Dos fios tecidos pelas mães de favela em meio ao luto e à vida precária
DOI:
https://doi.org/10.22409/antropolitica2025.v57.i1.a63997Palavras-chave:
Violência de Estado, Mobilizações, Mães e Familiares de Vítimas de Violência Estatal.Resumo
Este artigo apresenta um conjunto de reflexões que partem de pesquisas realizadas com mães e familiares de vítimas de violência estatal na cidade do Rio de Janeiro, com enfoque na luta de Ana Paula, Mãe de Manguinhos (RJ) e de Gláucia, Mãe Sem Fronteiras do Chapadão (RJ). Analisamos como as mães tecem os fios da luta, como articulam suas ações coletivas em contraposição às práticas e representações acerca da violência urbana. Tais representações operam o amálgama entre distintas dimensões raciais, de gênero, de classe e etárias, produzindo nos lugares das “margens” uma distribuição desigual da vida em sociedade, permitindo que vidas possam ser descartadas, enquanto outras são protegidas. Foi realizada pesquisa de campo em caráter etnográfico, com estudo de caso e entrevistas com mães de vítimas de violência estatal em distintos territórios. Sua principal contribuição explora tanto as dinâmicas das suas interações nos órgãos do sistema de justiça criminal, quanto a compreensão do cuidado e de como ele aparece nos repertórios de luta das mães a partir de uma perspectiva coletiva, que desenraiza o cuidado da esfera privada e doméstica ou familiar, trazendo-o para o âmbito público, do cuidado a ser exercido não somente consigo, com outras mães e familiares, mas também com os jovens de todas as favelas.
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