos direitos trabalhistas promovido pelos donos do capital na atualidade. A saída encontrada para os problemas de rigidez desse sistema produtivo, foi a “flexibilidade”. Harvey (2016, p. 140) chama essa resposta à rigidez fordista de acumulação flexível que “se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrão de consumo”. O Capitalismo flexível está ancorado no acelerado desenvolvimento tecnológico que vem se verificando desde a crise do fordismo, esse avanço das tecnologias é a base das transformações no mundo do trabalho e na vida social. Segundo Antunes (2020, p. 13), “as tecnologias de informação e comunicação (TIC), configuram-se, então, como um elemento central entre os distintos mecanismos de acumulação criados pelo capitalismo financeiro de nosso tempo”. Os(as) empresários(as) colhem os lucros, aos trabalhadores(as) a exploração sem limites, a precarização em todas as dimensões da vida. O trabalho precário se expande e atinge diversos setores da produção sendo muito difícil encontrar profissionais que não dependam de alguma forma do uso do celular ou da internet. O(A) estudante trabalhador(a) da EJA se encaixa bem nesse processo de precarização, por se encontrar entre o segmento da população mais pobre, com baixos níveis de escolarização e qualificação profissional. Como resultado de uma profunda terceirização das atividades laborais, introduzida pelo toyotismo, surge no Brasil na década de 2000, o trabalho plataformizado. Trata-se de um modelo de negócios que se adequa perfeitamente às características da economia flexível, à produção enxuta e à terceirização. 2
O fenômeno da plataformização é uma das faces do processo de precarização do trabalho. Esse fenômeno relaciona-se à dinâmica de expansão e reconfiguração da economia capitalista. O campo empírico e seus sujeitos Para atingirmos os objetivos propostos no estudo foi conduzida uma pesquisa empírica a fim de definir o perfil dos sujeitos do CEJA MARÉ. Essa ação foi realizada por meio da aplicação de questionários e entrevistas semiestruturadas na escola, no período noturno. O questionário foi aplicado a 45 estudantes. Posteriormente, foram entrevistados 4 estudantes, sendo 2 trabalhadores de aplicativos e duas trabalhadoras terceirizadas. Ao analisarmos o perfil étnico do grupo selecionado, percebemos que uma predominância de negros em sua composição. A pesquisa revela que no CEJA MARÉ, a maioria dos estudantes são mulheres negras. As problemáticas ligadas à raça e ao gênero se intercalam, resultando em diversas violações de direitos para esse grupo. Entre as pessoas entrevistadas, 77,8% exercem atividade remunerada e 53,3% possuem carteira assinada. A maioria desses (as) estudantes recebe até um salário-mínimo e tem até 3 dependentes. Apesar de grande parte dos (as) participantes da pesquisa ter carteira assinada, estes (as) estudantes estão expostos (as) ao processo de precarização do trabalho. Os questionários aplicados nos fizeram notar que, no grupo dos(as) trabalhadores(as) com carteira assinada, uma expressiva quantidade de trabalhadores(as) terceirizados(as) desempenhando a função de serviços gerais (SG). Diante desse novo fato foi necessário investigar as condições de trabalho desse grupo de forma mais detalhada. A análise dos dados obtidos no questionário e nas entrevistas mostram que tanto a plataformização como a terceirização são expressões da precarização do trabalho que atinge os sujeitos da EJA. Devido à sua condição de classe trabalhadora, estes(as) estudantes sofrem as consequências das políticas neoliberais que acentuam ainda mais a exploração do capital sobre o trabalho, retira direitos, rebaixa, salários e desorganiza coletivos de trabalho dificultando a luta da classe trabalhadora por melhores condições de reprodução da vida. Esse processo 3
tem efeito negativo sobre as diversas tentativas de escolarização dos(as) estudantes trabalhadores(as) da EJA. A conjuntura econômica macroestrutural tem gerado instabilidade no emprego e na vida dos estudantes da EJA. Essa realidade impacta de forma adversa a rotina escolar dos estudantes. Para entender as variadas alterações associadas às transformações do capitalismo que impactam o universo do trabalho, abordamos os conceitos de reestruturação produtiva, neoliberalismo, precarização do trabalho, terceirização e plataformização. Em seguida, esses conceitos foram conectados aos referenciais teóricos da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Nesse contexto, percebemos que essas transformações têm um efeito direto sobre a classe trabalhadora, resultando em insegurança social para os(as) trabalhadores(as) estudantes da EJA. Como resultado do estudo identificamos o perfil socioeconômico do grupo analisado, identificando que um número significativo de estudantes recebe até um salário-mínimo mensal. Verificamos também que o fenômeno da plataformização é pouco expressivo no ambiente estudado. Ficou evidente que um quantitativo considerável de trabalhadores(as) de serviços gerais (SG) terceirizados. Diante desse resultado, o estudo precisou ser redimensionado levando-se em consideração as condições concretas de vida desses(as) trabalhadores(as) estudantes. Sendo assim, foi necessário estender o questionário semiestruturado a trabalhadoras terceirizadas, a fim de comparar o nível de precarização do trabalho entre esses dois grupos: os(as) trabalhadores(as) plataformizados(as) e os(as) terceirizados(as). A partir da análise dos questionários ficou claro que o processo de precarização do trabalho atinge de forma desumana a ambos os grupos. Percebemos durante a comparação dos dados, que as características dos fenômenos apesar de diferentes, são manifestações de um mesmo processo. 4
Referências ANTUNES, R. Uberização, trabalho digital e indústria 4.0 . Boitempo Editorial, 2020. GERBELLI, C. V. de C. A destruição da EJA é um projeto racista. Le Monde Diplomatique Brasil , [ s. l ], p. 1-6, 2022. HARVEY, D. Condição pós-moderna . Edições Loyola, 2016. VENTURA, J. P. Educação de Jovens e Adultos Trabalhadores no Brasil: revendo alguns marcos históricos. [site da] Universidade Federal Fluminense . Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: http://cpa.sites.uff.br/wp-content/uploads/sites/296/2017/12/educacao-jovens-adultos -trabalhadores-revendo-marcos.pdf . Acesso em 20 de novembro de 2023. 5