V.22,
nº
49
-
2024
(setembro-dezembro)
ISSN:
1808-799
X
EDITORIAL
TN
49
JUVENTUDE
TRABALHADORA
À
DERIVA
E
SUAS
EXPERIÊNCIAS
DE
CLASSE
1
O
presente
número
temático
da
Revista
Trabalho
Necessário
nos
convida
a
refletir
sobre
os
grandes
dilemas
vividos
pelos
filhos
e
filhas
da
classe
trabalhadora.
Como
sinaliza
Krein
(2013),
na
primeira
década
do
século
XXI,
o
capitalismo
já
apontava
a
tendência
de
flexibilização
das
relações
entre
capital
e
trabalho
e,
portanto,
da
precarização,
ainda
maior
das
condições
de
vida
dos
jovens
e
adultos
trabalhadores.
Na
atualidade,
experimentamos
o
fenômeno
da
plataformização,
onde
a
juventude
se
vê
compelida
a
uma
sobrecarga
de
várias
ocupações,
cuja
finalidade
é
somar
uma
renda
que
lhe
possibilite
a
satisfação
de
suas
necessidades
básicas.
Tais
elementos
se
constituem
como
parte
integrante
da
gestão
da
crise
capitalista,
colocada
como
central
desde
os
anos
1980
no
Brasil.
Durante
a
Conferência
de
abertura
do
XIX
Seminário
de
Produção
Científica
do
Grupo
THESE,
realizada
em
novembro
de
2024,
o
professor
José
Dari
Krein
(Unicamp)
afirmou
que
a
juventude
está
no
mercado
de
trabalho
para
aumentar
ainda
mais
a
competitividade;
fez
alusão
ao
apelo
ideológico
feito
pelos
empresários,
no
sentido
de
que
os
jovens
tornem-se
empregáveis,
sem
garantias
reais
de
alocação
no
mercado.
No
atual
cenário,
cresce
o
trabalho
precarizado
no
telemarketing,
no
fast
food,
no
turismo
e
no
cuidado,
e
há
uma
perda
vertiginosa
de
sentido
do
trabalho
como
realização
humana,
e,
como
falsas
respostas
à
crise
social,
o
Estado
aponta
para
a
Reforma
Trabalhista,
o
empreendedorismo,
a
empregabilidade
e
a
qualificação
profissional.
1
Editorial
recebido
em
03/12/2024.
Aprovado
pelos
editores
em
04/12/2024.
Publicado
em
05/12/2024.
DOI:https://doi.org/10.22409/tn.v22i49.65616
1
A
contrarreforma
do
ensino
médio
segue
imersa
na
oferta
de
itinerários
formativos
que
mantém
a
lógica
de
uma
formação
minimalista
para
filhos
e
filhas
da
classe
trabalhadora.
São
poucos
os
que
conseguem
chegar
até
o
ensino
superior
no
Brasil,
e,
quando
chegam,
enfrentam
as
carências
de
uma
política
de
acesso
e
permanência
que
possibilite
a
continuidade
dos
estudos.
Diante
da
vitória
de
Donald
Trump
nas
eleições
presidenciais
dos
EUA,
o
imperialismo
segue
com
apelos
neofascistas,
impondo
um
comportamento
subordinado
da
periferia
do
capitalismo,
orientando
políticas
de
ajuste
fiscal,
com
a
finalidade
de
promoção
de
cortes
no
financiamento
de
políticas
sociais
e
incentivo
às
privatizações
em
larga
escala.
A
Reforma
Trabalhista
é
parte
do
aprofundamento
da
condição
de
precarização
do
trabalho,
uma
vez
que
a
terceirização
das
atividades
fins
tem
fragilizado
a
organização
dos
trabalhadores
e
aumentado
a
disputa
pelo
fundo
público.
Atualmente
a
juventude
trabalhadora
vive
sob
a
pressão
de
grandes
questões
postas
em
ordem
planetária,
e
que
demandam
ações
urgentes,
sob
o
risco
de
ameaça
à
vida
das
pessoas:
o
crescimento
exponencial
da
degradação
ambiental
e
climática,
o
colonialismo
racista,
sexista
e
as
estratégias
de
colonização
clássica
(tal
como
a
experimentada
há
anos
pela
ação
de
Israel
contra
a
Palestina),
e
a
superexploração
do
trabalho,
associados
à
crise
capitalista,
com
perdas
de
direitos.
Estes
são
elementos
que
nos
colocam
diante
de
um
mundo
reverso
à
solidariedade
e
à
construção
da
esperança.
A
superexploração
do
trabalho
demanda
da
juventude
trabalhadora
que
ela
se
torne
empregável,
acompanhando
as
exigências
galopantes
do
mercado
de
trabalho.
Ao
mesmo
tempo,
como
manifestação
das
contradições
entre
capital
e
trabalho,
a
juventude
está
entre
a
crise
civilizatória
do
capitalismo
e
os
apelos
das
organizações
da
classe
trabalhadora
na
demonstração
de
que
um
outro
mundo
é
possível.
Entre
as
experiências
de
resistência
que
se
manifestam
como
“experiências
de
classe”
(Thompson,
1987)
o
Movimento
Vida
Além
do
Trabalho
(VAT)
de
luta
pela
redução
da
jornada
de
trabalho,
tem
tido
à
frente
uma
liderança
jovem,
negra,
periférica,
conseguindo
adesão
e
mobilização
de
jovens
e
adultos
trabalhadores
em
manifestações
de
rua,
shopping
centers
e
redes
sociais.
A
reivindicação
é
pelo
fim
da
escala
6X1,
que
vem
exigindo
que
os
trabalhadores
e
trabalhadoras
tenham
direito
a
apenas
2
um
dia
de
“descanso”
por
semana.
A
luta
é
para
garantir
qualidade
de
vida,
o
que
requer
tempo
livre
para
a
família,
para
o
esporte,
o
lazer,
para
o
ócio;
enfim,
requer
tempo
para
‘viver’.
Como
disse
um
ativista:
“
Quero
saber
quando
é
que
nós,
da
classe
trabalhadora,
iremos
fazer
uma
revolução
nesse
país
relacionada
à
escala
6×1.
É
uma
escravidão
moderna.
Se
a
gente
não
se
revoltar,
colocar
a
boca
no
mundo,
meter
o
pé
na
porta,
as
coisas
não
vão
mudar
”.
2
O
número
49
da
Revista
Trabalho
Necessário
reúne
um
rico
material
que
expressa
essa
realidade,
onde
a
mulher
negra
vive
a
sobrecarga
no
mercado
de
trabalho,
e
a
juventude
periférica
não
encontra
garantias
de
emprego,
mesmo
com
qualificação
profissional.
Também
se
registra,
nessa
edição,
as
formas
de
luta
da
juventude
nas
primeiras
duas
décadas
do
século
XXI,
com
ocupações
de
escolas
e
as
possibilidades
de
mobilização
postas
pelas
redes
sociais,
ainda
que
essas
redes
sejam
também
um
espaço
de
poder
de
influência
dos
setores
dominantes.
As
experiências
das
greves
do
passado
se
reatualizam
hoje
como
necessárias,
apesar
dos
novos
desafios.
Coloca-se
em
evidência
a
riqueza
teórica
acumulada
pela
tradição
marxista
nas
reflexões
trazidas
em
“As
tarefas
revolucionárias
da
juventude”,
no
clássico
de
Lênin,
rememorado
na
TN
49.
Apesar
dos
desafios
impostos
pelo
modo
de
produção
capitalista,
a
juventude
segue
organizada
nos
partidos
políticos
de
inspiração
socialista
e
comunista,
nos
movimentos
populares,
de
onde
conseguem
propor
alternativas
contra
hegemônicas
nas
relações
sociais
de
produção.
A
busca
do
tempo
livre,
como
tempo
de
fruição,
de
produção
criativa,
mostra-se
como
chave
importante
de
interpretação
de
uma
grande
pauta
que
a
juventude
trabalhadora
tem
abraçado:
conquistar
na
luta
organizada
o
trabalho
como
mediação
nos
processos
de
reprodução
ampliada
da
vida,
e
não
de
produção
da
morte
pela
via
das
jornadas
extensas,
que
não
permitem
o
tempo
de
descanso
e
de
vida.
Movimentos
sociais
como
o
Movimento
Sem
Terra
e
o
Movimento
de
Pequenos
Agricultores
proporcionam
à
sua
juventude
uma
outra
relação
com
o
trabalho.
O
trabalho
alienado
é
reconhecido
na
luta
contra
o
agronegócio,
2
Alma
Preta
(
https://almapreta.com.br/sessao/politica/vida-alem-do-trabalho-entenda-o-movimento-que-prega-o-fi
m-da-escala-6x1/
).
Acessado
em
02/12/2024.
3
contra
a
grilagem
de
terras,
mas
também
através
do
trabalho
são
pensadas
novas
formas
de
relação
com
a
natureza,
de
onde
é
possível
pensar
a
preservação
ambiental.
Nesse
sentido,
ganha
importância
a
resistência
da
Cúpula
dos
Povos
em
contraposição
ao
G20,
e
a
mobilização
popular
para
que
a
COP
30
reconheça
as
urgências
dos
povos
e
comunidades
das
florestas,
impactados
com
a
ação
devastadora
da
mineração,
da
extração
de
combustíveis
fósseis,
capazes
de
ampliar
a
contaminação
dos
rios,
solo
e
ar,
colocando
em
risco
a
vida
planetária.
A
juventude
trabalhadora
tem
seus
corações
e
mentes
disputados
na
sociedade
contemporânea.
A
organização
da
extrema-direita
no
país
não
abandonou
as
igrejas
neopentecostais
como
espaço
de
aparelhamento
ideológico,
nem
tampouco
deixou
de
se
servir
dos
ataques
racistas
como
estratégia
de
dominação
nas
redes
sociais,
na
busca
da
fragilização
do
pertencimento
étnico-racial
da
juventude
periférica.
Os
dominantes
têm
se
defrontado
com
a
ampliação
dos
debates
antirracistas,
anticapitalistas,
e
com
a
resistência
organizada
do
campo
da
educação,
apesar
da
precarização
do
trabalho
docente.
Os
professores
da
rede
municipal
de
educação
do
Rio
de
Janeiro,
colocam-
se
de
pé
na
defesa
de
uma
educação
verdadeiramente
pública,
que
passa
pela
defesa
de
um
financiamento
público,
com
investimento
na
carreira
docente.
A
greve
como
estratégia
de
luta
da
classe
trabalhadora
ainda
é
duramente
reprimida,
o
que
reforça
o
mérito
deste
número
temático
em
recuperá-las,
possibilitando
aos
leitores
uma
reflexão
sobre
as
mudanças
no
padrão
de
acumulação
do
capital
que
proporcionam
desdobramentos
econômicos,
sociais
e
políticos
a
serem
enfrentados
pela
classe
trabalhadora
e
sua
juventude
na
história
do
presente.
Bom
final
de
ano
e
muita
força
em
2025,
e
sempre!
Um
abraço,
Jacqueline
Botelho,
Adriana
Barbosa
e
Lia
Tiriba
Referências
KREIN,
J.D.
As
transformações
no
mundo
do
trabalho
e
as
tendências
das
relações
de
trabalho
na
primeira
década
do
século
XXI
no
Brasil.
Revista
NECAT
-
Ano
2,
nº3,
Jan-Jun
de
2013.
4
KREIN,
J.D.
O
mundo
do
trabalho
hoje.
Conferência
de
abertura
do
XIX
Seminário
de
produção
Científica
do
Grupo
THESE
integrado
com
o
NEDDATE.
Grupo
THESE
(org.).RJ:
UERJ/UFF/EPSJV,
2024.
THOMPSON,
E.P.
A
formação
da
classe
operária
na
Inglaterra
.
Rio
de
Janeiro:
Paz
e
Terra,
1987.
5