Onde impera o medo: socioeducação, violência e afetos hostis no Rio de Janeiro
DOI:
https://doi.org/10.22409/antropolitica2024.v56.i3.a62595Palabras clave:
Afetos Hostis, Violência, Socioeducação.Resumen
A proposta do presente artigo é refletir sobre o modo pelo qual a violência no cotidiano de uma instituição de internação socioeducativa é exercida por meio de afetos hostis. Esses afetos expressam relações de poder que separam, hierarquizam e diferenciam determinados atores institucionais, bem como são elementos garantidores de humanidade. Para tanto, apresenta-se uma etnografia realizada em uma unidade de internação socioeducativa masculina do Rio de Janeiro, o Centro de Socioeducação Dom Bosco, analisando a partir do corpo de mulher branca da pesquisadora, entendido como “fora de lugar” nesta instituição, as condições de entrada e circulação no espaço. Serão examinados ainda os modos de habitar essa instituição e as possibilidades e limites de relação com cada ator institucional, especialmente os jovens internos e os agentes socioeducativos. No percurso etnográfico, ficam evidentes as formas de violência sutil exercidas na instituição por meio de afetos hostis, seja na construção de uma atmosfera de medo, nojo e/ou desprezo. Afetos esses experimentados tanto nas relações entre os diversos sujeitos que transitam pela internação quanto destes com o espaço de privação de liberdade. Desse modo, revela-se como tais afetos participam e são instrumentos de uma gestão de fluxos, própria às dinâmicas das instituições de confinamento.
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