Etnografia de um processo: a luta da militância trans e travesti pelo direito à retificação de registro civil

Autores/as

DOI:

https://doi.org/10.22409/antropolitica2025.v57.i3.a66922

Palabras clave:

Etnografia, Gênero, Poder Judiciário, Registro Civil, Sergipe.

Resumen

Este artigo analisa a atuação do Poder Judiciário sergipano em uma das primeiras demandas de retificação de registro civil de uma pessoa trans. Para tanto, foram analisados os autos de um processo civil que foi conduzido pela 6ª vara privativa de Assistência Judiciária da comarca de Aracaju (Sergipe). Priorizamos metodologicamente a etnografia de arquivo, pois entendemos que os documentos judiciais se constituem como importantes fontes de pesquisa para a compreensão do jogo de poder  que define a verdade jurídica. Os embates, os argumentos, as estruturas textuais, a presença das lutas sociais e a busca por direitos são marcadores fundamentais para inferir sobre os paradoxos e complexidades de formação de uma dada sociedade. A análise desse processo é relevante, pois evidencia os embates sobre as questões de gênero no estado de Sergipe, quando o Poder Judiciário é provocado a decidir sobre o assunto. O artigo foi estruturado em duas partes. Na primeira, foi apresentada a forma como se constituiu a militância trans e travesti no Brasil. Na segunda, descrevemos como se estabeleceu o trâmite processual da ação de retificação de registro civil e analisamos os aspectos culturais e jurídicos que estão presentes no processo, em especial, o embate entre o modelo heteronormativo e o paradigma da plurisexualidade, e o conflito entre dois modelos de identidade: o fisiológico e o psicossocial. Concluímos que o reconhecimento da identidade das pessoas trans e travestis, por meio da retificação de nome e gênero, foi oriundo de um processo intenso de mobilização da militância. O direito ao nome para as pessoas trans e travestis precisou ser reivindicado judicialmente, uma realidade que foi se modificando com o avanço jurisprudencial sobre o tema e que garantiu às pessoas trans a porta de acesso à cidadania.

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Biografía del autor/a

  • Gladston Oliveira dos Passos, Universidade Federal de Minas Gerais

    Doutorando em Antropologia pelo Programa de Pós-graduação em Antropologia da Universidade Federal de Minas Gerais, com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. 

  • Patrícia Rosalba Salvador Moura Costa, Universidade Federal de Sergipe

    Professora da Universidade Federal de Sergipe, atuando nos Programas de Pós-Graduação em Antropologia e Profissional em Ensino de História. Doutora em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa Catarina. 

  • Marcos Ribeiro de Melo , Universidade Federal de Sergipe

    Professor Associado do Departamento de Psicologia e professor permanente do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Cinema da Universidade Federal de Sergipe. Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Sergipe.

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Publicado

2025-12-01

Número

Sección

Dossiê Temático

Cómo citar

Etnografia de um processo: a luta da militância trans e travesti pelo direito à retificação de registro civil. (2025). Antropolítica - Revista Contemporânea De Antropologia, 57(3). https://doi.org/10.22409/antropolitica2025.v57.i3.a66922