Prorrogação de Prazo - Chamada para o Dossiê “Gênero, Sexualidade, Estado e Violência”

2022-07-25

O dossiê “Gênero, Sexualidade, Estado e violência” objetiva reunir artigos derivados de pesquisas etnográficas acerca de processos de Estado e violência tomados a partir de sua mútua constituição com relações de gênero e sexualidade e de suas possíveis articulações com raça, geração, classe e território – aqui entendidos como categorias e relações sociais que informam sobre diferenças e desigualdades. Trata-se de promover a articulação e a maior visibilização de pesquisas etnográficas cujos universos empíricos consistam, por exemplo, em processos de Estado e violência atinentes a prisão e encarceramento; gestão e criminalização de populações e territórios; práticas e políticas judiciais, policiais e de segurança pública; e mobilizações sociais por direitos e justiça. Busca-se, portanto, reunir um conjunto de trabalhos que compreendam tais processos de Estado e violência em meio àquelas relações sociais e categorias de diferenciação, tendo em vista que gênero e sexualidade não raro operam como linguagens que exprimem diferentes conflitos sociais e afetam os contornos da política, dos direitos e de seus sujeitos.

Com a presente proposta de dossiê situamo-nos junto a um conjunto de pesquisas, desenvolvidas no diálogo entre a Antropologia do Estado e os estudos de gênero e sexualidade, as quais vêm investindo em uma abordagem do Estado como processo, produzido por e produtor de sujeitos (VIANNA; LOWENKRON, 2017; AGUIÃO, 2018; EFREM FILHO, 2017; FARIAS, 2020; LAGO, 2019). Tais sujeitos são forjados em correlação tanto com práticas de gestão, classificação e controle quanto em meio a reivindicações por direitos, sendo costumeiramente incorporados e anunciados em termos de gênero, sexualidade e raça. Ao mesmo tempo, o que se convenciona chamar de “Estado” – em suas práticas burocráticas e cotidianas – remete a esforços, por vezes reconhecidos como violentos, de constituição de autoridade, legitimidade e fronteiras, tramados em relações e conflitos de classe, gênero, sexualidade, território, geração e racialização. Nesse sentido, interessam-nos também os contextos de pesquisa que apresentam lutas por justiça protagonizadas por sujeitos, individuais e coletivos, que interpelam o Estado por meio de processos judiciais, produção de documentos, articulações com órgãos de Estado em proposições de leis e audiências públicas, além de mobilizações mais amplas que agenciam a “linguagem dos direitos” em suas demandas.

Em meio a denúncias de “violência de estado” e reivindicações para interrompê-la ou repará-la, surgem outras categorias, como a da “vítima” que reclama por reparação e que tem condições de oferecer um “testemunho” de seu “sofrimento”. O agenciamento do sofrimento e mesmo a constituição de uma “vítima” capaz de reivindicar reparação demanda, por vezes, estratégias narrativas que mobilizam gênero e sexualidade em sua produção (FARIAS; LAGO; EFREM FILHO, 2020). Considerando que a “vítima” ganha relevância nas economias morais de nosso tempo (SARTI, 2011; MOUTINHO, 2014; EILBAUM; MEDEIROS, 2016; AZEVEDO, 2018) também serão bem-vindas apresentações de pesquisas que explorem as dimensões de gênero, sexualidade e demais categorias de diferenciação na produção da vitimização, de suas narrativas, e das potenciais demandas de vítimas direcionadas a aparatos estatais.

Discussões associadas à temática do dossiê ora proposto têm mobilizado intensamente pesquisadoras(es) das Ciências Sociais e, em especial, da Antropologia no Brasil. Contribuições relevantes a esse respeito podem ser encontradas, por exemplo, no dossiê “Gênero e Estado: formas de gestão, práticas e representação”, organizado pelas antropólogas Adriana Vianna e Laura Lowenkron e publicado no número 51 dos Cadernos Pagu, em 2017; e no dossiê “Mães e processos de Estado”, organizado pelas três organizadoras da presente proposta e publicado na Sexualidad, Salud y Sociedad – Revista Latinoamericana, em 2020. Nesta oportunidade, reunimos trabalhos sobretudo de jovens pesquisadoras, oriundas de diferentes regiões do país, voltados à compreensão do engajamento de “mães”, incluindo os diversos sujeitos que performatizam essa figura, em determinados processos de Estado, lutas e conflitos sociais.

A nova proposta de dossiê consiste, portanto, num adensamento das discussões que temos travado junto a um efervescente campo de pesquisas posicionadas na interseção entre os estudos de gênero e sexualidade e a Antropologia do Estado. Aqui, porém, enfatizamos principalmente a centralidade da violência nessas pesquisas e, por pressuposto, nas experiências dos sujeitos implicados nos processos de Estado de que essas etnografias se ocupam. A fecundidade analítica dessa ênfase na violência pode ser atestada no notável interesse de pesquisadoras(es) pelos espaços de discussão de trabalhos que oportunizamos em eventos acadêmicos recentes. Como exemplos, podemos citar o Grupo de Trabalho 11 “Gênero, Sexualidade, Estado e Violência”, parte do VII Encontro Nacional de Antropologia do Direito (ENADIR), que, organizado por Natália Lago e Roberto Efrem Filho, ocorreu em agosto de 2021 e contou com a apresentação de 15 trabalhos dedicados à mesma temática desta proposta de dossiê, alguns deles debatidos por Juliana Farias. É possível também mencionar o Simpósio de Pesquisas Pós-Graduadas 38 “Sexualidade e Gênero: políticas, direitos e sujeitos”, também coordenado por Natália Lago e Roberto Efrem Filho, agora junto ao 45º Encontro Anual da ANPOCS, que acontecerá em outubro próximo e já conta com 10 trabalhos aprovados, muitos dos quais direcionados às correlações entre violência e Estado.

Notamos a propósito que, seguindo as políticas de seleção dos trabalhos apresentados em tais grupos, a organização priorizará a diversidade regional e étnico-racial na composição dos textos do Dossiê.

 

Referências

AGUIÃO, Silvia. Fazer-se no "Estado": uma etnografia sobre o processo de constituição dos "LGBT" como sujeitos de direitos no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2018.

AZEVEDO, Desirée. Ausências Incorporadas. Etnografia entre familiares de mortos e desaparecidos políticos. São Paulo: Unifesp, 2018.

EFREM FILHO, Roberto. Mata-mata: reciprocidades constitutivas entre classe, gênero, sexualidade e território. 2017. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, 2017.

FARIAS, Juliana. Governo de mortes: uma etnografia da gestão de populações de favelas no Rio de Janeiro. Papéis Selvagens, Rio de Janeiro, 2020.

FARIAS, Juliana; LAGO, Natália; EFREM FILHO, Roberto. Mães e lutas por justiça. Encontros entre produção de conhecimento, ativismos e democracia. Sex., Salud Soc., Rio de Janeiro, n. 36, p. 146-180, dec. 2020.

EILBAUM, Lucía, MEDEIROS, Flavia. Onde está Juan?: moralidades e sensos de justiça na administração judicial de conflitos no Rio de Janeiro. Anuário Antropológico, v. 41, n. 1, p. 9–33, 2016.

MOUTINHO, Laura. Diferenças e desigualdades negociadas: raça, sexualidade e gênero em produções acadêmicas recentes. Cad. Pagu, v. 42, 2014, p. 201-248, 2014.

LAGO, Natália. Jornadas de visita e de luta: tensões, relações e movimentos de familiares nos arredores da prisão. 2019. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 2019.

SARTI, Cynthia. A vítima como figura contemporânea. Caderno CRH, v. 24, n. 61, p. 51-61, 2011.

VIANNA, Adriana; LOWENKRON, Laura. O duplo fazer do gênero e do Estado: interconexões, materialidades e linguagens. Cad. Pagu, v. 51, 2017.

O dossiê será composto de 6 artigos mais a apresentação. Assim, considerando os critérios de avaliação imposto às revistas científicas, serão selecionados 3 artigos de doutorandos, os demais artigos devem ter autoria de, ao menos, um doutor. Todos os artigos submetidos serão submetidos à avaliação às cegas de pareceristas externos, atendendo à política da revista. Para dar conta da diversidade de abordagens teóricas e metodológicas dos diferentes campos empíricos e problemáticas a serem debatidos, serão aceitos, preferencialmente, artigos das áreas de Antropologia e Ciências Sociais, observados os parâmetros de exogenia em relação à UFF.

Organizadores: Natália Lago (Unicamp/USP), Roberto Efrem Filho (UFPB/UFPE) e Juliana Farias (Pagu/Unicamp).

Prazo estendido: 09/11/2022.

OBS: Como temos outras chamadas abertas, é imprescindível indicar durante a submissão, no campo comentários aos editores, que o artigo é para o Dossiê “Gênero, Sexualidade, Estado e Violência”.

As contribuições podem ser enviadas até 09 de novembro de 2022 pelo sistema eletrônico da revista: https://periodicos.uff.br/antropolitica/about/submissions#onlineSubmissions

As normas para submissão dos textos são as mesmas válidas para artigos e encontram-se disponíveis em: https://periodicos.uff.br/antropolitica/about/submissions#onlineSubmissions