Chamada para o Dossiê “Antropologia das ‘rachaduras sociais’: formas de fazer sociedade em tempos de polarização extrema”

2025-07-04

A pergunta de como a sociedade é produzida ou vivida tem sido fundamental para a antropologia. Nesse sentido, os conflitos sociais - e sua relação com a ordem social - têm sido um tema clássico da antropologia política. Mais uma vez, estas questões estão adquirindo centralidade temática e teórica para se pensar o mundo atual, marcado por processos de polarização e rachaduras em que a construção do comum aparenta ser questionada. Dessa forma, surgem novas configurações de identidades políticas (em um sentido amplo) que são construídas pela oposição radical em uma via de aniquilação do diferendo e da diferença  Esse processo levou à configuração de novas identidades que parecem buscar bloquear, eliminar o outro. No entanto, os conflitos retroalimentam a separação que, paradoxalmente, necessita da existência do outro indesejado. Essas mudanças também exigem que pensemos sobre o lugar do Estado e das instituições de controle social, na produção de discursos coletivos e na manutenção da ordem.

Como uma perspectiva etnográfica pode ajudar a entender esses processos de polarização com base nas interações entre membros do mesmo grupo e entre diferentes grupos sociais? Como podemos entender a polarização e as fissuras que constroem o social hoje? Como elas foram transformadas e como expressam os afetos, as adesões a determinados grupos? Em contraste com outras formas de pensar as democracias ou a alternância de poder (assim como as poliarquias), nos encontramos hoje em um contexto onde se busca bloquear e eliminar a diferença, em regimes de dominação total tanto nas esferas geopolíticas globais, nos discursos científicos, quanto nos processos locais. Como a compreensão da oposição radical que tenta anular as diferenças nos permite pensar a democracia hoje? Quais grupos sociais, quais práticas são transformadas em formas legítimas de produção de discursos sociais hegemônicos? Nesse ponto, pensamos que as formas locais e territorializadas ocupam um lugar central. O foco nas interações, nas práticas cotidianas, nos permite apreciar a maneira como essas diferenças são produzidas e a diversidade de formas pelas quais os "modos de vida" e os projetos de vida, de valor social, são expressos.

Partindo do pressuposto que as dimensões dos fenômenos assumem formas plurais e complexas, como podemos compreender as variações morais, políticas e simbólicas dos efeitos das mudanças no "clima social" global? Que ferramentas de análise devemos mobilizar para dar conta dos problemas que surgem em escala global? Como as ciências sociais devem se comportar diante das mudanças impostas nos últimos 20 anos nas interações cotidianas e na "cultura política" de vários países? Essas mudanças globais aceleradas exigem que as ciências sociais reformulem algumas das bases conceituais que lhes são caras e que são inerentes à sua formação como um campo científico e disciplinar.

Sendo assim, buscamos interrogar quais feições que as controvérsias públicas ganham nesses novos regimes de verdade nos quais as justificativas e formas de expressões comunicativas ganham novas faces. Privilegiamos como eixos temáticos: 

  1. Estudos etnográficos sobre a ascensäo dos movimentos de extrema direita na contemporaneidade;
  2. Pesquisas de natureza etnográfica sobre o papel das redes sociais e da internet na producäo das rachaduras sociais;
  3. Empreendimentos etnográficos que reflitam sobre as consequências da pandemia na gestäo dessas novas formas de conflitos e de fazer o social;
  4. Etnografias sobre o papel das instituições de controle social na produçäo e reproduçäo das formas de violëncia;
  5. Reflexöes sobre os conflitos epistêmicos e suas consequências nas polarizações de ideias e concepções de mundo;
  6. Análises sobre o lugar dos sentimentos e dos afetos nos processos de produçäo dos pertencimentos a grupos e/ou identidades sociais;
  7. Propostas inovadoras de ferramentas analíticas e metodológicas para compreensäo do fenômeno tratado pelo presente Dossië.

 

Considerando os critérios de avaliação imposto às revistas científicas, poderão ser selecionados 50% artigos de doutorandos, os demais artigos devem ter autoria de, ao menos, um doutor. Todos os artigos submetidos serão submetidos à avaliação às cegas de pareceristas externos, atendendo à política da revista. Para dar conta da diversidade de abordagens teóricas e metodológicas dos diferentes campos empíricos e problemáticas a serem debatidos, serão aceitos, preferencialmente, artigos das áreas de Antropologia e Ciências Sociais, observados os parâmetros de exogenia em relação à UFF.

Organizadores: Fabio Mota (UFF-RJ) e Mariano Perelman (UBA-CONICET, Argentina).

Prazo estendido: 03/11/2025.

OBS: Como temos mais de uma chamada aberta, faz-se obrigatório indicar no campo ‘Comentários aos editores’ que a submissão é para o Dossiê “Antropologia das rachaduras sociais”.

As contribuições podem ser enviadas até 03 de novembro de 2025 pelo sistema eletrônico da revista: https://periodicos.uff.br/antropolitica/about/submissions#onlineSubmissions