
Introdução
Partimos da compreensão de que não existe capitalismo sem racismo, e que
o aprofundamento do segundo garante condições de sobrevivência do atual modo
de produção. O racismo, além de arma ideológica de dominação, nos termos de
Moura (2023), é arma de produção de hegemonia dos dominantes (Botelho, 2024).
Ele é um complexo de violências que atua objetivamente e subjetivamente contra
indivíduos negros, operando a consolidação de uma realidade supremacista branca
que produz convencimento de que a subordinação do negro é fruto da sua natureza.
Os negros representaram o contingente populacional massivo segregado na
sociedade capitalista no pós-abolição, cujo desafio torna-se, para além de
demonstrar objetivamente esta segregação, denunciar o mito da democracia racial,
uma estratégia de dominação burguesa, onde está viva a supremacia imperialista
branca.
Bell Hooks realiza uma reflexão sobre o processo de integração dos negros
nos EUA, quando se decreta o fim do regime de segregação, constatando que
conforme a luta pela libertação das pessoas negras ganhava
atenção, a ênfase não estava mais no racismo internalizado. A
supremacia branca raramente era mencionada. Líderes negros
começaram a equiparar a conquista da liberdade à conquista de
poder econômico, apenas com o que se supunha que pessoas
brancas tinham (Hooks, 2022, p. 46-47).
A historiografia sobre o negro brasileiro oculta que, no pós-abolição, havia três
portas fechadas para o negro no Brasil: o acesso à terra, o acesso à escola e o
acesso ao trabalho. Esta historiografia nega a política de embranquecimento da
população, a ação eugenista do Estado, assim como a educação racista no Brasil,
que traz como referências toda uma primeira geração de romancistas (1836-1852)
que difundiu o pensamento patriarcal, racista colonialista de interesse dos setores
dominantes. Moura (2020) nos demonstra que
Quando se cria uma Literatura Brasileira, uma ensaística brasileira,
ela é, praticamente, toda racista e não apenas em Oliveira Viana. Na
obra de Euclides da Cunha, de Silvio Romero, de Tobias Barreto,
este inclusive era mulato, assim como nos romances de Graça
Aranha, Julio Ribeiro e outros, vamos encontrar, como uma
constante, aquela determinação de dizer que o que sujou, o que
atrapalhou a dinâmica da sociedade brasileira não foi o fato de existir
a escravidão, mas o fato de existir o negro como raça inferior (Moura,
2020, p. 241).