
Introdução
“Você não acha estranho que só exista eu aqui de negro? Tenho
mais a ver com os corpos da aula de anatomia do que com meus
colegas”
(Maurício, em M8: quando a morte socorre a vida)
“O filme é uma obra de ficção, baseado na ficção, mas algumas
cenas que filmei, da forma que filmei, dialogam com o que a gente
viu, por exemplo, no Carrefour e em outros tantos casos de violência
policial contra os jovens negros”
“Embora o roteiro tenha ficado pronto há mais de dois anos, a
maneira como filmei retrata de maneira muito parecida, muito similar,
a violência que rolou com o George Floyd, com o Beto e com tantos
outros”
(Jeferson De – Diretor4)
O objetivo deste artigo é debater a possibilidade do filme “M8: quando a morte
socorre a vida5”, do diretor Jeferson De6, enquanto cinema de modo popular, isto é, o
uso do audiovisual, dos filmes, fora das salas de exibição tradicionais, em espaços
populares, culturais, bairros, ruas, praças, comunidades, no processo de formação
humana, política e de educação formal e informal. Para isso, utilizou-se da categoria
de “violência” – com base em Slavo Zizek e Mauro Iasi7 – como fio que tece o
debate, uma vez que concordamos com Ynaê Lopes dos Santos quando a autora
afirma que o racismo “é um sistema de poder que estrutura as sociedades
modernas, organizando as violências que acometem as populações
discriminadas” (Santos, 2022, p.14, grifo nosso). Além disso, foram utilizadas as
categorias de “realismo”, “tipicidade” e “tipico” em György Lukács para a
compreensão do filme enquanto arte.
O filme foi lançado entre a pandemia da COVID-19, a morte de George Floyd
nos EUA, o assassinato de João Alberto Silveira Freitas, morto após ser espancado
7 Sobre isso ver o debate do livro “Violência” de Slavo Zizek, feito por Mauro Iasi em 2014:
https://www.youtube.com/watch?v=7WSOA_KZClU.
6 Jeferson De dirigiu Doutor Gama (2021), uma cinebiografia do abolicionista Luiz Gama, além dos
filmes Correndo Atrás (2016), O Amuleto (2015) e Bróder (2010).
5 Ganhou o prêmio do público de Melhor Filme de Ficção no Festival do Rio em 2019. M8 foi indicado
no Grande Prêmio Brasileiro de Cinema de 2021 em cinco categorias: Melhor Diretor, Melhor Atriz
Coadjuvante (Zezé Motta), Melhor Roteiro adaptado (Jeferson De e Felipe Sholl), Melhor Maquiagem
(Sonia Penna), e Melhores Efeitos Visuais (Bernardo Neder). O filme faturou tanto o prêmio de
direção como o de roteiro adaptado. O roteiro também foi indicado ao Troféu Guarani 2021. Já no
Festival Sesc Melhores Filmes de 2021 recebeu os prêmios de melhor ator (Juan Paiva) e melhor
diretor. Também ganhou, nas mesmas duas categorias, o Prêmio APCA de Cinema.
4 GALVÃO, Pedro. M8 - Quando a morte socorre a vida' aborda o racismo brasileiro. Disponível em:
https://www.uai.com.br/app/noticia/cinema/2020/12/03/noticias-cinema,265585/m8-quando-a-morte-so
corre-a-vida-aborda-o-racismo-brasileiro.shtml. Acesso em 07 de agosto de 2024.