Conto de Origem Tibetana
DOI:
https://doi.org/10.22409/re.v2i3.452Resumo
A viagem
Conto de origem tibetana
Dois monges estão viajando. Há três dias, eles encontraram apenas uma velha mulher sobre o degrau da porta de sua cabana. Ela lhes ofereceu um pouco de cevada torrada servida com chá e manteiga rançosa. Esta magra tsampa[1], que data da véspera, já é feita de restos de outra. Eles têm fome. Eles têm frio. De repente, a chuva começa a cair. O mais jovem dos monges se protege o melhor possível com uma aba de seu vestido. O mais velho caminha, adiante, em silêncio. A noite cai, no horizonte nenhum abrigo, nem templo, nem eremitério, nem a mais modesta cabana. O caminho que eles seguem se perde ao longo da montanha. O jovem noviço não pode mais. Ele ignora o objetivo dessa interminável viagem. “O templo zen não deve estar distante”, pensa, “me parece que nos aproximamos de Kamakura, mas essa é mesmo nossa direção?” Rompendo as instruções rigorosas do silêncio, ele ousa interrogar seu superior que caminha com passo igual:
- Mestre, aonde vamos?
- Nós estamos aqui, responde o mestre.
- Você quer dizer que a parada está próxima? Insiste o jovem monge.
- Aqui, agora. Nós estamos aqui.
O noviço inquieto olha o caminho pedregoso que penetrava no nevoeiro. Ao longe, os cimos temíveis já se perdiam na noite. Ele tem medo. Ele tem frio. Ele tem fome. E rapidamente, como um raio, ele entende. Lembra-se das palavras que com frequência repetiam no monastério: “O Zen é um caminho que vai...” Em cada passo sobre esse caminho, a eternidade está cercada. No presente esconde-se a vida, o oásis, o infinito. Experimento o presente, o passado foge, o futuro é um sonho; o presente simplesmente é. “Quando você acorda para a verdade, diz um velho poema, seu espírito se torna brilhante e luminoso, como um raio de lua”.
O noviço ia em paz murmurando essas coisas.
BRUNEL, Henri. Contos Zen.
[1] A tsampa é o nome tibetano da farinha de cevada assada. É o alimento de base no Tibete, assim como o arroz é na China e o trigo é na Europa.
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