Poluição do rio Paraíba do Sul e economia pesqueira artesanal em Campos dos Goytacazes
Perspectivas da Comunidade Coroa Grande
Palavras-chave:
Meio ambiente., Poluição., Rio Paraíba do Sul., Pesca artesanal.Resumo
O Rio Paraíba do Sul é responsável por grande parte do desenvolvimento econômico e social da população de Campos dos Goytacazes (RJ). O “bem-estar” do rio reflete diretamente na vida do morador, que tem na pesca artesanal, sua principal fonte de renda. Tal afirmativa se comprova através das consequências negativas do rompimento da barragem da indústria Cataguases de Papel, em 2003, que deixou a água do Rio Paraíba do Sul imprópria para consumo e causou a morte de milhares de peixes (Castro, 2022). Para diversos núcleos sociais, toda ou grande parte da renda advém de algum corpo d’água. Portanto, este estudo se justifica pela urgência em frear o despejo de materiais poluentes em corpos d’água, tendo em vista que tal prática coloca em risco não apenas a água, mas todas as atividades que dependem desse recurso natural. Logo, o objetivo geral deste estudo é contribuir para a compreensão dos impactos socioambientais decorrentes do rompimento da barragem da indústria Cataguases de Papel na comunidade de pescadores de Coroa Grande, no bairro Parque Sumaré, em Campos dos Goytacazes. Portanto, pretende-se analisar os impactos do acidente ambiental na geração de renda dos pescadores de Coroa Grande, bem como suas reverberações nas relações de trabalho. A metodologia deste artigo foi construída com base em uma visita à comunidade pesqueira Coroa Grande, no bairro Parque Sumaré, região urbana de Campos dos Goytacazes (RJ). Através dessa visita, foi possível analisar alguns aspectos sociais da comunidade, bem como conversar com moradores, pescadores locais e com o presidente da APAC (Associação dos Pescadores Artesanais da Coroa Grande do Rio Paraíba do Sul), Elenilson do Espírito Santo Dias (Seu Ninil da Coroa). A partir da esclarecedora conversa com o presidente da APAC e da articulação bibliográfica com teóricos da vertente ecológica da economia do meio ambiente, foi possível identificar pontos essenciais para compreender a realidade socioambiental e econômica vivida pelos pescadores daquela região. Baseando-se na premissa de que a economia está inserida em um universo em que matéria e energia são finitas, subentende-se que a extração incessante de recursos, bem como a emissão de resíduos, são fatores que colaboram com a degradação em massa do meio ambiente (May, 2018). No caso do rompimento da barragem em Cataguases, foi possível perceber os impactos ambientais gerados na comunidade Coroa Grande, através da precisão da vivência nos relatos do presidente da Associação dos Pescadores Artesanais da Coroa Grande do Rio Paraíba do Sul:
"[...] Prejudicou geral. Todo mundo [...]. O município nosso aqui gritou socorro [...]. O que nós conseguimos aqui de peixe morto não foi brincadeira. Até levar no portão do Ministério Público nós levamos, um barco lotado de peixe podre, pra mostrar que a pesca da gente foi embora pro brejo - Seu Ninil da Coroa, Presidente da APAC.
O drama social vivido pela população da Coroa Grande é representado com precisão na fala de Seu Ninil. Através do relato, percebe-se o sentimento de indignação, sofrimento e desespero que tomou posse dos moradores da Coroa Grande durante o acidente ambiental de 2003. Na abordagem antropológica de Victor Turner (apud Huguenin; Martínez, 2023) pode-se pensar o drama social como um método reagente, que transcende as estruturas estatísticas, sem desconsiderar a existência de práticas e leis consolidadas, mas evidenciando as desarmonias da vida, as crises e os conflitos. A renda familiar do pescador da Coroa Grande também foi pontualmente afetada. Ao ser perguntado se houve redução na renda familiar dos pescadores associados da APAC, o presidente da associação não só afirma, como também anuncia os danos irreversíveis no berçário de peixes naquele trecho do leito do Paraíba do Sul:
"[...] Piorou porque nós perdemos o estado pesqueiro todo. E naquela época ainda tivemos a sorte [...]. Tínhamos o berçário. O berçário era a fonte que sustentava o rio. Hoje nós perdemos o rio e perdemos o berçário também. Não tem como você recuperar [...]" - Seu Ninil da Coroa, Presidente da APAC.
Como resultado do enfraquecimento da renda familiar dos pescadores artesanais da Coroa Grande, advindo da degradação do Rio Paraíba do Sul, notou-se uma ampla procura por fontes alternativas de renda no mercado de trabalho informal. Logo, percebeu-se um estado de precarização das relações de trabalho do pescador da Coroa Grande, evidenciada pelo rompimento da barragem. A pesca artesanal exercida na comunidade Coroa Grande em Campos dos Goytacazes não se constrói nas bases da acumulação de renda, mas sim, como único modelo de sustento para inúmeras famílias. A permanência na função e as dificuldades na execução do trabalho são preocupações evidentes para aqueles que dependem da pesca artesanal. Diante o cenário descrito, a frequente busca por novos mecanismos geradores de renda é, atualmente, uma realidade para os pescadores da Coroa Grande, que não conseguem garantir os proventos mínimos para o sustento familiar somente com a renda da pesca. No entanto, tal busca se firma através da precarização das relações de trabalho, tornando o pescador artesanal, refém do mercado de trabalho informal, sem acesso a quaisquer direitos trabalhistas.
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Referências
CASTRO, F. C. et al. Poluição e saúde: o dualismo do mundo moderno. Revista Brasileira de Pesquisa em Saúde/Brazilian Journal of Health Research, v. 24, n. 2, p. 4-6, 2022.
DA SILVA HUGUENIN, F. P.; MARTÍNEZ, S. A. “Depois da Cataguases, o rio não dá mais”: acidentes socioambientais na bacia do Paraíba do Sul como dramas sociais na pesca artesanal. Editora Chefe, p. 95, 2023.
MAY, P. H. Economia do meio ambiente: teoria e prática. 3ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.
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