A escrita literária
a coemergência da obra e do autor
DOI:
https://doi.org/10.22409/1984-0292/v33i1/5851Palabras clave:
escrita, produção de subjetividade, literaturaResumen
A dissertação tem como tema o processo de escrita literária, buscando compreendê-lo considerando seu aspecto coletivo. Este tema surgiu a partir do contato com entrevistas em que escritores comentam seu processo de criação, evidenciando que a escrita não é um processo individualizado, resultante de uma história pessoal, mas uma criação da qual participam diversos vetores – tecnológicos, econômicos, estéticos, etc. Isso contradiz duas concepções corriqueiras: para a primeira o “espírito do tempo” determina os textos; para a segunda o escritor é a origem da obra e nela projeta suas vivências e seus desejos. Tomando como referência as discussões de Roland Barthes, Michel Foucault e Roger Chartier acerca do autor, procura-se evidenciar que a ideia de que o texto é fruto de uma entidade individualizada não é natural nem óbvia, mas surgiu por volta do século XVII, com vistas a punir aqueles que escreviam textos considerados perigosos.
Este trabalho investiga ainda as principais vertentes de estudo da linguagem, buscando identificar suas consequências para a compreensão da escrita. Para isso, analisa o formalismo e sua ênfase nos invariantes da linguagem. Segundo essa vertente, a literatura é um caso de fala, obedecendo às regras impostas pela língua. Em contraposição a essa abordagem, recorremos ao pragmatismo de John Austin, que enfatiza o aspecto produtivo da linguagem e defende que os enunciados são capazes de modificar o mundo empírico, desde que sejam pronunciados em situações favoráveis. Ainda tratando da abordagem pragmática, toma-se como base Gilles Deleuze e Félix Guattari. Para eles, um enunciado não é uma simples combinatória das regras da língua, mas é capaz de provocar rachaduras em toda a linguagem. Além disso, os enunciados podem transformar o plano empírico sem depender da convergência entre o dito e as convenções sociais.
Deleuze e Guattari, bem como Blanchot e Foucault, enfocam a relação da literatura com a resistência a práticas de dominação, embora com diferentes nuances. Blanchot enfatiza a estranheza produzida pela palavra essencial, em oposição à familiaridade da palavra bruta. Foucault aponta para a palavra que permite a produção de novos discursos, em oposição àquelas que se esgotam em si mesmas. Por fim, Deleuze e Guattari enfocam o uso majoritário e minoritário da língua: o primeiro mais capturável por práticas homogeneizantes e o segundo mais permeável às desestabilizações.
Com base em John Dewey, conclui-se que, para haver experiência estética na escrita, é preciso um equilíbrio entre fazer e padecer. Assim, o escritor precisa escrever, mas também se deixar guiar pelo que percebe da sua obra: é escritor e leitor, agente e fruidor simultaneamente. Portanto, a sua criação não é nem um relato de sua vida nem uma criação ex-nihilo, pois o processo de criação também é um processo de produção de subjetividade, dizendo respeito à co-emergência da obra e do autor.
Ao longo desta dissertação estão presentes falas de escritores que nos ajudam a pensar a criação literária: Milton Hatoum, Ferreira Gullar, Carola Saavedra, Jorge Luis Borges, Ernest Hemingway e Cristóvão Tezza. Por fim, a pesquisa realizada ao longo desta dissertação me lançou rumo à escrita de novos contos, alguns dos quais passaram a compô-la.
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