Decisões eleitorais e a “aceitação” da diversidade sexual e de gênero na família: conflitos e conciliações entre “pessoas trans” e seus familiares nas eleições de 2018 para a presidência do Brasil
DOI:
https://doi.org/10.22409/antropolitica2025.v57.i1.a59337Palavras-chave:
Eleições, Etnografia, Família, Identidade de gênero, Transexualidade.Resumo
Este artigo discute os dilemas, tensionamentos e embates vividos por “pessoas trans”, travestis e transexuais, e suas famílias de origem durante a campanha eleitoral de 2018 para a Presidência da República. O objetivo é compreender como as disputas na arena política envolvendo moralidades sexuais, concepções de gênero e sexualidade e valores familiares foram experienciadas no cotidiano dos sujeitos com suas famílias. A problemática é relevante porque evidencia a permeabilidade da política à vida íntima, contribuindo para entender em que medida relações com familiares trans ou homossexuais têm ou não reflexo nas preferências de eleitores por candidatos considerados progressistas ou conservadores nas pautas relacionadas à diversidade sexual e de gênero. Os dados resultam de pesquisa de campo etnográfica realizada ao longo de 14 meses, entre 2018 e 2019, em João Pessoa (PB), em um ambulatório do “Processo Transexualizador” do Sistema Único de Saúde (SUS), em centros de políticas públicas para homossexuais, travestis e transexuais e em atividades de ativismo de uma organização de famílias de “filhos LGBT+”. Também foram realizadas entrevistas semiestruturadas, em profundidade, com 21 homens trans, mulheres trans e travestis e com 14 familiares de sujeitos transexuais. A pesquisa evidenciou como conflitos no campo da diversidade sexual e de gênero que ganharam relevo no debate público durante as eleições produziram efeitos variados nos arranjos de “aceitação” que preservavam as relações familiares, mobilizando decisões de voto e adesão às candidaturas identificadas como contrárias ou favoráveis aos direitos de minorias sexuais e de gênero.
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